SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL 
 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO  
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA 
INSTITUTO DE LETRAS E LINGUÍSTICA 
 MESTRADO PROFISSIONAL EM LETRAS 
 
 
 
 
 
 
MARCELA CRISTIANE DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONTOS, ROTEIROS E CURTAS-METRAGENS: UMA PROPOSTA DE ENSINO 
PARA A EJA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UBERLÂNDIA-MG 
 
2020 
 
 
MARCELA CRISTIANE DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONTOS, ROTEIROS E CURTAS-METRAGENS: UMA PROPOSTA DE ENSINO 
PARA A EJA 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação 
Mestrado Profissional em Letras (Profletras) da Universidade 
Federal de Uberlândia como requisito parcial para obtenção do 
título de Mestre em Letras. 
 
Área de concentração: Linguagens e Letramentos. 
 
 Orientadora:  Prof.ª Dr.ª Maria Aparecida Resende Ottoni. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UBERLÂNDIA-MG 
2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
_____________________________________________________ 
Prof.ª Dr.ª Cláudia Goulart Morais (ESEBA/UFU) – Videoconferência 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
A Deus, pelas bênçãos que me deram força, saúde e disposição durante a realização desta 
pesquisa. Ele é bom o tempo todo! 
À minha mãe maravilhosa, minha heroína, que sempre esteve em cena comigo, todo o brilho é 
e sempre será seu. Obrigada, por continuar segurando a minha mão para que eu brilhe! 
Ao meu pai (in memoriam), que embora não esteja mais em cena, deixa as marcas de uma linda 
história! 
Aos meus filhos Marlon, Eduardo, Arthur, por compreenderem as minhas ausências e serem 
em todas as horas, o meu porto seguro. 
Ao meu esposo João Batista, companheiro de todas as horas, que proporcionou a tranquilidade 
e o conforto de que tanto precisava para seguir em frente. 
À minha orientadora, Professora Cida, por me indicar os caminhos e dar a confiança necessária 
para concluir todas as etapas. Os vínculos afetivos que constrói com os/as /as orientandos/as 
não está nos manuais e, para mim, fez toda a diferença. Obrigada por respeitar as minhas 
limitações. 
À Conceição Guisardi, pelo apoio, colaboração, generosidade e altruísmo: sem me conhecer, 
me deu o melhor de si, abriu as portas da sua casa e ofereceu valorosas reflexões e contribuições 
para o meu trabalho. Terá sempre a minha admiração. 
Às professoras Claudia Goulart e Maria Cecília pelas pertinentes contribuições na banca de 
qualificação. 
Às professoras Claudia Goulart e Claudia Almeida por aceitarem participar da banca de defesa 
com prontidão e compromisso.  
Aos professores do mestrado: Adriana, Biella, Cida, Eliana, Elizete, Marisa, Marlúcia e 
Simone, pelo ensino primoroso, diferenciado e compromissado que por certo mudou a minha 
prática de ensino. 
À Coordenadora do Profletras, Marlúcia Maria e ao secretário do Profletras, Andson, pela 
educação, disponibilidade e agilidade diante das minhas necessidades. 
Aos meus amigos cúmplices de sempre: Elisangela, Sandra Leite, Ângela, Samantha, Justina, 
Marli, Alexsandra, Wilda, Ilma, Marisley, Mauro e Sueli que são fundamentais na minha vida, 
que me ensinam, me fazem rir e que emprestam o ombro amigo nas boas e más situações da 
vida.  
Às minhas parceiras da Transufu, Andreia, Iveliny, Sônia, Sunamita e Tayza, colegas da turma 
e da Secretaria de Educação do Distrito Federal, amigas que ganhei para a vida e que, entre as 
 
 
idas e vindas, incontáveis foram os risos e as confissões. A partir desse encontro, conversas 
longas, agradabilíssimas sob os cuidados do discreto Messias. 
Às minhas irmãs e irmãos Regis, Silvana, Luciana, Marcelo e Guilherme por fazerem parte da 
minha vida e darem apoio incondicional. 
À Lurdinha, pelas acolhidas aconchegantes em Uberlândia. 
Aos colegas, amigos/as da turma do Profletras que participaram da realização do sonho de um 
dia ser mestre/a, pelas emoções, partilhas, desabafos e cumplicidade. 
À direção e aos colegas da escola onde realizei a pesquisa, os quais deram total apoio para a 
aplicação da proposta interventiva. Especialmente Izabel e Fernanda. 
Muito obrigada! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Alguns querem um texto (uma arte, uma pintura) 
sem sombra, cortada da “ideologia dominante”; 
mas é querer um texto sem fecundidade, sem 
produtividade, um texto estéril (vejam o mito da 
Mulher sem Sombra). O texto tem necessidade de 
sua sombra: essa sombra é um pouco de ideologia, 
um pouco de representação, um pouco de sujeito: 
fantasmas, bolsos, rastos, nuvens necessárias; a 
subversão deve produzir seu próprio claro-escuro 
(BARTHES, 1996, p. 44). 
 
 
RESUMO  
 
Esta dissertação é resultado de uma pesquisa centrada na elaboração e aplicação de uma 
proposta interventiva de leitura e na análise crítica de contos, na produção de roteiros e de 
curtas-metragens, destinada ao público da Educação de Jovens e Adultos (EJA). O estudo tem 
como objetivos específicos: ler e produzir textos seguindo as convenções de diferentes gêneros, 
levando em conta a multissemiose e a integração das tecnologias digitais de forma reflexiva, 
significativa e crítica; ler contos da literatura brasileira, analisar e discutir as representações 
discursivas e identificações dos personagens neles construídas por meio de recursos 
linguístico/semióticos; investigar as representações e identificações de si construídas pelos 
discentes e relacioná-las às representações e às identificações dos personagens nos contos, 
articulando culturas, o lido e o vivido, estimular os/as estudantes ao protagonismo durante a 
realização das atividades propostas. Para atingir esses objetivos, apoiamo-nos em pressupostos 
da Análise de Discurso Crítica FAIRCLOUGH, 2001, 2003, 2008; CHOULIARAKI;  
FAIRCLOUGH, 1999; BATISTA JUNIOR; SATO; MELO, 2018; MAGALHÃES; 
MARTINS; RESENDE, 2017) , em estudos sobre os gêneros discursivos (BAKHTIN, 2015), 
sobre o ensino de Língua Portuguesa na EJA (FREIRE, 2002, 2005; OLIVEIRA, 2002), sobre 
o letramento crítico (FREIRE, 2005; MENEZES DE SOUZA, 2011; DUBOC, 2015) e 
multiletramentos ((ROJO; MOURA, 2012; SOARES, 2012; KLEIMAN, 2008), sobre os 
gêneros conto (CANDIDO, 1989; COSSON, 2012; CORTÁZAR, 2004; GOTLIB, 1988; 
VIEIRA, 2009), sobre o gênero roteiro (COMPARATO, 1983; FIELD, 2001) e sobre o gênero 
curta-metragem (ALCÂNTARA, 2014; ASSIS BRASIL, 2001; MIQUELANTE; MARSON; 
LANFERDINI, 2018). Desenvolvemos uma pesquisa qualitativa, ética, colaborativa, 
fortalecedora e de cunho etnográfico (THOMAS, 1993; GEERTZ, 1978; HAMMERSLEY; 
ATKINSON, 1995; CAMERON ET AL., 1992; GIEVE; MAGALHÃES, 1994; 
MAGALHÃES; GIEVE, 1998; IVANIC, 1998).  Os dados foram gerados por meio de 
questionários, de relatos orais e escritos, de gravações, de produção de um portfólio e de textos 
diversos em consonância com as convenções de diferentes gêneros e por meio de registros em 
diário de campo. Como resultado, pudemos perceber que o trabalho constituiu-se como uma 
oportunidade de protagonismo dos/as estudantes participantes, de reflexão sobre os usos da 
língua e de outros modos semióticos na leitura e na escrita, de análise crítica das representações 
e identificações construídas nos contos e de articulação do lido com o vivido, promovendo uma 
maior aproximação dos/as leitores/as da EJA do texto literário.  
 
Palavras-chave: Contos. Roteiro. Curta-metragem. EJA. Leitura, análise e produção textual. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
This dissertation is the result of a research centered on the elaboration and application of an 
interventionist reading proposal and in the critical analysis of short stories, in the production of 
scripts and short films, aimed at the Public of Youth and Adult Education (EJA). The study has 
as specific objectives: to read and produce texts following the conventions of different genres, 
taking into account multisemiosis and the integration of digital technologies in a reflective, 
meaningful and critical way; reading tales from Brazilian literature, analyzing and discussing 
the discursive representations and identifications of the characters built on them through 
linguistic / semiotic resources; to investigate the representations and identifications of 
themselves constructed by the students and to relate them to the representations and 
identifications of the characters in the stories, articulating cultures, the read and the lived, to 
stimulate the students to the protagonism during the performance of the proposed activities. To 
achieve these objectives, we rely on assumptions of the Critical Discourse Analysis 
FAIRCLOUGH, 2001, 2003, 2008; CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1999; BATISTA 
JUNIOR; SATO; MELO, 2018; MAGALHÃES; MARTINS; RESENDE, 2017), in studies on 
discourse genres (BAKHTIN, 2015), on the teaching of Portuguese Language at EJA (FREIRE, 
2002, 2005; OLIVEIRA, 2002), on critical literacy (FREIRE, 2005; MENEZES DE SOUZA, 
2011; DUBOC, 2015) and multi-tools ((ROJO; MOURA, 2012; SOARES, 2012; KLEIMAN, 
2008), about the short story genres (CANDIDO, 1989; COSSON, 2012; CORTÁZAR, 2004; 
GOTLIB, 1988; VIEIRA, 2009) , about the script genre (COMPARATO, 1983; FIELD, 2001) 
and about the short film genre (ALCÂNTARA, 2014; ASSIS BRASIL, 2001; MIQUELANTE; 
MARSON; LANFERDINI, 2018). We developed a qualitative, ethical, collaborative, 
strengthening and ethnographic (THOMAS, 1993; GEERTZ, 1978; HAMMERSLEY; 
ATKINSON, 1995; CAMERON ET AL., 1992; GIEVE; MAGALHÃES, 1994; 
MAGALHÃES; GIEVE, 1998; IVANIC, 1998). The data were generated through 
questionnaires, oral and written reports, recordings, portfolio production and various texts in 
line with the conventions s of different genres and through records in a field diary. As a result, 
we were able to perceive that the work constituted itself as an opportunity for protagonism of 
the participating students, for reflection on the uses of language and other semiotic ways in 
reading and writing, for a critical analysis of the representations and identifications built in the 
tales and articulation of the read with the lived, promoting a greater approximation of the 
readers of the EJA to the literary text. 
 
Keywords: Tales.Script. Short film. EJA. Reading, analysis and textual production. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
  
FIGURA 1 –  Concepção Tridimensional do discurso em Fairclough (2001) ......................... 41 
FIGURA 2 –  O tripé da obra de Fairclough (2003) ................................................................ 46 
FIGURA 3 –  A relação dialética e de internalização entre os tripés de Fairclough (2003) .... 47 
FIGURA 4 –  Apresentação dos resultados da sondagem ........................................................ 72 
FIGURA 5 –  Dinâmica para motivar a leitura do conto “A cartomante” ............................... 84 
FIGURA 6 –  Cópia das questões antes de saírem em duplas .................................................. 93 
FIGURA 7 –  Diferença ente conto, novela e romance ............................................................ 95 
FIGURA 8 –  Leitura oral compartilhada do conto “Tchau” ................................................... 96 
FIGURA 9 –  Imagem da capa do livro de contos “Tchau” ..................................................... 98 
FIGURA 10 – Slides explicativos sobre o gênero conto ........................................................ 100 
FIGURA 11 – Fotos dos/as contistas fixadas na parede ........................................................ 102 
FIGURA 12 – Colocação das placas dos nomes dos/as escritores/as às figuras no Cine Clube
 ........................................................................................................................ 104 
FIGURA 13 – Atividade sobre os títulos das obras: “A caolha” ........................................... 105 
FIGURA 14 – Atividade sobre os títulos das obras: “A terceira margem do rio” ................. 106 
FIGURA 15 – Atividade sobre os títulos das obras: “Clínica de Repouso” .......................... 107 
FIGURA 16 – Leitura compartilhada do conto “A caolha” ................................................... 109 
FIGURA 17 – Respostas da atividade contendo os trechos dos temas .................................. 116 
FIGURA 18 – Avaliação da sociedade atual .......................................................................... 117 
FIGURA 19 – Imagem do conto “A caolha” ......................................................................... 118 
FIGURA 20 – “A caolha” está de acordo com a descrição dada a ela no corpo do texto? 
Justifique. ....................................................................................................... 119 
FIGURA 21 – “Como você lê a imagem?” ............................................................................ 120 
FIGURA 22 – “O que mais lhe chama a atenção nessa imagem? Por quê?” ......................... 121 
FIGURA 23 – Palestra realizada com a mãe/professora de pessoa com deficiência ............. 123 
FIGURA 24 – Leitura do conto “A terceira margem do rio” ................................................. 125 
FIGURA 25 – Sequência de uma narrativa visual ................................................................. 126 
FIGURA 26 – Etapa de interpretação e de análise do conto “A terceira margem do rio” ..... 127 
FIGURA 27 – Imagem do conto “A terceira margem do rio” ............................................... 134 
FIGURA 28 – Interpretação da imagem do conto “A terceira margem do rio” ..................... 134 
FIGURA 29 – Palestra com o conselheiro tutelar Lucas........................................................ 137 
FIGURA 30 – Registro de Diário de campo .......................................................................... 139 
FIGURA 31 – Imagem do conto “Clínica de Repouso” ........................................................ 143 
FIGURA 32 – Interpretação da imagem do conto “Clínica de repouso” ............................... 143 
FIGURA 33 – Análises do gênero em grupos ........................................................................ 146 
FIGURA 34 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 1 .................... 147 
FIGURA 35 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 2 .................... 148 
FIGURA 36 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 3 .................... 149 
FIGURA 37 – Análise das especificidades do gênero conto coletivamente .......................... 150 
FIGURA 38 – Registro da análise das especificidades do gênero conto ............................... 151 
FIGURA 39 – Explicando o gênero Roteiro .......................................................................... 153 
FIGURA 40 – Produção do Roteiro ....................................................................................... 154 
FIGURA 41 – Uso dos computadores para a produção do Roteiro ....................................... 154 
FIGURA 42 – Familiarização com o gênero curta-metragem ............................................... 156 
FIGURA 43 – Apresentação do programa Filmora Wondeshare .......................................... 158 
FIGURA 44 – Escolha do fundo musical do curta-metragem................................................ 158 
FIGURA 45 – Produção e edição do curta-metragem ............................................................ 159 
 
 
FIGURA 46 – Folder do festival do curta-metragem ............................................................ 161 
FIGURA 47 – Organização do evento ................................................................................... 161 
FIGURA 48 – Exibição do curta-metragem ........................................................................... 162 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
QUADRO 1 – Categorias analíticas propostas no modelo tridimensional .............................. 43 
QUADRO 2 – Arcabouço de Chouliaraki e Fairclough (1999) ............................................... 44 
QUADRO 3 – Esquema de roteiro inspirado na proposta de Field (2001) .............................. 53 
QUADRO 4 – Idade dos/as participantes da pesquisa ............................................................. 68 
QUADRO 5 – Contexto de produção e constituição do gênero ............................................ 145 
QUADRO 6 – Avaliação dos/as convidados/as sobre os curtas-metragens ........................... 163 
QUADRO 7 – Avaliação dos/as participantes sobre os curtas-metragens ............................. 165 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
 
GRÁFICO 1 – Das leituras feitas dentro e fora da escola, do que você mais gosta? ............... 74 
GRÁFICO 2 – Você vê relação entre o que lê nos textos dentro da escola com aquilo que       
você vive? ........................................................................................................ 75 
GRÁFICO 3 – Você tem o costume de falar de si mesmo dentro da escola? .......................... 77 
GRÁFICO 4 – Você tem o costume de falar de si mesmo fora da escola? .............................. 77 
GRÁFICO 5 – Você tem o hábito de escrever sobre a sua vida? ............................................. 79 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1            CONTEXTUALIZAÇAO DA PESQUISA, OBJETOS, JUSTIFICATIVAS ..... 15 
2            REVISÃO DOCUMENTAL, FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-
METODOLÓGICA E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................... 25 
2.1         Histórico e desafios da EJA............................................................................................... 25 
2.1.1      Histórico da EJA ................................................................................................................. 25 
2.1.2      Desafios da EJA .................................................................................................................. 27 
2.2         Letramento Literário .......................................................................................................... 30 
2.3         A Pedagogia dos Multiletramentos .................................................................................. 34 
2.4         Letramento crítico .............................................................................................................. 36 
2.5         Análise de Discurso Crítica (ADC) .................................................................................. 39 
2.6         Gêneros discursivos ........................................................................................................... 48 
2.6.1      O conto ................................................................................................................................ 50 
2.6.2      O roteiro............................................................................................................................... 52 
2.6.3      O curta-metragem ............................................................................................................... 54 
2.7         Fundamentos metodológicos ............................................................................................. 56 
2.8         Procedimentos metodológicos, contexto de pesquisa e participantes ........................... 62 
2.8.1      A triangulação na pesquisa ................................................................................................ 66 
2.8.2      O contexto de pesquisa: a escola participante ................................................................. 67 
2.8.3      Os participantes do estudo ................................................................................................. 68 
3            RELATO E ANÁLISE DA APLICAÇÃO DA PROPOSTA .................................. 70 
3.1         Relato da aplicação da proposta, análise dos dados e discussão dos resultados.......... 70 
3.1.1      Bloco 1: relato, análise e avaliação .................................................................................. 71 
3.1.2      Aplicação do Bloco 2 ......................................................................................................... 84 
3.1.3      Aplicação do Bloco 3 ......................................................................................................... 93 
3.1.4      Bloco 4 - Leitura e interpretação .................................................................................... 108 
3.1.5      Bloco 5 - Avaliação .......................................................................................................... 165 
3.2         Reflexão sobre a pesquisa ............................................................................................... 169 
              CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 171 
              REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 175 
              APÊNDICES ................................................................................................................... 185 
              APÊNDICE A – Questionário – diagnóstico inicial..................................................... 186 
              APÊNDICE B – Roteiro de entrevista semiestruturada ............................................... 187 
              APÊNDICE C – Roteiro criado pelos/as participantes ................................................ 188 
              APÊNDICE D – Avaliação do curta - metragem ......................................................... 197 
              APÊNDICE E – Avaliação pelos/as participantes da pesquisa sobre a produção do 
curta-metragem ................................................................................................................. 198 
 
 
              ANEXOS .......................................................................................................................... 199 
              ANEXO A – Termo de consentimento livre e esclarecido para responsável legal por 
menor de 18 anos .............................................................................................................. 200 
              ANEXO B – Termo de Assentimento para o menor entre 12 e 18 anos incompletos
 ............................................................................................................................................ 202 
              ANEXO C – Termo de Consentimento livre e esclarecido ......................................... 204 
              ANEXO D – “A cartomante” de Machado de Assis .................................................... 206 
              ANEXO E – “Tchau” de Lygia Bojunga ....................................................................... 212 
              ANEXO F – “A caolha” de Júlia Lopes de Almeida ................................................... 218 
              ANEXO G – “A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa ................................... 222 
              ANEXO H – “Clínica de Repouso” de Dalton Trevisan ............................................. 225 
              ANEXO I –  Termo de autorização de uso de imagem ................................................ 228 
              ANEXO J –  Parecer Consubstanciado do CEP .......................................................... 229 
              ANEXO K – Convenções do PETEDI para transcrição de Material Oral ................. 230 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
15 
 
1 CONTEXTUALIZAÇAO DA PESQUISA, OBJETOS, JUSTIFICATIVAS  
 
A Educação de Jovens e Adultos, doravante EJA, é uma modalidade de ensino 
diferenciada que atende alunos provenientes de inúmeras demandas e frustrações, sejam de 
ordem escolar (são vários alunos retidos, repetentes e evadidos) ou de ordem familiar (quando 
ocorre o abandono por causa de gravidez precoce, necessidade de trabalho para ajudar/sustentar 
a família) e/ou ainda de ordem social (desemprego ou remuneração muito baixa). E, para 
agravar o quadro, há, entre os alunos, disparidade entre as idades que interferem no ensino e 
aprendizagem. Nesse contexto, temos adolescentes de 15 anos (a quarta maior parcela de 
estudantes da EJA, de acordo com o Inep/Censo, 2016) e senhores e/ou senhoras de mais de 40 
anos (a segunda maior parcela de estudantes da EJA de acordo com o Inep/Censo, 2016).  
Surgem, então, anseios e mudanças de comportamento, tal como o amadurecimento 
desse público, e, na posição de docentes, temos de lidar com toda essa diversidade em sala de 
aula.  Todavia, inegavelmente, todos esses estudantes querem apenas dar continuidade e 
concluir os estudos que outrora, não tiveram a oportunidade de cursar.  
Destacamos também como um problema, os livros didáticos disponíveis ao público da 
EJA que não contemplam as reais necessidades desses alunos: ou propõem atividades 
descontextualizadas e distantes da realidade dos estudantes, ou seguem os mesmos modos do 
Ensino Regular, sem a preocupação com a adequação curricular para a EJA. Tal constatação é 
evidenciada por Queiroz (2012, p. 125) que afirma “Nas escolas os alunos são condicionados a 
trabalhar com um livro didático descontextualizados distante de suas realidades.” e por Oliveira 
et al. (2014): 
 
Através da observação e da análise do livro didático alfabetização da EJA, verifica-se 
que na maioria das vezes, as propostas de atividades de compreensão textual e os 
exercícios de avaliação não condizem com a realidade vivenciada pelos educandos, 
tão defendida por Paulo Freire. Por meio desta análise, verificou-se que o livro 
didático não contempla a necessidade de aprendizagem dos alunos da EJA, pois os 
processos de ensino-aprendizagem nem sempre ocorrem com a participação do aluno, 
além de considerar as diferentes realidades e formas de aprendizagem (OLIVEIRA et 
al. 2014, p. 10). 
 
Esses livros, destinados ao público EJA, fazem parte do Plano Nacional do Livro 
Didático (PNLD) desde 2009, e já foram distribuídas duas edições, em 2011 e em 2014, mas já 
se encontram defasadas em relação ao Parecer CNE/CEB nº 1/2016 que, dentre outros aspectos, 
trata dos eixos integradores, devendo estes enlaçar-se com os saberes do trabalho. Os livros 
didáticos entregues aos alunos são também consumíveis, ou seja, o aluno pode realizar as 
 
16 
 
tarefas e fazer anotações no material e, devido à ausência de reposição deles pelo MEC, muitas 
turmas que foram sendo formadas não possuem o livro. Em 2018, a terceira edição do LD 
deveria ter sido entregue aos alunos, o que não ocorreu, pois, segundo o informe 46/2017 – 
COARE/FNDE, os marcos legais que norteiam a EJA estavam em revisão para adequação dos 
LD no ano de 2018.   
Há de se considerar ainda que vários estudantes retornam à escola depois de muitos anos 
fora dela e chegam cheios de esperança e expectativas de mudança de vida, nesse regresso. 
Assim, cabe a proposta de um currículo que seja organizado, a fim de atender aos anseios desses 
educandos. Mas, quando isso não acontece, o aluno evade da escola. Sobre a desistência, Catelli 
Júnior, da Organização não Governamental (ONG) Ação Educativa, em entrevista à revista 
Educação (2017), apresenta as seguintes considerações:  
 
A desistência tem a ver com três coisas, pelo menos: problemas de trabalho, de 
moradia ou de localização da escola, e o próprio currículo. No caso do currículo, às 
vezes porque a escola tem um horário extenso demais, ou um modelo de aula em que 
o aluno não acredita. Aí, ele simplesmente vai embora (CATELLI JÚNIOR, 2017, 
s/p). 
 
As ponderações desse especialista combinam com a opinião dos docentes dessa 
modalidade da educação básica e são facilmente percebidas no decorrer do ano letivo, das 
escolas que oferecem a EJA. 
Além disso, há outro desafio imposto aos professores da EJA: como trabalhar as 
habilidades socioemocionais desses alunos para que lidem com as próprias emoções e para que 
possam estabelecer relações com o próximo dentro e fora da sala de aula? Primeiramente, é 
preciso compreender que a EJA não é uma mera tentativa de recuperar conteúdos que não foram 
estudados em anos anteriores; oferecer uma oportunidade de concluir os estudos a esse público 
é além de tudo, uma questão social. As necessidades desses alunos vão muito além de 
simplesmente ler e escrever e, como ensina Paulo Freire (2002), são estudantes que retornam à 
escola cheios de saberes. Considerar tais saberes, que foram sendo adquiridos, ao longo da 
história de cada um, é possibilitar que eles se sintam ouvidos e isso parte do processo de ensino 
e aprendizagem. Nesse decurso, não vale um ensino universal que desconsidere as 
individualidades, mas um ensino que possibilite o protagonismo desses estudantes e dialogue 
com a realidade e expectativa deles. Sendo assim, as aulas de Língua Portuguesa devem estar 
voltadas para essa perspectiva, com leituras que busquem tanto a reflexão quanto o desejo de 
manifestar o que viveram, o que sonham, o que sabem, é libertar-se da posição de oprimido, 
 
17 
 
como bem defenderia Paulo Freire: “O importante é que a luta dos oprimidos se faça para 
superar a contradição em que se acham. Que esta superação seja o surgimento do homem novo 
- não mais opressor, não mais oprimido, mas homem libertando-se” (FREIRE, 2005, p. 58). 
Enfim, escutar o que esses estudantes têm a nos dizer. 
Para tal, sugerimos inserir obras literárias adequadas às diversas idades que compõem a 
EJA e criar estratégias que levem o aluno a pesquisar, elaborar, ler, analisar e produzir. Dessa 
forma, poderemos auxiliar o estudante a assumir o papel de protagonista, no processo de 
aprendizagem, de um sujeito produtor, abandonando a postura passiva e oprimida, tão comum 
a muitos.  
Ao pensarmos em uma proposta com obras literárias, vale salientar que não 
consideramos a literatura como apêndice da Língua Portuguesa. Não ignoramos o fato de que 
a literatura se encontra em estado de falência, porque não tem sido trabalhada como deveria ser. 
Cosson (2012, p. 23) defende que “estamos diante da falência do ensino da literatura. Seja em 
nome da ordem, da liberdade ou do prazer. O certo é que a literatura não está sendo ensinada 
para garantir a função essencial de construir e reconstruir a palavra que nos humaniza”. Isso 
não significa que, se trabalharmos qualquer texto, resgataremos o ensino significativo da 
literatura. Cosson (2012, p. 23) alerta para o fato de que “aqueles que acreditam que basta a 
leitura de qualquer texto, estão equivocados, pois essa experiência poderá ser ampliada com 
informações específicas do campo literário e até fora dele”. Tendo em vista essa perspectiva, 
nesta dissertação, propomos um trabalho de leitura e de análise crítica de histórias narradas em 
contos, no qual o aluno foi motivado a relacioná-las com a realidade em que vive e pode 
apresentar alternativas para as situações conflitivas dessas histórias. 
Na seleção de contos, foram incluídas histórias que provavelmente se assemelham aos 
dramas vividos pelos estudantes, tais como falta de qualificação para o trabalho, separação de 
casais, abandono dos pais etc. Por conseguinte, fomentamos a leitura e estimulamos os alunos 
ao hábito de ler para que pudesse ser uma prática cotidiana do estudante em qualquer série, 
dentro ou fora da escola. Ressaltamos que, além do conto, a proposta foi voltada para a 
produção do gênero roteiro e curta-metragem. Para o trabalho com curta-metragem, foram 
realizadas oficinas, no laboratório de informática. Nessas oficinas, foram ensinados aos alunos 
como criar os curtas-metragens, usando um programa de animação e exploramos, também, os 
elementos constituintes desse gênero, para que os alunos fossem capazes de produzir o gênero 
solicitado.  
 
18 
 
Para a produção desse trabalho, apoiamo-nos em pressupostos da Análise de Discurso 
Crítica (FAIRCLOUGH, 2001, 2003, 2008; CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1999; 
BATISTA JUNIOR; SATO; MELO, 2018; MAGALHÃES ; MARTINS; RESENDE, 2017), 
em estudos sobre os gêneros discursivos (BAKHTIN, 2015), sobre o ensino de Língua 
Portuguesa na EJA  (FREIRE, 2002, 2005; OLIVEIRA, 2002), sobre o letramento crítico 
(FREIRE, 2005; MENEZES DE SOUZA, 2011; DUBOC, 2015)  e multiletramentos (ROJO; 
MOURA, 2012; SOARES, 2012; KLEIMAN, 2008), sobre o gênero conto (CANDIDO, 1989; 
COSSON, 2012; CORTÁZAR, 2004; GOTLIB, 1988; VIEIRA, 2009), sobre o gênero roteiro 
(COMPARATO, 1983; FIELD, 2001) e sobre o gênero curta-metragem (ALCÂNTARA, 2014; 
ASSIS BRASIL, 2001; MIQUELANTE; MARSON; LANFERDINI, 2018). 
Participaram desta pesquisa discentes de uma turma de 8ª série1, do Segundo Segmento 
da EJA, de uma escola distrital da cidade de Brasília, no Bairro de Samambaia, na qual 
ministramos aulas2.  
Em um levantamento que fizemos, em diferentes bases de dados, identificamos que 
havia alguns trabalhos que foram desenvolvidos sobre os gêneros conto e curta-metragem, 
como estratégia de ensino e aprendizagem em diferentes áreas e anos, como Maiolini (2013), 
Moretto (2013), Fortes (2011), Oliveira (2015) e Cavalcante (2016), que dissertaram sobre 
contos sob diferentes perspectivas, Alcântara (2014), Venturini (2017), Hennig e Medeiros 
(2011)  e Freitas (2017), cujo enfoque foi o curta-metragem. 
Maiolini (2013) propôs investigar e discutir as práticas de letramento, tendo como 
público-alvo os alunos de 7º e 9º ano do Ensino Fundamental. O autor também observou e 
investigou como o gênero discursivo conto apareceu na coleção de Livro Didático “Viva 
Português”; Moretto (2013) investigou a cultura (e os contos orais) e a influência da fotografia 
na comunicação das histórias de vida, no bairro de Santa Cruz dos Navegantes, no município 
do Guarujá em São Paulo; Fortes (2011) apresentou o conto literário como estratégia de ensino 
e divulgação da língua portuguesa; Oliveira (2015) apresentou uma proposta pedagógica, a 
partir do conto de Vladimir Souza Carvalho, “Lugar na missa,” e que passou à produção de um 
curta-metragem - o produto final também foi a criação de um Caderno Pedagógico. Cavalcante 
(2016), por sua vez, escolheu quatro contos da obra “Com certeza tenho amor”, de Marina 
                                                     
1 A professora pesquisadora foi docente nesta turma no semestre anterior e, acredita que melhores resultados 
junto aos /às participantes da pesquisa podem ser alcançados devido a esse convívio entre as partes. 
2 Em conformidade com as normas do Profletras, o aluno deve elaborar uma proposta de intervenção e aplicá-la 
em turma do Ensino Fundamental, na qual ministra aulas.  
 
 
19 
 
Colasanti. Os contos lidos versam sobre a condição feminina e a partir da leitura, a estudiosa 
propôs uma sequência básica (COSSON, 2012). 
Alcântara (2014) propôs investigar, por meio de relatos dos professores de língua 
portuguesa de Cuiabá, Mato Grosso, como esses educadores utilizaram os curtas-metragens do 
programa “Curta na escola”, acompanhados de uma sequência didática, desenvolvido pela 
Petrobrás, desde 2006, além de tentar compreender como ocorre a produção de sentidos, por 
meio da linguagem audiovisual. Nessa pesquisa, ele buscou amparo nas ideias de Bakhtin 
(1987). Venturini (2017) desenvolveu uma pesquisa voltada para os alunos de 3º ao 5º ano do 
Ensino Fundamental com deficiência intelectual, em horário de contraturno, no interior do Rio 
Grande do Sul. Os estudantes tiveram oficinas, organizadas com o passo a passo, para a 
produção de um curta-metragem. Em seguida, escolheram dois temas transversais e produziram 
o roteiro e as filmagens. O material produzido foi disponibilizado no You tube. Hennig e 
Medeiros (2011) apresentaram um artigo sobre a realização de uma proposta de trabalho, para 
alunos do 2 º ano do Ensino Médio, que consistiu na leitura de 6 obras literárias (A moreninha, 
O Guarani, Memórias de um sargento de milícias, Dom Casmurro, Luzia-Homem e O Cortiço) 
para lerem e produzirem, em grupos, 10 (dez) curtas-metragens dessas obras. Freitas (2017), 
professor de Geografia, desenvolveu uma proposta interventiva junto aos alunos do 9 º ano do 
Ensino Fundamental de Santa Catarina, cujo assunto motivador foi sobre a África. Após as 
aulas sobre o continente africano, os alunos criaram 9 (nove) curtas-metragens, com diferentes 
temas a partir do assunto trabalhado e, posteriormente, foi realizado um festival de cinema na 
escola. 
Por esse levantamento, evidenciamos que nenhum dos trabalhos elencados tem como 
proposta trabalhar a leitura e a análise crítica de contos na EJA, a produção de roteiros e de 
curtas-metragens, na perspectiva da Pedagogia dos multiletramentos, do letramento crítico e da 
Análise de Discurso Crítica, como objetivamos fazer em nosso estudo. Assim sendo, essa 
pesquisa mostra-se necessária e relevante.  
Isso posto, a escolha da pesquisa voltada para o público EJA ocorreu pelo fato de ser 
uma parcela educacional com diversos problemas e que precisavam ser pesquisados, sendo o 
principal deles, a evasão. O abandono escolar, acreditamos que estivesse, entre outras razões, 
ligado às práticas educativas desvinculadas das necessidades dessa parcela de estudantes. 
Conforme Laibida e Pryjma (2013) asseveram: 
 
Outro questionamento revela que quando as estratégias de ensino adotadas pelos 
professores não atendem às necessidades dos alunos, elas podem acarretar a evasão 
 
20 
 
escolar dos alunos demonstrando que aquele docente que não inova, que insiste em 
aulas expositivas ou usa inadequadamente outras metodologias (vídeos muito 
extensos, pesquisas sem contextualização, laboratório sem finalidade e outros) amplia 
o fator de frustração e descontentamento pelo processo de ensino e aprendizagem 
(LAIBIDA ; PRYJMA, 2013, p. 10). 
 
A partir dessas reflexões, a nossa proposta teve por objetivo um fazer pedagógico 
diferenciado e voltado para as discussões e conflitos que permeiam a sociedade, por meio de 
histórias literárias.   
A pesquisa é também relevante porque propôs a produção de curtas-metragens, para que 
os estudantes da EJA pudessem se expressar, por meio da escrita, suas impressões, reflexões 
ou experiências vividas após o trabalho com os contos, o que é coerente com os pressupostos 
do letramento crítico (FREIRE, 2005; MENEZES DE SOUZA, 2011; DUBOC, 2015) e com a 
pedagogia de multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2000, 2009; ROJO, 2012). Isso porque, 
por meio do trabalho com os contos, foi possível conhecer diferentes culturas neles 
representadas e a cultura dos alunos (cultura local), associando-as e refletindo sobre elas, assim 
como, por meio da produção de curtas-metragens, foi possível levar em conta essas culturas e 
contemplar a abordagem de diferentes semioses3: o multissemiótico4. Além disso, a proposta 
constituiu uma oportunidade importante de protagonismo dos alunos da EJA, por meio da 
produção de curtas-metragens, de reflexão sobre os usos da língua e de outros modos semióticos 
na leitura e na escrita, enfim, de uma análise crítica e de produção criativa.  
São vários os contos de diferentes escritores que trazem histórias com personagens 
centrais ou secundários que se assemelham às histórias dos estudantes da EJA. Autores como 
Machado de Assis, Lygia Bojunga, Guimarães Rosa, Júlia Lopes de Almeida, Dalton Trevisan 
são contistas que costumam apresentar, em suas histórias criadas, personagens que, de alguma 
forma, trazem alguma representatividade a determinados leitores. Isso ocorre devido ao período 
histórico vivido pelos escritores, cujas características literárias são a denúncia social e crítica 
às instituições, desde o final do século XIX (igreja, sociedade, família etc.). Esses estilos de 
                                                     
3 No artigo de Fairclough (2012, p. 308), traduzido por Iran Melo, ele explica: “A semiose inclui todas as formas 
de construção de sentidos - imagens, linguagem corporal e a própria língua. Vemos a vida social como uma rede 
interconectada de práticas sociais de diversos tipos (econômicas, políticas, culturais, entre outras), todas com um 
elemento semiótico.” 
4 Rojo e Barbosa (2015) afirmam que “texto multimodal ou multissemiótico é aquele que recorre a mais de uma 
modalidade de linguagem ou a mais de um sistema de signos ou símbolos (semiose) em sua composição. Língua 
oral e escrita (modalidade verbal), linguagem corporal (gestualidade, danças, performances, vestimentas – 
modalidade gestual), áudio (música e outros sons não verbais – modalidade sonora) e imagens estáticas e em 
movimento (fotos, ilustrações, grafismos, vídeo, animações – modalidades visuais) compõem hoje os textos da 
contemporaneidade, tanto em veículos impressos como, principalmente, nas mídias analógicas e digitais. (ROJO 
e BARBOSA, 2015, p. 108). 
 
21 
 
épocas, que apresentam tais características, iniciaram, no Realismo5, permanecendo até os dias 
atuais e possui como cânone o escritor Machado de Assis, um dos fundadores da Academia 
Brasileira de Letras, negro, pobre, epilético, segundo Vasconcelos (2015). Esse escritor possui 
uma história de superação que mereceu ser conhecida pelos alunos da EJA, pois serviu de 
inspiração e muitos puderam se identificar com sua história de vida, por ter conseguido vencer, 
apesar de todas as adversidades.  
Nesse mesmo sentido, aponta Fernandes (2009, p. 19): “uma vez compreendido que a 
obra literária é uma manifestação de arte que atua sobre o indivíduo, entendemos que a literatura 
possibilita o contato dele com o universo que o cerca e que sua força reside na capacidade de 
formação do homem”.  Condizente com Fernandes (2009), sobre a obra literária, os contos 
escolhidos puderam possibilitar aos leitores reflexões críticas sobre si mesmos e sobre a 
sociedade a qual fazem parte e sobre as situações que lhes são impostas e os mantêm como 
marginalizados. Dito de outro modo, as preocupações com a voz dos personagens, nessas 
produções literárias, tanto podem simbolizar o silêncio como instigar o leitor a questioná-la 
quanto à marginalização de certos tipos humanos como a mulher negra, o nordestino, o pobre, 
o analfabeto, o idoso, o deficiente e vários outros tipos humanos. Cosson e Souza (2011) 
defendem também que a escola deve promover o letramento literário, que vai muito além do 
acesso à literatura. Trata-se de “uma experiência de dar sentido ao mundo por meio de palavras 
que falam de palavras, transcendendo os limites de tempo e espaço.” (COSSON; SOUZA, 2011, 
p. 103).  Nessa mesma direção, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enumera como 
uma das competências a serem desenvolvidas pelos alunos a prática de leitura literária: 
 
Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do 
senso estético para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-
culturais como formas de acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento, 
reconhecendo o potencial transformador e humanizador da experiência com a 
literatura (BRASIL, 2018, p. 89). 
 
A literatura, dessa forma, com tantos tipos e histórias, é uma excelente fonte para 
diminuir preconceitos e demonstrar o funcionamento da sociedade por meio da ficção e pode 
despertar, nos leitores, a compreensão e tolerância aos indivíduos que possuem diferentes 
culturas, crenças e valores. Coube ao professor, como mediador, instigar, despertar, trazer à 
                                                     
5“[...] o realismo em literatura (mesmo quando o termo é omitido) é um ideal: o da representação fiel do real, o do 
discurso verídico, que não é um discurso como os outros, mas a perfeição para a qual todos os discursos devem 
encaminhar-se” (TODOROV, 1984, p. 9). 
 
 
22 
 
tona o que não estava evidente na obra literária aos seus alunos, daí a sua importância nesse 
processo. Em outras palavras, sobre a literatura, Candido (1989) revela que: 
 
[...] o processo que confirma no homem aqueles traços que reputamos essenciais, 
como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o 
próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, 
o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do 
humor. A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos 
torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante. 
(CANDIDO, 1989, p. 117). 
 
A leitura de obras ficcionais também permitiu reflexões que foram além de debates e 
foram levadas em conta para demonstrar a evolução ou não de determinados aspectos da 
sociedade. A proposta deste projeto tentou também explicar como os sujeitos, enquanto 
personagens, podem ser também representações de tipos reais de humanos, que sofrem por 
serem quem são, dentro da obra ficcional. Dalcastagnè (2004) trata do assunto da seguinte 
forma: 
 
O silêncio dos grupos marginalizados – entendidos em sentido amplo, como todos 
aqueles que vivenciam uma identidade coletiva que recebe valoração negativa da 
cultura dominante, sejam definidos por sexo, etnia, cor, orientação sexual, posição nas 
relações de produção, condição física ou outro critério – é coberto por vozes que se 
sobrepõem a ele, vozes que buscam falar em nome desses grupos, mas também, 
embora raramente, pode ser quebrado pela produção literária de seus próprios 
integrantes (DALCASTAGNE, 2004, p. 15). 
  
Ademais, acreditamos que uma pesquisa fundamentada na ADC e centrada na leitura e 
análise de contos literários de diversos autores pôde colaborar para que os estudantes da EJA 
encontrassem sentido nas leituras e pudessem se posicionar de maneira mais crítica e reflexiva 
sobre diferentes temáticas como as apresentadas nos contos. Essa pesquisa pôde possibilitar aos 
participantes construir sentidos diferentes acerca daquilo que eles leem, além de ampliar a visão 
de mundo. Foi possível, também, a contribuição em fazer com que o aluno sentisse como 
protagonista do seu próprio processo de aprendizagem.  
A produção de roteiros e de curtas-metragens justificou-se por possibilitar que os alunos 
agissem ativamente sobre a linguagem tecnológica e lidassem com diferentes ferramentas, 
programas e recursos disponíveis nos computadores. Acreditamos que ao transformar os contos 
lidos em outro gênero, pudemos proporcionar, aos alunos da EJA, um desenvolvimento de 
habilidades de leitura e escrita, o acesso aos meios tecnológicos, a possibilidade de construir 
sentidos diante dos textos que leram. Esse trabalho com os contos pôde proporcionar aos alunos 
 
23 
 
da EJA, despertar o prazer pela leitura, facilitar a compreensão de textos que circulam 
socialmente, proporcionar o acesso à tecnologia e sentimento de empoderamento, pois muitos 
desses alunos também se sentem excluídos digitais e incapazes de lidar com os computadores, 
mas, por meio das oficinas no Laboratório de Informática, com vistas à produção audiovisual 
dos contos lidos os alunos puderam aspirar a superação dessa dificuldade.  
Considerando o exposto, o objetivo geral deste estudo foi: elaborar e aplicar uma 
proposta interventiva destinada à EJA e centrada na leitura e na análise linguística/semiótica 
crítica de contos e na produção (escrita e multissemiótica) dos gêneros roteiro e curta-
metragem, que possa contribuir para a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a 
participação significativa e crítica dos alunos da EJA em diversas práticas sociais constituídas 
por diferentes linguagens e possa levá-los a estabelecer relações entre o que leem e o que vivem.  
Para o alcance do objetivo geral, listamos a seguir os objetivos específicos:  
a) Ler e produzir textos seguindo as convenções de diferentes gêneros, levando em conta 
a multissemiose e a integração das tecnologias digitais de forma reflexiva, significativa 
e crítica. 
b) Ler contos da literatura brasileira, analisar e discutir as representações discursivas e 
identificações dos personagens neles construídas por meio de recursos 
linguístico/semióticos. 
c) Investigar as representações e identificações de si construídas pelos discentes e 
relacioná-las às representações e às identificações dos personagens nos contos, 
articulando culturas, o lido e o vivido.  
d) Estimular os/as estudantes ao protagonismo durante a realização das atividades 
propostas. 
Consoante ao que se propõe no Profletras e à proposta de Chouliaraki e Fairclough 
(1999), nós partimos de um problema social, com uma faceta discursiva, identificado na sala 
de aula ou na escola, relacionado ao ensino de Língua Portuguesa. Nessa perspectiva, 
consideramos que para obter bons resultados na EJA, o professor deve estar disposto a ouvir 
seus alunos e tentar torná-los protagonistas de suas histórias. Para que isso ocorresse, seria 
preciso criar situações em que houvesse uma escuta sensível6.  Porém, tal prática raramente era 
aplicada em sala de aula. Na maioria das vezes, os alunos precisam ler e escrever longe da 
                                                     
6  “A escuta sensível é o modo de tomar consciência e de interferir próprio do pesquisador ou educador que adote 
essa lógica de abordagem transversal”  (BARBIER, 1998, p. 172).  A escuta sensível é aquela que se apoia na 
empatia, é aquela que permite que o educador, o pesquisador, sinta o universo afetivo, imaginário e cognitivo do 
outro para poder entender suas atitudes, comportamentos, ideias, valores, mitos, etc. (BARBIER, 2002).  
 
24 
 
realidade em que vivem e distante de seus interesses.  
Como resultado, os alunos apresentam dificuldades com a leitura e a escrita e acabam 
se distanciando dos textos lidos, quando a intenção seria contrária.  Além disso, raramente, 
conseguem se ver e se identificar nos textos ou discutir qualquer representação de personagens.  
Desse modo, apresentamos uma proposta de intervenção aplicada em sala de aula, 
estabelecendo um caminho possível para minimizar o problema abordado. Tendo isso em vista, 
elencamos as seguintes questões de pesquisa:  
Como uma proposta interventiva centrada na leitura e na análise linguística/semiótica 
crítica de contos e na produção (escrita e multissemiótica) dos gêneros roteiro e curta-metragem 
pode contribuir para a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a participação 
significativa e crítica dos discentes da EJA em diversas práticas sociais constituídas por 
diferentes linguagens, para levá-los a estabelecer relações entre o que leem e o que vivem, 
aproximando-os do texto literário, e para a exploração da multissemiose e a integração 
das   Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) ao ensino? 
À vista do exposto, esta dissertação, vinculada à linha de atuação Leitura e Produção 
Textual: diversidade social e práticas docentes e subsumida ao projeto “Gêneros, discursos e 
identidades na sociedade brasileira”, coordenado pela Prof.ª Dr.ª Maria Aparecida Resende 
Ottoni encontra-se estruturada em cinco seções, além desta primeira. Na seção 2, realizamos 
uma revisão documental, discorremos sobre os fundamentos teórico-metodológicos da pesquisa 
desenvolvida, fazemos uma exposição sobre os instrumentos de geração de dados usados, o 
contexto de pesquisa, os/as participantes e os procedimentos metodológicos. Na seção 3, 
relatamos a sua aplicação, analisamos e discutimos os resultados obtidos com a aplicação e 
produzimos uma reflexão sobre a análise, sobre a proposta e sobre a pesquisa. Na seção 4, 
apresentamos as considerações finais de nosso estudo. 
A proposta interventiva, parte constitutiva da pesquisa, é apresentada em um “caderno 
suplementar”, organizado à parte, considerando as necessidades dos/as docentes que, muitas 
vezes buscam apenas o material de apoio para aplicar na sala de aula.  
 
 
 
 
 
 
 
25 
 
2 REVISÃO DOCUMENTAL, FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA E 
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 
 
Tendo em vista nossos objetivos e questões de pesquisa, nesta seção, apresentamos 8 
subseções. A primeira subseção apresenta um breve histórico e alguns desafios da EJA, 
discorremos em seguida, sobre o Letramento Literário, logo após, sobre a pedagogia de 
multiletramentos. Depois, sobre o Letramento Crítico e sobre a perspectiva da Análise de 
Discurso Crítica. Na parte seguinte, apresentamos as características e definições do Gênero 
Discursivo e, dentro dessa subseção abordamos sobre o conto, o roteiro e o curta-metragem. A 
outra subseção é destinada aos fundamentos metodológicos. E na última, explicitamos os 
procedimentos, contexto de pesquisa e participantes. 
 
2.1 Histórico e desafios da EJA  
 
Nesta seção, dividida em duas subseções, apresentamos um breve histórico da EJA no 
país até os dias atuais e, em seguida, os desafios para garantir à EJA um ensino de qualidade. 
 
2.1.1 Histórico da EJA 
 
A EJA teve início durante os tempos coloniais, quando os jesuítas exerciam ações 
educativas, para catequizar os adultos e, para ter êxito, era necessário antes alfabetizá-los 
(STRELHO, 2010). Em 1759, os jesuítas foram expulsos do Brasil e a população adulta ficou 
sem amparo educativo, inclusive durante o período imperial, pois se acreditava que a educação 
era direito apenas das elites. Além disso, até então, sequer cogitava-se o ensino para negros e 
mulheres. Segundo a Proposta Curricular para a EJA, legalmente, somente ocorreu durante a 
Constituição de 1824  
 
Sob forte influência europeia, a Constituição Brasileira de 1824 formalizou a garantia 
de uma “instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”. Tal definição foi sendo 
semeada e se tornou presente nas sucessivas constituições brasileiras (BRASIL, 2002, 
p. 13). 
 
Porém, nada, efetivamente, foi feito, ficando apenas as determinações no papel. De 
acordo com estudos da UNESCO:   
 
 
26 
 
O primeiro recenseamento nacional brasileiro foi realizado durante o Império, em 
1872, e constatou que 82,3% das pessoas com mais de cinco anos de idade eram 
analfabetas. Essa mesma proporção de analfabetos foi encontrada pelo censo 
realizado em 1890, após a proclamação da República (UNESCO, 2008, p.24). 
 
A seguir, na década de 40, a EJA ganhou destaque como Política Nacional, instituindo, 
a partir daí, várias campanhas nacionais contra o analfabetismo e, além disso, foi criado o Fundo 
Nacional para o Ensino Primário (1942). Até que, finalmente, na década de 60, a Lei nº4024/61 
estabeleceu que após os exames de madureza os maiores de 16 anos poderiam obter certificado 
de conclusão de colegial, e os maiores de 19, certificado de curso colegial (BRASIL, 2002). 
Foi na década de 60, que um novo método, empreendido por Paulo Freire, trouxe uma 
inovação que tanto se fazia necessária para o público de jovens e adultos. A proposta era levar 
em conta a realidade dos alunos, utilizando para alfabetizar os instrumentos do dia a dia deles. 
Freire (1987) cita, por exemplo, o tijolo como tema gerador, e pretende não só alfabetizar, mas 
também despertar a consciência crítica dos alunos, com questionamentos, tal como: “por que 
nem todos têm uma moradia para si?”. Tal método conseguiu alfabetizar, na região de Angicos, 
no sertão do Rio Grande do Norte, mais de 300 adultos, até então analfabetos, em apenas 40 
horas de aulas (LYRA, 1996). 
Mas, após o golpe militar de 64, tal trabalho foi interrompido e o educador exilado. 
Durante esse período, outras ações foram criadas, como a Cruzada de Ação Básica Cristã 
(ABC), de 1965 a 1971. De 1967 até o início dos anos 80, surgiu o Movimento Brasileiro de 
Alfabetização (MOBRAL), com vistas à alfabetização. O programa existiu em todo o país e 
passou por várias reformulações. Porém, foi muito criticado por não atender as reais 
necessidades dos estudantes e por acusações de corrupção, uma vez que geria seus próprios 
recursos. Por fim, com a extinção da ditadura militar, findou também o programa. 
A Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional (LDBEN) nº5692/71 implantou o 
ensino supletivo que poderia: 
 
Ser ministrado a distância, por correspondência ou por outros meios adequados. Os 
cursos e os exames seriam organizados dentro dos sistemas estaduais, de acordo com 
seus respectivos Conselhos de Educação. Já nesse período se afirmava a necessidade 
de adequar o ensino ao “tipo especial de aluno a que se destina”, resultando daí uma 
grande flexibilidade curricular (BRASIL, 2002, p. 16). 
 
Após o período militar, foi implantada a Fundação Nacional de Jovens e Adultos -  
Fundação Educar (extinta em 1990) e, no mesmo ano, promoveu-se a Conferência Mundial de 
Educação para Todos, na Tailândia, Jomtien, onde todos os países participantes assumiram o 
 
27 
 
compromisso de expandir e melhorar o atendimento ao público EJA (BRASIL, 2002). Em 
1994, concluiu-se o Plano Decenal, fixando metas e a LDBEN n.º 9.394/96 dedicou uma seção 
para a EJA e alterou a idade mínima de 15 anos para o Ensino Fundamental e 18 anos para o 
ensino médio. Finalmente, em 1997, em Hamburgo, Alemanha, ocorreu a V Confitea 
(Conferência Internacional de Educação de Jovens e Adultos), liderada pela Unesco, que 
viabilizou a construção da Declaração de Hamburgo e uma agenda para o futuro que propõe ao 
segmento ações e políticas (PAULA; OLIVEIRA, 2011). Nessa conferência, ampliou-se 
também o conceito de EJA para uma educação ao longo da vida. Parte do artigo 2 e o artigo 3, 
da Declaração de Hamburgo, sintetizam bem o novo entendimento da EJA: 
 
A educação de adultos pode modelar a identidade do cidadão e dar um significado à 
sua vida. A educação ao longo da vida implica repensar o conteúdo que reflita certos 
fatores, como idade, igualdade entre os sexos, necessidades especiais, idioma, cultura 
e disparidades econômicas. A educação de adultos engloba todo o processo de 
aprendizagem, formal ou informal, onde pessoas consideradas "adultas" pela 
sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e 
aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionais, direcionando as para a 
satisfação de suas necessidades e as de sua sociedade. A educação de adultos inclui a 
educação formal, a educação não-formal e o espectro da aprendizagem informal e 
incidental disponível numa sociedade multicultural, onde os estudos baseados na 
teoria e na prática devem ser reconhecidos (UNESCO, 2007, p. 40-38). 
 
São inúmeras as ações mundiais desde o início da década de 90 que procuram consolidar 
e tornar a EJA um ensino significativo e com dados como a evasão, menos negativos. Em 2009, 
por exemplo, a UNESCO, em conjunto com o governo brasileiro, realizou, em Belém do Pará, 
a VI Confitea. Nesse evento, publicou-se o documento Marco de Ação em Belém, 
 
que considera a aprendizagem ao longo da vida “uma filosofia, um marco conceitual 
e um princípio organizador de todas as formas de educação baseada em valores 
inclusivos, emancipatórios, humanistas e democráticos, sendo abrangente e parte 
integrante da visão de uma sociedade do conhecimento (UNESCO, 2010, p. 3-4). 
 
Isso mostra que a EJA, ao contrário do que se esperava, vem ganhando importância e é 
parte relevante da educação, que necessita de ações, estudos, conferências, leis, congressos, 
debates, fóruns para que os problemas até aqui averiguados sejam amenizados.  
 
2.1.2 Desafios da EJA 
 
Embora tenham ocorrido, ao longo dos anos, várias ações, com o intuito de amparar 
melhor esse segmento da Educação Básica, pensar em educação para essa parcela de estudantes 
 
28 
 
é ainda, nos dias de hoje, mais que um desafio: é preciso assumir um compromisso responsável 
e condizente com as reais necessidades desse público; possibilitar a aprendizagem por meio de 
práticas de multiletramentos, proporcionar autonomia e maior senso crítico a cada um deles. É 
com esse propósito que realizamos o trabalho interventivo, voltado para leitura e análise crítica 
de contos e a produção de curtas-metragens na turma de EJA de 8ª série, na perspectiva da 
pedagogia dos multiletramentos, o que pode contribuir para a valorização da multiplicidade 
cultural presente na sala de aula e da multiplicidade semiótica constitutiva de uma variedade de 
gêneros, para o desenvolvimento da competência discursiva dos estudantes e para a prática de 
ensino de outros profissionais da área.   
Concordamos com Paula e Oliveira (2011) quando afirmam:  
 
Considerando que a EJA deva se constituir a partir das identidades e culturas dos 
sujeitos que a integram, abrindo, assim, possibilidades de construção de propostas 
educativas relevantes e significativas, entendemos ser necessário o desenvolvimento 
de uma abordagem capaz de mapear e compreender a complexidade de suas 
realidades, desvelando, principalmente, os mecanismos desiguais que situam homens 
e mulheres em condições determinadas pela exclusão (PAULA; OLIVEIRA, 2011, p. 
47). 
 
Enveredados nesses dizeres, acreditamos que a pesquisa proposta no caderno 
suplementar que acompanha esta dissertação deverá interligar as histórias ficcionais lidas, às 
vidas reais dos alunos da EJA, pois os contos escolhidos tratam de problemas que ocorrem em 
várias famílias, tais como separação de pais, dificuldades financeiras, abusos, depressão, dentre 
outros. Esses temas, presentes nos contos literários, muitas vezes, não encontram espaço na 
modalidade EJA, devido ao menor tempo de duração da série cursada. Entretanto, são 
fundamentais para os alunos da EJA, por possibilitarem a discussão crítica sobre tais assuntos 
e uma forma de empoderamento por meio da linguagem.  
Ao longo dos anos, os educadores e a sociedade têm fortalecido as discussões sobre 
diferentes tipos de discriminação: racial, gênero, idade, condição social e várias foram as ações 
políticas e sociais para tentar acabar com as discrepâncias que ocorriam em diferentes situações 
e lugares, cujo direito à educação de qualidade era constantemente tirado dos cidadãos.  
Como se sabe, de acordo com a Constituição de 1988: 
 
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à 
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] 
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à 
pena de reclusão, nos termos da lei (BRASIL, 1988, p. 17). 
 
29 
 
Entretanto, ainda existem vários desafios que devem ser enfrentados, para assim fazer 
valer a igualdade entre todos os cidadãos. Dentre os indivíduos mais oprimidos encontram-se 
os estudantes da EJA, talvez a parte mais frágil da Educação Básica. São, por exemplo, 
estudantes mulheres que, como se não bastassem as obrigações domésticas que lhes são 
impostas pelos familiares, muitas vezes são conjuntamente mantenedoras das despesas 
familiares. Ademais, essas mulheres sofrem violências de todos os tipos: são vítimas de seus 
companheiros ou até dos filhos, quando esses se encontram na fase jovem ou adulta. Há, 
inclusive, jovens que tiveram que abandonar os estudos, para darem conta de suprir as 
necessidades financeiras da família e estudantes que não conseguiram acompanhar as aulas, no 
ensino regular, e foram reprovados mais de uma vez. Assim, é comum os estudantes chegarem 
à EJA com impressões negativas de si mesmos, como apontado na Proposta Curricular para a 
EJA: 
 
Na educação de jovens e adultos, é comum os alunos afirmarem que são ruins para 
escrever, que não conseguem entender como usar corretamente os sinais gráficos e a 
pontuação. Muitas vezes, esse tipo de dificuldade com relação aos processos de 
aprendizagem da escrita é consequência de mal sucedidas experiências anteriores. Por 
isso, investir na mudança de postura do aluno diante de suas dificuldades, fazendo-o 
incorporar uma visão diferente da palavra ao associar o trabalho de escrita com suas 
necessidades mais urgentes, seria uma primeira meta (BRASIL, 2002, p. 16). 
 
 A partir dessas afirmações, é preciso repensar as ações educativas voltadas para esse 
público, no sentido de não só resgatar a autoestima dos alunos da EJA como também dar 
oportunidade a eles de serem ouvidos por meio da reflexão, da análise e da produção textual, 
tendo como condutor, o texto. Ensinar, nessa perspectiva, de maneira contextualizada e próxima 
à realidade dos alunos é dar oportunidade para eles se sentirem parte do processo de construção 
do conhecimento. Todas essas propostas estão concordantes, também, com a Base Nacional 
Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2017, e que trata o texto literário como um elemento 
fundamental para a construção do conhecimento: 
 
Para que a função utilitária da literatura – e da arte em geral – possa dar lugar à sua 
dimensão humanizadora, transformadora e mobilizadora, é preciso supor – e, 
portanto, garantir a formação de – um leitor-fruidor, ou seja, de um sujeito que seja 
capaz de se implicar na leitura dos textos, de “desvendar” suas múltiplas camadas de 
sentido, de responder às suas demandas e de firmar pactos de leitura. Para tanto, as 
habilidades, no que tange à formação literária, envolvem conhecimentos de gêneros 
narrativos e poéticos que podem ser desenvolvidos em função dessa apreciação e que 
dizem respeito, no caso da narrativa literária, a seus elementos (espaço, tempo, 
personagens); às escolhas que constituem o estilo nos textos, na configuração do 
tempo e do espaço e na construção dos personagens; aos diferentes modos de se contar 
uma história (em primeira ou terceira pessoa, por meio de um narrador personagem, 
 
30 
 
com pleno ou parcial domínio dos acontecimentos); à polifonia própria das narrativas, 
que oferecem níveis de complexidade a serem explorados em cada ano da 
escolaridade; ao fôlego dos textos (BRASIL, 2017, p. 136). 
 
Dessa forma, a pesquisa alinha-se à BNCC também por propor textos literários que 
serão lidos e explorados de diversas formas: interpretação textual, inferências, gêneros, 
multiletramentos, multimodalidade e produção de gênero audiovisual. 
Na seção a seguir, abordaremos sobre o Letramento Literário. 
 
2.2 Letramento Literário 
 
Inicialmente, é preciso diferenciar o texto literário do texto não literário, para que 
possamos compreender o Letramento Literário. O texto literário apresenta uma linguagem 
conotativa e polissêmica, podendo, por essas razões, ter várias interpretações. Há também um 
valor maior na estética do texto e, para isso, o autor do texto literário recorre a recursos diversos, 
tais como o uso de figuras de linguagem, o uso de diferentes modos semióticos. Podemos 
considerar como texto literário, os poemas, os romances, as músicas, os contos, as fábulas, as 
novelas etc. Podemos citar, como exemplo, poemas, romances, crônicas, letras de músicas, 
contos, fábulas, novelas etc.  
Os textos não literários, por sua vez, de acordo com Barreto (2009), são aqueles que 
objetivam fornecer informações ao leitor. Possui predominância do sentido denotativo sem 
tantas brechas para outras interpretações. Podemos citar, como exemplo, cartas comerciais, 
artigos científicos, bulas e receitas médicas.  
Ambos os textos circulam na escola e estão presentes nos livros didáticos de Língua 
Portuguesa. Entretanto, comumente, esses textos acabam sendo trabalhados como pretextos 
para estudos da gramática. Como resultado, diversos estudantes associam a leitura ao ato de 
cumprir tarefas gramaticais e se afastam dos textos, especialmente os literários, cuja 
consequência é ter alunos que afirmam nunca ter lido uma obra literária por não gostar ou falta 
de interesse, contrariando o papel formador que a escola possui. Por isso, vários estudiosos 
buscam soluções capazes de fomentar a leitura de diversos gêneros. Cosson (2012) sugere o 
letramento literário. 
Em relação ao termo letramento, de acordo com Soares, “é aquilo que as pessoas fazem 
com as habilidades de leitura e escrita, em um contexto específico, e como essas habilidades se 
relacionam com as necessidades, valores e práticas sociais” (SOARES, 2012, p. 72). Ou seja, 
 
31 
 
podemos afirmar que um indivíduo que alcançou o letramento, fora dos muros da escola, é 
capaz de ler, e, a partir dessa leitura, agir com autonomia de acordo com as suas necessidades. 
E quanto ao letramento literário, Cosson (2012) acredita que ele deve ocorrer na sala de 
aula, para que haja uma “educação literária” e que vá além da escola, “pois fornece a cada aluno 
e ao conjunto deles uma maneira própria de ver e viver o mundo” (COSSON, 2012, p. 12). Esse 
autor afirma que a literatura tem valor e possui uma função social na sociedade e propõe 
caminhos metodológicos sistematizados para tornar a literatura significativa aos alunos: a 
sequência básica e a estendida. Explicaremos a sequência básica, uma vez que a utilizaremos 
como proposta interventiva nesse projeto.  
Cosson (2012) afirma que a sequência básica é “constituída por quatro passos: 
motivação, introdução, leitura e interpretação” (COSSON, 2012, p. 51). Uma sequência básica 
pode ser conceituada como uma sistematização da leitura literária na escola, elaborada a partir 
de perspectivas metodológicas que podem contribuir, de maneira significativa e prática, no 
direcionamento e fortalecimento do ensino de literatura oferecido aos alunos e alunas 
(COSSON, 2012). Executar essa sequência requer um preparo cuidadoso pelo professor que 
vai desde a seleção das leituras até os ambientes que serão usados. A seguir, explicaremos os 
quatro passos conforme a sequência do autor: motivação, introdução, leitura e interpretação.  
Cosson (2012) defende que a primeira etapa chamada motivação, prepara o aluno para 
o trabalho que irá ocorrer: 
 
As motivações que propusemos sempre foram bem recebidas pelos alunos. 
Acreditamos que o elemento lúdico que elas contém ajudaram a aprofundar a leitura 
da obra literária [...] É preciso lembrar que a motivação prepara o leitor para receber 
o texto, mas não silencia o texto nem o leitor... Naturalmente, a motivação exerce uma 
influência sobre as expectativas do leitor, mas não tem o poder de determinar sua 
leitura. (COSSON, 2012, p. 56). 
 
 Nessa etapa, podemos por meio de estratégias motivacionais resgatar o que os alunos 
sabem, memórias, lembranças que muitas vezes permanecem guardadas e raramente são 
acionadas durante as aulas. Ao fazer isso, provavelmente os alunos estarão mais envolvidos 
com a tarefa e, melhor ainda, com a leitura. Cosson (2012) alerta que a motivação, que serve 
também para influenciar, deve ser bem-vinda e desejada e não o contrário para ambos: professor 
e aluno. Para o autor, quando a estratégia de motivação produz efeitos negativos, é conveniente 
que o professor intervenha. 
No caso de nossa proposta, levaremos o conto “A cartomante” de Machado de Assis 
(ANEXO D) como estratégia de motivação, pois, além de ser um conto intrigante, possui 
 
32 
 
elementos do misticismo devido à presença de uma das personagens que parece, numa primeira 
leitura, interferir no destino dos personagens. Organizaremos uma dinâmica para que os 
participantes da proposta relembrem fatos que remetem a essa temática. Além disso, o contista, 
Machado de Assis, possui história pessoal de superação que pode servir de inspiração aos 
estudantes da EJA. 
A próxima etapa é chamada de introdução e diz respeito à apresentação do autor e da 
obra que será trabalhada. Embora pareça ser simples, Cosson (2012) enumera alguns cuidados: 
 
Um primeiro é que a apresentação do autor não se transforme em longa e expositiva 
aula sobre a vida do escritor [...] Na fase da introdução é suficiente que se forneçam 
informações básicas sobre o autor e, se possível, ligadas àquele texto. O outro cuidado 
(está) na apresentação da obra [...] Quando se está em um processo pedagógico o 
melhor é assegurar a direção para quem caminha com você. Por isso, cabe ao professor 
falar da obra e da sua importância naquela fase, justificando assim sua escolha. 
(COSSON, 2012, p. 57). 
 
Tais cuidados são fundamentais para o professor, pois muitas vezes o exagero na leitura 
sobre a biografia do autor pode vir a se tornar negativo, afetando posteriormente a leitura da 
obra. Para Cosson, a capa, as apreciações críticas como as que constam nas orelhas, nas 
contracapas e outros elementos paratextuais podem ser importantes para a interpretação e 
ajudam no levantamento de hipóteses feitos pelos alunos que poderão ser confirmadas ou 
recusadas depois de finalizada a leitura.  
Nessa fase, como propomos o trabalho com cinco contos de cinco escritores diferentes, 
centraremos na apresentação breve de cada um dos escritores e na apresentação dos títulos de 
cada um dos contos aguçando a curiosidade e/ou expectativas dos alunos sobre o que 
possivelmente será a história dos contos a serem trabalhados. Dedicaremos, também, uma aula 
para o conhecimento sobre o conto. Considerando que esse gênero, que contém o pré-gênero 
(tipo textual), predominantemente narrativo, configurado em prosa, e que possui 
especificidades e características próprias como a concisão, a existência de um único conflito, 
poucos personagens e, capaz de causar impactos nos leitores devido aos temas dos enredos, 
propomos o estudo sobre o gênero conto, o que o diferencia ou o aproxima de outros gêneros 
como crônicas, fábulas, novelas e romances. Inserimos o conto “Tchau” de Lygia Bojunga 
(ANEXO E) para que leiam e percebam com essa leitura o que é um conto e o que é literário. 
A etapa de leitura, nesse caso escolar, precisa de acompanhamento porque tem uma 
direção, um objetivo a cumprir, e esse objetivo não deve ser perdido de vista (COSSON, 2012, 
p. 62). No caso dos contos, acreditamos que, dentre os outros gêneros como romance e novela, 
 
33 
 
se encontra em vantagem por ter como uma de suas características a brevidade do enredo. 
Assim, poderá ser lido em uma aula. Uma “experiência estética” que, neste caso, ao contrário 
das leituras mais extensas, é capaz de suprir o interesse do leitor pelo desfecho em menor tempo. 
Acreditamos que a seleção criteriosa dos contos que têm temas que “dialogam” com o 
dia a dia dos alunos é fundamental para que eles se sintam atraídos pelos enredos. Lembramos 
que a EJA é constituída de uma diversidade de alunos com diferentes histórias, idades e, com 
o trabalho com os contos, além de buscarmos despertar o prazer na leitura, objetivamos que os 
alunos consigam estabelecer uma relação de aproximação entre o lido e o vivido. Por isso, para 
essa fase, escolhemos os contos “A caolha” de Júlia Lopes de Almeida (ANEXO F), “A terceira 
margem do rio” de Guimarães Rosa (ANEXO G) e “Clínica de Repouso” de Dalton Trevisan 
(ANEXO H). Dentre esses autores, temos a escritora Júlia Lopes de Almeida, que raramente é 
lembrada como escritora do Realismo e que publicou contos e romances que trazem 
personagens mulheres que fugiam aos padrões impostos pela época e até mesmo a biografia da 
escritora que, embora tivesse lutado na época para fazer parte da Academia Brasileira de Letras, 
não conseguiu. Suas personagens são complexas, marginalizadas e fortes como a Caolha.  
Outro escritor, canônico, Guimarães Rosa, cujos contos quase sempre possuem uma 
linguagem poética e inovadora e os enredos possuem personagens também complexos e cheios 
de problemas não resolvidos, como o caso do narrador-personagem do conto “A terceira 
margem do rio”: um filho que não consegue compreender as razões pelas quais o pai abandonou 
a família. A biografia do escritor geralmente atrai o público por ter exercido várias profissões, 
falar várias línguas e ter viajado por vários lugares do mundo. 
“Clínica de Repouso” é uma obra que trata das relações familiares, cuja personagem 
principal é uma idosa que acaba sendo abandonada pela filha em um asilo. Os estudantes da 
EJA possuem histórias de abandono de diferentes naturezas e, por isso, essa obra possui enredo 
que deve instigá-los a pensar sobre esse tema. Além disso, o autor, Dalton Trevisan, vai na 
contramão dos valores contemporâneos: é avesso às exposições públicas, fotos tanto na mídia 
como na própria cidade onde mora.  
Nessa fase, os contos serão lidos em sala de aula com diversas estratégias de leitura, 
além disso, após a leitura de cada um deles iremos incluir a etapa da interpretação.  
 Durante a etapa de interpretação, segundo Cosson é imprescindível que:  
 
Após a leitura da obra, o processo de leitura literária precisa ser complementado com 
práticas que levem a uma maior interação com o texto, uma exploração de q’suas 
características, uma explicitação da construção de seus sentidos, uma compreensão de 
 
34 
 
sua constituição estética, uma interpretação, enfim, que garanta a apropriação daquele 
texto como parte do letramento literário. (COSSON, 2012, p. 126). 
 
É nessa fase que o aluno irá realizar as inferências, as interpretações do que leu e tentar 
estabelecer uma conexão com situações do dia a dia ou como as situações lidas nos contos 
ocorrem na vida real.  
Cosson (2012) cita algumas atividades de escrita tais como maquetes, diários, resenhas, 
júri simulado, produção de cenários, produção de poemas e feiras culturais. O escritor ressalta 
que é importante haver algum registro após a leitura que seja coerente com o letramento 
literário. 
Nesta proposta, além das atividades de interpretação, inserimos a produção de roteiros 
e de curtas-metragens. A sugestão de trabalho com esses gêneros rompe com algumas tradições 
escolares no trabalho com gêneros e alia-se ao trabalho com as TDIC. Ela será composta de 9 
fases para que possa contemplar o planejamento e os propósitos dessa fase, pois, conforme 
Cosson (2012)  
 
é preciso compartilhar a interpretação e ampliar os sentidos construídos 
individualmente. A razão disso é que, por meio do compartilhamento de suas 
interpretações, os leitores ganham consciência de que são membros de uma 
coletividade e de que essa coletividade fortalece e amplia seus horizontes de leitura. 
(COSSON, 2012, p. 66).  
 
Na próxima seção, discorremos sobre a pedagogia dos Multiletramentos. 
 
2.3 A Pedagogia dos Multiletramentos  
 
Com o advento das tecnologias, a sociedade contemporânea tem mudado as relações 
sociais. Tanto as culturas quanto as linguagens foram afetadas de alguma forma, emergindo 
cada dia mais conflitos e casos de intolerâncias em várias partes do mundo. Diante desse 
cenário, um grupo de estudiosos dos letramentos - Grupo de Nova Londres (GNL) - se 
reuniram, em 1996, e publicaram o manifesto “Uma pedagogia dos multiletramentos - 
desenhando futuros sociais”. Nele, segundo Rojo (2012), o GNL apontava para a necessidade 
de a escola se responsabilizar pelos novos letramentos. Além disso, segundo os autores do 
manifesto, a escola também deveria “levar em conta e incluir nos currículos a grande variedade 
de culturas já presentes nas salas de aula de um mundo globalizado e caracterizada pela 
intolerância na convivência com a diversidade cultural, com a alteridade” (ROJO, 2012, p. 12). 
 
35 
 
Rojo (2012), principal estudiosa sobre o assunto no Brasil, também traz as seguintes 
considerações sobre os multiletramentos: 
 
 o conceito de multiletramentos - é bom enfatizar - aponta para dois tipos específicos 
e importantes de multiplicidade presentes em nossas sociedades, principalmente 
urbanas, na contemporaneidade: multiplicidade cultural das populações e a 
multiplicidade semiótica de construção dos textos por meio dos quais ela informa e se 
comunica. (ROJO, 2012, p. 13). 
 
Como argumenta Rojo (2012), o conceito de multiletramentos compreende a abordagem 
da multiplicidade cultural e semiótica. Cabe destacar que, como consequência da globalização, 
não existe mais fronteira entre as culturas e, mais especificamente no caso do Brasil, há uma 
variedade de culturas locais que têm sido ignoradas pela escola, durante muitos anos. 
Considerar esse formato social inclui mudar as práticas pedagógicas, uma vez que, nessa 
perspectiva, a diversidade encontrada na sala de aula passa a ser componente importante para 
promover maior interação entre todos. O público da modalidade EJA pode ser estimulado, pelos 
seus professores, a apreciar a “bagagem” histórica dos colegas - pessoas de diferentes lugares, 
costumes e idades - por meio de um trabalho voltado para o respeito, tolerância e apreciação 
pela cultura do outro possibilitando, também, integrar, nas atividades de sala de aula, a 
multiplicidade existente que envolve tanto as culturas locais, ricas e significativas aos alunos 
quanto as demais culturas, que, há muito tempo, estão integradas no currículo. Ensinar pelos 
multiletramentos requer o abandono das abordagens tradicionais e indica um novo caminho 
para o ensino. 
No tocante à multiplicidade semiótica, (ROJO, 2012, p.18-19) que diz respeito à 
multiplicidade de linguagens, modos ou semioses nos textos em todas as suas formas de 
circulação social e por diferentes meios, Rojo (2012) destaca também algumas características 
presentes no texto na pedagogia dos multiletramentos: 
 
eles são interativos; mais que isso, colaborativos; (b) eles fraturam e transgridem as 
relações de poder estabelecidas, em especial as relações de propriedade (das 
máquinas, das ferramentas, das ideias, dos textos [verbais ou não]); (c) eles são 
híbridos, fronteiriços, mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas). (ROJO, 
2012, p. 23). 
Para ela, tais características estão presentes nos hipertextos e hipermídias das redes 
(ROJO, 2012), sendo eles interativos tanto quanto os multiletramentos. Nessa direção, Rojo 
propõe ensinar “pela introdução de novos e outros gêneros de discurso - ditos por Canclini 
 
36 
 
“impuros” -, de outras e novas mídias, tecnologias, línguas, variedades, linguagens” (ROJO, 
2012, p. 16). 
Há também outras linguagens que a escola pode e deve incorporar ao ensino, como as 
linguagens corporais, gestuais, musicais, visuais, braile etc., que são tão importantes quanto a 
linguagem verbal e fazem parte do dia a dia das pessoas. Sobre a multiplicidade de linguagens, 
Kress e van Leeuwen (1996) reforçam: 
 
Um texto falado não é apenas verbal, mas também visual, combinando-se com "não-
verbal” modos de comunicação, como expressão facial, gestos, postura e outros 
formas de auto apresentação. Um texto escrito, da mesma forma, envolve mais de 
linguagem: está escrito em alguma coisa, em algum material [...] e está escrito com 
alguma coisa [...]; com letras formadas em sistemas influenciados por considerações 
estéticas, psicológicas, pragmáticas e outras; e com um layout imposto sobre a 
substância material, seja na página, na tela do computador ou em uma placa de latão 
polido. (KRESS; VAN LEEUWEN, 1996, p. 39). 
 
A partir dessas informações, para trabalhar com os contos, propomos uma análise 
discursiva e a produção de curtas-metragens, junto à EJA, na perspectiva dos multiletramentos 
e do Letramento Crítico. Ressaltamos que a pedagogia dos multiletramentos poderá conduzir 
os estudantes à consciência da existência das multiculturas e das multilinguagens nas obras 
lidas e na vida das pessoas. Quanto ao Letramento Crítico, ele poderá possibilitar/contribuir 
para que o aluno compreenda a formação da sua identidade, numa perspectiva histórica e 
filosófica e com isso tornando também possível a sua transformação social. Discorremos a 
seguir sobre o Letramento Crítico. 
 
2.4 Letramento crítico 
 
O termo letramento foi citado pela primeira vez na obra de Mary Kato em 1986 e em 
1998 por Magda Soares. Para Soares (1998, p. 18) “Letramento é, pois, o resultado da ação de 
ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou 
um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais”. 
Quando o indivíduo se apropria da leitura e da escrita, ele torna-se capaz de resolver situações 
do dia a dia com autonomia, como ir ao mercado e escolher as mercadorias conforme queira, 
lendo, por exemplo, as informações do produto. Kleiman (2008) acrescenta ao conceito, a 
capacidade do indivíduo em usar tecnologias diante de objetivos específicos.  
O modelo ideológico de letramento considera que o letramento varia de acordo com o 
contexto e que seus significados não são apenas ‘individuais’ ou ‘cognitivos’, mas derivados 
 
37 
 
de processos culturais. Dessa forma, os significados específicos que a escrita assume para um 
grupo social dependem das instituições em que ela tiver sido adquirida; daí se falar em 
letramentos (no plural), dos quais o letramento escolar é apenas um tipo. 
Tavares (2009) também aponta diversos tipos de letramento: digital, computacional, 
informacional, visual, midiático e outros. Para a autora, cada um destes letramentos faz 
referência a um grupo de habilidades que são mobilizadas pelos indivíduos em práticas 
discursivas específicas de letramento. Ela também ressalta que, embora esses letramentos sejam 
acionados especificamente, direta ou indiretamente, eles englobam os outros nas situações de 
uso.  
Os novos letramentos, termo que iniciou na década de 1990, surgiram a partir de estudos 
realizados em diferentes áreas do conhecimento e trouxeram a ideia de linguagem como prática 
social. Por essa vertente, Brandt e Clinton (2002) sugerem que os professores desenvolvam o 
senso crítico dos/as estudantes proporcionando por meio das aulas, análises, questionamentos, 
reflexões e que eles/as sejam também capazes de contestar as relações de poder com vistas a 
uma mudança social. Gee (2008, p. 67), importante teórico desses estudos, afirma que os novos 
letramentos “começaram a substituir a noção tradicional de letramento por uma abordagem 
sociocultural.” Ou seja, “conjunto plural de práticas sociais”. 
Segundo Duboc e Ferraz (2011) o Letramento Crítico (LC) surgiu das contribuições da 
pedagogia de Paulo Freire ao buscar um ensino que levasse os indivíduos ao empoderamento 
social. Freire (2005) destaca que o leitor deve ser um sujeito crítico e, portanto, capaz de 
construir significados e sair do senso comum. Para isso, o indivíduo deve perceber-se no outro, 
o não-eu, coletivo. Isso significa que para que seja um indivíduo crítico precisa exercitar a 
escuta. Para Menezes de Souza (2011, p. 2) é dessa forma, que o indivíduo se dará conta de que 
“Ao aprender a escutar, o aprendiz pode perceber que seu mundo e sua palavra – ou seja, seus 
valores e seus significados - se originam na coletividade sócio histórica na qual nasceu e à qual 
pertence.” Partindo das concepções de Freire (2005) e de Menezes de Souza (2011), nos 
deparamos com um sujeito (leitor/a e autor/a) socialmente e historicamente constituído. 
Segundo Menezes de Souza (2011, p. 2) “A tarefa de letramento crítico seria então a de 
desenvolver essa percepção e entendimento”.  A partir dessas ideias, tanto a identidade quanto 
o sentimento de pertencimento passam a fazer sentido, além de uma consciência histórica.   
  Por essa linha de pensamento, ao mesmo tempo em que lemos um texto e procuramos 
compreendê-lo, escutamos não somente o texto, mas também a nós como leitores. No mesmo 
sentido, Menezes de Souza (2011, p. 3) acrescenta “Isso quer dizer que ao mesmo tempo em 
 
38 
 
que se aprende a escutar, é preciso aprender a se ouvir escutando.” O estudioso ressalta que 
escutar e se ouvir são atos simultâneos e inseparáveis e por isso essa prática altera o tempo 
presente do leitor/autor. Não é somente o autor que produz significação, mas ambos, em iguais 
condições como produtores de significação: autor e leitor. Dado o exposto, recorremos à 
proposta de trabalho pedagógico do LC pela perspectiva de Duboc (2015): 
 
A proposta de letramento crítico consiste em trabalhar a leitura e a produção de 
sentido dos alunos de forma que estes compreendam a teia de privilégios e 
apagamentos nas práticas sociais. [...] o letramento crítico possibilita que o aluno 
compreenda sua construção histórico –filosófica, permitindo ou aumentando as 
chances da transformação de sua situação se ele desejar. (DUBOC, 2015, p. 219)  
 
A autora sugere que o LC seja um trabalho realizado nas brechas que podem surgir 
durante as aulas. Para Duboc (2015), os professores podem aproveitar as questões que podem 
surgir durante as aulas para expandir os sentidos e as interpretações. Por essa perspectiva, as 
aulas podem mudar o enfoque, pois existem momentos não previstos e não planejados pelo 
professor: o “agora” da questão suscitada e o “agora” do aluno podem fazer mais sentido para 
a turma do que a continuidade do planejamento daquela aula. Essa estratégia leva em conta o 
contexto local, a voz reflexiva e crítica daquele/s aluno/s e pode ser também um momento de 
tensão que para Alencar (2017, p. 48) o professor deve 
 
estar preparado para lidar com elas. Enfrentar essa tensão pode ajudar a desconstruir 
valores rígidos, fixos, tradicionais e que excluem muitos dos que não se enquadram 
na rigidez dos padrões e daquelas cujas singularidades não entram na tradição, em 
geral, imposta nas escolas.  
 
Assim, o LC é uma perspectiva que deve vir acompanhada de outras abordagens e nunca 
sozinha, como é o caso de nossa proposta que, além de se pautar nos pressupostos do LC, 
também se apoia nos fundamentos da ADC, da Pedagogia dos Multiletramentos e do letramento 
literário.  
Luke e Freebody (1997) conceituam o Letramento Crítico como  
 
uma série de princípios educacionais para o desenvolvimento de práticas discursivas 
de construção de sentidos. Práticas de letramento crítico “incluem uma consciência 
de como, porque, e segundo os interesses de quem, textos em particular podem 
funcionar. Ensinar letramento crítico, assim, encoraja o desenvolvimento de posições 
e práticas de leitura alternativas para questionar e criticar textos e suas formações 
sociais e assunções sociais afiliadas. Também pressupõe desenvolver estratégias para 
se falar sobre, reescrever e contestar textos da vida cotidiana. (LUKE; FREEBODY, 
1997, p. 218, apud Wielewicki e Jordão) 
 
 
39 
 
À luz do LC, não basta ler os contos. É preciso que os estudantes sejam capazes de 
refletir sobre o que leram numa perspectiva histórica e filosófica. Para isso, durante a aplicação 
da proposta, após as leituras dos contos, além de considerarmos que perguntas e reflexões 
espontâneas possam surgir, inserimos questões de interpretação e análise que, além de 
suscitarem discussões sobre o que foi lido, também poderão promover inquietações nos alunos 
diante das temáticas levantadas. O entrecruzamento   entre o lido e o vivido poderá ser 
inevitável, assim como a prática situada, tratada por Duboc (2015) como “brechas”. Isso porque 
não conseguimos prever quais serão as percepções e reflexões críticas que poderão surgir. Com 
isso, esperamos que os estudantes se tornem mais engajados, mais críticos e sensíveis ao mundo 
que os cerca, levando em conta também o contexto local. Além disso, pela perspectiva do LC, 
o sujeito ativo, conforme aponta Pinheiro (2015, p. 8) “adota uma postura crítica diante de um 
texto com o intuito de compreender os privilégios e os apagamentos nas práticas sociais”. Por 
isso, quando o professor adota essa abordagem, considera qualquer momento da aula uma 
oportunidade para promover a reflexão crítica por meio da linguagem. Salientamos que 
desenvolver um trabalho com base nos pressupostos do LC é uma maneira de tornar a aula mais 
instigante, atraente e contempla um dos objetivos específicos desse trabalho: proporcionar o 
protagonismo aos /às estudantes da EJA.  
O LC aliado à ADC, poderão contribuir para a transformação de problemas que 
acometem os alunos da EJA. Acreditamos que tanto o LC quanto a ADC nos fornecerão 
subsídios para explorarmos temas que possuem relação com esse público. Temas esses que são 
inescapáveis quando se pretende discutir aspectos sobre as representações, as relações, as 
interações e as identificações.  
Sobre a ADC, discorremos a seguir. 
 
2.5 Análise de Discurso Crítica (ADC)  
 
Esta pesquisa tem ancoragem, também, na ADC, que é um modelo teórico metodológico 
legatária de uma teoria criada nos anos 70, denominada Linguística Crítica (LC), na qual os 
linguistas Kress, Trew e Fowler defendiam que há um vínculo entre sociedade e linguagem. 
Essa, capaz de exercer papel importante nas relações de poder, cujas escolhas sintáticas e 
lexicais revelam segundo eles, ideologias (MAGALHÃES, 2005).  
Posteriormente, em 1985, a ADC, termo criado pelo britânico Norman Fairclough, da 
Universidade de Lancaster, apareceu, pela primeira vez, em um artigo publicado no Journal of 
 
40 
 
Pragmatics e, desde então, Fairclough vem contribuindo com os estudos da ADC, juntamente 
com Wodak e Van Dijk (BATISTA JUNIOR; SATO; MELO, 2018). Segundo Ottoni (2007): 
 
A ADC constitui um modelo teórico-metodológico que estabelece um diálogo entre a 
Ciência Social Crítica e a Linguística, especificamente a LSF. Uma das características 
que define esse modelo é o fato de que, na tentativa de compreender os problemas 
sociais, não fica estagnado dentro de um único campo disciplinar (OTTONI, 2007, p. 
28). 
 
Conforme expõem Resende e Ramalho (2006), em 1991, houve a consolidação da ADC, 
a partir da realização de um Simpósio em Amsterdã. Os linguistas Teun A. van Dijk, Norman 
Fairclough, Gunther Kress, Theo van Leeuwen e Ruth Wodak resolveram criar um método com 
o objetivo de analisar a linguagem, de forma crítica, aliando as teorias linguísticas às ciências 
sociais e, embora esses teóricos participantes do Simpósio tivessem divergências, em alguns 
pontos, possuíam também vários aspectos em comum, o que permitiu um intercâmbio desses 
linguistas, durante três anos. Esses linguistas acreditavam que havia, até então, no campo 
linguístico, uma preocupação com o texto e com a interação no campo do discurso e a prática 
social não era levada em conta. Desde então, passaram a analisar criticamente como se davam 
as relações de poder no discurso durante o uso da língua. 
 A ADC estabelece um diálogo com outras teorias e métodos tais como de Foucault 
(1997, 2003) e de Bakhtin (2006, 2015). Segundo Batista Júnior; Sato e Melo (2018), a análise 
do discurso acolhe também diferentes abordagens e perspectivas: 
 
 [...] como a linguística sistêmico-funcional, a análise de discurso multimodal ou 
multimodalidade, a análise de narrativa, a análise de discurso mediada, a análise de 
conversação, a análise de discurso baseada em corpus, dentre outros. [...] possui 
diferentes vertentes, como a abordagem cognitiva, de Van Dijk, e a perspectiva 
histórica, de Wodak, além da abordagem de Fairclough sobre o capitalismo 
(BATISTA JUNIOR; SATO; MELO, 2018, p. 8). 
 
Todas essas vertentes têm em comum a preocupação social e utilizam a pesquisa para 
desvelar as relações de poder e a transdisciplinaridade, segundo Batista Júnior; Sato e Melo 
(2018). No caso da pesquisa em questão, escolhemos a abordagem dialético relacional, 
defendida por Norman Fairclough, maior expoente em ADC. Ele propõe, nesse método de 
estudo, a investigação da linguagem como prática social vinculada às transformações sociais 
contemporâneas que estão ocorrendo na sociedade, incluindo também o campo ideológico 
(MAGALHÃES, 2005). 
 
41 
 
Para melhor compreender a abordagem dialético-relacional, proposta por Fairclough, é 
necessário discorrer sobre as suas obras que consideramos fundamentais, a saber: Fairclough 
(2001- tradução da obra de 1992); Chouliaraki e Fairclough (1999); e Fairclough (2003) e sobre 
alguns conceitos basilares como o de discurso, de prática social, de ordem do discurso e de 
prática discursiva. 
Na obra traduzida e publicada em 2001, Fairclough retoma muito do que havia exposto 
em obra anterior (FAIRCLOUGH, 1989), na qual ele já havia esboçado uma proposta de 
abordagem tridimensional do discurso. Essa abordagem compreende três dimensões: a do texto, 
a da prática discursiva e a da prática social, que se complementam e são indispensáveis para a 
análise do discurso, na perspectiva desse autor (MAGALHÃES; MARTINS; RESENDE, 
2017).  
Nessas duas obras, Fairclough concebe o discurso como uma prática social e apresenta 
três aspectos dos efeitos construtivos do discurso: ele contribui para a construção de identidades 
sociais, de relações sociais e também para a “construção de sistemas de conhecimento e 
crença”. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91). Estabelecendo um diálogo com a Linguística 
Sistêmico-Funcional (LSF), o autor afirma que esses três efeitos “correspondem 
respectivamente a três funções da linguagem e a dimensões de sentido que coexistem e 
interagem em todo discurso [...] identitária, relacional e ideacional” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 
92). 
O discurso é, para esse linguista, “um modo de ação” que possibilita aos indivíduos 
tanto agir sobre o mundo como sobre os outros, além de ser um modo de representação e que 
se consolida pelo uso da linguagem (FAIRCLOUGH, 2001, p. 90). Com relação à abordagem 
tridimensional mencionada, reproduzimos, a seguir, uma Figura 1, que a representa:  
 
FIGURA 1 – Concepção Tridimensional do discurso em Fairclough (2001) 
 
Fonte: Fairclough (2001, p. 101). 
 
42 
 
 
Na dimensão do texto, a análise se volta mais para o vocabulário, a gramática, a coesão 
e a estrutura textual. É a análise no nível micro. A segunda dimensão, a da prática discursiva, 
envolve “processos de produção, distribuição e consumo textual, e a natureza desses processos 
varia entre diferentes tipos de discurso de acordo com fatores sociais.” (FAIRCLOUGH, 2001, 
p. 106-107). Ela contribui tanto para “reproduzir a sociedade (identidades sociais, relações 
sociais, sistemas de conhecimento e crença) como é, mas também para transformá-la”. 
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 92). A terceira dimensão é a da prática social e focaliza aspectos em 
nível macro, como a ideologia e a hegemonia. O autor esclarece:  
 
A conexão entre o texto e a prática social é vista como mediada pela prática discursiva: 
de um lado, os processos de produção e interpretação são formados pela natureza da 
prática social, ajudando também a formá-la e, por outro lado, o processo de produção 
forma (e deixa vestígios) no texto, e o processo interpretativo opera sobre ‘pistas’ no 
texto. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 35-36). 
 
Fairclough (2001, p. 123-124) defende que a concepção de luta hegemônica “em termos 
da articulação, desarticulação e rearticulação de elementos está em harmonia” com a 
“concepção dialética da relação entre estruturas e eventos discursivos” e que a prática discursiva 
é “uma faceta da luta hegemônica que contribui [...] para a reprodução ou transformação não 
apenas da ordem de discurso existente [...], mas também das relações sociais e assimétricas 
existentes”.  
A ordem do discurso é considerada como “a faceta discursiva do equilíbrio contraditório 
e instável que constitui uma hegemonia, e a articulação e a rearticulação de ordens de discurso 
são, consequentemente, um marco delimitador na luta hegemônica” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 
123). Nessa perspectiva, “as ordens do discurso podem ser consideradas como facetas 
discursivas das ordens sociais, cuja articulação e rearticulação interna têm a mesma natureza” 
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 99).  
Para a análise de cada dimensão, Fairclough (2001) elenca algumas categorias, as quais 
foram organizadas em um quadro por Resende e Ramalho (2019), o qual reproduzimos a 
seguir:   
 
 
 
 
 
43 
 
QUADRO 1 – Categorias analíticas propostas no modelo tridimensional 
TEXTO PRÁTICA DISCURSIVA PRÁTICA SOCIAL  
 
Vocabulário Produção         Ideologia  
Gramática  Distribuição             Sentidos  
Coesão  Consumo             Pressuposições  
Estrutura textual Contexto             Metáforas  
Força         Hegemonia  
Coerência              Orientações econômicas,  
Intertextualidade             Políticas, culturais, ideológicas 
Fonte: Resende e Ramalho (2019, p. 29). 
 
É importante afirmar, após o estudo do modelo tridimensional de Fairclough (2001), 
que a escola é um espaço privilegiado para que ocorra a distribuição e circulação dos textos, 
fundamental para promover as mudanças sociais, além de constituir-se de uma comunidade 
multicultural e multilinguística e que pode também propiciar profundas reflexões e análises, 
por meio da mediação dos professores. Nela, a linguagem oral ou escrita é a principal prática 
social entre os indivíduos e significa também uma forma de práxis, além de, por meio da 
mediação dos educadores, possibilitar abordagens transdisciplinares e interdisciplinares, como 
defende Fairclough (2001).  
No enquadre da ADC, Chouliaraki e Fairclough (1999) defendem que o mundo 
contemporâneo passou por diversas transformações que alteraram a maneira como as pessoas 
veem a si mesmas, os outros e o mundo. A essa nova fase social eles chamaram de 
“Modernidade tardia”. Nessa obra, o discurso deixa de ser visto como prática social e passa a 
ser concebido como um dos elementos da prática social. Esses autores buscaram apoio teórico 
no Realismo Crítico (RC) de Bhaskar (1998). O RC sustenta que a vida natural e social é um 
sistema aberto que pode ser governado por mecanismos e estruturas geradores de poder em um 
sentido complexo, e que é constituída de redes interconectadas de práticas sociais 
(CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1999, p. 19). Assim, argumentam em favor da análise das 
práticas sociais. Eles acreditam que as mudanças sociais, econômicas e culturais ocasionaram 
também mudanças no uso social da linguagem.  
 As práticas sociais são compreendidas como “maneiras habituais, em tempos e espaços 
particulares, pelas quais pessoas aplicam recursos – materiais ou simbólicos – para agirem 
juntas no mundo” (CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1999, p. 21). A ADC, nessa fase, propõe 
estudo “sobre discurso em práticas sociais da modernidade tardia, período em que a linguagem 
ocupa o centro do modo de produção do capitalismo” (RAMALHO, 2005, p. 288). 
Ottoni (2007, p. 21) explica que  
 
44 
 
 
O conceito de práticas sociais, como explicam Chouliaraki e Fairclough, é trazido do 
materialismo histórico-geográfico de Harvey (1996). Este autor identifica seis 
elementos das práticas: relações sociais, poder, práticas materiais, 
crenças/valores/desejos, instituições/rituais e discurso. Chouliaraki e Fairclough, ao 
trazerem tal conceito para a ADC, operam uma mudança, identificando apenas quatro 
elementos das práticas: atividade material, relações sociais e processos (relações 
sociais, poder, instituições), fenômenos mentais (crenças, valores, desejos) e 
discurso/semiose. 
 
Desse modo, o discurso é compreendido como um dos elementos da prática social e não 
como a prática social. Ainda na obra de 1999, Chouliaraki e Fairclough (1999, p. 60) 
apresentaram um arcabouço para o desenvolvimento da pesquisa em ADC, o qual apresentamos 
no Quadro 2 a seguir:  
 
QUADRO 2 – Arcabouço de Chouliaraki e Fairclough (1999) 
1. Um problema (atividade, reflexividade).  
2. Obstáculos para a a) análise da conjuntura 
superação do problema:  b) análise da prática (i) a(s) prática(s) é relevante para o 
 da qual o discurso é problema?  
um momento:  (ii) Relações do discurso com 
 outros momentos da prática  
c) análise de - análise estrutural (ordem do 
discurso:  discurso). 
 - análise interacional.  
- análise interdiscursiva. 
- análise linguística e semiótica.  
3. Funcionamento do problema na prática.  
4. Possíveis maneiras de superar ou minimizar os obstáculos.  
5. Reflexão sobre a análise.  
Fonte: Chouliaraki e Fairclough (1999, p. 60). 
 
No artigo de Fairclough (2012, p. 312), traduzido por Iran Melo, o autor explica: 
 
O estágio 1 mostra como essa abordagem da ACD é baseada em problemas. A ACD 
é [...] projetada para mostrar problemas enfrentados pelas pessoas em razão das 
formas particulares de vida social, fornecendo recursos para que se chegue a uma 
solução. É claro que isso leva a uma pergunta: um problema para quem? [...] a ACD 
tem objetivos emancipatórios e focaliza os chamados “perdedores” dentro de certas 
formas de vida social – os pobres, os excluídos socialmente, aqueles que estão sujeitos 
a relações opressivas de raça e sexo, e assim por diante. Mas isso não nos dá uma um 
conjunto de problemas sociais claramente definidos e incontroversos. Os assuntos 
problemáticos e que requerem mudança são inerentemente controversos e 
contestáveis, e a ACD estará inevitavelmente envolvida em debates e controvérsias 
sociais quando enfatizar certas características da vida social como problema. 
 
 
45 
 
Nesta pesquisa, consideramos que o problema está na prática durante as aulas de Língua 
Portuguesa, à qual são propostas leituras de textos desvinculados dos interesses dos alunos e, 
consequentemente, sem sentido para os alunos da EJA. Além disso, os estudantes encontram 
também dificuldades em realizar leituras literárias com autonomia, e, dificilmente, conseguem 
estabelecer conexão entre o que leem ao que vivem ou de construir sentidos sobre aquilo que 
leem. Isso pode acontecer com os textos não literários e, especialmente, com os textos literários; 
uma vez que este tipo de texto geralmente possui vocabulários, figuras de linguagens, inversões 
sintáticas não usuais, distantes da linguagem cotidiana dos alunos e dos textos não literários.   
Com isso, dentro e fora da escola, esses alunos têm dificuldades para perceberem que a leitura 
e a escrita são práticas sociais que ocorrem cotidianamente, principalmente com o advento das 
novas tecnologias e interações por meio das redes sociais. 
Investigar criticamente os textos, tendo como base teórica a ADC, significa se deparar 
com inúmeros aspectos essenciais da vida social, como as relações capitalistas entre as classes, 
a discriminação e preconceitos diversos. Por essa análise, é indispensável que o sujeito 
reconheça que as transformações linguísticas estão atadas a sistemas sociais e culturais. Em 
conformidade com o arcabouço apresentado, neste estudo, faremos uma análise da conjuntura, 
uma análise das relações do discurso com outras fases da prática social de ensino de Língua 
Portuguesa na EJA e uma análise das ordens de discurso atreladas à ordem social da educação, 
uma análise interdiscursiva, linguística e semiótica.  Tais análises constituirão nossa proposta 
e serão feitas em relação aos dados gerados. 
O que propomos nesta dissertação representa um caminho para minimizar o problema 
exposto. Também em consonância com o arcabouço de Chouliaraki e Fairclough, a análise será 
uma constante no desenvolvimento do estudo e, ao final, apresentaremos uma reflexão, sobre a 
proposta e seu desenvolvimento junto aos alunos, sobre seus resultados, sobre a análise e sobre 
os efeitos do Profletras na nossa constituição identitária. 
Dentre as obras que consideramos fundamentais para a compreensão da abordagem 
dialético-relacional de ADC, está a de Fairclough (2003), Analysing Discourse. Nela, seu 
principal interesse está na análise linguística de textos, entretanto, ressaltamos que essa é 
somente uma parte da pesquisa que desenvolve sobre a ADC. Os textos são compreendidos, 
por Fairclough (2003), como componentes de eventos sociais, capazes de transformar “[...] 
modificar ou para sustentar, assimetricamente, identidades, conhecimentos, crenças, atitudes, 
valores ou mesmo para alterar relações” (FAIRCLOUGH, 2003, p. 8).  O estudioso acredita 
que os textos podem repercutir sobre as pessoas, as ações, as relações sociais e sobre o mundo 
 
46 
 
material. Tais repercussões são mediadas pela construção do significado e pelo contexto. Nesse 
sentido, Batista Júnior; Sato e Melo (2018) definem o texto como “unidade mínima de análises 
em ADC” (BATISTA JÚNIOR; SATO; MELO, 2018, p. 49). 
Para Fairclough (2003), o discurso atua conjuntamente de três modos: ação, 
representação e identificação, ou melhor, por meio da linguagem, agimos (ação), manifestamos 
a nossa perspectiva de mundo (representação), e nos assumimos enquanto indivíduos 
(identificação). Esses elementos se relacionam, na mesma ordem, com as categorias gênero, 
discurso e estilo, como pode ser observado na Figura 02, que representa o tripé da obra de 
Fairclough (2003): 
 
FIGURA 2 – O tripé da obra de Fairclough (2003) 
 
Fonte: Ottoni (2014, p. 31). 
 
Nessa obra, Fairclough (2003) aproxima mais a ADC da LSF de Halliday (1994) e 
sugere a conexão entre as macrofunções linguísticas de Halliday existente nos textos: textual, 
ideacional e interpessoal7 e as concepções de gênero, discurso e estilo. Com isso, a cada maneira 
de interação entre discurso e prática social, Fairclough apresenta uma relação dialética entre 
eles. Essa relação dialética e de internalização é representada por Ottoni (2014) da seguinte 
forma: 
                                                     
7 De acordo com o artigo de De Sousa e Dionísio (2012) “A metafunção ideacional representa ou constrói os 
significados de nossa experiência do mundo exterior ou interior por meio do sistema de transitividade. A 
interpessoal expressa as interações e os papéis assumidos pelos usuários, revelando as atitudes desses usuários 
para com o interlocutor e para com o tema abordado por meio do sistema de modo e modalidade. A metafunção 
textual está ligada ao fluxo de informação e organiza a textualização por meio do sistema de tema.”  
 
47 
 
FIGURA 3 – A relação dialética e de internalização entre os tripés de Fairclough (2003) 
 
Fonte: Ottoni (2014, p. 32). 
 
Na Figura 3, percebemos que, embora cada campo esteja em um lugar específico, há 
uma relação dialética entre eles tanto no seu próprio círculo quanto entre eles.  Nesta pesquisa, 
levaremos em conta esses três modos como o discurso figura na prática social de ensino de 
Língua Portuguesa na EJA: o discurso como ação (gêneros); o discurso como representação 
(discursos) e o discurso como identificação (estilos). Na proposta, contemplamos o discurso 
como ação, por meio do trabalho com os gêneros conto, roteiro e curta-metragem, o discurso 
como representação (os discursos) e como identificação (estilos/identidades), ao analisar e 
discutir com os alunos as representações discursivas e identificações dos personagens nos 
contos, ao investigar como os alunos se representam e se identificam e representam o mundo e 
ao estimular os alunos a relacionarem as representações e identificações dos personagens nos 
contos com as representações e identificações de si construídas pelos discentes, articulando 
culturas, o lido e o vivido. 
O texto, como parte das práticas sociais, baseia-se numa “visão funcionalista da 
linguagem, que a entende como um recurso de que as pessoas lançam mão em sua vida diária 
para interagir e se relacionar, para representar aspectos do mundo assim como para ‘ser’, para 
identificar a si e aos outros” (VIEIRA; RESENDE, 2016, p. 180). 
Nesta pesquisa, propomos a leitura de contos que possuem temas capazes de despertar 
nos alunos da EJA, após um trabalho com a ADC, a percepção de que existem ideologias e 
discursos que os mantêm nas condições, muitas vezes, de submissão e conformismo, diante da 
realidade que os cerca. Dessa forma, a ADC propõe que os textos – materializações do discurso 
– possam promover junto aos estudantes, nesse caso da EJA, a consciência de desvantagem 
 
48 
 
social, dos discursos presentes nas narrativas e despertar nesses indivíduos o desejo de mudança 
social. Sendo assim, o trabalho com contos permitirá dar atenção ao papel da linguagem e as 
relações dos personagens dentro da história. Esses textos, materialização dos discursos, são 
vistos como fenômenos sociais e levando-se em conta o contexto social podem “descrever, 
explicar, revelar e interpretar os diferentes discursos nas práticas sociais” (BATISTA JÚNIOR; 
SATO; MELO, 2018, p. 49), durante a análise dos textos. O texto passa, por essa perspectiva, 
a ser uma interação, representação de mundo e identificação de si mesmo. No caso desse estudo, 
os contos enquanto textos são capazes de revelar relações “transparentes ou veladas, de 
discriminação, de poder e de controle manifestas no discurso” (BATISTA JÚNIOR; SATO; 
MELO, 2018, p. 49). 
Cabe salientar também, que a prática social de leitura na escola constitui-se como uma 
ação concreta que, além de promover interações entre os alunos e entre os professores, ainda é 
capaz de alterar e alcançar as relações familiares, posto que, ao perceberem-se como vozes 
silenciadas, ou vítimas de um processo de marginalização ou cativos nas mesmas condições por 
meio de ideologias impostas pelas classes dominantes, poderão tentar tirar a si e aos familiares 
dessas situações. A partir da leitura e análise dos contos, pretendemos promover reflexões sobre 
diversos temas que constituem o cotidiano desses alunos à luz da ADC.  
 
2.6 Gêneros discursivos  
 
O ensino de Língua Portuguesa tem se tornado um desafio para nós professores, tanto 
no que diz respeito à seleção de conteúdo, quanto contribuir a fim de que o aluno desenvolva 
sua capacidade de ler, interpretar e produzir textos com autonomia. Com o propósito de reverter 
esse quadro, é preciso adotar, como prática de ensino, o estudo dos gêneros discursivos que 
estão disponíveis na sociedade. Não só reconhecê-los, mas também saber utilizá-los são 
habilidades fundamentais aos falantes, com o fito de que possam transitar por eles e usá-los 
conforme a necessidade ou intencionalidade. Tais ideias são sustentadas pelo reconhecido 
pesquisador da linguagem, Mikhail Bakhtin (2015). 
Para compreender os gêneros do discurso, é necessário recorrer à abordagem 
sociodiscursiva de gêneros de Bakhtin, pela sua importância no estudo dos gêneros e pelo fato 
de que Fairclough, filiado à abordagem sociossemiótica, dialoga com Bakhtin, no que diz 
respeito aos gêneros. De acordo com Bakhtin (2015) 
 
 
49 
 
os gêneros constituem formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na 
cultura, caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e construção 
composicional. As intenções comunicativas, como parte das condições de produção 
dos discursos, geram usos sociais que determinam os gêneros que darão forma aos 
textos. (BAKHTIN, 2015, p. 279).  
 
Segundo ele, a linguagem é social e a interação dos sujeitos se dá por meio do diálogo. 
Este sujeito, na concepção de Bakhtin, é histórico, cultural e situacional. Dessa forma, ele 
considera que todo dizer possui outros dizeres, ou seja, não há vozes individuais porque somos 
o que somos pela cultura, linguagem, história e situação a qual fazemos parte. Com efeito, sobre 
o discurso, Bakhtin (2015, p. 274) afirma que “O discurso só pode existir de fato na forma de 
enunciações concretas de determinados falantes, sujeitos do discurso. O discurso sempre está 
fundido em forma de enunciado pertencente a um determinado sujeito do discurso, e fora dessa 
forma não pode existir”. 
Outro documento importante que norteia a prática pedagógica dos professores e trata 
sobre os gêneros, são os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa para o Ensino 
Fundamental (PCNLP) que apresentam em seu texto as ideias de Bakhtin  
 
é preciso que as situações escolares de ensino de Língua Portuguesa priorizem os 
textos que caracterizem os usos públicos da linguagem. Os textos a serem 
selecionados são aqueles que, por suas características e usos, podem favorecer a 
reflexão crítica, o exercício de formas do pensamento mais elaboradas e abstratas, 
bem como a fruição dos usos artísticos da linguagem, ou seja, os mais vitais para a 
plena participação numa sociedade letrada. (BRASIL, 1998, p. 21). 
 
Viabilizar o acesso aos textos que estão circulando na sociedade e favorecer a reflexão 
crítica dos alunos, de forma que possam interpretá-los e conduzi-los a uma escolha autônoma 
do gênero e que corresponda às suas necessidades em diversas situações sociais, é dar ao aluno 
condições de empoderamento pessoal e social. Ancorados nessas reflexões, vale ressaltar que 
o ensino voltado para os gêneros discursivos também apontam para a relação entre os 
indivíduos, cujos discursos passam a ser vistos como interacionais, conforme a concepção de 
Bakhtin (2015): 
 
A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo o discurso. Trata-
se da orientação natural de qualquer discurso vivo. Em todos os seus caminhos até o 
objeto, em todas as direções, o discurso se encontra com o discurso de outrem e não 
pode deixar de participar, com ele, de uma interação viva e tensa. (BAKHTIN, 2015, 
p. 88). 
 
 
50 
 
Nesse contexto, Bakhtin (2006) afirma que todas as pessoas estão cheias de 
pensamentos e palavras e tem algo a dizer, mesmo aqueles que teimam em permanecer em 
silêncio: 
 
Aquele que apreende a enunciação do outro não é ser mudo, privado de palavra, mas 
ao contrário um ser cheio de palavras interiores. Toda a sua atividade mental, o que 
se pode chamar de “fundo perceptivo”, é mediatizado para ele pelo discurso interior 
e é por aí que se opera a junção com o discurso apreendido no exterior. A palavra vai 
à palavra. É no quadro do discurso interior que se efetua a apreensão da enunciação, 
isto é, a orientação ativa do falante. (BAKHTIN, 2006, p. 153-154). 
 
O autor ainda separa os gêneros do discurso em primários e secundários. São primários, 
as situações interacionais simples como um diálogo do dia a dia e secundários (complexos) os 
romances, contos, teatro, discurso científico etc. Dessa forma, trabalhar na EJA com os gêneros 
discursivos envolverá a possibilidade de interação entre os estudantes, por intermédio do 
diálogo a partir da leitura dos contos, a reflexão de vários temas abordados nos enredos das 
histórias lidas, a construção de sentidos ao levar em conta as experiências de vida dos estudantes 
bem como as suas culturas ao relacionar aos contos e a produção de curtas-metragens de certa 
forma entrelaçada às histórias lidas. Todas essas ações pedagógicas implicam em ajudar o aluno 
a se tornar protagonista da própria história. 
 
2.6.1 O conto  
 
A contação de histórias às crianças é uma prática tradicional nas famílias e ocorre 
enquanto elas são ainda bem pequenas, antes que entrem na escola. Geralmente, as histórias 
escolhidas para a contação são os contos infantis – mais especificamente os contos de fadas – 
histórias capazes de produzir encantamento e a emoção ao ouvinte enquanto narradas 
(MASSUIA, 2011).  
Curiosamente, o conto de fadas, seguido do conto maravilhoso, também contado 
oralmente, está presente nas escolas de educação infantil e também na tradição familiar, ou seja, 
faz parte da cultura familiar contar breves histórias e estas têm o poder de despertar diferentes 
sentimentos, reflexões e consciência de mundo. Geralmente, essas histórias são tão marcantes 
que, mesmo após adultos, não são esquecidas. Além disso, o conto envolve diversos tipos e 
pode ser lido por diferentes idades. Fiorussi (2003, p. 103) apresenta para esse gênero o seguinte 
conceito “O conto é uma narrativa curta. Não faz rodeios: vai direto ao assunto. No conto tudo 
importa: cada palavra é uma pista. Em uma descrição informações valiosas; cada adjetivo é 
 
51 
 
insubstituível; cada vírgula, cada ponto, cada espaço – tudo está cheio de significado”. Cortázar 
(2004) ressalta que o conto em toda a sua brevidade precisa ser envolvente desde o início. 
Segundo ele: 
 
Um escritor argentino, muito amigo do boxe, dizia-me que nesse combate que se trava 
entre um texto apaixonante e o leitor, o romance ganha sempre por pontos, enquanto 
que o conto deve ganhar por knock-out. É verdade, na medida em que o romance 
acumula progressivamente seus efeitos no leitor, enquanto um bom conto é incisivo, 
mordente, sem trégua desde as primeiras frases. (CORTAZAR, 2004, p. 152).  
 
Durante a leitura dos contos, às vezes, o leitor pode pensar que o enredo é um relato de 
algo verdadeiro, mas Gotlib (1988) afirma que “O conto, no entanto, não se refere só ao 
acontecido. Não tem compromisso com o evento real [...] é literatura.” (GOTLIB, 1988, p.12-
14). A mesma autora aponta, em sua obra, várias definições de conto como a do escritor Edgar 
Alan Poe que define o conto como aquela narrativa que pode ser lida de “uma só assentada, 
para se conseguir esta unidade de efeito” (POE, apud GOTLIB, 1998, p. 32). Gotlib (1998) 
apresenta também a definição de conto, segundo o escritor Brander Matthews, “o conto é o que 
lida com um só elemento: personagem, acontecimento, emoção e situação.” (MATTHEWS, 
apud GOTLIB, 1998, p. 59). Partindo dos conceitos sobre os contos dos diferentes teóricos, a 
autora realiza um apanhado das principais acepções sobre o gênero: 
 
E é este também o segredo do conto, que promove o sequestro do leitor , prendendo-
o num efeito que lhe permite a visão em conjunto da obra, desde que todos os 
elementos do conto são incorporados, tendo em vista a construção deste efeito (Poe); 
neste sequestro temporário, existe toda uma força de tensão , num sistema de relações 
entre os elementos do conto e em que cada detalhe é significativo (Cortazar). O conto 
centra-se num conflito dramático, em que cada gesto e olhar são até mesmo 
teatralmente utilizados pelo narrador (E. Bowen). Não lhe falta a construção simétrica, 
de um episódio, num espaço determinado (B. Matthews). Trata-se de um acidente da 
vida (José Oiticica), cercado, neste caso, de um ligeiro antes e depois (José Oiticica). 
De tal forma que esta ação parece ter sido mesmo criada para um conto, adaptando-
se a este gênero e não a outro, por seu caráter de contração (N. Friedman) (GOTLIB, 
1988, p. 81). 
 
Dessa forma, os contos lidos, em menor tempo e centrado em um único conflito, são 
eficazes para capturar o interesse do leitor. Embora, vale salientar, nem sempre eles caem no 
gosto do ouvinte/leitor. Pode haver aqueles cujo enredo não produza a emoção ou a curiosidade 
pelo desfecho da história. Para Cortázar (2004, p. 152), “um conto é ruim quando é escrito sem 
tensão que se deve manifestar desde as primeiras palavras ou desde as primeiras cenas”. Outra 
característica comum aos contos é a preocupação com um determinado tema. São diversos 
assuntos, dirigidos a qualquer idade. De acordo com Cortázar (2004): 
 
52 
 
 
Um mesmo tema pode ser profundamente significativo para um escritor, e anódino 
para outro; um mesmo tema despertará enormes ressonâncias num leitor e deixará 
indiferente a outro. Em suma, pode-se dizer que não há temas absolutamente 
significativos ou absolutamente insignificantes. O que há é uma aliança misteriosa e 
complexas entre certo escritor e certo tema num momento dado, assim como a mesma 
aliança poderá logo entre certos contos e certos leitores. (CORTAZAR, 2004, p. 155). 
 
Vieira (2009, p. 72) afirma que um conto pode terminar de três maneiras: “O 
protagonista vence; o protagonista perde; o antagonista vence.” O autor também salienta que 
há diversos tipos de contos como “os contos de humor, fantásticos, de mistério e terror, realistas, 
psicológicos, sombrios, cômicos, religiosos, minimalistas, estruturados de acordo com a 
narrativa” (VIEIRA, 2009, p. 115).  
No caso desta proposta que apresentamos, os contos selecionados são dos tipos realistas 
e psicológicos, uma vez que mesmo sendo ficcionais, apresentam histórias que contêm enredos 
possíveis de terem acontecido ou que possam vir a acontecer e os personagens são apresentados 
de forma complexa, simulam personalidades, sentimentos e comportamentos reais, embora 
fictícios. Além do gênero conto, o roteiro também fará parte da nossa proposta. Sobre o roteiro 
discorremos na próxima seção.  
 
2.6.2 O roteiro 
 
O roteiro é um gênero que deve ser escrito para orientar a todos os envolvidos no 
processo de produções dramáticas que tanto podem ser teatrais quanto cinematográficas. Field 
(2001, p. 2) define o roteiro como “uma história contada em imagens, diálogos e descrições, 
localizada no contexto da estrutura dramática.” Essas histórias podem ser criadas para uma 
produção audiovisual ou podem ser feitas a partir de uma adaptação de uma obra, de qualquer 
outro gênero como um romance, um conto, um poema, uma novela. Com outras palavras, 
Comparato (1983, p. 15) afirma que o roteiro “é a forma escrita de qualquer espetáculo áudio e 
/ou visual.” 
Maciel (2017) aponta que a origem do roteiro veio da peça de teatro da Grécia Antiga, 
sendo Aristóteles quem definiu as três partes da ação dramática: tempo, espaço e ação (FIELD, 
2001). Tais partes ainda se mantêm como fundamentais na construção do roteiro e outras foram 
acrescentadas com o passar dos anos. Segundo Field (2001, p. 2) em um roteiro “Uma história 
é um todo, e as partes que a compõem – a ação, personagens, cenas, sequencias, Atos I, II, III, 
 
53 
 
incidentes, episódios, eventos, música, locações etc. são o que a formam. Ela é um todo.” Esses 
elementos compõem a estrutura que sustenta a história para se tornar única. 
Podemos representar o paradigma(esquema) do roteiro da seguinte forma: 
 
QUADRO 3 – Esquema de roteiro inspirado na proposta de Field (2001) 
Ato I Ponto de Ato II Ponto de Ato III 
Início virada I Meio virada II Fim 
Apresentação Confrontação Resolução 
Apresenta-se o Episódio, É a fase que o Episódio ou Solução da 
personagem incidente ou personagem incidente que história que 
principal, sobre o evento que principal enfrenta impulsiona a pode ser 
que se trata, quais impulsiona a obstáculos, mostra ação para que a favorável ou 
são as ação para que a os seus desejos, as história se não ao 
circunstâncias em história se necessidades. direcione à personagem 
torno da ação. direcione ao Enfim, o conflito.  resolução da principal. 
próximo ato. história 
Fonte: Quadro formulado pela pesquisadora a partir da leitura da obra de Field (2001, p. 1-7). 
 
Outro aspecto importante a ser abordado é o assunto (De que se trata?), nesse caso 
envolve ação e personagem. Segundo Field (2001, p. 11) “a ação é o que acontece; o 
personagem, a quem acontece.” Esse personagem possui características e personalidade que 
deve ser revelado visualmente. Field (2001) orienta que o roteirista classifique o personagem 
sob três componentes: profissional, pessoal (solteiro, viúvo, amigos etc.), privado (o que ele faz 
quando está sozinho) – explorar as relações que esse personagem tem com os outros. E, a partir 
daí definir qual é a necessidade do seu personagem e o ponto de vista que ele tem sobre tudo o 
que envolve o enredo. 
Outro item a ser considerado são os diálogos que estão relacionados com a necessidade 
do personagem, segundo Field (2001, p. 24) e que deve “mover a história adiante.” 
Para iniciar um roteiro é preciso que se faça uma sinopse. Comparato (1983, p. 78-79) 
revela que “é a primeira forma textual de um roteiro. É preciso especificar de maneira clara e 
concreta os acontecimentos da história. Uma boa sinopse é o guia perfeito para se obter o 
roteiro.” No caso dessa proposta, a sinopse não será necessária, pois já temos o gênero conto 
que é uma narrativa concisa.  
 Assim, os contos lidos na escola, serão adaptados conforme a vontade dos participantes 
da pesquisa e transformados no gênero roteiro e posteriormente, produzidos os curtas-
metragens.  Sobre o curta-metragem discorremos na próxima seção. 
 
 
54 
 
2.6.3 O curta-metragem 
 
As mudanças na sociedade estão ocorrendo de maneira acelerada e, cotidianamente, 
deparamo-nos com o velho e o novo. Na escola, não é diferente. O uso dos livros didáticos, dos 
livros literários, de revistas e de jornais enquanto materiais físicos disponíveis, mesmo que de 
forma precária, concorrem com inúmeros outros artefatos tecnológicos como computadores, 
smartphones, que disponibilizam novos gêneros discursivos, novas formas de interação e de 
acesso tanto dos alunos quanto dos professores. Tomando como exemplo, um indivíduo pode 
abrir várias janelas durante a navegação na internet e ler textos que contêm apenas imagens, 
apenas escrita, apenas áudio ou todas as formas juntas, ou seja, são inúmeros textos multimodais 
e multissemióticos à disposição de pessoas de qualquer idade. Entretanto, nem sempre esses 
acessos são feitos de maneira crítica e reflexiva, muitos indivíduos podem estar, por meio 
desses recursos tecnológicos, promovendo ideologias que massificam e impõem a dominação 
de uns sobre os outros, incentivam ao consumismo e a um comportamento cada vez mais 
homogêneo e passivo. A BNCC (2017) aborda sobre esses novos gêneros da seguinte forma:  
 
As práticas de linguagem contemporâneas não só envolvem novos gêneros e textos 
cada vez mais multissemióticos e multimidiáticos, como também novas formas de 
produzir, de configurar, de disponibilizar, de replicar e de interagir. As novas 
ferramentas de edição de textos, áudios, fotos, vídeos tornam acessíveis a qualquer 
um a produção e disponibilização de textos multissemióticos nas redes sociais e outros 
ambientes da Web. Não só é possível acessar conteúdos variados em diferentes 
mídias, como também produzir e publicar fotos, vídeos diversos, podcasts, 
infográficos, enciclopédias colaborativas, revistas e livros digitais etc. Depois de ler 
um livro de literatura ou assistir a um filme, pode-se postar comentários em redes 
sociais específicas, seguir diretores, autores, escritores, acompanhar de perto seu 
trabalho; podemos produzir playlists, vlogs, vídeos-minuto, escrever fanfics, produzir 
e-zines, nos tornar um booktuber, dentre outras muitas possibilidades. (BRASIL, 
2017, p. 66). 
 
Tudo isso leva o professor a repensar sobre as ações pedagógicas e o conduz a novas 
práticas para que outros letramentos sejam possíveis, como o letramento digital e o letramento 
crítico. Assistir filmes, séries, novelas, clipes, resenhas e vários outros gêneros audiovisuais são 
as preferências dos internautas, segundo pesquisa realizada pelo IBGE (2016), 76,4%. Portanto, 
a produção de curtas-metragens, pelos alunos da EJA, neste projeto, parece ser uma proposta 
viável, uma vez que o professor pesquisador pretende fomentar o uso de tecnologias por meio 
das redes da internet e o uso de programas para a produção dos curtas-metragens. Nesse mesmo 
sentido, a BNCC (2017) busca nortear os professores: 
 
 
55 
 
Refletir sobre as transformações ocorridas nos campos de atividades em função do 
desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação, do uso do hipertexto 
e da hipermídia e do surgimento da Web 2.0: novos gêneros do discurso e novas 
práticas de linguagem próprias educacional. Obviamente tais mudanças impactam no 
ambiente escolar e provocaram a da cultura digital, transmutação ou reelaboração dos 
gêneros em função das transformações pelas quais passam o texto (de formatação e 
em função da convergência de mídias e do funcionamento hipertextual), novas formas 
de interação e de compartilhamento de textos/ conteúdos/informações, reconfiguração 
do papel de leitor, que passa a ser também produtor, dentre outros, como forma de 
ampliar as possibilidades de participação na cultura digital e contemplar os novos e 
os multiletramentos. (BRASIL, 2017, p. 70). 
 
De acordo com o dicionário de Cegalla (2005, p. 263), o curta-metragem é um “filme 
de curta duração, mais ou menos dez minutos, rodado para fins artísticos, educativos ou 
comerciais.” Esse tipo de produção, segundo Assis Brasil (2001), foi incentivada por intermédio 
da Lei do Curta “Criada em 1974, implantada em 1977, reformulada em 1985 e inviabilizada 
em 1990.” Graças a essa lei, criou-se, a partir dela, “um mercado para a produção e distribuição 
de filmes de curta-metragem no país”, mas com a sua inviabilização, nos anos 90, Assis Brasil 
(2001) assevera que existe hoje em dia pouca boa vontade política para a valorização e exibição 
de curtas no país. Longe das pretensões de mercado, acreditamos que a produção de curtas-
metragens na escola, como estratégia de ensino, seja importante para os alunos, pois serão 
acionados diversos conhecimentos que não se comportam apenas na disciplina de LP, mas em 
diversas outras áreas, ou seja, produzir curtas-metragens são ações transdisciplinares e 
interdisciplinares.  
Além disso, a produção desse gênero discursivo é capaz de promover interações entre 
os alunos, estimular a criatividade e a troca de conhecimentos que eles já possuem, 
proporcionando a eles o protagonismo.  Nessa proposta, os alunos deverão transformar os 
contos lidos e analisados em curtas-metragens procurando fazer as adaptações dos enredos, por 
meio de um roteiro, conforme o planejamento e, assim, produzirem os curtas-metragens. Na 
sequência, disponibilizar no You tube e inscrevê-los no festival de curtas a ser promovido na 
escola no final do trabalho. 
Os alunos poderão também fazer a inscrição dos curtas-metragens produzidos, no 5º 
Festival de Curtas-metragens das escolas públicas do Distrito Federal, caso o tema esteja de 
acordo com a produção dos estudantes. 
 
 
 
 
 
56 
 
2.7 Fundamentos metodológicos  
 
A escola pode e deve ser um ambiente favorável às diversas pesquisas, uma vez que a 
instituição está inserida na sociedade e, como parte da sociedade, é um ambiente propício a 
inúmeros eventos sociais. Ou seja, a escola não está isenta aos eventos externos a ela. Se a 
violência, por exemplo, torna-se maior na comunidade, essa se manifestará dentro do ambiente 
escolar de alguma forma. Além disso, os sujeitos que dela fazem parte são propensos a levar 
para dentro da instituição inúmeras vivências, conflitos e angústias. Mas, a própria escola, na 
maioria das vezes, não consegue resolver os próprios problemas que ela deveria dar conta, tais 
como: a não aprendizagem dos estudantes, indisciplina, convivência, repetência, evasão e 
inúmeras outras agruras.  
Portanto, é bastante relevante que os professores, atores sociais importantes do sistema 
educacional, coloquem-se como pesquisadores e que façam “recortes” desses inúmeros 
problemas para, mediante o uso de diferentes estratégias, serem capazes de tentar explicar a 
realidade a qual fazem parte e intervir nesse espaço do qual fazem parte. 
Encontrar soluções para os problemas, por meio da pesquisa, é fundamental para a 
escola contemporânea e toda a sociedade. Pela pesquisa, novas descobertas podem ajudar 
diversos indivíduos e abrir caminhos para outras investigações. Segundo Prodanov e Freitas 
(2013): 
Pesquisa é, portanto, um conjunto de ações, propostas para encontrar a solução para 
um problema, as quais têm por base procedimentos racionais e sistemáticos. A 
pesquisa é realizada quando temos um problema e não temos informações para 
solucioná-lo. A pesquisa procura respostas! Podemos encontrá-las ou não. As chances 
de sucesso certamente aumentam à medida que enfocarmos a pesquisa como um 
processo e não como uma simples coleta de dados. (PRODANOV; FREITAS, 2013, 
p. 44). 
 
Gil (2008, p. 8) afirma que o principal objetivo da ciência é procurar a veracidade dos 
fatos e “o que torna, porém, o conhecimento científico distinto dos demais é que tem como 
característica fundamental a sua verificabilidade.”  Para isso, segundo Gil, deve-se determinar 
o método que levou a determinado conhecimento. Contudo, não há métodos universais e únicos. 
Eles deverão ser escolhidos conforme o objeto da pesquisa, a área e principalmente a que 
propósito e conhecimento se quer chegar.  
O método é “o caminho para chegarmos a determinado fim” (PRODANOV; FREITAS, 
2013, p. 24) e, embora pareça ser exclusividade da ciência, não é. Marconi e Lakatos (2007) 
afirmam que o método pode ser usado em qualquer situação do cotidiano e o fazemos, às vezes, 
 
57 
 
até mesmo automaticamente, como o preparo de um café, cuja receita é sempre a mesma. Há 
um caminho escolhido para ter o mesmo sabor da bebida. Esses esclarecimentos são válidos 
para mostrar que os métodos, especialmente os científicos, podem durante a sua verificação 
chegar a conhecimentos inesperados. E como pesquisadores devemos estar atentos a isso. 
Vale ressaltar que as pesquisas científicas se caracterizam quanto à abordagem, à 
natureza, aos objetivos e aos procedimentos, conforme apontam Silveira e Córdova (2009).  
No tocante à abordagem, pode ser qualitativa, quantitativa ou quantiqualitativa, A 
pesquisa representada neste projeto é qualitativa, a qual é conceituada por Prodonov e Freitas 
(2013) como: 
 
Pesquisa qualitativa: considera que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o 
sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do 
sujeito que não pode ser traduzido em números. A interpretação dos fenômenos e a 
atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Esta não 
requer o uso de métodos e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta 
para coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave. Tal pesquisa é descritiva. 
Os pesquisadores tendem a analisar seus dados indutivamente. O processo e seu 
significado são os focos principais de abordagem (PRODONOV; FREITAS, 2013, p. 
70). 
 
É importante salientar a relação da pesquisa qualitativa com a ADC. De acordo com 
Magalhães, Martins e Resende (2017): 
 
O método desenvolvido pela ADC situa-se na tradição da pesquisa qualitativa, em 
virtude do foco da análise detalhada de textos e discursos. [...] trata-se de um método 
que conjuga o estudo textual discursivo à crítica social. Dessa forma, a ADC volta-se 
para o debate de um determinado problema social, contribuindo para a reflexão sobre 
ele (MAGALHAES; MARTINS; RESENDE, 2017, p. 33). 
 
Quanto à natureza, as pesquisas podem ser básicas ou aplicadas. Nosso estudo tem 
natureza aplicada, pois “objetiva gerar conhecimentos para aplicação prática, dirigidos à 
solução de problemas específicos” (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009, p. 35).  
No que concerne aos objetivos, as pesquisas científicas podem ser classificadas em três 
grupos: a exploratória, a descritiva e a explicativa (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009) e nossa 
pesquisa enquadra-se no grupo da pesquisa explicativa, a qual 
 
preocupa-se em identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a 
ocorrência dos fenômenos (GIL, 2007). Ou seja, este tipo de pesquisa explica o porquê 
das coisas através dos resultados oferecidos. Segundo Gil (2007, p. 43), uma pesquisa 
explicativa pode ser a continuação de outra descritiva, posto que a identificação de 
fatores que determinam um fenômeno exige que este esteja suficientemente descrito 
e detalhado (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009, p. 35). 
 
58 
 
 
No que diz respeito aos procedimentos, uma pesquisa científica pode ser classificada 
como: experimental, bibliográfica, documental, de campo, ex-post-facto, de levantamento, com 
survey, estudo de caso, participante, pesquisa-ação, etnográfica e etnometodológica 
(SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009). Tendo em vista isso, compreendemos que nosso estudo, no 
tocante aos procedimentos, pode ser classificado como uma pesquisa de campo, participante, 
uma pesquisa-ação tendo também um cunho etnográfico. A pesquisa de campo, se caracteriza 
“pelas investigações em que, além da pesquisa bibliográfica e/ou documental, se realiza coleta 
de dados junto a pessoas, como recurso de diferentes tipos de pesquisa” (SILVEIRA E 
CÓRDOVA, 2009, p. 37). 
Assim, em nossa pesquisa, geramos dados8 junto a alunos com o recurso da pesquisa-
ação e participante. De acordo com Fonseca (2002, p. 34-5), a pesquisa-ação 
 
pressupõe uma participação planejada do pesquisador na situação problemática a ser 
investigada. O processo de pesquisa recorre a uma metodologia sistemática, no 
sentido de transformar as realidades observadas, a partir da sua compreensão, 
conhecimento e compromisso para a ação dos elementos envolvidos na pesquisa [...] 
O investigador abandona o papel de observador em proveito de uma atitude 
participativa e de uma relação sujeito a sujeito com os outros parceiros. O pesquisador 
quando participa na ação traz consigo uma série de conhecimentos que serão o 
substrato para a realização da sua análise reflexiva sobre a realidade e os elementos 
que a integram. A reflexão sobre a prática implica em modificações no conhecimento 
do pesquisador. 
 
Thiollent (1998, p. 17-19), grande teórico nos estudos sobre pesquisa-ação reforça que 
“[...] pela pesquisa-ação é possível estudar dinamicamente os problemas, decisões, ações, 
negociações, conflitos e tomadas de consciência que ocorrem entre os agentes durante o 
processo de transformação de situação.” 
Considerando que a pesquisa participante “caracteriza-se pelo envolvimento e 
identificação do pesquisador com as pessoas investigadas” (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009, 
p. 40), compreendemos que também desenvolvemos uma pesquisa participante. Além disso, 
ela tem cunho etnográfico, posto que, de acordo com Laplantine (2000, p. 75), a pesquisa 
etnográfica “só começa a existir a partir do momento no qual se percebe que o pesquisador 
                                                     
8 Em consonância com Mason (1997) preferimos falar em geração de dados à coleta de dados, porque na pesquisa 
qualitativa o pesquisador é visto como alguém que não encontra os dados à sua espera para serem coletados, mas 
trabalha de forma a gerá-los a partir dos instrumentos que escolheu. “Isso implica reconhecer que o processo de 
geração de dados é um processo participativo, analítico e interpretativo marcado tanto pela perspectiva ontológica 
do pesquisador acerca da realidade social quanto pela sua perspectiva epistemológica de como a realidade pode 
ser conhecida” (REES; MELO, 2011, p. 34-5) 
 
 
59 
 
deve ele mesmo efetuar no campo sua própria pesquisa, e que esse trabalho de observação 
direta é parte integrante da pesquisa”.  Como professoras e pesquisadoras, nós efetuamos no 
campo nossa própria pesquisa e desenvolvemos um trabalho de observação direta. Além disso, 
nossa descrição dos eventos e atores sociais é interpretativa e buscamos interpretar o que dizem 
os sujeitos participantes da pesquisa, o que também caracteriza a pesquisa etnográfica, 
conforme Geertz (1978). 
Ademais, em nosso estudo pautamo-nos em pressupostos da etnografia crítica, que 
“reconhece como seu ponto de partida o compromisso com a teoria crítica” (OTTONI, 2007, 
p. 100). Tal perspectiva é, conforme Ottoni (2007) explica, consoante com os propósitos da 
Análise de Discurso Crítica porque a etnografia crítica, semelhante à ADC, vale-se de “um 
enquadre explícito que, ao modificar a consciência ou convidar para ação, esforça-se para usar 
o saber na transformação social” (THOMAS, 1993, p.  4).  
Com base em Hammersley e Atkinson (1995) e em Thomas (1993), Ottoni (2007) trata 
de um tema central nas discussões sobre o desenvolvimento da etnografia crítica:  a habilidade 
para refletir criticamente sobre o processo de pesquisa, a reflexividade: 
 
Ela não é entendida como mera autorreflexão do/a pesquisador/a. Mais propriamente, 
ela envolve um complexo diálogo entre pesquisador/a, participantes, o processo de 
pesquisa e os resultados da pesquisa.  A reflexividade, de acordo com Berg (2001: 
139) implica mais uma mudança na forma como entendemos os dados e a coleta dos 
mesmos. Essa característica reflexiva implica que o/a pesquisador/a entende que é 
parte do mundo social que investiga. Ele/a ainda tem que estar sempre pronto/a a 
modificar suas crenças, teorias se os dados exigirem. A questão não é provar nada, 
mas ver se o problema identificado inicialmente de fato existe. E quando nossas visões 
mudam, o foco de nosso estudo muda, porque novas visões abrem novos horizontes a 
partir dos quais produzimos questões e tentativas de respostas. Começamos, então, a 
fazer diferentes perguntas, reorganizar os dados para corresponderem às novas ideias, 
e redefinimos a natureza do problema original (Thomas, op. cit.: p. 67) (OTTONI, 
2007, p. 101).  
 
Essa reflexividade foi uma marca na elaboração do nosso projeto de pesquisa, na 
elaboração da proposta didática, na sua reconfiguração quando do trabalho em campo, no 
desenvolvimento da proposta, no relato, na análise e na discussão dos dados.  
Um outro ponto importante relacionado à pesquisa pautada nos pressupostos da 
etnografia crítica, que também foi levado em conta em nosso estudo, diz respeito à “ruptura 
na concepção assimétrica da pesquisa baseada na captação de informações” (OTTONI, 2007, 
p. 101). Segundo a autora, a etnografia crítica (THOMAS, 1993) e a pesquisa colaborativa 
(IVANIC, 1998), democrática (MAGALHÃES; GIEVE, 1998); e fortalecedora (CAMERON 
et al., 1992) supõem essa ruptura: 
 
60 
 
 
Ao transformar o/a participante em interlocutor/a e em sujeito participante da 
pesquisa, uma nova modalidade de relacionamento e de produção do conhecimento 
pode surgir. A relação dialógica pesquisador/a-participante é, portanto, um elemento 
fundamental para uma pesquisa colaborativa. Com essa posição metodológica, então, 
busca-se uma conexão entre a reflexão e a ação. (OTTONI, 2007, p. 101). 
 
Nessa perspectiva, é fundamental que o pesquisador leve em conta questões 
relacionadas a poder, à ética e à validade na relação com os participantes (GIEVE; 
MAGALHÃES, 1994) e adote três atitudes com relação aos seus colaboradores: ética, defesa 
e fortalecimento.  
A atitude ética é referente à atitude do pesquisador, ético, que procura minimizar o 
máximo possível os danos aos participantes da pesquisa, tomando o cuidado para que as suas 
identidades sejam preservadas utilizando pseudônimos e outros recursos para que quando os 
dados forem divulgados, não sejam expostos. Além disso, também reconhece as contribuições 
desses participantes. Ottoni (2007, p. 102) afirma que esse tipo de pesquisa é caracterizado 
como “PESQUISA SOBRE”. 
A defesa diz respeito ao compromisso assumido pelo pesquisador em prol dos 
participantes indo além da pesquisa. Como no caso dos professores que realizam a pesquisa de 
campo que se valem de suas habilidades e conhecimentos para conseguir algo necessário aos 
participantes, como por exemplo, campanhas e bazar para aqueles que revelam essa 
necessidade. Ottoni (2007, p. 102) ressalta que essa pesquisa é caracterizada como “PESQUISA 
SOBRE E PARA os sujeitos.” 
Magalhães e Gieve (1994) e Cameron et al. revelam que, algumas pessoas tratam, 
metaforicamente, o poder como uma propriedade e que, em determinados contextos, os impõe 
sobre os outros. Por outro lado, Foucault (1995, p. 248) afirma que “não há relação de poder 
sem resistência”, essa relação de poder e resistência durante a pesquisa pode prejudicar ou 
mascarar os dados gerados. Por isso, sustentamos que a pesquisa seja democrática, dando 
espaço para o diálogo, honestidade e a negociação. E buscar maneiras de dar fortalecimento a 
quem nesse espaço social geralmente não tem poder, os participantes da pesquisa.  
No caso da EJA, percebemos que se encaixam como grupo marginalizado, oprimido, 
cujo conhecimento e consciência crítica servirá como fortalecimento para a própria libertação 
e para realizar as próprias escolhas e como resistência. Magalhães e Gieve (1994) afirmam que 
devemos enquanto pesquisadores “dar a voz ao sujeito”, fazer com que ela apareça e evitar 
imposições ideológicas. 
 
61 
 
Além do já exposto, nosso estudo é também construído com base nos aportes da ADC, 
que é tanto uma teoria quanto um método. Nessa perspectiva, a pesquisa foi construída em 
consonância com arcabouço empreendido por Chouliaraki e Fairclough (1999) para o 
desenvolvimento de pesquisas em ADC apresentado na seção 2.5, no Quadro 02.  
De acordo com esse arcabouço, a pesquisa parte da identificação de um problema social 
com faceta semiótica. Nesta pesquisa, como já dissemos nas seções 1 e 2.1, consideramos que 
há um problema na prática de leitura, de análise e de produção de textos nas aulas de Língua 
Portuguesa da EJA. Nessas aulas, em geral, são propostas leituras de textos desvinculados dos 
interesses dos alunos e, consequentemente, sem sentido para os alunos da EJA. Além disso, os 
estudantes encontram também dificuldades em realizar leituras literárias com autonomia, e, 
dificilmente, conseguem estabelecer conexão entre o que leem e o que vivem e construir 
sentidos sobre aquilo que leem. Isso pode acontecer com os textos não literários e, 
especialmente, com os textos literários; uma vez que estes geralmente possuem vocabulários, 
figuras de linguagens, inversões sintáticas não usuais, distantes da linguagem cotidiana dos 
alunos e dos textos não literários.  Da mesma forma, isso ocorre também com a análise e a 
produção de textos. Além de essas análises conterem questões superficiais e sem qualquer 
compromisso para que o que tenha sido lido pelos alunos torne-se profundo e rompa com 
situações hegemônicas, por exemplo. Sem dúvidas, esse é papel do professor que ensina na 
perspectiva do Letramento Crítico e na ADC. Outro problema, encontra-se nas produções 
textuais, quase sempre malvistas e temidas pelos estudantes, pois na maioria das vezes essas 
produções são feitas sem a mediação do professor durante a produção. Geralmente a correção 
e sugestões são feitas depois, numa devolutiva do professor, às vezes, cheia de cortes e 
correções com o uso de caneta vermelha que assusta o aluno e quase sempre quando solicitado 
a produzir há uma repulsa generalizada.   
 Com isso, dentro e fora da escola, esses alunos têm dificuldades para perceberem que 
a leitura e a escrita são práticas sociais que ocorrem cotidianamente, que o que se tem nos textos 
é uma representação de parte da realidade, construída por meio de recursos 
linguístico/semióticos, e que o que se tem nos textos pode ter relação com o que vivem. Tudo 
isso acaba constituindo um problema que é também social e que tem uma faceta discursiva 
importante.  
Ainda em conformidade com o arcabouço apresentado, neste estudo, para 
identificarmos os obstáculos a serem superados, fazemos uma análise da conjuntura ( seção 
2.1), elaboramos e aplicamos uma proposta didática com o intuito de minimizar o problema 
 
62 
 
identificado e analisamos a relação do discurso com outros elementos da prática social de 
ensino de língua portuguesa na EJA, as ordens de discurso articuladas, fazemos ainda, a partir 
dos dados gerados em campo, uma análise interdiscursiva, linguística e semiótica.             
Também em consonância com o arcabouço de Chouliaraki e Fairclough (1999), fazemos 
uma reflexão sobre a proposta, seu desenvolvimento junto aos alunos, seus resultados, sobre a 
análise e sobre os efeitos do Profletras na nossa constituição identitária. 
 
2.8 Procedimentos metodológicos, contexto de pesquisa e participantes 
 
Este trabalho, pensado e executado conforme estudos realizados no Profletras, iniciou-
se com a verificação de problemas quanto à apropriação da leitura e da escrita presentes em 
meio aos estudantes em todas as modalidades de ensino, não sendo diferente na EJA.  
Percebemos que quando os/as estudantes, especialmente da EJA, não conseguem ler, escrever 
e interpretar adequadamente, essa dificuldade repercutirá na vida pessoal de cada um deles, 
proporcionando a exclusão e a marginalização desse grupo, por isso afirmamos que esse 
problema é também social. Assim, delimitado o tema, iniciamos a revisão bibliográfica que se 
deu durante todo o estudo.  
A partir dessa revisão, elaboramos o projeto de pesquisa e o apresentamos à direção da 
escola, onde pretendemos desenvolver a investigação, para sabermos do interesse da direção da 
instituição coparticipante. Após a produção do projeto e a explicitação do interesse da direção 
dessa instituição, submetemos o projeto ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos 
(CEP) da Universidade Federal de Uberlândia. Em seguida, elaboramos uma primeira versão 
de nossa proposta didática de intervenção, centrada na leitura de contos e na produção de curtas-
metragens, com o intuito de promover o desenvolvimento da competência discursiva dos 
alunos, tendo em vista o problema do qual partimos, as questões de pesquisa propostas e os 
objetivos apresentados.  
Para a elaboração da proposta, depois de identificar o problema, pensamos numa 
proposta que pudesse minimizá-la. Percebemos que as turmas de EJA, especialmente do 
noturno, além de ter altos índices de desistência durante o semestre letivo, também são bastante 
faltosas. Assim, precisaríamos de um gênero literário cujo texto fosse curto e pudesse ocorrer 
a leitura em um único dia. É por esse motivo que decidimos trabalhar com os contos: pela 
brevidade das histórias. O próximo passo seria selecionar quais os contos que fariam parte do 
repertório a ser lido. Partimos da experiência de um projeto desenvolvido na escola, durante o 
 
63 
 
dia, onde se daria a pesquisa, junto aos alunos do ensino médio, intitulado por “Quem conta um 
conto”. Nesse projeto, são estudados anualmente 10 contistas e cerca de 50 contos e produzidas 
fotonovelas. Portanto, como professora criadora do projeto e leitora de centenas de contos, ficou 
fácil selecionar aqueles que pudessem despertar nos estudantes da EJA o gosto e a fruição pelos 
contos. Inicialmente, selecionamos 12 contos e, após as orientações da professora, 
permanecemos com 5, cujas histórias poderiam despertar o interesse do público EJA, contendo 
temas como abandono, preconceito, conflitos familiares, velhice. 
A partir daí, estudamos os gêneros discursivos e com as orientações da professora 
pudemos chegar aos teóricos que poderiam embasar e orientar para a elaboração da proposta. 
Sem dúvidas, a proposta começou pela perspectiva da ADC de Fairclough e, como é uma teoria 
e metodologia que se articulam às outras, percebemos que a sequência básica de Cosson seria 
a melhor maneira de organizar o planejamento para o desenvolvimento de práticas de 
letramento literário. Devido ao perfil do público atendido, de múltiplas idades, histórias, 
culturas, linguagens, buscamos como apoio teórico/metodológico a pedagogia dos 
Multiletramentos e o LC, cujas bases dialogam com a ADC. Consideramos que o trabalho 
norteado por essas bases poderia contribuir para que os alunos desenvolvessem a habilidade de 
posicionar-se diante das inquietações, de analisar como os usos que fazemos da linguagem têm 
efeitos sociais e constroem diferentes representações de mundo e identificações. 
Após a construção da proposta interventiva, ela foi avaliada por uma banca, durante o 
exame de qualificação. E, a partir das considerações feitas por essa banca, realizamos as 
alterações necessárias para posterior aplicação em sala de aula. Após a aprovação do projeto 
pelo CEP9, o trabalho foi desenvolvido pela professora pesquisadora na sala de aula, em uma 
escola que oferece Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos do primeiro e segundo 
segmentos do Ensino Fundamental da rede pública de Brasília do Distrito Federal sobre a qual 
falamos na seção 2.8.1. 
Antes de começar o desenvolvimento do estudo, foi feita a apresentação da proposta aos 
professores da escola, para que a conhecessem, aos alunos do 8ª série da EJA, na qual a 
professora pesquisadora ministra aulas, e aos responsáveis pelos alunos menores de 18 (dezoito) 
anos da turma, para que manifestassem o interesse ou não na participação na pesquisa.  
A apresentação aos responsáveis foi feita em reunião de pais prevista em calendário 
escolar e, aos estudantes, no espaço da sala de aula. Depois da manifestação de interesse, foi 
                                                     
9 Projeto aprovado pelo CEP em 29 de março de 2019, número do Parecer n.º 3.234.339. 
 
 
64 
 
apresentado, aos responsáveis pelos alunos menores de 18 anos, o Termo de Consentimento 
Livre e Esclarecido para responsável legal por menor de 18 anos (ANEXO A); aos alunos 
menores de 18 anos, o Termo de Assentimento para o Menor entre 12 e 18 anos incompletos 
(ANEXO B) e, para os alunos maiores de 18 anos, o Termo de Consentimento Livre e 
Esclarecido (ANEXO C). Deixamos claro a todos/as também que haveria a geração de dados 
por meio de entrevista, de questionário, de registro de respostas dos alunos participantes, da 
produção de textos e das atividades realizadas. Além disso, foram também informados de que 
a identidade dos/as participantes seria mantida em sigilo, de que os dados comporiam o corpo 
de análise, sem identificação e de que a participação do aluno iria ocorrer somente após a 
assinatura dos dois termos citados. Garantimos a eles/as que o sigilo seria garantido mesmo 
com a publicação dos resultados alcançados. 
 Esses termos foram lidos conjuntamente e esses sujeitos tiveram o prazo de uma 
semana para releitura dos termos e para decidirem se concordavam ou não com a participação 
no estudo. Todos concordaram, assinaram e devolveram os termos à professora-pesquisadora.  
Prevíamos 43 (quarenta e três) aulas que correspondem a 7 (sete) semanas letivas para 
a realização da pesquisa. Entretanto, foram necessárias 52 (cinquenta e duas) aulas.  
A pesquisa foi desenvolvida nos horários previstos da escola e contempla os conteúdos 
da Proposta Curricular para a EJA.  
Para a coleta e geração de dados, durante a aplicação da proposta de leitura e de 
produção de textos, foram utilizados os seguintes instrumentos: entrevista semiestruturada10 
(ver roteiro no apêndice B), questionário (apêndice A), gravação de aulas e diário de campo. 
Além disso, confeccionamos uma pasta portfólio que contém tanto as ações planejadas, quanto 
as dúvidas, questionamentos, atividades, reflexões, fotos e análises do material coletado.  
Após a gravação das aulas, o material foi transcrito seguindo as convenções de 
transcrição construídas pelo Grupo de Pesquisa sobre Texto e Discurso (PETEDI), disponíveis 
no Anexo K, as quais foram adaptadas, tendo em vista o nosso propósito nesta pesquisa.  
Avaliamos a participação dos alunos durante as leituras, interpretações, análises por 
meio dos questionários aplicados, da produção de textos, seguindo as convenções de diferentes 
gêneros como o roteiro e o curta-metragem, e da divulgação do curta-metragem ao final. 
                                                     
10 A entrevista semiestruturada está focalizada em um assunto sobre o qual confeccionamos um roteiro com 
perguntas principais, complementadas por outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista. 
Para o autor, esse tipo de entrevista pode fazer emergir informações de forma mais livre e as respostas não estão 
condicionadas a uma padronização de alternativas. (MANZINI ,1990/1991, p. 154). 
 
65 
 
Durante o desenvolvimento da proposta com os colaboradores, fomos organizando os 
materiais gerados para iniciarmos o relato da aplicação, a análise e a discussão dos dados.  
A análise se deu à luz dos pressupostos da ADC e de tudo sobre o que discorremos na 
revisão documental e na fundamentação teórica. Na análise, para que as identidades fossem 
resguardadas, utilizamos como códigos, letras e números, de A1 a A24, seguindo a ordem da 
chamada daqueles/as que são frequentes e/ou faltosos/as. 
A partir de várias leituras do material gerado e considerando nossas questões de pesquisa 
e objetivos, identificamos como produtivas as seguintes categorias de análise da ADC: 
intertextualidade, vocabulário, interdiscursividade e avaliação. Fizemos também uma reflexão 
sobre a análise e sobre a prática de pesquisa, na seção 3, em consonância com o arcabouço de 
Chouliaraki e Fairclough (1999).  
Para contemplar os objetivos da pesquisa, no decorrer da aplicação da proposta, 
organizamos e analisamos os dados, sustentados pelos aportes teóricos estudados. Analisamos 
e revisamos as seções que tratam das abordagens teóricas e metodológicas e organizamos o 
caderno suplementar (Disponível como material didático aos professores em caderno específico 
que acompanha esta Dissertação). 
A fim de facilitar a compreensão, elencamos a seguir os passos referentes à análise: 
1º passo: Seleção do corpus a ser analisado. 
2º passo: Identificação de categorias no corpus. 
3º passo: Análise e interpretação do corpus. 
Para o primeiro passo, reunimos todo o material gerado durante a aplicação da proposta, 
transcrevemos os áudios das gravações, preservando as identidades dos participantes, lemos as 
produções escritas e o diário de campo e, observando os objetivos da pesquisa, definimos o 
corpus. 
No segundo passo, definimos as categorias de análise mais evidentes no corpus: 
intertextualidade, vocabulário, interdiscursividade e avaliação. As marcas linguísticas 
observadas para a categoria intertextualidade foram as relações que os participantes 
estabeleceram entre os contos lidos a diversas outras “vozes” escritas ou orais. Evidenciamos 
o vocabulário como categoria importante, ao trabalharmos com a linguagem do conto, enquanto 
texto literário, inclusive a recorrência de uso de atributos nos contos e as outras linguagens 
utilizadas pelos participantes durante a aplicação da proposta. Na categoria interdiscursividade, 
escolhemos os trechos que evidenciam a maneira como os participantes interpretam os 
discursos presentes nos contos. A avaliação, também se sobressaiu como uma categoria de 
 
66 
 
análise, pois além das afirmações avaliativas (os juízos de valor) também apresentaram 
afirmações com verbos de processo mental afetivo (“eu gostei...”, “isso é errado”) em diversos 
materiais coletados.  
Em seguida, no terceiro passo, realizamos a análise e interpretação dos dados 
considerando as categorias mais frequentes e observando os aportes teóricos e metodológico. 
 
2.8.1 A triangulação na pesquisa  
 
A triangulação, segundo Cohen e Manion (1983, p. 254), consiste no “uso de dois ou 
mais métodos no estudo de algum aspecto do comportamento”. Essas possibilidades de 
combinação estão sendo utilizadas nas ciências sociais por entender que o ser humano se 
constitui de comportamentos complexos e, por isso, pode demandar mais de uma metodologia 
para serem explicados. Esses autores trazem os seguintes tipos de triangulação: de tempo, 
espacial, níveis combinados de triangulação, teórica, do investigador e metodológica. 
Dentre esses tipos, utilizamos a triangulação teórica e a metodológica. A abordagem 
teórica baseia-se em teorias alternativas ou concorrentes, em vez de utilizar apenas um ponto 
de vista e que, segundo Ottoni (2007, p. 99), trata-se do uso de uma diversificação “relevante 
para alcançar uma maior veracidade nos dados coletados e nas interpretações.” Kelle (2001) 
considera que o uso de uma triangulação metodológica pode alcançar um resultado do objeto 
em estudo mais completo do que quando usamos um único método e Morse (1994) acredita que 
“o pesquisador pode obter uma visão mais holística do cenário” (Morse,1994, p. 224). Logo, o 
uso de vários métodos funciona como um conjunto de forças que se somam para explicar uma 
mesma pesquisa. São combinações de perspectivas e de métodos de pesquisas levando em conta 
uma série de aspectos, que numa única abordagem, poderiam ficar de fora. 
A nossa pesquisa propõe uma triangulação teórica, envolvendo a ADC, estudos sobre 
gêneros discursivos e sobre alguns gêneros específicos (como os contos, os roteiros e os curtas-
metragens), o letramento crítico, a pedagogia dos multiletramentos; e faz uma triangulação 
teórica e metodológica, envolvendo a ADC e a proposta da sequência básica de Cosson e 
diferentes procedimentos de geração de dados, tais como: diário de campo, questionário, aulas 
gravadas em vídeo, textos produzidos pelos/as alunos/as.  
 
 
 
 
67 
 
2.8.2 O contexto de pesquisa: a escola participante 
 
A escola pública, onde desenvolvemos a pesquisa, encontra-se na periferia do Distrito 
Federal e atende alunos do Ensino Médio regular nos três turnos e EJA primeiro e segundo 
segmento no noturno. Ao todo, são cerca de 2000 alunos matriculados, distribuídos em 55 
turmas de sala de aula. Sobre o Gráfico de pessoal são 138 professores efetivos, 19 professores 
temporários,13 servidores do SAE, 6 cantineiras de empresa terceirizada, 6 agentes de limpeza 
de empresa terceirizada, 4 agentes de segurança de empresa terceirizada e 10 servidores 
readaptados. 
A escola, comparada à realidade de inúmeras outras, possui ótimas instalações: 1 
laboratório de informática (com 30 computadores), 1 cine clube, 1 sala de multimídias, 1 
Biblioteca escolar/comunitária, 20 salas de aula, 1 laboratório de Física, 1 laboratório de 
Química, 1 laboratório de Biologia, 1 sala de recurso, 1 sala de orientação, 2 salas de 
professores, 1 sala bem ampla de secretaria, 1 sala de mecanografia, 1 sala de administração, 1 
sala de coordenadores, 1 sala de direção, 1 sala de servidores, 1 cozinha, 1 cantina, 2 quadras 
de esportes ( 1 coberta e a outra não), 2 guaritas para os vigilantes, 1 horta (frutas e hortaliças) 
,1 lanchonete (recentemente fechada pela Secretaria de Educação),1 sala de rádio, amplo 
estacionamento e 1 bosque. E é também muito bem equipada com quadros brancos em todas as 
salas de aula, além de Datashow, sons e ventiladores. 3 bebedouros modernos nas áreas 
externas, câmeras instaladas em diversos locais, 6 computadores para os alunos (disponíveis na 
Biblioteca), 6 computadores para os professores (disponíveis em uma das salas de 
coordenação). Todos os banheiros da escola foram reformados, assim como a quadra de 
esportes e a boa iluminação tornou-se o destaque neste ano.  
A instituição recebe verbas que são bem aplicadas e satisfaz todas as demandas da 
comunidade escolar.  
Quanto aos recursos pedagógicos e demais materiais, não existe limitações para o 
trabalho pedagógico dos professores (como pincéis para Gráfico branco, tintas para pincéis, 
apagadores, cópias etc.). Todo esse aparato torna a escola em destaque tanto pela comunidade 
escolar quanto pelos profissionais lotados nela. Boa parte desses servidores atuam nela há mais 
de 20 anos. 
 
 
 
 
68 
 
2.8.3 Os participantes do estudo 
 
O público participante é do 8ª série da EJA. São 37 alunos matriculados. Entretanto, 
desses, 13 não compareceram à escola desde o início do ano letivo e não foram considerados 
em nenhuma fase da pesquisa. Dos 24 alunos restantes, 8 são faltosos, ou seja, possuem mais 
faltas do que presença nas aulas, mas, mesmo assim, participaram da pesquisa, nas fases em 
que estiveram presentes.  
Realizamos a pesquisa com os 24 alunos, sendo 15 mulheres e 9 homens, desses, 8 
menores de idade. Os participantes possuem idades bastante heterogêneas como pode ser 
verificado no quadro abaixo: 
 
QUADRO 4 – Idade dos/as participantes da pesquisa 
 
Fonte: Quadro criado pela pesquisadora.  
 
Dos/as 37 estudantes matriculados, 21 eram frequentes no semestre anterior e desses, 4 
não retornaram durante esse semestre por incompatibilidade com o horário de trabalho. Desse 
total, dos/as 24 participantes da pesquisa, das 15 mulheres, onze são mães e dentre elas, 3 são 
avós. Dentre os 9 homens, 4 são pais e entre esses, um é avô. 6 são estudantes da escola desde 
a EJA primeiro segmento. Os/as outros/as matricularam posteriormente no decorrer de alguma 
série do segundo segmento. 9 estudantes trabalham, sendo que dentre esses, 2 são autônomos 
(possuem comércio de vendas), 1 cozinheira, 3 são domésticas /diaristas, 1 lanterneiro, 1 
 
69 
 
auxiliar de pedreiro, 1 que presta atendimento ao público em uma empresa terceirizada do 
Detran/DF. 
Observamos pelo tempo de atuação na EJA (7 anos), que as prioridades dos/as 
estudantes são as demandas da família e do trabalho. Logo, caso surja algum problema em 
alguma dessas esferas, geralmente eles/as abandonam os estudos e podem retomá-lo 
posteriormente. Isso pode ser observado na turma participante, tendo 4 estudantes que não 
continuaram os estudos devido ao horário de trabalho, segundo alegam.  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
70 
 
3 RELATO E ANÁLISE DA APLICAÇÃO DA PROPOSTA 
 
 Esta seção constitui-se do relato, da análise e da avaliação da aplicação da proposta em 
uma turma da 8ª série da EJA do ensino fundamental da rede pública do Distrito Federal, 
durante as aulas de LP. Constitui-se, ainda, de uma reflexão sobre a proposta, sobre sua 
aplicação e sobre a pesquisa como um todo. O caderno suplementar encontra-se disponível 
como material didático aos/às professores/as em caderno específico que acompanha esta 
Dissertação. 
Utilizamos as seguintes categorias de análise da ADC: intertextualidade, vocabulário, 
interdiscursividade e avaliação conforme explicitadas nas subseções 2.5 e 2.8. 
 
3.1 Relato da aplicação da proposta, análise dos dados e discussão dos resultados 
 
Conforme exposto na seção anterior, nós prevíamos 43 (quarenta e três) aulas para a 
aplicação da proposta de intervenção. Entretanto, devido às demandas da proposta que foram 
surgindo como as discussões11 e a realização das atividades sugeridas que demoraram mais 
tempo que o planejado, além da alteração do calendário como saídas de campo, provas externas 
(Olimpíada de matemática e provas diagnósticas), festa junina e imprevistos tais como sinal de 
internet ruim, laboratório de informática indisponível, o tempo de aplicação ficou maior. E 
ainda, devido à falta de ônibus em horários após as 23 horas e o medo dos/as estudantes da 
violência fora dos muros da escola até que cheguem aos lares, todos/as eles/as saíam da escola 
às 22h 30min. Assim, as duas últimas aulas ficaram bem menores que o previsto. Como a turma 
participante possui os dois últimos horários uma vez na semana, isso também repercutiu para 
que a aplicação da proposta ficasse maior que o esperado. Dessa forma, foram necessárias 52 
aulas para a realização de toda a aplicação. 
As subseções seguintes foram organizadas em consonância com os blocos que 
compõem a proposta de intervenção.  
 
 
 
                                                     
11 As discussões que surgiram durante a aplicação da proposta são consideradas essenciais, pois a ADC propõe 
que os sujeitos reflitam sobre a relação entre a linguagem e a sociedade e esses momentos de reflexão foram 
constituídos de ditos, gestos e até mesmo silêncios. Assim, é natural que, dependendo da temática do conto, as 
aulas se estendam mais que o previsto.   
 
71 
 
3.1.1 Bloco 1: relato, análise e avaliação 
 
Na primeira aula da proposta, entregamos uma folha impressa resumida com 
informações sobre todos os blocos que compõem a proposta e sobre quantas aulas seriam 
necessárias para cada um deles. Revimos os objetivos e informamos aos /às estudantes que 
utilizaríamos codinomes para nos referirmos a eles/as, a fim de garantir o sigilo quanto à 
identidade de cada um/a. Conforme a chamada dos/as estudantes frequentes, utilizamos a letra 
A seguida do número do/a discente na chamada: de A1 a A24, dispostos. 
A seguir, aplicamos um questionário com o propósito de fazer uma sondagem sobre o 
que os alunos/as leem dentro e fora da escola, sobre seus gostos de leitura, sobre a percepção 
dos alunos/as de alguma relação entre o que leem e o que vivem, sobre o gosto pela leitura de 
textos literários, sobre as oportunidades que eles/as têm de falar e de escrever sobre eles/as 
mesmos. Utilizando duas aulas, aplicamos esse questionário para a sondagem inicial, entregue 
em uma folha ofício a cada estudante. Orientamos que se empenhassem em responder as 
questões com sinceridade e comprometimento. 
Como a turma é composta de estudantes mais velhos (que demoram mais tempo para 
realizar cada atividade) e outros muito jovens que tendem a realizar tarefas rapidamente, além 
de alguns/as trabalharem e chegarem à escola mais tarde, a aplicação do questionário foi feita 
no decorrer dos dois primeiros horários. Percebemos que essa diferença de entrada na sala de 
aula comprometeu em parte as respostas dadas pelos/as participantes, pois as orientações 
ocorreram no primeiro momento, mas também à medida que os/as participantes chegavam à 
sala de aula de maneira mais resumida para não atrapalhar aqueles/as que já respondiam.  
Posteriormente, em outra aula, com as respostas dos questionários, apresentamos aos/às 
estudantes os resultados da sondagem, por meio de gráficos, em Power Point, no Datashow da 
sala de aula, conforme Figura 4. Antes de dar início, explicamos quantos/as participantes 
responderam ao questionário, como o gráfico foi concebido e porque seria importante eles/as 
conhecerem esses resultados. 18 participantes responderam e entregaram os questionários e, a 
partir das respostas, elaboramos os gráficos para apresentar os resultados aos/às participantes 
da proposta.  
 
 
72 
 
FIGURA 4 – Apresentação dos resultados da sondagem 
  
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Nós apresentamos aos/às discentes os resultados referentes a cada pergunta contemplada 
no questionário, separadamente, mas, aqui, tecemos considerações sobre algumas questões 
separadamente e, sobre outras, em conjunto, para melhor articulação das informações e fluidez 
do texto.  
Com relação à primeira e à segunda perguntas: “O que você costuma ler durante a 
semana fora da escola?” e “O que você costuma ler durante a semana dentro da escola?”, o 
Quadro 5 a seguir representa os resultados: 
 
QUADRO 5 – Sondagem sobre as leituras dentro e fora da escola 
 
Fonte: Elaborado pela pesquisadora a partir dos resultados do questionário de sondagem. 
 
As respostas dadas pelos/as participantes no quadro 5 evidenciam que o que leem fora 
da escola, são leituras que eles/as concebem como necessárias/importantes no dia a dia e, por 
isso fazem sentido. Notamos que eles/as buscam essas leituras, numa atitude ativa. Para as 
leituras dentro da escola, os/as participantes listaram textos que chegam a eles/as como 
conteúdo, de certa forma, impostos pelos/as docentes, nesse caso, sentem-se passivos/as. E por 
isso, há um distanciamento de olhar sobre essas leituras. Ao percebermos que os/as 
 
73 
 
participantes listaram os livros e os romances como lidos fora da escola, mesmo tendo uma 
biblioteca com inúmeros livros à disposição da turma, inclusive com a presença de 2 
bibliotecários e funcionamento no turno noturno, pudemos falar sobre a importância de 
frequentá-la e a liberdade que é dada a eles/as de escolherem os livros e levarem para a casa. 
No gráfico apresentado na sala de aula, 27% dos participantes responderam não ler nada 
dentro e fora da escola. Ao serem perguntados sobre essa afirmação, os/as participantes não 
discorreram sobre. Talvez uma explicação possível para essa resposta seja que, esses/as 27% 
de discentes têm dificuldade de perceber que a leitura é parte do dia a dia da maioria das pessoas 
e que podem não ter clareza do que se concebe como leitura. Aproveitamos esse momento para 
mostrar que a leitura, embora se apoie na maioria das vezes na grafia das letras, também pode 
ser feita em gráficos, em símbolos, em desenhos etc.  
Outro motivo para essas respostas, pode estar ligado à maneira como as atividades são 
realizadas pelos/as estudantes/as da EJA no dia a dia. Em geral, os/as professores/as auxiliam 
os/as estudantes individualmente para que possam ler, escrever e interpretar, acompanhando-
os/as a cada passo dado. Diferente disso, para não alterar ou comprometer as respostas à 
sondagem, as questões foram apenas lidas pela professora pesquisadora para que respondessem 
e sem demais auxílios enquanto formulavam as respostas.  
Observamos, comparando os dois resultados, que devemos trabalhar na perspectiva do 
letramento literário, de acordo com as Orientações Curriculares Nacionais, OCEM, “como 
estado ou condição de quem não é apenas capaz de ler poesia ou drama, mas dele se apropria 
efetivamente por meio da experiência estética, fruindo-o.” (BRASIL, 2006, p. 55). Pinto (2014) 
nos revela que a leitura muitas vezes pode não ser prazerosa, mas conduzirá o leitor à fruição. 
Fenômeno que “advém da crise a que a obra é capaz de fazer abater sobre o leitor, de colocá-lo 
em choque com o seu universo até então conhecido, podendo daí o leitor derivar ou não prazer”. 
(PINTO, 2014, p. 78). 
 No tocante à terceira questão “Dessas leituras feitas dentro e fora da escola, do que 
você mais gosta?”, chamou-nos a atenção o fato de a maior parte dos/as participantes afirmar 
que gosta mais dos textos que lê na escola, conforme Gráfico 1: 
 
74 
 
GRÁFICO 1 – Das leituras feitas dentro e fora da escola, do que você mais gosta? 
Notícias
Política
Novelas
11% 11%
5% 6% Jogar
5% 5% Nada
5% 5% textos da escola
5% 5% Sobrenatural Legend.
5% Whatsapp
32% em branco
Bíblia
Fora da escola
Livros de literatura
 
Fonte: Dados da pesquisa. 
 
Como mostra o gráfico, 32% dos/as participantes da pesquisa revelaram que a leitura 
que eles/as mais gostam é de textos da escola, seguidos de 11% que disseram gostar de ler 
notícias e outros 11% que gostam de ler livros de literatura. Assim como as respostas do quadro 
5, os textos de escola parecem estar associados aos conteúdos e atividades desenvolvidas na 
escola. O fato de não serem especificados, reforça a ideia de que não sentem que o que leem 
dentro da escola, seja importante e que pode estar associado ao que vivem fora dela. Na ocasião, 
aproveitamos para perguntar o que estavam estudando em algumas disciplinas como História e 
Ciências e eles não se lembraram. Isso mostra que, precisamos, enquanto docentes, refletir e 
organizar estratégias de ensino e projetos para a EJA de forma que sintam a relevância desses 
aprendizados. 
 Percebemos também que entre esses/as participantes é bem comum a não especificação 
até mesmo quando se trata dos/as professores/as. Eles/as dizem “o professor de matemática”, 
“o professor de ciências”, sem o cuidado de aprender os nomes dos/as docentes. Ao elencarem 
o Whatsapp, como um suporte, por onde circulam diversos gêneros, não esclarecem quais 
gêneros são por eles/as mais usados. As únicas especificações foram da série “Sobrenatural”, 
em que o/a participante se declarou fã da série e a Bíblia. Consideramos que o trabalho com a 
proposta pedagógica possa ajudá-los a dar importância às especificações, pois isso ocorre 
quando existe algum tipo de vínculo afetivo.    
 Quanto à quarta questão “Você vê relação entre o que lê nos textos dentro da escola 
com aquilo que você vive?”, a maioria estabelece uma relação entre o que lê dentro da escola 
com o que vive. Vejamos os dados: 
 
 
 
75 
 
GRÁFICO 2 – Você vê relação entre o que lê nos textos dentro da escola com aquilo que você 
vive? 
Sim.
5%5%
11% Não.
58% Algumas vezes.
21%
Em branco
Nunca li dentro da escola
 
Fonte: Dados da pesquisa. 
 
Para essa pergunta obtivemos 58% dos/as participantes afirmando que o que se lê dentro 
da escola tem a ver com aquilo que vivemos e, como justificativa fizeram uma paráfrase da 
pergunta, ou não justificaram, respondendo apenas que sim. 11% dos participantes disseram 
“algumas vezes”, sem apresentar as justificativas. Dentre os 21% que disseram não, alguns não 
justificaram e outros consideraram que “histórias são histórias”, além de 5% afirmando que 
nunca leu dentro da escola e 5% em branco. Esse resultado é importante, uma vez que um dos 
nossos focos é o estabelecimento de relações entre o que é representado nos contos e o que os 
alunos vivem. Essa vivência dos/as estudantes está em consonância com os Multiletramentos, 
Cani e Coscarelli (2016) afirmam que “A pedagogia de multiletramentos propõe uma 
perspectiva de interpretação do mundo projetado por experiências transversais entre culturas, 
gêneros, estruturas sociais e econômicas.” (CANI; COSCARELLI, 2016, p. 23). Tais 
experiências, tendo o/a professor/a como mediador/a e provocador/a, tanto podem ser reveladas 
nos contos e nos demais gêneros que serão trabalhados, como no dizer e no não dizer dos/as 
participantes da pesquisa. 
Considerando nossa proposta de trabalho com contos, na 6ª questão, perguntamos aos/às 
participantes: “Você gosta de ler livros literários? Se sim, lembra-se de algum, cuja história 
tenha ficado marcada em sua memória?”. Dos/as 18 que responderam ao questionário, 10 
afirmaram que gostam de ler livros literários e 8 disseram que não gostam. Sobre alguma 
história que tenha ficado marcada na memória, os/as discentes elencaram: espiritismo, criação 
do mundo na bíblia, história de amor, livro da mulher de José Bento (livro da saúde da mulher 
escrito por um médico), os Miseráveis (de Victor Hugo), Dark Souls (Vídeo jogo do gênero 
RPG). 
 
76 
 
Para essa questão, observamos que 32% afirmaram não gostar de ler livros literários. De 
fato, dependendo da maneira como a literatura chega na sala de aula, cria-se uma antipatia pela 
leitura que não ficará apenas dentro da escola, mas também fora dela. Assim, é importante que 
as leituras sejam preparadas pelo/a professor/a proporcionando um ambiente agradável e 
atrativo aos/às estudantes. Além disso, devemos, enquanto docentes, buscar estratégias que 
levem os/as estudantes à estima e proximidade com o texto lido, além da fruição. 
Observamos que a maioria fez menção a histórias que não são parte de obras literárias, 
como espiritismo, criação do mundo, bíblia e livro da mulher de José Bento. Isso mostra que o 
conceito de literatura não está claro aos/às participantes. Para que pudessem melhor 
compreender o campo da literatura, além do desenvolvimento da proposta, levamos também 
para leitura, fábulas, crônicas e poemas (trabalhados em outras aulas e concomitantes à 
proposta) para que percebessem melhor o campo da ficção e dos plurissignificados que 
permeiam a literatura. Percebemos também pelas respostas, que a religiosidade está bem 
presente na vida dos/as participantes. 
Com a sexta questão “Você considera que a leitura de textos pode ajudá-lo na sua vida? 
Se sim, como?” e a questão “De que modo a leitura tem ajudado na sua vida?”, objetivamos 
saber se percebem a leitura de textos como forma de ajudá-los/as em algum aspecto da vida. 
Para a primeira pergunta todos/as afirmaram que a leitura pode ajudá-los/as na vida, variando 
apenas como isso pode ocorrer. Das 18 respostas dadas, 11 disseram que aprendem mais, 3 
apenas sim, 2 afirmaram que a leitura abre a mente, 1 respondeu que a leitura “ajuda na 
autoestima”, 1 que ajuda a expressar melhor e 1 a se comportar. Embora os/as participantes não 
expressem explicitamente, aqui eles/as assumem a leitura como uma prática social capaz de 
mudar a história de cada um/a em algum aspecto. Para o resultado da segunda pergunta, 4 
acreditam que a leitura tem ajudado para que possam aprender, 3 para falar e escrever melhor, 
2 no desenvolvimento, 2 conhecimento, 2 em todos os aspectos. Entretanto, 3 não acham que a 
leitura tenha ajudado na vida deles/as. Observamos que constroem uma representação da leitura 
como uma prática útil dentro e fora da escola, por meio da qual podem ser produzidas mudanças 
no modo como eles agem, interagem e representam o mundo. 
Com o propósito de sondar se os/as participantes falam de si mesmos aos outros e dessa 
forma revelam suas crenças, hábitos, personalidades, culturas, linguagem, incluímos no 
questionário as questões 7 e 8, que são, respectivamente: “Você tem o hábito de falar de si 
mesmo fora da escola? Se sim, o que isso significa para você?”; “Você tem o hábito de falar 
 
77 
 
sobre si mesmo na escola? Se sim, o que isso significa para você?”. Nos Gráficos 3 e 4 a seguir 
apresentamos o resultado desta parte da sondagem: 
 
GRÁFICO 3 – Você tem o costume de falar GRÁFICO 4 – Você tem o costume de falar 
de si mesmo dentro da escola? de si mesmo fora da escola? 
11% 17%
6%
39%
44%
39%
44%
Sim. Não. Em branco. Às vezes . Sim. Não. Às vezes.
  
Fonte: Dados da pesquisa. 
 
Comparando os dois gráficos, se somarmos o sim e o às vezes, teremos 50% que falam 
sobre si dentro da escola e 61% fora da escola, podemos, por esse resultado, perceber que os/as 
participantes consideram o ambiente escolar menos favorável para os diálogos que os outros 
ambientes fora da escola. Falar de si dentro e fora da escola deve ser uma prática saudável, pois 
cada vez mais as pessoas isolam-se entretidas com as redes sociais ou com a própria rotina e 
acabam sentindo-se solitárias. Não somente o hábito de falar, mas também da escuta tornou-se 
um problema social. Percebemos que as pessoas estão na maioria das vezes apressadas, 
atarefadas por viverem numa sociedade capitalista. Essas são algumas marcas do que Giddens 
(1991) chama de Modernidade Tardia ou “Crise da modernidade” que teve início após o 
Iluminismo e consolidou-se com as Revoluções Industriais. Uma das consequências desse 
evento é a exclusão, o desemprego, a solidão. Logo, é preciso investir em práticas sociais como 
a escuta para que estas possam se tornar comuns no nosso dia a dia. Percebemos que, mesmo 
alguns não falando de si, sabem que isso é importante para o seu desenvolvimento social. 
Sobre o que significa falar de si mesmo dentro e fora da escola, os que responderam sim 
representam positivamente essa prática e apontaram a importância disso para que o/a outro/a 
 
78 
 
possa conhecê-los/as melhor, para que se sintam melhor, para que possam desabafar e 
compartilhar seus sentimentos, como podemos ver nos excertos a seguir: 
 
(1) “É muito bom depois de um dia corrido” (resposta ao questionário de 
sondagem, A2, 02 de abril de 2019). 
(2) “Para que meus colegas me conheçam melhor” (resposta ao questionário de 
sondagem, A8, 02 de abril de 2019). 
(3) “Significa compartilhar a minha felicidade” (resposta ao questionário de 
sondagem, A23, 02 de abril de 2019). 
(4)  “Significa família” (Resposta ao questionário de sondagem, A9, 02 de abril 
de 2019).  
(5) “Me sinto leve, pois é um desabafo” (resposta ao questionário de sondagem, 
A13, 02 de abril de 2019). 
(6) “As pessoas ficam sabendo mais sobre a minha história” (resposta ao 
questionário de sondagem, A15, 02 de abril de 2019).  
 
Os que responderam “não” apresentaram as seguintes justificativas para não falarem 
de si dentro da escola, como o aluno A16: “Não dá tempo”, avaliaram que “Seria muito bom” 
(aluno A20) se falassem e disseram “Dialogo comigo mesmo” (aluno A4).  
Chamou-nos a atenção a resposta do aluno A14 que fala sobre si às vezes. Segundo 
ele, “As pessoas querem que aconteça o pior”. Percebe-se uma representação do/a outro/a como 
alguém que não quer ver o bem das pessoas com quem convive; tem-se uma representação 
pessimista do/a outro/a. 
Esse resultado também nos revela que seria preciso propiciar aos/às participantes da 
pesquisa momentos dentro da escola para falarem de si e escreverem sobre si. Na proposta 
desenvolvida, as diversas culturas e crenças dos/as participantes são respeitadas e valorizadas, 
há um incentivo ao protagonismo dos/as estudantes e a percepção de que as histórias tratadas, 
embora ficcionais, são histórias possíveis de acontecer e que algumas passagens lidas podem 
ter sido vividas por alguns deles/as; e há uma abertura para falarem e escreverem sobre si 
mesmos/as.  Seriam socializadas por eles/as mesmos/as, assim como a linguagem por meio da 
leitura dos contos poderá dar oportunidade para que se expressem oralmente. 
 Tendo em vista um de nossos propósitos com a elaboração e aplicação da proposta 
interventiva, sobre os hábitos de escrever sobre si mesmos, incluímos no questionário a questão 
9: “Você tem o hábito de escrever sobre a sua vida? Se sim, onde escreve? Conforme o Gráfico 
5, somente 22% dos participantes têm esse hábito. Esse resultado evidencia que os/as 
participantes não encontram na escrita o sentido que este tipo de hábito pode trazer a quem o 
pratica. Ter um diário ou bloco de anotações em aplicativos de celulares e que podem ser 
 
79 
 
escritos diariamente ou semanalmente podem ser aliados eficientes para os/as estudantes da 
EJA, pois constituem-se de escritas espontâneas e privadas, uma oportunidade para desabafos 
que muitas vezes não são expressados oralmente. Devemos estimular os/s estudantes a fazer 
este tipo de registro, pois ajuda na compreensão dos próprios comportamentos e além disso, 
ajuda a escrever melhor. 
 
GRÁFICO 5 – Você tem o hábito de escrever sobre a sua vida? 
22%
Não
78% Sim
 
Fonte: Dados da pesquisa. 
 
Os 22% que afirmaram terem o hábito de escrever sobre suas vidas disseram que 
escrevem “Em algumas redações de Português”, “nas notas do celular”, “no meu diário”. 
Durante a discussão desses resultados relembramos que duas produções textuais haviam sido 
feitas dentro da sala de aula cujo gênero era relato pessoal. A primeira produção era sobre as 
lembranças boas e ruins que os/as participantes tiveram na escola e a segunda produção era 
sobre as maiores alegrias e decepções que os/as participantes tiveram na vida. Lembramos que 
as produções haviam sido lidas e a primeira delas iria ser digitada e formaria um livro a ser 
lançado na biblioteca no final do semestre letivo. Quando os/as participantes se lembraram 
dessas produções, perceberam que não tinham entendido ou lido direito a pergunta e que, por 
isso, a maioria havia respondido não.  
Esse resultado também revela o quanto precisamos estimular os alunos a escreverem 
sobre si mesmos, a estabelecerem relações entre o lido e o vivido e tornar a escrita uma prática 
natural em meio aos/às estudantes, pois os alunos da EJA são “Protagonistas de histórias reais 
e ricos em experiências vividas, os alunos jovens e adultos configuram tipos humanos diversos. 
Homens e mulheres que chegam à escola com crenças e valores já constituídos” (BRASIL, 
2006, p. 4). Ao darmos a oportunidade de trazerem à tona essas experiências, quer seja por 
escrito ou oralmente, daremos sentido ao que aprendem na escola.  
 
80 
 
Dando continuidade à sondagem sobre leitura e escrita, questionamos: “Você considera 
que quem lê mais possui maior capacidade de se expressar verbalmente?”. 17 disseram que sim 
e 1 disse que não. Mais uma vez, fica evidente que os/as participantes acreditam que a leitura 
pode transformar as suas vidas, pois 90% responderam que quem lê mais expressa-se melhor. 
Os /As estudantes da EJA retornam ao espaço escolar, na maioria das vezes, por terem vivido 
experiências de exclusão pela dificuldade em ler e escrever. Além disso, sentem dificuldade 
para conseguir empregos, pois o nível de escolaridade é uma exigência do mercado de trabalho 
e percebem que, dentro e fora da escola, quem lê apresenta melhor desenvoltura e habilidade 
para expressar-se. Logo, especialmente os/as docentes de Língua Portuguesa devem não só 
estimulá-los/as a ler e a escrever, mas também planejar e executar propostas pedagógicas que 
levem os/as estudantes a praticar dentro da sala de aula o ato de ler, de interpretar, de analisar, 
de escrever, de pensar, de refletir, de argumentar, de defender pontos de vistas.  
Com a 11ª pergunta “Para você o que é uma leitura proveitosa?”, objetivamos sondar 
qual o tipo de leitura que gostariam/gostam de ter acesso ou para qual propósito. Os dados 
revelam que os participantes representam uma leitura proveitosa como aquela que lhe permite 
construir conhecimentos úteis dentro e fora da escola, aquela associada à compreensão, a 
aprendizado, e ao detalhamento, como nos excertos a seguir: 
 
(7) É aquela leitura que me passa alguma coisa boa”, (resposta ao questionário 
de sondagem, A18, 02 de abril de 2019). 
(8) “É aquela que lê e aprende”, (resposta ao questionário de sondagem, A2, 02 
de abril de 2019). 
(9) “Quando consegue entender o texto”, (resposta ao questionário de 
sondagem, A9, 02 de abril de 2019). 
(10) “É fonte de conhecimento”, resposta ao questionário de sondagem, A7, 02 
de abril de 2019). 
(11) “Quando é bem detalhada”, (resposta ao questionário de sondagem, A22, 02 
de abril de 2019). 
(12) “É ler e levar para a vida”, (resposta ao questionário de sondagem, A2, 02 
de abril de 2019). 
 
Há também os alunos que avaliam uma leitura proveitosa como “Leitura interessante”, 
“Bom” e há um, o aluno A14, que associou a leitura proveitosa à “Leitura memorizada”. Os/As 
estudantes da EJA almejam mudar de vida a partir dos estudos e, por isso, desejam leituras que 
os/as ajudem a realizar este sonho. Muitos/as relatam aos/às professores/as da EJA que 
perderam tempo demais fora da escola ou dentro dela reprovando. Assim, anseiam por leituras 
que possibilitem aprendizagem aliadas ao conhecimento como as que constam nos livros 
 
81 
 
didáticos ou anotações dos conteúdos na lousa feitas pelos/as professores/as. Além disso, estão 
também acostumados/as com a leitura de trechos de textos literários, lidos nas salas de aula 
para o desenvolvimento de atividades gramaticais. Ademais, as leituras de textos que ocorrem 
na escola se apresentam como leituras prontas e acabadas, concebidas como indiscutíveis, sem 
espaço para reflexões e análises, e, por isso, distantes do/a leitor/a. Logo, tornar a leitura literária 
proveitosa é um desafio: como aproximar os contos dos leitores para que sintam que essas 
leituras se tornem prazerosas, significativas e inacabadas?  
Dando segmento à sondagem, realizamos a seguinte pergunta “De que modo a leitura 
tem ajudado na sua vida?”. Nosso objetivo foi ver se os/as participantes conseguem perceber 
melhorias na vida deles/as a partir das leituras. Os dados apontam que boa parte dos/as 
participantes conseguem identificar quais os benefícios que a leitura pode proporcionar ao 
indivíduo conforme os excertos abaixo:   
 
(13) “Em todos os aspectos” (resposta ao questionário de sondagem, A20, 02 de 
abril de 2019). 
(14) “No meu desenvolvimento” (resposta ao questionário de sondagem, A13, 02 
de abril de 2019). 
(15) “Conhecimento, falar melhor, melhorar a escrita” (resposta ao questionário 
de sondagem, A8, 02 de abril de 2019). 
(16) “Falar e escrever melhor” (resposta ao questionário de sondagem, A19, 02 
de abril de 2019). 
(17) “Aprender” (resposta ao questionário de sondagem, A5, 02 de abril de 2019). 
(18)  “Melhorar no serviço” (resposta ao questionário de sondagem, A23, 02 de 
abril de 2019). 
(19) “Me faz esquecer os problemas” (resposta ao questionário de sondagem, A7, 
02 de abril de 2019). 
(20) “Perder a vergonha” (resposta ao questionário de sondagem, A9, 02 de abril 
de 2019). 
 
As respostas “De nenhuma forma”, dada pelo/a aluno/a A10, “Nada”, do/a aluno/a A22 
e “Nenhum” do/a aluno/a A2, mostram que eles/as não conseguem perceber que a leitura pode 
proporcionar inúmeros benefícios como o desenvolvimento intelectual e social. 
Com o intuito de sondar o conhecimento que os/s participantes têm sobre o gênero conto 
perguntamos: Você sabe o que é um conto? Já leu algum? Como resposta, 8 disseram que sim 
e 6 especificaram: “De mágica”, “Conto de escola”, “Leitura com espaço limitado a um 
ambiente”; “É um texto curto, com poucos personagens. Sim.”, “Eu já li.” “Substantivo 
masculino, leitura narrativa breve, concisa.”, 5 disseram que não sabem e 5 deixaram em 
branco. Discutindo sobre esses resultados, lembramos aos/às participantes a leitura do “Conto 
 
82 
 
de escola” de Machado de Assis, no início do semestre letivo. Pareceu-nos que essa leitura não 
foi internalizada pelos/as estudantes, pois apenas um/a participante lembrou de citá-la. 
Acreditamos que a leitura dos 5 contos da proposta, que possuem histórias variadas, poderá 
elucidar melhor o que é um conto e ajudar na construção de sentidos. 
Com o objetivo de verificar se os/as participantes conhecem o gênero roteiro que será 
trabalhado durante a proposta, realizamos a seguinte pergunta “Você já leu algum roteiro?”.  6 
disseram que sim, mas não especificaram que tipo de roteiro, 6 disseram que não, 1 “não sei” e 
5 deixaram em branco. Esse gênero é bastante incomum no espaço escolar e, por isso, a sua 
produção será um dos desafios da proposta. A proposta de produção desse gênero está em 
consonância com as habilidades a serem desenvolvidas do 6º ao 9º ano, conforme a BNCC: 
 
(EF69LP37) Produzir roteiros para elaboração de vídeos de diferentes tipos (vlog 
científico, vídeo-minuto, programa de rádio, podcasts) para divulgação de 
conhecimentos científicos e resultados de pesquisa, tendo em vista seu contexto de 
produção, os elementos e a construção composicional dos roteiros. (BRASIL, 2017, 
p. 151). 
 
Relacionada com a questão anterior e com o propósito de sondar se alguns/mas 
participantes já haviam produzido o gênero roteiro, perguntamos: “Você já produziu roteiro 
para filme, documentário ou curta-metragem?” 16 participantes afirmaram não terem produzido 
roteiro, 2 deixaram em branco. Acreditamos, pelo tempo de docência nesta modalidade de 
ensino, 10 anos, que não seja comum na EJA produzir roteiros. Pela sondagem, todos/as os/as 
participantes desconhecem como esse gênero se constitui. E não somente eles/as, mas também 
a professora pesquisadora, que teve que estudar para compreender os elementos constitutivos 
do gênero, por não ser comum a sua produção e veiculação nas escolas. Esse gênero surgiu de 
uma necessidade: como os contos lidos poderiam ser recontextualizados para que 
produzíssemos curtas-metragens? Precisaríamos de um guia para ser seguido com todos os 
detalhes, falas, progressões, o roteiro para um curta-metragem. Durante os estudos, percebemos 
que existem vários tipos que poderiam servir de modelo para essa proposta.  
Para sondar se os/as participantes apreciam o gênero curta-metragem, perguntamos 
“Você gosta de curta-metragem?” .13 afirmaram que sim, 3 disseram que não,1 em branco e 1 
“depende do assunto”. Assim como os roteiros, os curtas-metragens, tratados como gêneros, 
não parecem fazer parte do universo dos/as participantes da pesquisa como curta-metragem, 
mas apenas como filmes e, por isso, podem ter deixado em branco ou ainda afirmado que não. 
Acreditamos que a produção de um filme com menos de meia hora, utilizando diversos recursos 
 
83 
 
tecnológicos, deverá suscitar a curiosidade e o envolvimento de toda a turma participante, além 
de possibilitar o protagonismo desses/as participantes e o desenvolvimento de práticas de 
Multiletramentos, uma vez que implica o uso de uma diversidade de linguagens e recursos 
multissemióticos/multimodais e envolve o uso de tecnologias e mídias. Provavelmente, essa 
será a parte da proposta que irá exigir mais da nossa mediação e incentivo, pois os/as 
participantes deverão utilizar diversas dependências da escola para produção do curta-
metragem, os computadores da escola, a filmadora; deverão organizar os ambientes, as trocas 
de roupas, tudo isso envolve uma mudança de papel dos/as participantes: de passivos a ativos. 
Enfim, em relação a essa parte de apresentação e discussão dos resultados da sondagem, 
estimulamos os/as participantes a comentarem sobre os resultados e lemos cada item de cada 
slide para que pudessem ter um olhar analítico sobre os gráficos ao interpretá-los. Os gráficos 
foram organizados em forma de gráfico de barras12 para que compreendessem melhor os 
resultados. Diante de cada slide, puderam refletir sobre as respostas da turma e as deles/as 
mesmos.  
Entretanto, embora fossem incentivados/as a dizer oralmente o que acharam dos 
resultados de cada questão, preferiram ficar calados/as a dizer algo. Isso pode ser explicado 
pelas características das turmas de EJA que não gostam de se expor oralmente, principalmente 
quando estão diante de algo novo. Isso não quer dizer que não estivessem refletindo sobre o 
que estava sendo apresentado. Bakhtin (2015) afirma que há sempre uma atitude responsiva 
ativa dos sujeitos envolvidos na situação de interação. Assim, pela maneira como observavam 
e acompanhavam a leitura dos gráficos, percebemos que estavam interessados/as nos resultados 
dos questionários. 
Segundo Fairclough (2012), os momentos das práticas sociais são: atividade produtiva, 
meios de produção, relações sociais, identidades sociais, valores culturais, consciência e 
semiose que estão relacionados dialeticamente e articulados entre si. Portanto, acreditamos que 
essa apresentação dos resultados e discussão constituiu um evento de (multi)letramento, o qual 
está vinculado à prática social do ensino e aprendizagem de LP. Como tal, envolveu a 
articulação: de uma atividade material; das relações sociais estabelecidas entre professora e 
alunos, entre os alunos; das crenças, dos valores e dos desejos dos participantes em relação à 
proposta, às questões da sondagem, ao ensino de LP; das crenças, valores e desejos da 
                                                     
12 Optamos pelo gráfico de barras para ser apresentado aos participantes da pesquisa porque boa parte deles não 
compreendem o assunto porcentagem. Entretanto, para o registro da pesquisa, convertemos os mesmos gráficos 
em pizza e porcentagens. 
 
84 
 
pesquisadora; e da instituição escola. Tudo isso contribuiu para a construção de diferentes 
sentidos e de representações dos alunos, da leitura pelos alunos etc.  
Nesse evento de (multi)letramento, foram levadas em conta a multiplicidade semiótica, 
uma vez que, por meio da apresentação dos dados, exploramos a linguagem verbal e a não 
verbal, e a multiplicidade cultural representada na turma participante, constituída por um grupo 
bastante heterogêneo em termos de idade e de experiência de vida. 
 
3.1.2 Aplicação do Bloco 2 
 
Para a etapa de motivação (COSSON, 2012) e para o alcance dos objetivos do Bloco 2, 
a saber: aproximar os/as estudantes do gênero conto que será trabalhado; possibilitar uma leitura 
sensível do conto; estimular o gosto pelas histórias lidas ou ouvidas, prevíamos três aulas, 
entretanto, foram necessárias 4 aulas.  
Neste bloco, desenvolvemos uma dinâmica para motivar a leitura do conto “A 
cartomante” de Machado de Assis (ANEXO D). Antes do início da aula, cerca de 15 minutos, 
disponibilizamos as mesas dos/as participantes em U e, ao centro, ocupando duas mesas, cartas, 
pedras coloridas e um globo iluminado com uma lanterna dentro. Além disso, colocamos a tocar 
uma música ambiente e as luzes foram apagadas para que os/as participantes vivenciassem 
sensações de um ambiente misterioso e, ao mesmo tempo, curioso. A Figura 5 a seguir ilustra 
essa preparação: 
 
FIGURA 5 – Dinâmica para motivar a leitura do conto “A cartomante” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
85 
 
Os/ as participantes pareciam muito curiosos e, ainda no escuro, perguntamos-lhes o 
que acharam daquele ambiente quando chegaram. Seguem algumas respostas: 
 
(21) A2: ah... professora... achei muito massa... sei lá... 
                  A20: achei esse escuro uma coisa diferente... né? A gente fica assim      meio 
espantado e meio perdido no tempo... de qualquer forma é bom...  
(Trecho da gravação das aulas do dia 03 de abril de 2019). 
 
Esses excertos mostram que a motivação é de fato importante no ambiente escolar e 
que, às vezes, basta dispor a sala de uma maneira diferente ou levar algum material que não 
pertence ao universo escolar para despertar a curiosidade e o desejo pela aula planejada daquele 
dia. Os atributos usados para avaliar o ambiente “muito massa”, “uma coisa diferente, “bom” 
mostram que ficaram surpresos com o que encontraram e que gostaram disso. Ao explicitar o 
efeito que isso lhes causou “A gente fica assim meio espantado e meio perdido no tempo”. O 
aluno A20 revela que os/as participantes já internalizaram uma representação padronizada e 
estereotipada do evento de letramento aulas de LP e que a atividade proposta rompe com essa 
representação. 
Sobre a motivação, Mendonça (2015, p. 5) afirma que “a motivação pode ser vista como 
uma força, uma pulsão, um impulso, uma necessidade ou uma predisposição que permite ao 
indivíduo empreender uma determinada ação com um objetivo concreto.”. Dentro desse 
contexto, acreditamos que a motivação serve tanto para que os/as participantes sintam que 
haverá algo interessante a partir daquela atividade, quanto serve para o/a professor/a que, ao 
planejar as aulas com algo que desperte seus/as educandos/as, encontra-se motivado/a para o 
alcance dos seus objetivos. Provavelmente ao se depararem com o ambiente daquela forma, já 
começaram a pensar que tipo de leitura poderia vir a ser: as pistas dispostas estavam no centro 
da sala. Isso mostra que a construção de sentidos pode começar bem antes da leitura de um 
texto literário e, que, ao incluirmos estratégias para motivá-los/as, o interesse pelo texto poderá 
ser maior.  
Dando continuidade à aula motivacional, ligamos as luzes e pedimos que observassem 
os materiais que estavam no centro da mesa e lhes dissemos que, quando quisessem, poderiam 
retornar aos lugares. Perguntamos o que aqueles objetos lembravam: 
 
(22) A2: tarô... 
A1: macumba... 
 
86 
 
                  A12: parece de gente que lê cartas, né professora?... aquelas pedras ali... têm 
a ver com aquele lugar perto de Sobradinho que acredita no poder das 
pedras... né professora?  
(Trecho da gravação da aula do dia 03 de abril de 2019). 
 
Esses excertos demonstram que os/as participantes da pesquisa já começaram a associar 
a proposta ao que eles/as conheciam ou já tinham ouvido falar do dia a dia da sociedade, 
inclusive das crenças locais como citado pelo/a participante A12 sobre a comunidade Vale do 
Amanhecer13. De acordo com os estudos do Letramento Crítico, os professores que trabalham 
por essa perspectiva devem estimular os/as participantes a falar sobre o que sabem e/ou se 
sentirem em iguais condições para construir relações de sentido. Rojo (2013, p. 39) afirma que 
“para propor uma pedagogia dos multiletramentos que dê conta das diversidades culturais e 
semióticas, é preciso compreender as maneiras como elas se manifestam e funcionam em nossa 
sociedade.” Algumas dessas diversidades culturais foram relatadas pelos/s participantes, 
inclusive uma delas, faz parte da crença local citada pelo/a participante A12, assim como os 
recursos semióticos acionados mentalmente pelos/as participantes quando viram os objetos 
dispostos na mesa, como a carta, que para A2 lembrava tarô. A luz dentro do pote bem como 
os lenços preto e vermelho foram associados à macumba por A1 e as pedras coloridas ao 
misticismo do Vale do Amanhecer, por A12. Essa capacidade de interpretar, de fazer conexões 
e estabelecer relações com o uso de objetos dispostos na mesa e o conhecimento de mundo é 
esperada tanto na pedagogia dos multiletramentos, como na perspectiva do Letramento Crítico. 
Nessa atividade, pela mediação e provocação da professora, os/as participantes por meio da 
linguagem oral conseguiram perceber que a aula teria algo a ver com a temática do conto que 
ainda não tinha sido apresentada. 
Durante essa aula, os/as estudantes foram chegando aos poucos e chovia bastante na 
ocasião. Cerca de 10 minutos após o início, a proposta teve que ser adaptada ao que ocorreu a 
seguir: a turma da 7ª série foi encaminhada à sala dos/as participantes da pesquisa, para subida 
de horário, pois os professores dos próximos horários haviam faltado, ficando muito cheia a 
sala. Pouco depois, um grupo de 5 policiais chegou até a sala, numa ação surpresa e preventiva 
para fazer vistoria nos materiais e nos/as estudantes. Essa ação durou cerca de 20 minutos e, 
durante a abordagem, os policiais encontraram uma faca de açougueiro em uma das mochilas 
dos /as estudantes, ficando a partir daí, o ambiente constrangedor e silencioso. 
                                                     
13 Segundo o Google, a Comunidade religiosa Vale do Amanhecer está localizada na cidade de Planaltina e conta 
com cerca de 10 mil moradores. Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Tia_Neiva . Acesso em: 19 de 
outubro de 2019. 
 
87 
 
Segundo o gestor da direção do Noturno, a direção havia solicitado há bastante tempo 
essa ação da polícia, para coibir a venda de drogas pelos arredores da escola feita pelos/as 
estudantes do Noturno. Como a escola possui câmeras dentro e fora da escola, o grupo militar 
e a direção já sabiam que dentre os/as estudantes da EJA havia traficantes, por isso, a ação 
militar foi realizada na sala e, não poderia acontecer em outro dia ou horário, pois segundo o 
Gestor, essa ação iria ocorrer em outra escola próxima. 
  Pensamos em adiar a dinâmica de motivação, entretanto, como já a havíamos iniciado, 
ponderamos que o adiamento poderia afetar mais ainda aquele passo tão importante da 
proposta. 
Dando prosseguimento à proposta, com perguntas ainda sobre os objetos do centro, 
um/a dos/as participantes da pesquisa deu o seguinte depoimento: 
 
(23) A18: tinha uma senhora vizinha quando eu tinha uns doze ou treze anos que 
ela tinha Parkinson e não andava já há muitos anos e... à noite... fui brincar 
na sala dela com outras crianças e de frente à casa dela tinha umas plantas e 
aí eu resolvi ir embora pra casa... por volta de umas dez da noite e eu olhei 
pro rumo da casa dela de novo e vi ela de pé... toda de branco... tirando uma 
flor daquelas plantas e a lua estava bem clarinha e deu pra ver ela direitinho... 
na época ainda não tinha energia... eu vi ela e eu pisquei assim pra ver se eu 
não estava louca e não... .eu vi ela... tirando uma rosa vermelha... aí no outro 
ano ela faleceu... mas ela nunca tinha andado mais... eu tive essa revelação 
e eu nunca esqueci disso... porque quando eu saí de lá ela estava deitada e 
dormindo... e eu vi ela de pé tirando uma rosa... isso marcou a minha vida... 
eu mostrei pra minha mãe...  
(Trecho da gravação da aula do dia 03 de abril de 2019). 
 
Essas vivências, relatadas durante as práticas de leituras, acionam os conhecimentos 
prévios que eles/as possuem e estabelecem uma relação com o que será lido. São hipóteses, 
bem-vindas e esperadas, que eles/as levantam e que poderão ser confirmadas ou não durante a 
leitura. O/A participante A18 esteve fora da escola, segundo ele/a por quase 20 anos e, ao 
contrário dos/as demais participantes, é bem falante e participativo/a. Os/As demais 
participantes ainda se posicionam de maneira bem tímida e reservada, preferindo o silêncio ou 
apenas acenos com a cabeça como respostas afirmativas ou negativas.  
 Por esse depoimento, ficou evidente que os elementos dispostos na sala puderam 
motivá-los a pensar no tema do conto que envolvia mistério. Após esse depoimento, demos 
ainda tempo para outros dizeres e, diante do silêncio dos/as estudantes, entregamos-lhes uma 
cópia impressa do conto “A cartomante”. Devido à junção de uma turma de 7ª série à turma 
 
88 
 
participante, como relatamos, alguns ficaram sem a cópia impressa, pois havia mais de 50 
estudantes e apenas 45 cópias. Assim, 3 estudantes leram em duplas. 
Como a chuva estava bastante forte, a leitura oral do conto foi realizada pela professora 
pesquisadora, pois os/as participantes leem baixo e com o som da chuva não conseguiriam ser 
ouvidos dentro da sala. Em seguida, os/as estudantes puderam expressar o que acharam do 
conto e recontá-lo oralmente. Pudemos perceber que boa parte dos/as participantes 
aproveitaram para opinar entre eles/as sobre o conto e poucos resolveram compartilhar 
oralmente com as turmas que estavam presentes. Por isso, fomos fazendo as perguntas nas quais 
respondiam coletivamente, como: Quem escreveu o conto? Como começa a história? Qual era 
o nome da moça que foi à cartomante? Por que ela foi à cartomante? Pelo que o Camilo disse 
sobre a Rita ter ido à cartomante, ele acreditava em previsões? Segue a transcrição de alguns 
trechos: 
 
(24) A1: eu achei que era história de amor... deu ruim... 
                  A17: é a história de uma mulher que traía o marido e morreu ela e o 
amante... com tiro... 
A8: e tem a cartomante... então a cartomante mentiu! 
                  A18: começa com a Rita que fica com medo do marido saber de tudo...    
que ela tinha um caso com o amigo dele...e morre todo mundo... só fica 
ele... será que depois tem continuidade... professora? 
A12: pior é que era tudo amigo... né professora! 
(Trecho da gravação da aula do dia 03 de abril de 2019). 
 
Percebemos, por esses recortes, que os/as participantes adotaram discursos sobre a 
história condizentes com os valores morais instituídos na sociedade, como o participante A12 
que relembra que os personagens eram amigos iniciando com o atributo “Pior é que”. O/A 
participante também conclui que a “cartomante mentiu” e traz a ideia de que ela, como 
cartomante, não deveria mentir. Assim, a história traz para esse/a participante um choque 
cultural: há uma crença de que no campo da vidência não se deve mentir. No discurso de A17 
a mulher é culpabilizada pela tragédia, uma vez que afirma ser a “história de uma mulher que 
traía o marido”.  Cabe lembrar, que Fairclough (2001) aponta que certos discursos já estão 
cristalizados e naturalizados no meio social. Para Candido (2011, p. 175) “Os valores que a 
sociedade preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes nas diversas 
manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática”, por isso os textos, como uma forma 
de concretização do discurso, servem para refletirmos sobre esses valores. 
 
89 
 
Outro trecho que chama a atenção é quando o/a participante A1 diz que achava ser uma 
história de amor. Ou seja, histórias que terminem com finais felizes, após resolvido o conflito. 
Por muito tempo apenas as histórias que tinham finais felizes eram consideradas boas para 
serem lidas e contadas. Muitas viravam novelas. Embora histórias com finais felizes tenham o 
seu espaço, outros tipos de enredos ganharam importância e valor literário, especialmente por 
suscitarem reflexões e análises importantes para que repensemos sobre as representações, os 
discursos e as relações de poder.  
A seguir, relembramos oralmente sobre a vida do escritor Machado de Assis (já 
conhecido pelos/as turmas, pois haviam lido o conto “Conto de escola” no início do ano letivo). 
Perguntamos se algum/a participante conseguia ver relação da própria vida com a vida do autor. 
Apenas um dos/as participantes disse “Era preto, ué!” (Pelo trecho da filmagem não é possível 
distinguir qual dos/as participantes disse isso). Esse dizer mostra que se identificam com o 
escritor pela cor. Aproveitamos para considerar que, provavelmente por ser negro, Machado de 
Assis tenha sofrido muitos preconceitos. Relembramos que o escritor também frequentou a 
escola por pouco tempo e que teve que começar a trabalhar muito cedo.  
Sobre as características do gênero conto, perguntamos por que aquela história era 
chamada de conto: “Quais as características possuem essa história que a consideramos como 
um conto?” Como não responderam, resolvemos explicar brevemente sobre as características 
do gênero. 
Posteriormente, receberam uma folha em branco para escreverem o trecho do conto que 
mais lhes chamou a atenção. Alguns/as participantes pediram o dicionário, pois o conto tinha 
palavras que eles/as desconheciam. A aula terminou antes de finalizar a tarefa, ficando o 
restante da proposta para o outro dia.  
Avaliamos que o pedido de um dicionário por vários/as participantes foi positivo, uma 
vez que identificaram que o conto continha palavras que não faziam parte do repertório 
vocabular deles/as. Embora não tenha dado tempo de buscar o material solicitado, orientamos 
os/as estudantes a irem à biblioteca para consultarem as palavras cujo significado era 
desconhecido e levarem por escrito para a próxima aula. 
Na aula seguinte, perguntamos se tinham buscado os significados dos termos que não 
sabiam na biblioteca ou em casa e nenhum dos/as presentes afirmou ter consultado um 
dicionário. A seguir, para que relembrassem a história e para que os/as estudantes que não 
estavam presentes no dia da leitura do conto “A cartomante” pudessem se situar e realizar as 
próximas tarefas, fizemos a mesma estratégia da aula anterior: realizamos perguntas sobre a 
 
90 
 
história oralmente e os/as participantes responderam. Segue abaixo trechos que demonstram 
que aquele conto lido foi compreendido pelos/as participantes: 
 
(25) A15: é uma história de assassinato... 
A18: é uma história de amizade, traição e assassinato e a cartomante... 
((Trecho da gravação da aula do dia 09 de abril de 2019). 
 
Solicitamos também que lessem, de forma voluntária, o trecho que chamou a atenção de 
cada um/a e que haviam escrito na folha entregue no dia anterior e explicassem os motivos 
pelas quais escolheram escrevê-los. Vejamos alguns dados da transcrição da gravação das aulas 
que representam essa parte da proposta: 
 
(26) A20: “Como ia Camilo, que lhe chamou a atenção. Com dois tiros de 
revólver, estirou-o morto no chão.” ... 
P: [...] por que você escolheu esse? 
A2: porque achei isso perigoso... mexeu com arma e deu nisso... né? ...acho 
que é porque é a parte mais forte dessa história... 
A12: “a verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas 
felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo 
olhou para o mar e estendeu-lhe e olhou para fora até onde a água e o céu...” 
não deu tempo de eu terminar... 
P: entendi... por que você escolheu esse trecho? 
A12: ah... professora...porque ele olhou para o mar... [...] Camilo... olhou 
para o mar...  
P: verdade... acho que eu teria escolhido essa parte também... 
A12: eu gostei dessa parte... 
A3: a minha foi parecida... mas mudou um pouco... mas fez parte também... 
mas um pouco diferente... 
P: não... o seu é o mesmo do A20... que é quando atira e ele fica morto no 
chão... por que você escolheu esse? 
A3: eu escolhi esse porque eu acho isso muito errado... esse tipo de coisa... 
alguém tirar a vida de alguém... violência... pra mim isso é errado...querer 
chamar a atenção pra ver se diminui um pouco essas violências no nosso 
Brasil velho... 
A18: o meu é bem... bem... bem petitinho... “A traição de Rita com o amigo 
de infância do marido” ... 
P: por que esse? 
A18: porque a partir de então que houve a traição é que aconteceram todas 
as tragédias... então não é legal...foi o início de tudo... entendeu?... e prova 
que traição não é bom e não traz nada de bom pra ninguém... foi a partir 
disso que toda tragédia... tudo de ruim aconteceu... 
A17: a parte que eu achei muito interessante... a parte que eu achei muito 
bizarra...que ele fala assim... “tu crês deveras nessas coisas?”... tipo assim... 
a pessoa que vai à cartomante pela primeira vez... quando começa a falar 
 
91 
 
alguma coisa que tá batendo... você fica pra lá de encantada né... e aí quando 
você vai contar pra uma pessoa que não acredita... ela fica duvidando de 
tudo que você está falando... tipo... não acredito nessa bobeira né...  que ele 
falou isso pra ela...eu achei isso muito importante... 
P: A22... qual foi o trecho que você copiou? 
A22: “pegou-o pela gola, e deu-lhe dois tiros de revólver.” 
P: por que você escolheu esse trecho? 
A22: porque eu achei a parte mais “top”...sei lá... 
A24: o final me chamou a atenção né... 
P: por quê? 
A24: porque é uma parte forte né... 
A15: a mesma coisa... 
P: da A24... por quê? 
A15: achei uma parte muito forte mesmo... pessoa entrar numa sala e ver 
uma pessoa ensanguentada no chão e não ter condição nenhuma... 
A4: quando ele deu o tiro no cara lá... porque ela é muito forte... 
(Trecho da gravação da aula do dia 09 de abril de 2019). 
 
Ao contrário das outras aulas, os/as participantes mostraram-se mais participativos/as e 
seguros/as. Observamos que ao lerem os trechos escritos retirados de um texto que eles/as 
escolheram, estavam confiantes para responderem, porque não tinha naquele momento o certo 
ou o errado, mas ele/a enquanto leitor/a participava do texto destacando o que era mais “forte”, 
“interessante”, “bizarro”, “top”. Destacamos que é neste momento que esses/as participantes 
percebem que lhes foi dado o “poder” de escolha dos trechos e também de argumentação. É o 
instante em que não é a professora e nem o autor quem está de posse do texto, mas eles/as, e, 
com isso, podem interpretar, adentrar na história do texto e mostrar quais saberes podem 
externar para a turma. Essa é uma das 3 forças da literatura, que para Barthes (1989) faz girar 
os saberes. Outro aspecto importante, é a socialização que os/as participantes fizeram dos 
trechos da atividade envolvendo não somente a leitura dos trechos, mas também as opiniões 
para a escolha. Para Cosson (2012, p. 29) a análise literária no ambiente escolar deve ser 
explorada “ao máximo”, pois é assim que seremos capazes de “experienciar toda a força 
humanizadora da literatura”. Dessa forma, ele defende que, para o alcance do letramento 
literário, o professor deve criar condições de análise que possibilite “respostas do leitor”. 
Verificamos também que a crença e os valores são revelados nas falas do/a participante 
A3 (no excerto 26) ao avaliar o ocorrido na história como parte de uma violência presente em 
nossa sociedade como “errada”. Essa associação da história do conto com a realidade social 
mostra que a literatura traz para dentro das histórias, parte “de nossa identidade cultural” e que 
“não há maneira de se atingir a maturidade do leitor sem dialogar com essa herança, seja para 
recusá-la, seja para reformá-la, seja para amplia-la”. (COSSON, 2012, p. 34). Esse diálogo com 
 
92 
 
a obra pode ser observado inclusive na relação que o/a participante A18 estabelece entre a 
traição (causa) dos personagens que leva a uma série de tragédias (consequência) e avalia que 
a “traição não é bom pra ninguém”. O/A participante A17 mostra que tem conhecimentos do 
que é recorrer à consulta de cartas, ao se colocar no lugar da personagem Rita diante dos dizeres 
da vidente “você fica pra lá de encantada, né” e, tal qual a personagem Rita, ao contar para 
alguém essas previsões, não é levada a sério.  
Percebemos por meio dessa atividade que o destaque maior que os/as participantes 
deram foi para o desfecho violento do conto lido. Essa violência está presente também 
atualmente. Inclusive boa parte desses/as participantes mora nas quadras mais perigosas da 
cidade-satélite de Samambaia e acabam convivendo com cenas de violência envolvendo uso de 
armas de fogo. É possível perceber que os/as participantes fizeram a ligação do conto e dos 
personagens com o meio social a qual estão inseridos - parecem se ver ali representados 
indiretamente. Percebemos também que a escolha do trecho do conto que revela a morte por 
tiros foi feita pelos /as participantes mais jovens da turma.  
Van Dijk, (2005) afirma que a ADC é uma abordagem crítica que vai além do seio da 
pesquisa e procura desvelar e opor-se às desigualdades sociais de todos os tipos. Percebemos 
pela escolha dos trechos e falas dos/as participantes que a oposição à violência expressa no 
conto é também uma forma de manifestar a oposição ao meio social violento em que vivem. 
Outro ponto destacado pelos/as participantes é a traição que culmina em mortes violentas no 
conto e que também faz parte do dia a dia das pessoas, diariamente noticiadas nos meios de 
comunicação e redes sociais. A personagem feminina do conto morreu de maneira violenta 
porque foi descoberta a traição. De maneira análoga, embora tenha passado mais de um século 
da publicação desse conto, nos deparamos com diversos casos semelhantes na atualidade. Isso 
reforça o quanto a literatura pode colaborar com a compreensão da realidade. 
Em um segundo momento da aula, os/as participantes foram orientados/as a escolher 
um/a colega para formar duplas e responder às três perguntas seguintes: O que você gostaria de 
ter feito no passado e não fez? Por quê? Qual é o futuro que você deseja? O que a proposta feita 
para essa turma da EJA poderá contribuir para isso? Essas perguntas foram copiadas no 
caderno. Na Figura 6, apresentamos uma foto do momento em que estão copiando as questões:  
   
 
93 
 
FIGURA 6 – Cópia das questões antes de saírem em duplas 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Na atividade, cada um/a exerceria a função de cartomante ao realizar as perguntas ao 
seu par. Os/As estudantes trocaram a função de cartomante entre os pares, um/a representando 
a cartomante primeiro, depois, o/a outro/a. Solicitamos que pegassem as folhas que continham 
as anotações sobre a parte do texto com a qual mais se identificaram, e que escrevessem, na 
parte que ficou em branco, uma previsão do futuro do/a colega, levando em consideração tudo 
que foi perguntado a ele/a. Ressaltamos que deveriam fazer previsões positivas e que não 
deveriam contar ao/à colega o que tinham escrito. A seguir, abrimos o pote para que colocassem 
os papéis dobrados, sendo assegurado a eles/as que o pote seria aberto apenas ao término do 
semestre. 
Ao final desse bloco, em relação à motivação, acreditamos que os objetivos foram 
alcançados, pois além de instigar a participação dos/as participantes por meio da dinâmica 
desenvolvida, puderam perceber que as histórias dos contos poderiam estar associadas de 
alguma maneira ao que eles/as vivem e/ou acreditam e que, ao manifestarem-se oralmente sobre 
os temas das histórias, suas vozes estariam sendo ouvidas e que o que eles/ as têm a dizer, quer 
sejam as experiências vividas ou os seus conhecimentos de mundo, tem importância e 
relevância dentro da proposta. 
 
3.1.3 Aplicação do Bloco 3 
 
Para o bloco 3, que trata da introdução, prevíamos 5 aulas divididas em duas fases. 
Cosson (2012) afirma que essa etapa se trata da “apresentação do autor e da obra”. O autor 
chama a atenção para que essa apresentação do autor não seja muito extensa e que permita o 
levantamento de hipóteses sobre a obra que será lida. Incluímos, nessa etapa, a compreensão 
 
94 
 
sobre o gênero conto. Para as duas fases apresentamos os seguintes objetivos: Compreender as 
especificidades do gênero conto; diferenciar contos de outros gêneros pertencentes à esfera 
literária; estimular o interesse dos/as estudantes pela leitura de contos literários; estimular o 
interesse pelos autores selecionados e seus respectivos contos; explicar os motivos para a 
escolha dos contos. 
 Para a primeira parte deste bloco, apresentaríamos um vídeo, disponível no You tube, 
que estabelece a diferença entre romance, novela e conto. Para isso, reservamos a sala de 
multimídias com antecedência e salvamos o vídeo em um pen drive. Entretanto, ao conectar o 
pen drive, o computador infectou o dispositivo com vírus, não sendo possível utilizar essa sala. 
Então, encaminhamos a turma de volta à sala de aula e levamos um notebook. 
Ressaltamos que todas as salas de aula são equipadas com Datashow e som, mas 
optamos, para a aplicação da proposta, usar outros espaços da escola, além da sala, para que 
os/as participantes pudessem familiarizar-se com os ambientes que posteriormente seriam 
utilizados como cenários para a produção dos curtas-metragens.  
Ao serem perguntados/as sobre o que sabiam sobre contos, novelas, romances e crônicas 
mais uma vez optaram pelo silêncio. Talvez para os/as docentes que não possuem experiência 
pedagógica com o público EJA possa ser incômodo ter estudantes que se silenciam ao invés de 
falar, mesmo em se tratando de uma atividade diferente do costumeiro em sala de aula. Para 
compreender um pouco mais sobre esses/as estudantes, precisamos lembrar que “não há como 
deixar de pensar no jovem expulso que foi do sistema regular de ensino e que depende da EJA 
para inserir-se e continuar a aquisição sistematizada de conhecimentos” (VALIM, 2009, p. 18). 
São estudantes acostumados com inúmeras práticas pedagógicas que não deram certo, ou que 
tiveram que deixar a escola em algum momento devido a demandas no âmbito familiar. Essa 
necessidade de evadir da escola ocorre durante todo o ano letivo. Assim, as turmas podem estar 
inicialmente com cerca de 40 estudantes matriculados e, ao final do semestre, não ter sequer a 
metade deles/as concluindo. Essa evasão é percebida por quem continua até o final e interfere 
no comportamento de toda a turma. Freire (2000) afirma que: 
 
Os alunos da EJA, ao vivenciarem, pelo viés da exclusão social, o agravamento das 
formas de segregação - cultural, espacial, étnica, bem como, das desigualdades 
econômicas -, experimentam, a cada dia, o abalo de seu sentimento de pertencimento 
social, o bloqueio de perspectivas de futuro social (FREIRE, 2000, p. 254).   
 
Dessa forma, percebemos que esses/as estudantes não se veem como sujeitos ativos, 
capazes de posicionar-se criticamente, por isso, é comum permanecerem em silêncio.  
 
95 
 
Por outro lado, afirmar que todas as turmas da EJA possuem essa característica, também 
não é aceitável. Como acontece com as outras modalidades de ensino da educação básica, há 
na EJA turmas que são mais participativas, outras desinteressadas, ou seja, cada uma dessas 
turmas pode apresentar determinadas características. No caso dessa turma participante, 
percebemos desde o semestre anterior14 que o silêncio é uma tática adotada por eles/as quando 
são perguntados ou por medo de errar, ou por não gostarem de estar em evidência na sala.  
Em seguida, os/as participantes da pesquisa assistiram ao vídeo que tratava da diferença 
de conto, novela e romance. A partir da exibição do vídeo, exploramos os conhecimentos 
prévios dos/as discentes sobre esses gêneros. Ao explorarmos os conhecimentos prévios dos/as 
estudantes, estamos criando um ambiente de escuta e valorizando os saberes que eles/as já 
possuem. Essa prática é essencial na abordagem do LC, pois cria-se a oportunidade de 
valorização da fala dos/as discentes, tanto da turma quanto do/a professor/a. 
Após essa exploração do conhecimento prévio dos/as discentes, fizemos um registro 
sistematizado no quadro a fim de que compreendessem as principais características de cada um 
desses gêneros, especialmente, os contos e, em seguida, registramos no quadro o nome de cada 
gênero estudado para que pudessem falar sobre cada um deles oralmente estabelecendo as 
diferenças e semelhanças entre eles, conforme podem ser vistos na Figura 7: 
 
FIGURA 7 – Diferença ente conto, novela e romance 
 
Fonte:  Acervo pessoal. 
 
Dando continuidade, explicamos aos/às estudantes que eles iriam promover uma leitura 
oral compartilhada de um conto. Antes disso, solicitamos que escolhessem qual papel iriam 
desempenhar na leitura: o do narrador, o da mãe, o da filha ou o do pai. Para facilitar a leitura 
compartilhada, previamente destacamos as falas de cada personagem e do narrador, com caneta 
marca texto, em quatro cópias do conto “Tchau” (ANEXO E) e entregamos essas cópias aos 
                                                     
14 A professora pesquisadora foi docente na turma pesquisada durante o 1º semestre de 2018. 
 
96 
 
/às estudantes que fariam a leitura oral. Combinamos também que todos/as leriam em conjunto 
o título do conto.  
Perguntamos-lhes se poderíamos gravar a leitura oral em áudio (por meio de um 
aplicativo baixado no celular) e todos/as concordaram. Para facilitar o trabalho, os/as leitores/as 
voluntários/as sentaram-se de frente para a turma, conforme mostra a Figura 8.  
 
FIGURA 8 – Leitura oral compartilhada do conto “Tchau” 
   
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Ao final, perguntamos o que acharam do texto lido e da experiência de compartilhar a 
leitura oral e gravá-la em áudio:  
 
(27) A17: que legal! ai professora (risadas)...dá um nervoso... 
A20: muito bom... 
P: e a história o que vocês acharam? 
A9: legal... é uma história bonita... é triste...  
(Trechos da gravação da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
Os/As participantes demonstraram durante e após a leitura estarem se divertindo com a 
maneira como o conto foi lido e, conforme o excerto, eles/as apreciaram a atividade, avaliando-
a por meio dos atributos “legal”, “muito bom” e manifestaram apreciação pela história por meio 
dos atributos “bonita” e “triste”. Tentamos passar o áudio para toda a turma imediatamente após 
a atividade. Entretanto, era necessário transferir o áudio gravado do celular para o Notebook e 
conectá-lo à caixa de som da sala. Constatamos que teríamos que ouvir em outra aula, pois o 
cabo do celular estava apresentando mau contato com o aparelho. Ao dizermos que 
posteriormente iríamos disponibilizar o resultado do áudio da leitura, os/as participantes 
ficaram ansiosos pela próxima aula.  
No momento da leitura, todos/as estavam compromissados/as com o texto e seus turnos 
de leitura. Assim, os /as participantes experimentaram um envolvimento maior com o texto 
enquanto leitores. Pudemos   notar dois momentos: o prazer de ler o conto apossando-se dele 
 
97 
 
enquanto leitores e a fruição literária. Barthes (1996, p. 21-22) considera fruição aquele texto 
“que põe em estado de perda, aquele que desconforta (talvez até um certo enfado), faz vacilar 
as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, a consistência de seus gostos, valores e de 
suas lembranças, faz entrar em crise a sua relação com a linguagem”. Logo, esse conto traz os 
dois elementos como podemos averiguar na fala do/a participante A9 “Legal. É uma história 
bonita, é triste”. Essa ambiguidade, que também parece um conflito, é segundo Barthes (1996), 
esperada ao leitor que lê “levantando a cabeça”. 
Dando continuidade, conversamos sobre o conto lido e a seguir, realizamos a 
interpretação oral do conto. Para Cosson (2012, p. 26-27) a escola deve ir sempre além de uma 
leitura literária, pois a literatura “é um lócus de conhecimento e, para que funcione como tal, 
convém ser explorada de maneira adequada”. Dessa maneira, consideramos que a interpretação 
oral permite socializar as ideias dos/as participantes podendo ser um “ato solidário”. Segue no 
excerto alguns trechos do áudio: 
 
(28) A20: fala sobre tudo... sobre amor... sobre a vida... sobre o passado... sobre 
a mãe... 
A3: sobre a mãe... 
A9: por causa de um amor... 
A3: era um amor que não era verdadeiro...porque o amor era os filhos... 
A3: era uma paixão que ela arrumou fora do casamento... 
(Trechos da gravação da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
 
Percebemos que a interpretação que os/as participantes fazem do conto está vinculada 
ao conhecimento de mundo deles/as, suas crenças, seus valores, elementos constitutivos do 
evento de letramento aula. Para A3 o que representa como amor verdadeiro, são os filhos. 
Levando em conta os estudos do Letramento Crítico, percebemos que há um choque de valores 
e de crenças ocasionando um discurso de reprovação à atitude de uma mulher que abandona os 
filhos na fala de A3 “Era uma paixão que ela arrumou fora do casamento”.  
Alguns alunos apresentam uma posição contrária ao que está representado no texto, 
manifestando seus valores, como A3 no excerto a seguir:  
 
(29) P: [...] vocês se colocaram no lugar de quem aqui? do pai? da mãe? da 
Rebeca? 
A12: acho que no lugar da Rebeca... 
P: quem se colocou no lugar do pai? 
A1: ah...eu me coloquei no lugar da Rebeca... 
A15: no lugar do pai... 
 
98 
 
P: quem se colocou no lugar da mãe? 
A3: eu não me colocaria no lugar dela... porque eu não largaria meus filhos 
por nada desse mundo... 
(Trechos da gravação da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
Nenhum /a dos participantes quis se colocar no lugar da mãe. Há um discurso de 
reprovação à atitude de uma mulher que abandona os filhos. Conforme observamos na fala de 
A3 “Eu não me colocaria no lugar dela, porque eu não largaria meus filhos por nada desse 
mundo.”. Esse excerto demonstra que durante a leitura do conto os/as participantes se 
colocaram no lugar de todos os personagens e de maneira reflexiva, mas evitaram se colocar no 
lugar da personagem que abandonou o lar. Apenas após a mediação/provocação da professora 
e das próprias questões interpretativas, alguns consideraram se colocar no lugar da personagem 
que é a mãe da Rebeca, o que representa um avanço, haja vista que boa parte dos/as 
participantes, especialmente as mulheres, ficaram revoltados/as com o abandono do lar e dos 
filhos por essa personagem. Tal revolta, evidencia a cultura de nosso país na qual as pessoas 
aceitam melhor o abandono do lar pelos homens e, quando isso é feito pela mulher, o discurso 
hegemônico vem à tona: homem sim, a mulher/mãe não.  
Dando continuidade, com o propósito de expandir a interpretação, problematizamos a 
representação que fizeram da personagem com a capa do livro de contos “Tchau”. Para isso, 
solicitamos que observassem a imagem que estava no conto lido: 
 
FIGURA 9 – Imagem da capa do livro de contos “Tchau” 
 
Fonte: Capa do livro “Tchau “de Lygia Bojunga de 1984. 
 
Em seguida, realizamos algumas perguntas conforme segue o excerto: 
 
 
 
99 
 
(30) P: quem é que está nessa imagem? 
A1: a Rebeca... 
T: não...é a mãe... 
P: vocês acham que essa imagem mostra uma mãe feliz? 
T: não... 
A12: é uma mãe triste... 
A9: ela tá presa aos filhos... 
(Trechos da gravação da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
Durante a discussão, percebemos que as participantes mulheres ficaram mais revoltadas 
com a atitude da mãe que os participantes homens. Com essas questões levantadas durante a 
interpretação, pela perspectiva da ADC, notamos que dificilmente os/as participantes 
aceitariam se colocar no lugar de personagens cujos comportamentos não são aceitos 
culturalmente como a mãe da personagem Rebeca. Assim, foi fundamental mostrar que a 
personagem estigmatizada pelos/as leitores/as, além de não ser uma vilã, pode ter sido criada 
pela autora propositalmente para romper paradigmas e padrões de comportamentos esperados 
de uma mulher. 
A seguir, solicitamos que observassem os subtítulos do conto lido (ANEXO E) e 
dissessem o que cada subtítulo lembrava ou representava no conto. Pudemos perceber no 
subtítulo “A mala” a extrapolação do conto, como segue o excerto: 
 
(31) P: uma mala representa muita coisa... imagina você chegar em casa... na casa 
de alguém... e tem uma mala lá no meio... 
A 12: ave Maria! 
A15: e a mala pode ser a minha... 
A 9: você pensou na sua madrasta... 
A15: pensei na minha madrasta querendo me expulsar de casa... 
 (Trechos da gravação da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
Podemos observar, pela fala de A15, que o conto selecionado pode suscitar várias 
críticas e reflexões, como o medo que o/a participante revela de ser expulso de casa pela 
madrasta. Essa situação vivida pelo/a participante A15 parece ser conhecida pelos/as colegas, 
uma vez que o/a participante A9 foi quem sugeriu que a mala de A15 poderia estar na sala 
colocada pela madrasta, revelando uma relação conflituosa entre A15 e sua madrasta. Logo, o 
texto lido serviu de motivação para que falasse de si mesmo, na sala de aula, se apropriando, 
enquanto leitor, daquele texto literário. Nesse sentido, a OCEM (2008, p. 55) afirma que “Faz-
se necessário e urgente o letramento literário: empreender esforços no sentido de dotar o 
educando da capacidade de se apropriar da literatura”. Tal apropriação depende também do 
 
100 
 
papel do/a professor/a que, segundo Cosson (2012), é o intermediário entre o livro e o/a 
estudante. Ou seja, a escolha do repertório a ser lido no ambiente escolar será feita pelo/a 
professor/a e, antes de selecionar, ele/a deve levar em conta a diversidade de obras (canônicas 
e não canônicas) e de leitores/as.  
Depois, no Datashow, em slides de Power point, apresentamos o gênero conto e 
procuramos dar explicações mais detalhadas sobre as especificidades desse gênero.  Para isso, 
utilizamos a lousa e realizamos perguntas aos participantes a fim de verificar se conseguiram 
compreender o que foi ensinado. 
 
FIGURA 10 – Slides explicativos sobre o gênero conto 
  
 
Fonte: Consulta Disponível em: 
https://drive.google.com/file/d/1lYyh1dULdM4E6ySJmzfLYSxpEGZ7jX2a/view?usp=sharing 
. 
 
101 
 
Logo após, seguimos com perguntas que foram respondidas oralmente sobre o que 
aprenderam até aquele momento sobre os gêneros e que constam algumas respostas no seguinte 
excerto:  
 
(32) P: [...] o que é conto? 
A20: conto é... ah... professora eu não sei muito bem explicar isso não... mas 
vamos lá né... conto é a gente conhecer as pessoas... conversar... acho que 
seria mais ou menos por aí... 
A8: conto pra mim é uma história... uma história de vida... uma história que 
realmente aconteceu... eu vejo o conto como se fosse uma história real...  
A15: pra mim eu vou te ser bem sincero... eu não acho diferença não... mas 
eu sei que o conto... às vezes... ele é baseado em fatos reais... tem parte que 
é fictício... novela é criada uma história... às vezes... pode ter até verdade no 
meio... mas ela é história maior e eu acho que é isso... eu não tenho muita 
ideia não... 
A9: pode ter história de qualquer tipo... mas tem história que não dá pra 
criança...né... 
P: o que deve conter um conto... quais são os elementos do conto... que a 
gente acabou de ver? tem que ter o quê? 
A8: narrador... 
A8: personagem... 
A8: enredo... 
A8: desfecho... 
A20: objeto simbólico... 
P: exatamente... são elementos de um conto... quais são os tipos de contos 
que a gente já falou aqui que vocês conhecem? 
A15: conto policial... 
A15: conto romântico... conto de fadas...  
(Trecho da aula do dia 17 de abril de 2019). 
 
Perguntamos também “Existe indicação de faixa etária para a leitura dos contos?” ao 
que responderam coletivamente que sim. Dentre as falas, A3 disse que o conto “A cartomante” 
“Não serve pra criança de jeito nenhum” e, para a pergunta “Você acredita que as histórias dos 
contos, embora sejam ficcionais, podem representar situações reais do cotidiano das pessoas? 
Justifique.” Todos/as os/as participantes disseram que sim, tendo como justificativa “Traição é 
o que mais tem” (A16), “Tanto aquele conto lá como esse conto de agora é de história que 
aconteceu. Não tem jeito, gente.” (A15). 
Pelos excertos, percebemos que os/as participantes conseguem identificar os elementos 
do conto, compreendem que é uma história, entretanto, não está claro para eles/as que esse 
gênero, além de ser uma arte, possui valor estético, pertence ao campo ficcional e que pode 
estar relacionado com fatos da realidade, mas há sempre alguns elementos do imaginário e 
possibilidade de plurissignificação.   
 
102 
 
Posteriormente, na terceira aula, antes de dar início à segunda fase desse bloco, os/as 
participantes da pesquisa pediram para ouvir o áudio da gravação da leitura do conto “Tchau” 
feito pela turma. Momento em que demonstraram orgulho de si mesmos, pois pediram que 
gravasse em pen drives para eles/as ou enviasse pelo Whatsapp. Disponibilizamos o link 
também no google drive:   
 
https://drive.google.com/drive/folders/1lN85AFC7wMvbQUaDj2-MUbyVrWChqFee?usp=sharing .  
 
Foi durante esta atividade que decidiram que deveríamos fazer parte do grupo da sala, 
para compartilhar o que fosse feito no projeto. Conversamos que devido à garantia de sigilo 
não seriam compartilhados fotos, vídeos e demais atividades que poderiam expor a identidade 
deles/as.  
Ao levar o áudio das vozes deles lendo o texto, observamos que uma atividade de sala 
de aula como essa, utilizando recursos tecnológicos, pode surgir de outras demandas também 
tecnológicas e digitais: ao se ouvirem no áudio da gravação da leitura do conto quiseram 
mostrar essa leitura para outras pessoas, provavelmente do vínculo afetivo deles, pelo 
Whatsapp. Uma atividade de leitura simples ganhou tanta importância e sentido que a partir 
dali passou a circular em outros ambientes. 
Dando continuidade, iniciamos a segunda fase do Bloco 3, que consistiu na apresentação 
dos/as escritores/as e das obras com o tempo estimado de 2 aulas de 50 minutos. O objetivo 
consistiu em estimular o interesse pelos/as autores/as selecionados/as e seus respectivos contos 
e explicar os motivos para a escolha das histórias. 
Primeiro, fixamos no mural 5 fotos de escritores/as, mas não dissemos quem eles/as 
eram, conforme Figura11 a seguir: 
 
FIGURA 11 – Fotos dos/as contistas fixadas na parede 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
 
103 
 
Perguntamos a ele/as se sabiam de quem se tratavam. Disseram alguns nomes e depois 
resolveram entre eles/as que se tratava de escritores/as, mas não sabiam os nomes. Segue o 
excerto: 
 
(33) P: vocês viram aquelas fotos que estão ali? dá uma reparada... quem conhece 
quem? 
A15: eu não conheço ninguém... mas pela história que passou ali aquela deve 
ser aquela escritora Cecília Meireles. 
P: Cecília Meireles... qual você acha que é Cecília Meireles? 
A15: aquela última lá de branco... 
P: quem mais? 
A13: Flávio... 
P: qual é Flávio? 
A13: aquele de óculos... 
P: o de óculos?  
A13: não é o Flávio?  
P: vamos ver daqui a pouco... Flávio Cavalcanti... não é que parece mesmo? 
vocês acham que eles são quem? 
T: escritores... 
P: vamos ver se é isso mesmo... 
A15: esse aqui tá parecendo o Machado de Assis... tá bem antigo... 
P: esse aí... Machado de Assis?  
A15: eu acho que pode ser...  
(Trecho da gravação da aula do dia 24 de abril de 2019). 
 
Dando sequência à proposta, com a exibição de vídeos sobre os/as autores, em outro dia 
e em outra sala de vídeo denominada “Cineclube”, os/as participantes da pesquisa assistiram 
sobre os/as outros/as três autores dos contos com os quais trabalharíamos na proposta: 
Guimarães Rosa (https://www.youtube.com/watch?v=v9CbLYE-T3k )  
, Lygia Bojunga (< https://www.youtube.com/watch?v=9KKob3AWnGk> e Machado de Assis (< 
https://globoplay.globo.com/v/887079/>). Para cada vídeo, os/as participantes eram 
convidados a colar na parede o nome do/a escritor/a junto à sua respectiva foto. A Figura 12 
mostra a participação deles/as durante essa atividade.  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
104 
 
FIGURA 12 – Colocação das placas dos nomes dos/as escritores/as às figuras no Cine Clube 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Após a exibição dos vídeos perguntamos o que mais chamou a atenção sobre os/as 
escritores e qual o contista que mais gostaram. Seguem alguns trechos da gravação: 
 
(34) A11: eu achei aquela escritora ali divertida... 
P: a Lygia Bojunga? por quê? 
A11: não sei... ela é alegre... bonitona... 
A15: eu gostei do Guimarães... a senhora disse que ele falava quantas 
línguas? 
P: 8 e ainda a nossa ...9... então... 
A15: eu não acredito... pra mim é mentira... 
A9: tá duvidando da professora? 
A15: não... mas eu acho que tem exagero nisso aí... 
A1: a Júlia Lopes é a mais feia... coitada... 
A17: ahh... mas a professora disse que esse aí era negro e essa foto não 
mostra ele negro não... eu gosto das histórias dele... 
P: o Machado de Assis era negro... mas como eu disse... por muitos anos a 
imagem dele era outra... essa aí é porque é uma imagem antiga...mas ele era 
negro... 
A15: esse “Dalto” também era esquisitão...né professora... 
P: ele ainda vive... tem mais de 90 anos... 
A15: achei ele esquisitão... 
(Trecho da gravação da aula do dia 23 de abril de 2019). 
 
Percebemos que gostaram mais da escritora Lygia Bojunga. Em seguida, perguntamos 
qual a importâncias de ler contos e outros textos literários. Apenas o/a participante A15 disse 
“Aprender mais”, “Sobre a vida, os escritores, conhecer histórias”. Destacamos após essa fala, 
que além do que já havia sido dito pelo/a participante A15, os contos e os outros textos literários 
proporcionariam um determinado prazer que a leitura literária causa aos leitores e que poderiam 
se tornar mais críticos, humanizados e capazes de realizar interpretações e ir além do que está 
 
105 
 
no texto. Pedimos que listassem os contos lidos até aquele momento com seus/as respectivos/as 
autores/as para que compreendessem que é importante saber o título e o/a autor/a de uma obra. 
Logo após, dividimos os/as participantes em 3 grupos para explorar os títulos de cada 
conto que seria trabalhado com 5 perguntas. O propósito dessa atividade era despertar a 
curiosidade dos/as participantes pela obra que seria lida e para que pudessem fazer inferências 
a partir do título. Estipulamos 15 minutos para responderem e, além disso, cada grupo deveria 
apresentar aos/às demais o que foi escrito e/ou discutido no grupo sendo elas respondidas 
conforme nas Figuras abaixo: 
 
FIGURA 13 – Atividade sobre os títulos das obras: “A caolha” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Vimos que o grupo infere que no conto será narrada uma história de uma pessoa 
depressiva e triste e que acontece na história. O grupo também representa uma pessoa caolha 
como alguém que pode ser vítima de preconceito, propensa ao isolamento e depressiva.  
 
 
106 
 
FIGURA 14 – Atividade sobre os títulos das obras: “A terceira margem do rio” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
No primeiro momento, o grupo ficou perdido quanto ao título em questão. Vieram nos 
perguntar o que seria a terceira margem. Respondemos com a pergunta: Quantas margens tem 
o rio? Os /as participantes desse grupo responderam que duas, então pedimos que pensassem e 
discutissem o que viria a ser essa terceira margem na história. O grupo infere que no conto será 
narrada uma história fictícia de alguém que vai imaginar que existe uma terceira margem e 
defende que não existe terceira margem.  
 
 
107 
 
FIGURA 15 – Atividade sobre os títulos das obras: “Clínica de Repouso” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Esse grupo infere, a partir do título, que no conto será narrada uma história baseada em 
fatos reais, que acontece no dia a dia, em uma clínica de reabilitação para curar vícios e 
depressão, frequentada por pessoas que sozinhas não conseguirão vencer suas dificuldades.  
Para Cosson (2012), a escola deve formar o leitor literário. Para isso, é necessário ir 
além da superfície do texto. As inferências são formas de ir além dessa superficialidade. 
Verificamos que todos os grupos de alguma forma conseguiram se aproximar das ideias das 
narrativas dos contos que serão lidos, apenas pelos títulos e perguntas em busca da construção 
de sentidos.   
Ao final das apresentações de cada grupo, solicitamos que todos/as batessem palmas 
pelo trabalho feito. Pedimos que, mesmo que não fossem falar, todos/as fossem à frente para 
dar apoio a quem iria representá-los/as. Em seguida, pedimos que identificassem os/as 
autores/as dos títulos de cada grupo dizendo qual título do conto pertencia a qual escritor/a. 
Depois, os/as participantes fixaram esses títulos dos contos as fotos dos/as autores/as.  
Ao final, dissemos a eles/as que depois leriam os contos e analisariam se as inferências 
que fizeram correspondiam ao que é narrado em cada conto. Dessa forma, finalizamos a 
atividade com os/as participantes motivados/as e curiosos/as para o próximo passo. 
Acreditamos que esse tipo de atividade tenha despertado o interesse dos/as participantes 
não só pelos/as escritores/as como também pelos contos. Cosson (2012, p. 61) ressalta que a 
função da introdução é “apenas permitir que o aluno receba a obra de maneira positiva.” 
 
108 
 
Acreditamos que o desenvolvimento da introdução tenha ajudado aos/as participantes a 
perceberem o quanto é importante saber um pouco sobre quem escreve a obra e sobre as 
características do gênero conto. 
 
3.1.4 Bloco 4 - Leitura e interpretação 
  
Para o desenvolvimento desse Bloco foram destinadas 31 aulas distribuídas em 9 fases. 
O Bloco está em consonância com a sequência básica de Cosson (2012) por se tratar de leituras 
curtas que ocorreram na escola conforme orienta o autor e damos ênfase à experiência da leitura 
e à interpretação como “ato de construção de sentido em uma determinada comunidade”. 
(COSSON, 2012, p. 65). O autor afirma que a introdução envolve práticas e postulados 
numerosos que devem ser feitos compartilhando os sentidos, ampliando-os, socializando-os e 
é também o momento dos registros que podem ser feitos de diversos modos. Para o autor, os 
registros da interpretação dependem “da turma, dos textos escolhidos e dos objetivos do 
professor”. (COSSON, 2012, p. 69).   
Este bloco também está em consonância com os pressupostos da ADC e focaliza a 
representação que Fairclough (2003) associa a discursos, no caso dessa proposta, presentes nos 
contos e a representação discursiva que os/as participantes fazem de si mesmos/as levando-se 
em conta o que leram e as suas culturas, as vivências e as crenças. Fairclough (2003) também 
afirma que a identificação compõe as práticas sociais e está relacionada a identidades. Nessa 
proposta, tentamos compreender como os/as participantes identificam a si mesmos e como 
identificam os /as outras no texto e fora dele. 
Logo, os objetivos desse bloco são: ler, coletivamente, contos de diferentes contistas da 
literatura brasileira aproximando-os/as ao texto literário; analisar e discutir as representações 
discursivas e identificações dos personagens nos contos; investigar como os alunos se 
representam e se identificam e representam o mundo; relacionar as representações e 
identificações dos personagens nos contos com as representações e identificações de si 
construídas pelos discentes, articulando culturas, o lido e o vivido; valorizar as obras literárias.  
Para o desenvolvimento da primeira fase, prevíamos 3 aulas de 50 minutos. O texto lido 
foi “A caolha” de Júlia Lopes de Almeida (ANEXO F). Inicialmente, levamos a turma para a 
sala de vídeos, disponibilizamos as cadeiras em círculos e entregamos cópias desses contos a 
cada participante. Previamente, destacamos 2 ou mais parágrafos do conto. Assim, quando o/a 
participante recebia a cópia, havia 2 ou 3 parágrafos destacados para que lesse na sequência da 
 
109 
 
leitura oral do/a colega. Assim, explicamos para a turma. Como tratava-se de um conto com 
longas narrações e pouquíssimas falas dos personagens, adotamos essa estratégia e não a outra 
como foi feita no conto “Tchau”.  Os/As participantes começaram a ler os contos oralmente e 
individualmente conforme estava destacado e providenciamos que novamente fosse gravado 
um áudio dessa leitura por meio do aplicativo “Gravador de voz fácil” do celular. Essa 
estratégia foi feita dessa forma porque pediram anteriormente que fizéssemos a mesma 
estratégia de leitura do conto “Tchau”. A figura 16, a seguir, ilustra esse momento: 
 
FIGURA 16 – Leitura compartilhada do conto “A caolha” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Observamos que muitos/as começaram a se perder na leitura, pois ficavam prestando 
atenção na leitura do/a colega sem acompanhar o seu próprio texto. Além disso, logo o sinal de 
encerramento do horário foi dado e não deu tempo de finalizar o conto. Dessa forma, a estratégia 
de leitura adotada para o trabalho com o conto “Tchau”, que anteriormente havia dado certo, 
dessa vez, não deu. Avaliamos que não deu certo também porque dessa vez, a leitura não foi 
feita por personagens e sim por parágrafos, além disso, embora tivéssemos explicado que cabia 
a cada um ler em voz alta o trecho que estava destacado, alguns/mas não entenderam ou ficaram 
nervosos/as. Reconhecemos também que a imposição da tarefa, pode ter repercutido 
negativamente a alguns/as deles/as, pois para a leitura do conto “Tchau” quem quis ler 
individualmente se ofereceu, agora , no tocante ao conto “A caolha”, todos/as deveriam ler 2 
ou 3   parágrafos destacados. Para o ensino pautado no Letramento Crítico, o professor deve 
exercitar a escuta e ouvir os /as estudantes, estar disposto a mudar o planejamento conforme as 
demandas que podem surgir. Freire (1997) ressalta que devemos, além de falar ao aluno, falar 
com o aluno, considerando o sentimento dele em sala de aula, para que dessa forma possa haver 
uma troca de conhecimentos. 
A partir dessa constatação, na aula seguinte, antes de dar continuidade de leitura do 
conto “A caolha”, conversamos com os/as participantes sobre o que acharam daquela estratégia 
 
110 
 
de leitura e se concordavam em mudar. Disseram que acharam difícil ler daquela forma e que 
ficaram perdidos. Então propomos que voltassem à leitura inicial do conto e que iríamos exibir 
um vídeo disponível no You tube, https://www.youtube.com/watch?v=A3yFqsii84k, e que 
acompanhassem a leitura do conto silenciosamente a narração da história. Estratégia mais 
acertada, pois prestaram atenção no texto, além disso, estava de acordo com a proposta. 
Depois, para a fase de interpretação e análise do conto, apresentamos-lhes várias 
questões nos slides, levando em conta os objetivos desta fase da sequência básica, o propósito 
de articulação do lido e do vivido, de análise das representações discursivas e identificações 
dos personagens e de relacioná-las a como os/as alunos/as se representam e se identificam, 
tendo em vista as especificidades do gênero, os pressupostos da ADC e os objetivos desta parte 
da sequência básica.   
Dessa maneira, para a questão “Na sua opinião, por que o narrador descreve 
detalhadamente os aspectos físicos da Caolha? Como ela é representada e identificada por meio 
dessa descrição?” O objetivo era mostrar como a caolha é representada e identificada na 
história. 
Para que pudessem perceber os detalhes, retomamos a leitura oral feita por um/a dos 
participantes do 1º, 2º e 3º parágrafos. Em seguida, solicitamos que sublinhassem as 
características que estavam postas no conto: 
 
“A caolha era uma mulher magra, alta, macilenta, peito fundo, busto arqueado, braços 
compridos, delgados, largos nos cotovelos, grossos nos pulsos; mãos grandes, 
ossudas, estragadas pelo reumatismo e pelo trabalho; unhas grossas, chatas e 
cinzentas, cabelo crespo, de uma cor indecisa entre o branco sujo e o louro grisalho, 
desse cabelo cujo contato parece dever ser áspero e espinhento; boca descaída, numa 
expressão de desprezo, pescoço longo, engelhado, como o pescoço dos urubus; dentes 
falhos e cariados. 
O seu aspecto infundia terror às crianças e repulsão aos adultos; não tanto pela sua 
altura e extraordinária magreza, mas porque a desgraçada tinha um defeito horrível: 
haviam lhe extraído o olho esquerdo; a pálpebra descera mirrada, deixando, contudo, 
junto ao lacrimal, uma fístula continuamente porejante. 
Era essa pinta amarela sobre o fundo denegrido da olheira, era essa destilação 
incessante de pus que a tornava repulsiva aos olhos de toda gente.” (ALMEIDA, 1903, 
p. 93) 
 
Explicamos que o conto “A caolha” foi um conto escrito durante o Realismo, movimento 
que propunha descrever os textos para evitar excesso de subjetividades em oposição ao 
Romantismo, ou seja, aquela descrição procurava ser o mais fiel possível ao desejado pelo 
autor. Em seguida, solicitamos que respondessem a segunda questão oralmente. Seguem alguns 
trechos do excerto: 
 
 
111 
 
(35) A8: dá uma impressão que ela é muito pobre... 
A12: muito feia... 
A9: ela não se achava que era uma coitada... ela não sentia vergonha dela ser 
daquele jeito... 
(Trecho da gravação do dia 30 de abril de 2019). 
 
Os recursos verbais usados no conto e sublinhados pelos/as participantes nos três 
primeiros parágrafos do conto, construíram, para os/as estudantes, a representação da Caolha 
como “pobre e feia”. Essas características usadas não fogem às representações que dadas às 
pessoas que fugiam ao padrão estabelecido, como a deficiência, daquela época e que ainda 
permanecem nos dias de hoje, na maioria das vezes estigmatizadas e isoladas da sociedade.  
O entendimento do/a participante A9 “Ela não se achava que era uma coitada”, nos leva 
a outro tipo de ver a autorrepresentação, ao deduzir que a própria personagem não se achava 
uma coitada. Essa interpretação feita pelo/a aluno/a não está explícito no conto. Por esse 
excerto, é possível dizer que os/as participantes compreenderam que a Caolha, embora fosse 
uma mulher dita no texto como “aspecto repugnante”, ainda assim, ao/à participante A9 a 
considerava como uma mulher forte e determinada. Essa interpretação é importante, pois 
evidencia que de alguma forma sentiu-se representado/a e houve uma identificação com a 
personagem mãe Caolha, ao contrário dos textos anteriores “A cartomante” e “Tchau”, em que 
os/as participantes revelaram não gostar das protagonistas, ainda que fossem descritas como 
bonitas, tiveram condenadas as suas atitudes.  
Para responder a questão “A partir dessa descrição, como as pessoas e o filho são 
representados e identificados?” Novamente pedimos que lessem os trechos que mostravam essa 
representação e sublinhassem: 
Quando em criança entrou para a escola pública da freguesia, começaram logo os 
colegas, que o viam ir e vir com a mãe, a chamá-lo – o filho da caolha. 
Aquilo exasperava-o; respondia sempre: 
– Eu tenho nome! 
Os outros riam e chacoteavam-no; ele se queixava aos mestres, os mestres ralhavam 
com os discípulos, chegavam mesmo a castigá-los – mas a alcunha pegou. Já não era 
só na escola que o chamavam assim. 
Na rua, muitas vezes, ele ouvia de uma ou outra janela dizerem: o filho da caolha! Lá 
vai o filho da caolha! Lá vem o filho da caolha! 
Eram as irmãs dos colegas, meninas novas, inocentes e que, industriadas pelos irmãos, 
feriam o coração do pobre Antonico cada vez que o viam passar! 
As quitandeiras, onde iam comprar as goiabas ou as bananas para o lanche, 
aprenderam depressa a denominá-lo como os outros, e, muitas vezes, afastando os 
pequenos que se aglomeravam ao redor delas, diziam, estendendo uma mancheia de 
araçás, com piedade e simpatia: 
– Taí, isso é para o filho da caolha! 
 
112 
 
O Antonico preferia não receber o presente a ouvi-lo acompanhar de tais palavras; 
tanto mais que os outros, com inveja, rompiam a gritar, cantando em coro, num 
estribilho já combinado: 
– Filho da caolha, filho da caolha! 
[...] 
Aos onze anos o Antonico pediu para sair da escola: levava a brigar com os 
condiscípulos, que o intrigavam e malqueriam. Pediu para entrar para uma oficina de 
marceneiro. Mas na oficina de marceneiro aprenderam depressa a chamá-lo – o filho 
da caolha, a humilhá-lo, como no colégio. 
Além de tudo, o serviço era pesado e ele começou a ter vertigens e desmaios. Arranjou 
então um lugar de caixeiro de venda: os seus colegas agruparam-se à porta, 
insultando-o, e o vendeiro achou prudente mandar o caixeiro embora, tanto que a 
rapaziada ia-lhe dando cabo do feijão e do arroz expostos à porta nos sacos abertos! 
Era uma contínua saraivada de cereais sobre o pobre Antonico! 
[...] 
Depois disso passou um tempo em casa, ocioso, magro, amarelo, deitado pelos cantos, 
dormindo às moscas, sempre zangado e sempre bocejante! (ALMEIDA, 1903, p. 95 
e 96). 
  
Para realizar essa tarefa, solicitamos que sublinhassem as identificações e 
representações referentes às pessoas na cor preta e as identificações e representações referentes 
ao Antonico na cor vermelha na cópia do conto “A caolha”. Tarefa demorada e que 
consideramos que não foi fácil. Pedimos para que um/a participante fosse lendo os trechos aos 
poucos, para juntos/as identificarmos o que deveria ser sublinhado na cor vermelha e o que 
deveria ser sublinhado na cor preta e por quê. Percebemos que os/as participantes que 
evidenciam maior dificuldade na leitura e na escrita solicitaram ajuda aos/às colegas que 
tiveram mais facilidade. 
Na sequência, discutimos sobre o comportamento dos personagens do texto que chamam 
o Antonico como “O filho da Caolha”. São personagens homens, mulheres e crianças e com 
diversas profissões que no conto apelidam e maltratam o personagem Antonico e, isso afetou a 
vida pessoal e social e até mesmo a saúde do personagem. A representação de diversos 
personagens que apelidam o Antonico é um recorte da sociedade daquele tempo que não se 
coloca no lugar do outro e nem percebem o sofrimento que tais atitudes podem causar, como 
na história, tornando-o fragilizado.  
Para a questão “Você considera que seu comportamento também foi mudando, à medida 
que foi crescendo?” Todos/as afirmaram que sim e justificaram que: 
 
(36) A12: porque ele foi vendo que as coisas não eram como os outros falavam... 
A9: porque ele foi sentindo vergonha dela... 
A12: ficou envergonhado... 
A15: na verdade porque de tanto ele receber nomes e ver ela ser xingada ele 
começou a tomar vergonha da mãe... 
(Trecho da gravação do dia 30 de abril de 2019). 
 
113 
 
 
A representação do filho que foi crescendo e percebendo o que a mãe representava para 
a sociedade influenciou-o para que se envergonhasse da mãe. Pela perspectiva da ADC, a 
linguagem atua sobre os indivíduos na sociedade e influencia no comportamento dos indivíduos 
historicamente, em uma relação dialética e cíclica tal qual podemos notar no conto. Esses 
excertos, que são interpretações feitas diante dos fatos sucedidos no conto, evidenciam que, 
numa prática de letramento o/a estudante é capaz de fazer inferências que condizem com o texto 
e com o que conhece historicamente ou socialmente.  
Outra questão que refletiram e se manifestaram foi sobre como ser o filho da Caolha 
afetou a vida do Antonico. Percebemos que se basearam inicialmente no texto, como na fala de 
A16, para externar o que ele sentia seguido de que ela andava chateado e que se afastou de todo 
mundo. 
 
(37) A16: teve uma hora que ele disse que tinha nome... né? 
A15: andava muito chateado... 
A15: ele se afastou de todo mundo... 
A13: é... ele não gostava... 
A20: tipo um coitado... 
(Trecho da gravação do dia 30 de abril de 2019). 
 
Para eles/as, a identidade do personagem Antonico foi afetada porque vivenciou o 
Bullying ao ser tratado não pelo nome, mas como o “filho da caolha” de tal forma que ficou 
como um “coitado” e “se afastou de todo mundo”. 
Levantamos também a seguinte questão: O apelido adquirido pelos lugares onde o 
Antonico passava o levou a não frequentar mais a escola. O Bullying é um problema antigo e 
atual. De que forma vocês enfrentariam esse problema? Já passaram por algo semelhante ou 
presenciaram? Ao abordarmos sobre o Bullying, a fim de aproximarem-se mais de um problema 
social atual, perguntamos como reagiriam caso estivessem no lugar do Antonico vivendo a 
mesma situação: 
 
(38) A15: seria resolvido na porrada... o povo das antigas resolvia isso é na 
porrada... oxi... eu dava uma porrada... professora eu tenho um apelido de 
Magrão Holiday dos meus 10 ou 11 anos... até eu acostumar com esse 
apelido eu briguei... o menino que colocou esse apelido em mim eu briguei 
com ele umas quase cem vezes... até que um dia eu desisti... então... até que 
eu desisti e tive que aceitar... 
A20: ahhh... eu brigaria... né? com certeza... 
A16: eu não brigaria... 
 
114 
 
A12: eu procuraria sempre defender a minha mãe... mesmo por ela ser 
defeituosa com esses problemas que ela deu... mas eu procuraria sempre 
defendê-la... brigaria também... 
A5: também brigaria... 
A8: defenderia... 
A13: eu iria encher de tapa... 
P: alguém já passou por algo semelhante ou presenciou? de Bullying... é 
isso? ele já relatou né... que sofreu Bullying devido à altura etc. e tal... 
A9: eu também... Maria Palito... Olívia Palito... eu tinha uma pinta no nariz 
que era bem no meio e era a bruxa... então assim... eu já sofri muito... 
A12: inclusive um colega meu que estava me xingando levou até uma 
advertência... me xingava de gari de jipe... de dinossauro e eu não gostava... 
e eu cheguei pro meu chefe e contei a história pra ele... aí ele chamou nós 
dois e conversamos e aí depois ele continuou chamando... aí meu chefe 
pegou e deu uma advertência nele... foi no ambiente de trabalho... 
P: mais alguém já vivenciou ou viu? A1? 
A1: eu não... se isso acontecer eu vou pra cima... eu mato... 
A16: tem um punhado de surdo aqui... vai ver sofreu e nem escutou... 
(Trecho da gravação do dia 30 de abril de 2019). 
 
Os relatos dos/as participantes A15, A9 e A12 mostraram que houve uma aproximação 
da história lida à uma situação vivida: o personagem Antonico sofreu Bullying dentro e fora da 
escola e esses/as participantes também relataram apelidos que os/as incomodavam. A12 relatou 
um caso vivido no ambiente de trabalho e, que embora tenha sido um incômodo, foi resolvido 
com a participação do chefe de trabalho. Entretanto, no ambiente escolar, muitas vezes o 
problema nem chega até um adulto, quer seja na escola ou em casa e, como na história, pode 
levar à evasão escolar do/a agredido/a. Ao serem colocados numa situação hipotética, no lugar 
do personagem Antonico, foram unânimes em dizer que resolveriam o problema do Bullying 
com algum tipo de violência. O Bullying, a partir de 2018 passou a ser um tema previsto em lei 
para ser trabalhado nas escolas, a Lei antibullying 13.663/18. Trata-se de um problema antigo e 
atual longe de ser resolvido e retratado na literatura, como no caso desse conto.  
No ambiente escolar, o Bullying ocorre em diversas situações e modalidades de ensino, 
não sendo diferente na EJA. A leitura desse conto e a interpretação, levantando essa temática 
foi um momento importante, pois ao frequentarem a escola os/as participantes podem tanto 
sofrer como cometer o Bullying, além disso, boa parte deles/as são pais ou mães e até mesmo 
avós (4 deles/as) e podem ajudar os familiares a resolver esse entrave. Apesar dos/as 
participantes dizerem resolver o problema de forma violenta, mostramos eles/as que existem 
hoje em dia maneiras de combater o Bullying, sendo uma delas por meio do diálogo e, em casos 
extremos, denúncia, cujas punições já são previstas no Código Penal. 
 
115 
 
Abordamos, em seguida, sobre o tema deficiência, pois ele se encontra em todo o conto e 
é a razão pela qual a protagonista teve que enfrentar diversos preconceitos, até mesmo de seu 
filho Antonico. Após conversarmos com os/as participantes como o tema pode ser encontrado no 
conto, perguntamos se os/as participantes conheciam histórias semelhantes. Então surgiram os 
seguintes relatos, conforme segue no excerto abaixo: 
 
(39) A15: esse que eu conheço é caolho... rasgou assim de fora a fora... e se vocês 
verem ele trabalhando... vocês ficam de cara... ele faz tudo... ele usa uma 
prótese... só que ele antes de ter a prótese... ele era muito discriminado... pra 
senhora ver... a senhora anda por aquele Parkshopping?... tem uns três... 
quatro anos que ele trabalhava lá... mas antes ele ficava com o buracão no 
olho... um oco... Aí o que acontece... deram um óculos escuro pra tampar... 
isso... pra tampar... como eu tinha muita amizade com ele... ele tirava o 
óculos na minha frente e aí juntaram os amigos e pagaram um olho de vidro... 
na verdade... professora... esse cara foi na mesma situação... atiraram uma 
pedra no olho... hoje graças a Deus ele trabalha na empresa de segurança lá 
no hospital de Brazlândia... e foi uma pedrada que deram nele... 
(Trecho da gravação do dia 30 de abril de 2019). 
 
O relato do/a participante A15 junto à história do conto foi fundamental para perceberem 
que o tema da palestra, deficiência, seria importante, pois além da existência daqueles/as que 
nascem com alguma deficiência, qualquer pessoa ao longo da vida pode se tornar também, em 
caso de doença ou acidente como o caso da caolha.  
 Depois, para que exercitassem a escrita e a pesquisa, e continuarmos com a categoria de 
análise, o vocabulário, solicitamos que se dividissem em grupos com três integrantes, que 
relessem o conto “A caolha” e procurassem os trechos que tratassem sobre:  abandono, 
qualificação para o trabalho, o papel da mulher na sociedade, caridade, solidariedade, conflitos 
familiares e depressão. Cada grupo ficou com um tema. Após realizarem a tarefa, leram as 
respostas para toda a turma: 
 
 
116 
 
FIGURA 17 – Respostas da atividade contendo os trechos dos temas 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
A fim de que a leitura seja facilitada, transcrevemos abaixo os textos da Figura 17: 
Solidariedade: “As quitandeiras, onde iam comprar as goiabas ou as bananas para o lanche, 
aprenderam depressa a denominá-lo como os outros, e, muitas vezes, afastando os pequenos 
que se aglomeravam ao redor delas, diziam, estendendo uma mancheia de araçás, com piedade 
e simpatia: 
– Taí, isso é para o filho da caolha!” 
Conflitos familiares: “Depois começou a desconfiar de outra causa; por fim recebeu uma carta 
em que a bela moreninha confessava consentir em ser sua mulher, se ele se separasse 
completamente da mãe! Vinham explicações confusas, mal alinhavadas.” 
Abandono: “Aos onze anos o Antonico pediu para sair da escola” 
Caridade: “A infeliz mulher contou ao mestre toda a história do filho e suplicou-lhe que não 
deixasse os aprendizes humilhá-lo; que os fizesse terem caridade!” 
O papel da mulher na sociedade: “Morava numa casa pequena, paga pelo filho único, operário 
numa fábrica de alfaiate; ela lavava a roupa para os hospitais e dava conta de todo o serviço 
da casa inclusive cozinha.” 
Depressão: “Quando em criança entrou para a escola pública da freguesia, começaram logo os 
colegas, que o viam ir e vir com a mãe, a chamá-lo – o filho da caolha. 
Aquilo exasperava-o; respondia sempre: 
– Eu tenho nome!” 
Qualificação para o trabalho: “Pediu para entrar numa oficina de marceneiro. Aos dezesseis 
anos, vendo-o mais forte, pediu e obteve-lhe, a caolha, um lugar numa oficina de alfaiate.” 
 
117 
 
Com o intuito de realizar essa atividade, os/as participantes demoraram bastante e 
solicitaram a nossa mediação para explicar como a tarefa deveria ser feita e, antes de 
apresentarem os trechos par a turma, inseguros/as, pediram que lêssemos as respostas. Apesar 
da insegurança, todos os grupos conseguiram identificar os trechos conforme a tarefa exigia. O 
conto possuía todos os temas evidenciados na questão. A cada leitura do tema e da resposta, 
conversamos sobre como os temas podem ocorrer na sociedade, procurando relacioná-los ao 
que vivem.  
Para que os/as participantes evidenciassem como representam e avaliam a sociedade 
perguntamos se casos como a Caolha podem ocorrer atualmente. Puderam escrever no papel e 
em grupos como  podemos observar na Figura 18: 
 
FIGURA 18 – Avaliação da sociedade atual 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Transcrevemos a resposta, pois a imagem aparece muito escura:  
“Sim, é possível, pois vivemos em uma sociedade que ainda é muito preconceituosa e 
julga muito o próximo pela aparência.” 
 
Por esse trecho, os/as participantes avaliam que os preconceitos vividos pelos 
personagens do conto e o preconceito vivido por pessoas com casos semelhantes na sociedade 
são parecidos porque “julgam o próximo pela aparência”. Refletimos e chegamos à conclusão 
que para que esse ciclo seja rompido, é necessário evitarmos apelidos e brincadeiras sobre a 
aparência das pessoas. Partindo dessas reflexões, acreditamos que os temas tratados a partir da 
leitura do conto, transcendem o espaço escolar por meio das discussões e busca refletir sobre 
como se dão as interações sociais e se essas interações são viáveis. 
Embora várias partes da proposta tenham sido feitas até aquele momento oralmente, 
percebemos que eles/as preferem as tarefas escritas. Geralmente demoram mais e escrevem 
tentando inserir as pontuações e obedecer às regras gramaticais que eles/as aprenderam.   
Notamos que houve avanços significativos, pois no início da proposta dificilmente os/as 
participantes se manifestavam concordando e muito menos discordando. E, com o 
 
118 
 
desenvolvimento, estão também tornando-se mais participativos. Essa mudança, além de 
cumprir com os objetivos almejados, também confirma o que defende Cosson (2012, p. 27) 
sobre a leitura ser uma atividade sistemática que deve ocorrer na escola e que, a interpretação 
é solidária, uma prática social em que o sentido do texto só se completa quando “se faz 
passagem de sentidos entre um e outro” e que “a leitura é um concerto de muitas vozes e nunca 
um monólogo”. Assim, o desejo de dizer sobre o texto, vem ocorrendo aos poucos com o uso 
da triangulação das teorias e metodológicas empregadas. 
Solicitamos que, ainda sobre a personagem a caolha, observassem a imagem que estava 
na cópia dos contos lidos, como linguagem não verbal e que corrobora na construção desses 
sentidos sobre a personagem. Colocamos também a imagem no slide para que visualizassem 
em tamanho maior. Conforme pode ser vista na Figura 19: 
 
FIGURA 19 – Imagem do conto “A caolha” 
 
Fonte: Disponível no http://verbumlittera.blogspot.com/2012/11/conto-caolha-de-julia-lopes-de-almeida.html 
 
Depois, pedimos que respondessem por escrito, em grupos de 3 integrantes, algumas 
questões sobre a imagem disponibilizada nas cópias dos contos. Essa atividade interpretativa é 
importante, pois além de dirigir as atenções dos/as participantes para a existência da imagem 
como uma linguagem não verbal que completa a leitura do texto verbal, também possibilita que 
passem a ter o hábito de ler as imagens que cada vez mais fazem parte do cotidiano da 
sociedade.  Essas atividades foram feitas em trios e depois socializadas para todos/as. 
 
 
 
 
 
119 
 
FIGURA 20 – “A caolha” está de acordo com a descrição dada a ela no corpo do texto? 
Justifique. 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Transcrevemos abaixo os textos da Figura 20, para facilitar a leitura: 
“Não. Porque no texto ela era uma mulher muito sofrida pelas pessoas só por causa dos seus 
defeitos.” 
“Não, a caolha está parecendo uma senhora magra de aparência não muito agradável por idade 
e por falta de cuidados talvez por isso e por ser magra e fuma cigarros por julgarem aparência.” 
“Não porque ela não aparenta todo esse sofrimento mas é firme em toda essa descrição dada a 
sua pessoa ela não se ilimita por amor a seu filho.” 
“Não porque o autor descreve uma mulher magra demais. Peito fundo, busto arqueado e na 
imagem que a gente vê não está tão assim.” 
 “Não porque lá no texto fala que o seu olho lacrimeja e na imagem não está mostrando isso.” 
“Não pois no texto o autor descreve uma mulher magra demais. Peito fundo, busto arqueado e 
na imagem que a gente vê, ela não é tá tão assim magra.” 
 
Os/As participantes acharam que a imagem da Caolha não estava de acordo com a 
descrição dela no corpo do texto, conforme pode ser visto em alguns excertos que compõem a 
transcrição dos trechos. Pelas respostas dadas, fica evidente que esperavam uma mulher com 
outras características que a imagem que estava disponível no conto. Essa discordância é vista 
como positiva, uma vez que uma das questões de pesquisa envolvia a capacidade dos/as 
estudantes EJA analisar, discutir e investigar as representações discursivas e identificações dos 
personagens. Assim, nessa imagem não conseguiram estabelecer uma identificação entre o lido 
na imagem com o que estava no texto. Na perspectiva do Letramento Crítico e dos 
Multiletramentos os/as participantes são incentivados a pensar criticamente e, perceber a 
linguagem como forma de socialização de saberes e de instrumento de luta e oposição a valores 
 
120 
 
historicamente construídos. Logo, os trechos transcritos das atividades revelam que os/as 
participantes passaram a defender a personagem até mesmo pela sua aparência “Uma mulher 
magra mas não tanto como no texto e nem é tão estranha como o autor descreve ela.”; “Não 
porque o autor descreve uma mulher magra demais. Peito fundo, busto arqueado e na imagem 
que a gente vê não está tão assim.”; “Não porque lá no texto fala que o seu olho lacrimeja e na 
imagem não está mostrando isso.” Isso revela que durante a leitura, somos facilmente levados 
a gostar ou não de um personagem muito mais pelo seu comportamento do que pelos aspectos 
físicos. Para Rouxel, Rezende e Langlade (2013, p. 27) “Se a identificação constrói e alimenta 
a interioridade do leitor, a consciência que este tem varia segundo uma escala dupla que 
interfere na intensidade e no momento em que a identificação ocorre.”  
 
FIGURA 21 – “Como você lê a imagem?” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Transcrevemos abaixo as respostas da Figura 21, para facilitar a leitura: 
 “Uma mulher de uns 60 ou 65 anos caolha magra de pernas longas e aparência triste.” 
“Uma mulher com suas peles enrugadas mas não parece que ela sofria.” 
“Uma mulher magra mas não tanto como no texto e nem é tão estranha como o autor descreve ela.” 
“Vejo a imagem como a demonstração da face de uma mulher forte, trabalhadeira, mas que sofreu muito 
na vida.” 
“Cabelos pouco escuros, um olho todo branco, pouco magra, um pouco triste.” 
“Uma senhora maltratada.” 
“Como uma mulher bastante sofrida, tudo por amor incondicional ao seu filho ela não revelou a verdade 
que a deixou caolha.” 
 
121 
 
“De uma mulher sofrida pela sua deficiência.” 
“Uma mulher sofrida e trabalhadeira.” 
 
Os/As participantes podem ter se identificado com a protagonista do conto “A caolha” 
por ser uma mulher que vivia em função do filho, educava-o e tentava resolver os problemas 
dele que iam surgindo, mas ainda assim era incapaz de impedir que ele fosse tratado pelos 
outros como “o filho da caolha”. Essa luta e o preconceito à qual tanto a personagem mãe 
quanto o filho sofrem é semelhante aos preconceitos vividos pelos/as estudantes da EJA. 
Segundo Camila Cecílio, da revista Nova Escola, um dos vencedores do Prêmio Educador Nota 
10 de 2018, o professor Mauro da EJA disse que “muitos dos estudantes foram, em algum 
momento da vida, excluídos do processo de ensino, fosse por trabalho, casamento, filhos ou 
outras responsabilidades.” Consideramos que esse seja o perfil dos/as participantes dessa 
proposta. Por isso, sentem-se representados diante da personagem “A caolha”. 
 
FIGURA 22 – “O que mais lhe chama a atenção nessa imagem? Por quê?” 
 
Fonte: Acervo Pessoal. 
 
Transcrevemos abaixo as respostas da Figura 22, para facilitar a leitura: 
 “O olho. Porque os olhos é branco.” 
“O olhar da mulher não pelo fato dela ser caolha, mas pelo sofrimento transmitido no seu olhar.” 
“A aparência triste, porque está triste por situações da vida “provavelmente”, pela situação com 
seu filho.” 
“O olho. Porque o olho não tem as características que tem no texto.” 
“Seu jeito tristonho! Porque ela parece não ter nenhuma expectativa de vida pensando só nos 
defeitos apontados nela.” 
 
122 
 
“Uma mulher nova, mas por ser muito sofrida e envelhecido por trabalhar e seu olho.” 
 “O olho de não estar como no texto cita e ela não parece tão perdido o olho e sim a visão.” 
“Que é uma mulher sem cuidados e abatida.” 
“O que me chama a atenção é por ser uma mulher muito guerreira porque ela trabalha muito 
para sustentar o filho.” 
 
Pelos trechos, notamos que a referência aos olhos foi bastante citada, associando-os à 
tristeza e sofrimento da Caolha. Tal referência está associada à leitura que fizeram do conto, 
interagindo, as ideias do texto e a imagem para essa atividade. Inclusive quando afirmam que 
“O olho. Porque o olho não tem as características que tem no texto” e “O olho de não estar 
como no texto cita e ela não parece tão perdido o olho e sim a visão.” Estão argumentando 
tendo o texto como parâmetro, ou seja, ambos contribuem para a construção crítica discursiva 
dos/as participantes. 
Com o propósito de perceberem que o lido relaciona-se com o vivido e para que 
conseguissem ampliar os conhecimentos sobre os problemas verificados no conto e quais os 
aspectos que se assemelham e se diferenciam na sociedade atual tendo o dizer de outra pessoa 
da comunidade local, orientamos que os/as participantes da proposta a realizassem uma 
pesquisa na comunidade ou cidades-satélites vizinhas sobre as Ongs, escolas e demais 
instituições que dão assistência à pessoa com deficiência, pois esse assunto foi também 
discutido durante a interpretação e a análise do conto “A caolha”. 
Conversamos sobre o que encontraram e se já tinham visitado alguma das instituições 
pesquisadas. 2 participantes disseram que moravam próximos à escola especial da cidade 
satélite, mas que nunca entraram para conhecê-la. Posteriormente, convidamos uma professora 
de escola de Centro de Ensino Especial da comunidade local e também mãe de um jovem autista 
para dar palestra sobre as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiências e relatos 
sobre ser mãe de pessoa com deficiência. Com antecedência, solicitamos, em documento por 
escrito, autorização, à convidada para filmar esse momento para uso de algum trecho na 
produção dos curtas-metragens.  
Destinamos para a palestra 2 aulas de 50 minutos. Antes de dar início, conversamos com 
aos/as participantes sobre a melhor maneira de realizar as perguntas à palestrante. Foi acordado 
que: era necessário levantar-se para ser visto/a por todos/as e principalmente pela palestrante; 
a entonação de voz deveria ser a mais alta possível; deveriam dizer o nome antes de realizar as 
perguntas. Além disso, demos-lhes, outras orientações que foram importantes para o um bom 
encontro com a convidada, tais como: não conversar com os/as colegas durante as falas da 
 
123 
 
palestrante e as perguntas dos/as colegas, manter o celular guardado e silencioso, não sair da 
sala, salvo se realmente necessário. 
 
FIGURA 23 – Palestra realizada com a mãe/professora de pessoa com deficiência 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Os/As participantes receberam os papéis contendo as perguntas e antes de darmos início 
mostraram uns/as aos/às outros/as quais as perguntas que iriam fazer, inclusive alguns/mas 
trocaram entre eles/as esses papéis. Foram realizadas 16 perguntas para a palestrante: 
 
1. Como foi o nascimento do Samuel? 
2. O que passou pela sua cabeça depois da descoberta da Síndrome de seu filho? 
3. Você teve que lidar com preconceitos relacionados ao Samuel? Quais eram ou são mais 
comuns? 
4. Como é a rotina do Samuel? 
5. O que o Samuel te ensinou até aqui? 
6. Você optou em trabalhar numa escola com pessoas com deficiência. Você teria escolhido 
essa opção caso o seu filho fosse “normal”? 
7. Quais são os maiores desafios dos alunos que estudam no CEE1 de Samambaia dentro e 
fora da escola? 
8. O que o aluno aprende no CEE? 
9. Boa parte do público do CEE é pessoa com qual deficiência? 
10. Como são as famílias dos alunos que estudam no CEE? 
11. As mães dos alunos especiais são mais frágeis ou mais fortes no dia a dia? 
12. Quais são os maiores medos das mães dos alunos com deficiência? 
13. O que você acha sobre a inclusão nas escolas? Ela funciona, na sua opinião? 
14. A caolha era uma mulher desamparada naquele tempo pelo estado. Hoje em dia tem 
várias leis que protegem e tornam a vida da pessoa com deficiência mais fácil. Dentre 
essas leis, quais, você acha que são imprescindíveis? 
 
124 
 
15. As vezes a pessoa não nasce com a deficiência, mas torna-se deficiente ao longo da 
vida...No centro de ensino especial isso acontece? A maioria ocorre por quais motivos? 
16. Até que idade uma pessoa com deficiência pode frequentar a escola? E depois o que 
acontece? 
  
Durante o evento, todos/as procuraram atender às orientações iniciais: levantaram-se no 
seu turno de pergunta, deram boa noite à palestrante, diziam o nome e liam em voz alta a 
pergunta. A palestrante fazia questão de repetir o nome do/a participante e interagir com ele/a 
naquele/a momento ou com os/as demais, conforme segue o excerto:  
 
(40) S15: gente... alguém aqui já ouviu falar do autismo? quem aqui já ouviu falar? 
já? alguém aqui conhece alguma pessoa com autismo ou tem um irmão? um 
primo? você conhece? é parente?  
A7: eu cuidei de um que tinha 4 anos...  
S: ahh!...você cuidou né... mais alguém? 
A9: eu conheço um vizinho...é filho da minha vizinha e meu sobrinho está 
com suspeita... 
S:é?... e qual a idade do seu sobrinho? 
A9: ele está com seis anos...  
(Trecho da gravação da palestra do dia 08 de maio de 2019). 
 
Ela contou várias histórias engraçadas do filho autista, situações que ela como mãe teve 
que passar, sobre diversas deficiências e a maneira como a sociedade se comporta diante da 
pessoa com deficiência. Ao final da palestra, solicitamos que os/as participantes avaliassem 
sobre o evento de letramento, conforme segue o excerto: 
 
(41) P: todas as perguntas foram respondidas? vocês gostaram gente? 
T: sim...  
P: gostaram desse bate-papo? 
T: sim... 
P: gostaram desse formato? 
T: sim... 
A20: demais da conta... 
A8: mas eu gostaria de fazer a minha pergunta...  
P: pois então faz que enquanto isso eu só vou ali dizer que vocês vão sair 
daqui uns minutinhos.  
A8: boa noite... meu nome é A8... eu gostaria de saber até que idade uma 
pessoa com deficiência pode frequentar a escola e depois o que acontece?  
S: ah! que pergunta boa. [...] 
A11: eu posso fazer uma visita lá... professora?  
S: pode ir pode... pode sim... gente... vocês muito bem-vindos. 
(Trecho da gravação da palestra do dia 08 de maio de 2019). 
                                                     
15Inicial do nome da palestrante. 
 
125 
 
Avaliamos que a melhor estratégia seria que destinássemos uma ou duas aulas para que 
os/as participantes elaborassem as perguntas que seriam feitas durante a palestra, tendo em vista 
um dos os objetivos que é possibilitar a eles/as o protagonismo. Entretanto, nos vimos 
impossibilitados de estender ainda mais o calendário de aplicação, mas ressaltamos que, 
posteriormente, durante a aplicação da proposta em outras turmas, essa aula deverá ser prevista 
no calendário para melhor atender os objetivos elencados na proposta. 
No outro dia, iniciamos a aula pedindo que avaliassem o momento da palestra e o que 
acharam de todas as perguntas, da participação deles/as e o assunto abordado que foi segundo 
os/as participantes “proveitoso”,” diferente”, “engraçado”, “eu não sabia nada sobre o que ela 
falou, eu aprendi muito”, “eu achei bom porque agora eu posso até ajudar a minha irmã com o 
caso do meu sobrinho”. Além disso, os/as participantes da pesquisa puderam perceber que 
assim como a Caolha, que era deficiente e mãe, tinha força para seguir em frente para criar o 
filho Antonico, na sociedade acontece o mesmo com as mães que têm filhos/as especiais e 
conseguem manter-se firmes para proteger e cuidar deles/as. Pudemos perceber que o lido, ou 
seja, o conto “A caolha”,  e o vivido, representado pelo depoimento dado pela palestrante por 
meio das perguntas realizadas e pelas experiências que os/as participantes relataram durante as 
aulas, puderam ser articulados e que os/as estudantes foram estimulados/as a assumir o 
protagonismo durante a realização das atividades propostas. 
Dando continuidade ao Bloco, iniciamos a segunda fase que tinha como previsão, 3 aulas 
de 50 minutos cada. Os/As participantes da pesquisa foram levados à sala de vídeo para a leitura 
do próximo conto “A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa (ANEXO G). Depois de 
distribuídas as cópias a cada um/a dos/as participantes, ouvimos o áudio de leitura do conto 
disponível na rádio poeta do You tube https://www.youtube.com/watch?v=iB0tIZJydFM 
(tempo de 18 min.06 seg.). Durante a leitura do conto, ouvindo o áudio, os/as participantes 
mostraram-se muito concentrados e bastante receptivos à leitura.  Embora fosse longa, 
permaneceram atentos, conforme se pode ver nas fotos que compõem a Figura 24 a seguir: 
 
FIGURA 24 – Leitura do conto “A terceira margem do rio” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
 
126 
 
Depois, pedimos que assistissem a narrativa visual do conto, disponível em 
https://www.youtube.com/watch?v=ueGgMaGtcUw  - 4min.31 seg.). Em seguida, explicamos 
que eles/as iriam recontar o conto oralmente à medida que íamos pausando as imagens. 
Todos/as conseguiram relatar as partes conforme apareciam as imagens. Como pode ser 
observado na Figura 25: 
 
FIGURA 25 – Sequência de uma narrativa visual 
 
Fonte: Disponível https://www.youtube.com/watch?v=ueGgMaGtcUw 
 
Ao término do vídeo, antes de darmos início às discussões sobre o conto o/a participante 
A5 disse que o conto tinha mexido demais com ele/a por causa do pai que havia morrido no 
final do ano de 2018 e que eles não tinham aproveitado o tempo juntos o suficiente. Os/As 
demais participantes também pareciam emocionados com o relato da/o colega. O/A participante 
A9 disse que também ficou pensando no pai e na mãe porque achava que o conto tinha a ver 
com a história dele/a por ter sido abandonado/a por ele assim que a mãe faleceu. Aproveitamos 
o momento e deixamos que falassem sobre o que acharam da história e se haviam 
compreendido. Seguem os excertos: 
 
(42) A15: eu sou igualzinho esse pai que ficou no rio... só que fui jogado... porque 
quem separou de mim foi ela... ela levou as minhas duas filhas para Águas 
Lindas e eu só posso ver elas quando ela está de bom humor... não tem como 
ouvir essa história e não ficar pensando... professora... 
A11: esse pai só pode ser maluco... sair assim e ficar morando no rio... 
A3: eu acho que ele fez foi morrer no rio e a canoa que ficou vagando... 
(Trecho da gravação da aula do dia 10 de maio de 2019). 
 
Em seguida, o sinal foi dado antes que mais algum/a participante pudesse falar. 
Observamos que o tema do conto para alguns/mas poderia ser difícil, uma vez que boa parte 
parece não ter a convivência com os pais. 
 
127 
 
Na aula seguinte, para a fase de interpretação e análise do conto, apresentamos algumas 
questões, como fizemos com relação ao conto A Caolha, levando em conta os objetivos desta 
fase da sequência básica, o propósito de articulação do lido e do vivido, de análise das 
representações e identificações dos personagens e de relacioná-las a como os alunos se 
representam e se identificam.  
Nós recortamos papéis com as questões e fomos colando-as na lousa, conforme pode ser 
visto na Figura 26, e, à medida que iam sendo respondidas, colávamos a próxima. 
 
FIGURA 26 – Etapa de interpretação e de análise do conto “A terceira margem do rio” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Lembramos a todos/as que os/as participantes estavam fazendo relatos sobre o que 
entenderam da história e davam depoimentos sobre os pais no final da aula anterior e que as 
perguntas de interpretação poderiam dar oportunidade para falarem caso quisessem. Antes das 
questões, o/a participante A12 quis relatar sobre como a história e o narrador-personagem 
mexeram com as emoções dele/a, conforme segue o excerto: 
 
(43) A12: eu senti isso... eu senti muita falta dele... pela distância né? eu senti isso 
aí como se fosse um abandono... eu era criança... eu mais a minha irmã... 
entendeu? então eu senti muita falta dele... eu senti muita falta dele... pela 
distância... né? eu senti isso aí como se fosse uma abandonada...  
(Trecho da aula do dia 17 de maio de 2019). 
 
Essa articulação, feita pelos/as participantes da proposta contempla um dos objetivos da 
pesquisa, pois construíram as representações e as identificações dos personagens, no caso do 
relato de A12, com o narrador-personagem do conto que relata o abandono do pai quando ele 
era ainda criança. A literatura aqui parece cumprir muito mais que uma função de fruição e de 
prazer, mas também funciona como uma ferramenta de resgate de histórias de abandono e de 
 
128 
 
tristezas vivenciadas pelos/as participantes. Esse excerto revela como a separação dos pais é 
conflituosa para os filhos e eles/as, em geral se sentem abandonados/as e incompreendidos/as.  
 Todos/as os personagens da história de Guimarães Rosa acionaram alguma lembrança 
que os/as participantes queriam relatar. Segundo Candido (1995, p. 243) “A literatura confirma 
e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos 
dialeticamente os problemas.” Esses problemas presentes na sociedade e na vida dos 
indivíduos, muitas vezes não são abordados dentro da escola, mas a cada dia tem se tornado 
mais necessário, uma vez que eventos, como a modernidade tardia, alteraram o cotidiano das 
pessoas tendo como uma das consequências a ausência do diálogo. 
Aproveitamos a ocasião para refletirmos sobre a maneira como as famílias rompem os 
laços familiares e, que muitas vezes a ausência do diálogo é um dos motivos para essas 
ocorrências ou o motivo para os filhos crescerem sem saber o que aconteceu para que um dos 
pais se distanciasse deles/as. Solicitamos que relessem os 4 primeiros parágrafos para 
perceberem a ausência do diálogo entre os personagens e que o conto publicado em 1962 traz 
um problema não somente daquela época, mas também de hoje. 
Em seguida, os/as participantes realizaram a interpretação oral do texto lido. Para a 
primeira pergunta que trata sobre o narrador, os/as participantes dizem que é narrado por “um 
mocinho”, “adulto” e que para A15 “Ele vai crescendo junto com a história.” Sobre a linguagem 
da história os/as participantes disseram que perceberam que se tratava de uma linguagem 
diferente. Para A9 “Eu achei mas eu não sei dizer como”.  Para os/as participantes tudo estava 
em ordem na história até que um dia, segundo A15, “Ele inventa uma canoa.” Para A24, a canoa 
era “o motivo” para o desenrolar de todos os outros fatos da história. Em meio à interpretação 
o/a participante A12 levantou a mão, pois queria continuar a sua história, como segue no excerto 
abaixo: 
 
(44) A12: ele largou minha mãe para morar com outra família... e eu era caçula... 
então... eu era muito apegada com ele... a partir do momento que ele se foi... 
aí... eu me senti abandonada... como se... como se ele tivesse me largado 
mesmo... o abandono... porque foi para lá e não voltou mais... não procurou 
mais a gente... quando ele voltou lá para ver a gente eu já estava grande já...  
P: e as relações não foram mais as mesmas?  
A12: não foram... aí depois ele veio ver a gente e voltou para lá também... e 
aí a gente não viu mais ele... no final das contas... ele faleceu... antes dele 
falecer... ele deu uma tuberculose... ele pediu muito para ver a gente antes 
dele morrer... quando ele estava doente... ele queria ver a gente... e como a 
gente ficou... como ele abandonou a gente... todo mundo ficou com raiva... 
ninguém queria procurar ele... por ele ter abandonado a gente... então... ele 
 
129 
 
queria ver a gente antes dele morrer... e acabou que não foi ninguém... ele 
morreu por lá só com a família que ele construiu por lá... entendeu? e 
ninguém foi lá ver ele...  
P: entendi... mais alguém aqui tem separação de pais... história de separação 
de pais? ninguém?  
A8: eu tenho... só que meu pai separou da minha mãe para ficar com a irmã 
da minha mãe... e hoje ela é minha madrasta e minha tia... e meus irmãos são 
irmãos e primos...  
P: e a convivência?  
A8: a convivência? é mais ou menos... eu não gosto da minha tia... minha 
madrasta e quando a gente viaja para lá é um tormento...  
A20: eita! 
A11: meu Deus! 
A8: eu não suporto a minha tia de jeito nenhum... porque ela roubou meu pai 
da minha mãe... ela roubou... ela roubou meu pai da minha mãe... e teve o 
cinismo de espalhar que a minha mãe foi embora com um amante... sendo 
que ela é que era amante do meu pai... e minha mãe descobriu... e ele foi e 
botou ela para fora de casa para ficar com a irmã... e está com ela até hoje! 
A9: esse conto lembra também a minha história... o meu pai morou no Rio... 
minha mãe morreu e meu pai ficou com cinco filhos... com 16 dias meu pai 
deixou eu que era mais nova para morar com minha madrinha... e começou 
a separar os filhos... e com 16 dias o meu pai arrumou outra mulher... então 
foi uma mágoa muito grande que nós carregamos... a minha madrinha ficou 
comigo uns três meses... aí quando fez 3 meses que eu estava com ela... a 
minha avó paterna que é a mãe do meu pai pediu para ele me buscar... nisso... 
meus irmãos já tinham se revoltado com meu pai... e fugiram de casa para 
casa dos tios... aí não deu certo na casa do tio foram pra casa da avó 
materna... aí nós ficou separado... com os quatro mais próximos e eu mais 
distante deles... eu passei a ter contato com eles depois de eu mais velha... 
eu tenho contato com meus irmãos hoje em dia... e meus outros irmãos 
acham que eu tive mais carinho do meu pai por eu ter ficado com a mãe do 
meu pai... por ter contato com a família do meu pai... e eu sempre achei que 
eles tiveram mais carinho com a família da minha mãe... porque eles foram 
criados com a família da minha mãe... sim... somos cinco...  
A12: deixa eu terminar... é outra coisa... meu pai... ele construiu uma família 
com essa mulher e ele teve duas filhas... uma faleceu... e tem outra... que 
essa irmã eu não conheço... meu pai primeiro faleceu... e depois a mãe dela 
veio a falecer... e tem essa irmã que a gente não conhece... que a gente está 
fazendo planos... a gente fala pelo zap... que eu acabei descobrindo... através 
de família mesmo do meu pai... mas a gente não se conhece... aí a gente tá 
fazendo plano de juntar os irmãos por parte de pai para gente ir lá conhecer 
ela... porque a primeira irmã dela faleceu... e ela era caçula... e faleceu meu 
pai e a mãe dela...e ela falava pelo zap que se sentia muito sozinha... e hoje 
não... depois que a gente começou a se chegar... ela sente que não está mais 
sozinha... [...] 
A9: professora... saindo um pouquinho... 
P: pode sair... esteja à vontade... 
A9: eu ouvi na rádio... esses dias... não sei se foi aqui em Brasília... uma 
menina pelo pai... só que eles foram separados porque a mãe morreu... e o 
 
130 
 
pai ficou criando a filha... só que quando tinha o dia das mães não tinha a 
mãe para ir na reunião da festinha da escola... né? não sei se você ouviu... e 
aí... ela falou para o pai que queria que a mãe dela estivesse lá... na festinha 
do dia das mães e ela pediu para ele se vestir como a mãe dela era...  
A15: ah... eu vi no Face book um cara barbudão... não é?  
A9: é... ele pintou a barba de rosa... 
A15: aí o cara se vestiu de vestido e tal e foi na escola...  
A9: eu achei tão assim... emocionante... né...[..] 
A9: e naquela época o que era mais difícil para mim era o dia das mães... foi 
na época da escola... eu achava isso difícil... o pai sugeriu a mãe... a avó... a 
tia e ela não aceitou... ela queria ter ela mesmo na festinha... eu achei muito 
bonito... 
P: muito bonito... né? e muito confuso também... como é que é que a criança 
está lidando com tudo isso? 
A12: eu acho que isso aí pode até confundir a cabeça dela não de verdade... 
né? porque vai estimular como se a mãe estivesse ali viva ...  
(Trecho da gravação da aula de 17 de maio de 2019). 
 
Pelos excertos da participação de A12 notamos que queria muito falar como um 
desabafo a história vivida e que para ele/a se assemelha à história lida e que os sentimentos do 
narrador-personagem de abandono são semelhantes aos dele/a. Pelo seu relato, considera o seu 
pai um traidor de toda a família, além de ausente. Ao final do seu relato percebemos que era 
importante dizer que com o pai não teve como refazer as relações, mas que estavam tentando 
construir outras, após a morte do pai, com os filhos que ele teve após deixar a família. Ao 
analisarmos os relatos desse/a participante, percebemos que se trata de um/a estudante que é 
pouco participativo/a até então durante as aulas e que, queria terminar a sua fala, pois contraria 
o final do conto. Na ficção, no desfecho do conto, não existe chance de recomeçar. Mas para 
A12 esse recomeço estava acontecendo.  
O/A participante A8 revelou ter uma convivência ruim com a madrasta que também é 
tia e que ela “roubou” o pai da mãe. Por meio dessa fala, fica evidente que esse termo é 
comumente utilizado na sociedade e isenta o homem de qualquer culpa. Ou seja, faz parte da 
nossa cultura dizer que a madrasta é má porque roubou o esposo, o pai. Não é à toa, que os 
contos de fadas sempre trazem as madrastas como as vilãs das histórias. Entretanto, no relato 
de A8 ele/a afirmou que o pai expulsou a mãe de casa. Tais discursos são reproduzidos e 
dificilmente quebrados, pois já se consolidaram na sociedade. 
O/A participante A9 inicia o relato dizendo que o conto relembrava a própria história e 
que tem mágoa da atitude do pai por ter arrumado outra esposa logo nos primeiros dias em que 
ficou viúvo e que a partir de então houve vários conflitos na família:  revolta contra o pai, fuga 
 
131 
 
dos irmãos, mudanças para casas de diferentes parentes à procura de um lar, separação dos 
irmãos.  
Pelos trechos do excerto, o conto “A terceira margem do rio” também trouxe à tona 
diversas experiências dos/as participantes, cujos pais também se ausentaram da família e 
constituíram outras, e que se sentiram à vontade para relatar o que viveram e contar outras 
histórias que mostram o quanto a ausência de um dos componentes familiares pode ser sentida 
e que algumas pessoas encontram formas de minimizar o problema, como o caso relatado pelo/a 
participante A9. 
Para o item que tratava sobre os neologismos, foi preciso inicialmente explicar o 
conceito e, a partir daí releram o conto e trouxeram várias palavras desconhecidas que não eram 
necessariamente neologismos. Explicamos sobre as características da escrita de Guimarães e 
fizemos a busca juntamente com os/as participantes quais palavras poderiam ser. Assim, devido 
às demandas da atividade, fizemos duas listas: uma para os neologismos e outra para os termos 
desconhecidos. Para essa atividade, buscamos dicionários que foram usados com bastante 
dificuldade pela turma. Foi necessário explicar para os/as participantes como usar o dicionário 
detalhadamente, por isso pedimos que listassem apenas cinco palavras e que marcassem as 
outras na folha de contos para procurarem no dicionário depois e mostrassem durante outra 
aula. Eles/as buscaram os significados das seguintes listadas: cordura, escrúpulo, alumiado, 
esconso, pojava e dos seguintes neologismos: dever durar, saiu se indo, rio-rio-rio, diluso, rio-
pondo, indaguia. Na qual procuramos explicar que os neologismos de Guimarães geralmente 
eram formulados com junções de palavras já conhecidas. Em seguida, explicamos os 
significados de cada um deles dentro do contexto do texto. 
 Para a questão “Como os rompimentos dentro da família ocorrem hoje em dia e quais 
são as consequências?” seguem trechos do excerto: 
 
(45) A3: quando acontece algum desentendimento por algum motivo e desagrada 
um e o outro... e às vezes a pessoa fica um pouco ressentida... guarda um 
pouco de mágoa... e aí se afasta um pouco... Ah... eu conheço um casal que 
eram casados e era assim perfeito... e quando sem mais sem menos o marido 
dela com uma amante... fala isso até hoje... e ele já não entendeu... mas 
alguma coisa entre eles tinha acabado e ela não percebeu... porque tem que 
perceber quando alguma coisa está errada... 
A15: hoje em dia tem internet... Whatsapp hoje contribui bastante...Tinder... 
Tinder... Whatsapp...  
P: o que é esse tal de Tinder? eu só fui me tocar que existe esse tal do Tinder 
por causa daquela música...  
 
132 
 
A15: é um negócio de relacionamento... só que aquilo lá é uma p..... é uma 
p.... o povo se acha o último do pacote da bolacha...  
A11: você tinha...  
A15: eu tinha Tinder... sim... mas lá tem muita mentira... pode ter mentira... 
eu tirei... eu estava no seu perfil... 
A11: ele está falando que estava no meu perfil... menor de idade não passa 
no Tinder... eu nem tive...  
A15: eu tinha tantos aplicativos desse tipo... olha aí... tá vendo? tô cheio de 
aplicativos de relacionamentos...  eu já tinha outros... eu tirei uns 10... 
A3: isso aí é furada... professora...   
A15: não... eu sou sincero... professora... eu não falo mentira não...  
P:tá certo... tá certo... gente... o rompimento acontece hoje em dia do mesmo 
jeito que antigamente? 
A20: eu acho que sim... professora... hoje em dia está mais complicada as 
coisas... né? qualquer coisinha as pessoas rompem...  
A16: as pessoas não ficam mais tanto tempo casado...  
A9: é verdade e olha que os casamentos eram arrumados... hoje em dia as 
mulheres também são mais independentes em relação ao homem... as 
mulheres eram subordinadas ao homem... hoje em dia as mulheres 
trabalham... 
A15: hoje em dia as mulheres fazem é quebrar o pau... 
A9: eu acho que naquela época não tinha nem amor... 
A13: eu acho que antigamente as mulheres eram mais amorosas... ela fazia 
o que homem queria e era bem tratada... elas gostavam de ficar em casa... 
que quando ela é bem tratada ela é feliz... eu acho...  
A15: acho que antigamente os relacionamentos demoravam acabar 
passavam anos e anos... porque antigamente a mulher se subordinava ao 
homem e o homem tentava fazer o gosto da mulher para ela não se afastar... 
meu pai...10 anos de casamento e a mulher... ele faz o que ela quiser... 
A16: tem nada disso não... cara... eu tive três casamentos e elas é que me 
botaram fora... 
P: eu acho que tem uma complexidade e tem um empoderamento e a 
igualdade de direitos... 
A12: antigamente havia respeito... e hoje quase não existe mais... respeito... 
A9: sei não... sei não... 
A12: a mulher era submissa ao homem... mas tinha respeito... hoje em dia 
tem casal que não se respeita... 
P: mas você concorda que a mulher deve ser submissa ao homem? 
A12: não... não concordo... mas na época era... a mulher era submissa ao 
homem... fazia tudo o que o homem queria pra poder agradar ele... então ela 
era submissa... entendeu...[...]... professora... mas tem muitos que vivem 
assim... tem muitos que vivem... 
A16: na verdade hoje... no final tudo se concentra no respeito... tá 
entendendo? sem respeito... acabou... 
A12: muita gente vive de aparência... respeito que é bom... não tem... 
A9: a minha vizinha... o marido saiu pra comprar cigarro voltou depois de 
15 dias pra casa... aliás... nunca voltou... 
A16: tem uma sobrinha... que ela foi fazer assistência técnica no celular e lá 
a cliente chegou e pegou o zap do marido dela... quando foi com uma semana 
 
133 
 
ele ligou pra ela... começou a cantar ela... tipo “vamos sair, você é muito 
bonita...” pra você ter ideia... quase se separou do marido dela por causa 
disso... então as redes sociais é bom... mas também atrapalha... se o sujeito 
não souber se controlar... aí se enrola... 
A9: é a tentação... né? 
A16: é... 
(Trecho da gravação do dia 17 de maio de 2019). 
 
Por esse excerto percebemos que os/as participantes culpam o uso da internet, das redes 
sociais e sites de relacionamentos para o fim dos relacionamentos de hoje em dia sendo 
considerado por isso, mais complicado mantê-los. O/A participante A9 traz o discurso de 
gêneros para a discussão dizendo que a mulher antigamente era “submissa” ao homem. O que 
contraria as ideias de A12 que defende essa submissão da mulher “daquele tempo”. Ao final, 
todos/as os /as participantes concordam que o que mantém a relação é o respeito entre os casais. 
O que notamos nesse excerto, são os diálogos que ocorreram entre os/as participantes na qual 
opinaram sem medo de julgamentos dos/as colegas. Falaram de si mesmos uns aos outros 
revelando histórias do passado e também sobre como se comportam no presente. 
Para a questão “Sabemos que os atributos aparecem com muita frequência nos contos. 
No trecho “Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho 
e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. 
Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, 
conhecidos nossos. Só quieto. [...]”, quais efeitos de sentido esses atributos constroem tendo 
em vista a representação e a identificação da personagem?” Segue o excerto:  
 
(46) A15: que ele era um cara muito bom... 
(Trecho da gravação da aula do dia 17 de maio de 2019). 
 
Os/As demais acenaram com a cabeça concordando com a fala de A15. Nessa ocasião, 
aproveitamos para conversar sobre o discurso hegemônico presente no conto nos 4 primeiros 
parágrafos e como o uso daqueles atributos contribuíam para mostrar que uma família era 
considerada adequada aos padrões daquela época tendo um pai com aquelas características. 
Batista Junior, Sato e Melo (2018) ressaltam que a hegemonia é a relação de dominação com o 
consentimento e naturalização de práticas sociais. Para romper com essa naturalização 
utilizamos o enredo do conto que, à primeira vista, parece ter personagens cujas vidas eram de 
padrões normais, mas diante de uma leitura mais apurada podemos perceber que naquela 
 
134 
 
família padrão não havia o diálogo e que essa prática era muito comum em meio aos lares 
brasileiros.  
Dando sequência à interpretação, solicitamos aos/às participantes para observar a 
imagem presente no conto que pode ser vista na figura 27: 
 
FIGURA 27 – Imagem do conto “A terceira margem do rio” 
 
Fonte: Disponível em https://vermelho.org.br/2015/08/21/a-terceira-margem-do-rio/ 
 
Para que não ficassem apenas na oralidade, solicitamos que fizessem o registro numa 
folha que continham as perguntas para cada um/a deles/as. Embora fosse individual, os/as 
participantes optaram por discutir entre eles e colocarem as mesmas respostas. Deixamos que 
discutissem e fizessem a atividade assim, pois na ocasião a equipe da direção solicitou uma 
reunião com todos/as os/as professores. 
 
FIGURA 28 – Interpretação da imagem do conto “A terceira margem do rio” 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
 
135 
 
Transcrevemos as perguntas e respostas dos/as participantes a seguir a fim de facilitar a 
leitura: 
 
“16. A imagem do homem do barco, representando o pai do narrador-personagem no rio, está 
consoante com o enredo do conto? Justifique. 
Sim. É um homem solitário na canoa, em um rio! 
17. A imagem é adequada ao texto “A terceira margem do rio”? 
Sim. 
18. Como você lê a imagem? 
Um homem solitário, dentro de uma canoa. 
19. O que mais lhe chama a atenção nessa imagem? Por quê? 
Ele está navegando nas páginas de um livro velho. 
20. Onde é possível encontrar essas pessoas no nosso dia a dia? 
Pescadores a beira do rio, população ribeirinha e índios.” 
 
Percebemos que, ao contrário da impressão que tiveram da imagem no conto “A caolha”, 
os/as participantes concordaram que a imagem presente na “A terceira margem do rio” estava 
de acordo com a história lida. A leitura de “um homem solitário dentro de uma canoa navegando 
nas páginas de um livro velho” permite que os/as participantes construam um cenário literário 
ficcional.  O trabalho com o texto verbal (linguístico) juntamente com o texto não-verbal 
(imagético) estabelecendo entre eles uma relação é importante para que percebam que não 
somente a palavra tem valor, mas também a imagem e que todos esses textos contribuem na 
construção de sentidos.  
Ao final da interpretação, orientamos aos/às participantes da proposta a realizarem uma 
pesquisa na comunidade ou cidades satélites vizinhas sobre as creches, abrigos, conselhos 
tutelares e Ongs que prestam assistência ou cuidam de crianças e adolescentes. Esse tema foi 
escolhido junto aos/as participantes porque o conto “Tchau”, o conto “A caolha” e o conto “A 
terceira margem do rio” possuem personagens crianças que se sentem desamparadas pelos seus 
pais. 
Na aula seguinte, alguns/as participantes trouxeram a pesquisa solicitada impressa e 
outros/as, manuscrito. Conversamos sobre o que encontraram e se já tinham visitado alguma 
delas ou se conheciam o papel do Conselho Tutelar. Alguns/as participantes disseram que 
sabiam onde ficava o prédio do Conselho Tutelar, mas nenhum revelou ter ido ou ter 
necessitado de algum serviço desse órgão. Sobre as creches, um/a dos/as participantes afirmou 
ter trabalhado na cozinha e que era “muito trabalhoso e cansativo” ficando pouco tempo. Um/a 
dos/as participantes mais jovens revelou que frequentou o abrigo “Casa Azul”, apenas em um 
 
136 
 
dos programas sociais que o abrigo oferece gratuitamente, capoeira, e disse que entrou porque 
queria integrar a banda musical do abrigo, mas que não conseguiu a vaga e desistiu.   
Diante do exposto, percebemos que deveríamos convidar alguém que fosse ligado ao 
Conselho Tutelar para sanar as dúvidas e dar depoimentos. Posteriormente, convidamos um 
conselheiro tutelar da comunidade local para dar palestra sobre as leis, o funcionamento do 
Conselho Tutelar dentre outras questões que envolvem a criança, o adolescente e a família.  
Antes do início do evento com o palestrante, seguimos os mesmos procedimentos 
adotados quando da realização da palestra anterior.  
A palestra ocorreu em um dia negociado com os/as professores/as que tinham horário 
na turma pesquisada para uma quinta-feira, dia de coordenação pedagógica dos professores de 
Códigos e Linguagens nas escolas públicas do Distrito Federal. Isso foi feito porque o 
palestrante Lucas não tinha disponibilidade de dia e horários diferentes. Antes de dar início, 
os/as participantes da pesquisa receberam as perguntas e foram orientados/as sobre como 
proceder. Foram realizadas 14 perguntas que vem a seguir: 
 
1. Quais são as atribuições do Conselho Tutelar? 
2. Como é feita a escolha de um Conselheiro Tutelar? São quantos em 
Samambaia? 
3. O que o Conselho Tutelar faz quando recebe a notícia da prática de crime 
contra a criança ou adolescente? 
4. O Conselheiro Tutelar só age mediante denúncia? 
5. A denúncia de maus tratos, violência contra a criança e ao adolescente 
geralmente são feitos por quais meios? 
6. Cabe ao Conselho Tutelar agir diante de uma disputa de guarda da criança, 
cujos pais resistem às visitas enquanto não tem uma decisão judicial? 
 
7. Em que casos há a necessidade de acompanhamento do Conselheiro Tutelar 
durante as visitas de pais ou avós após uma decisão judicial? 
8. Quais são os casos que mais ocorrem em Samambaia em que o Conselho 
Tutelar precisa agir? 
9. Geralmente como as crianças e adolescentes reagem emocionalmente a uma 
intervenção do Conselho Tutelar? Dá para perceber? 
10. O que é feito com a criança e o adolescente quando nenhuma das partes 
responsáveis pela criança tem condições de ficar com ela por motivos de drogas, 
bebidas, espancamentos? 
11. Quais são as maiores dificuldades para a atuação do Conselho Tutelar 
atualmente? 
12. Onde fica o Conselho Tutelar de Samambaia? 
13. No conto “A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa, o narrador 
personagem da história é o filho, que embora já esteja velho, não consegue superar a 
perda do pai. Você acredita que essa história literária pode ocorrer na vida real? Ou seja, 
 
137 
 
uma pessoa estando adulta, pode ficar com problemas emocionais por ter vivido 
separações violentas entre os pais? 
14. No conto “Tchau” que nós lemos da Lygia Bojunga, os pais delegam a uma 
menina de 10 anos a responsabilidade de cuidar do irmão que era apenas um bebê. E a 
mãe vai embora. Casos assim são frequentes em Samambaia? 
 
 O palestrante autorizou a filmagem e a gravação da palestra, assim como assinou o 
documento para exposição de imagem e vídeo, caso viesse a ocorrer.  
 
FIGURA 29 – Palestra com o conselheiro tutelar Lucas 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Os/As participantes aparentemente gostaram mais da palestra do conselheiro tutelar, 
provavelmente porque os temas eram mais próximos do dia a dia deles/as. Notamos que 
ouviram os casos com seriedade e preocupação, uma vez que segundo o palestrante, a cidade 
tem inúmeros casos de ocorrências em quase todas as quadras. Estavam também mais 
confiantes para realizar as perguntas, inclusive dois participantes queriam fazer mais de uma. 
Dessa vez, como os/as participantes teriam outras aulas após a palestra, não tivemos tempo de 
avaliar o encontro como ocorreu com a outra palestra. Solicitamos no final, que um dos/as 
participantes agradecesse em nome da turma, sendo o/a participante A15 quem se 
disponibilizou fazê-lo.  
Como já foi dito, avaliamos que as perguntas devem ser criadas pelos/as participantes 
para que seja garantido a oportunidade de serem protagonistas neste sentido também. 
 
138 
 
Antes de iniciar a terceira fase do bloco, retomamos a palestra para que pudessem avaliar 
e comentar sobre o evento de letramento. Segue o excerto conforme disseram: 
 
(47) A9: é um nervoso assim... parece que trava tudo dentro de você... 
A20: tudo que ele falou é importante... professora. 
A8: eu nem sabia que a gente podia ir lá e eu moro bem pertinho... 
A15: ahh... eu gostei... o cara falou casos ali que tem uns que eu até acho que 
conheço viu... 
A17: eu queria fazer logo era duas perguntas... a professora não deixou... 
(Trecho do áudio do dia 24 de maio de 2019). 
 
Notamos que apenas os/as participantes A9 e A17 falaram sobre o momento de 
participação deles/as. A fala de A9 mostra que estar em evidência diante da turma e de outras 
pessoas, tendo como única voz a sua naquele momento é um desafio, visto que não estão 
acostumados/as com esse tipo de atividade, sendo o centro das atenções e assumindo um 
compromisso em meio a um determinado público. Reportamos mais uma vez a Freire (2005) 
que defende uma educação libertadora que desperte para que os educandos sejam protagonistas 
e saiam da condição de oprimidos. 
Após a avaliação da palestra, entregamos uma cópia do conto “Clínica de repouso” de 
Dalton Trevisan (ANEXO H) para cada participante, dando início a terceira fase à qual puderam 
realizar a leitura oral compartilhada. Dissemos que poderiam seguir com a leitura enquanto 
achassem suficiente, mas que quem estivesse lendo, deveria terminar o parágrafo todo para que 
o/a próximo leitor/a não ficasse confuso/a. Logo após, conversamos sobre o conto. Conforme 
segue o excerto de trechos do diário de registro de campo na Figura 30: 
 
 
139 
 
FIGURA 30 – Registro de Diário de campo 
 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Pelo relato do diário de campo, podemos notar que os/as participantes trouxeram casos 
reais que eles/as conheciam, relacionando o conto com o que vivem: pessoas idosas vivendo 
situações de exploração e abandono. Devido ao número de relatos que eles fizeram e as 
 
140 
 
discussões que foram feitas, decidimos não passar o vídeo que consta na proposta e passamos 
às questões interpretativas. Como estratégia para que todos/as participassem, escrevemos as 
questões em tiras de papéis e distribuímos entre os/as participantes. Durante a leitura da 
questão, alguns/as preferiram ir à frente da turma e outros/as apenas se levantavam, mas 
permaneciam onde estavam. 
Dadas as 8 perguntas iniciais de interpretação: 1.O título do conto está de acordo com a 
história? Por quê? 2.Podemos afirmar que a personagem Dona Candinha foi desrespeitada? 
Justifique. 3.O tratamento que a filha deu à sua mãe, colocando-a no asilo, é diferente do que 
acontece hoje em dia? O que mudou do ano em que foi publicado o conto, 1979, para os dias 
de hoje sobre os idosos? 4. Como é a sua relação com os idosos da família? 5.O que você acha 
sobre os idosos serem deixados em clínicas pelos familiares? 6.Você já visitou uma casa de 
idosos? Se sim, relate como foi. 7.A resistência da Dona Candinha à presença do genro João 
acontece de que maneira nas famílias na vida real? 8.Como a experiência de vida do idoso pode 
ser valorizada pelos familiares? Chamou-nos a atenção, os/as participantes concluírem que é 
bastante comum os maus tratos pelos familiares com os/as idosos/as aproveitando da fragilidade 
que eles/as possuem devido à idade e às doenças. Para eles/as não mudou nada sobre a condição 
dos/as idosos/as do ano de publicação, em 1979, até os dias atuais. Lembramos à turma que 
existe o estatuto do idoso – a Lei nº 10.741, de. 1º de outubro de 2003 – que podemos considerar 
uma conquista e que possibilita uma série de ações, inclusive denúncias pelo telefone disque 
100. Segundo os depoimentos dos/as participantes não deixariam os/as idosos/as de seu vínculo 
familiar irem para uma clínica e que desejam visitar uma casa de atendimento aos idosos, pois 
nenhum/a deles/as nunca foi a nenhuma delas. Ressaltaram ser muito importante ouvir os/as 
idosos/as porque eles/as gostam de relembrar casos passados e que é preciso ter paciência com 
todos/as independente de qualquer coisa. 
Encerramos a aula com a questão 9 parcialmente respondida, ficando as demais para o 
próximo dia letivo. Para os/as participantes a palavra correta na questão 9 não é aceitação, mas 
segundo A15 “Rejeição” “ao sem vergonha do genro, a dona Candinha não gosta do genro”, e 
que a separação entre as personagens, mãe e filha é triste. E que consideram a situação de dona 
Candinha mais triste que os personagens dos outros contos, pois a acham mais frágil como 
podemos perceber no excerto abaixo: 
 
(48) A15: da dona Candinha é mais triste... 
A3: porque sei lá... um filho pegar um pai colocar no asilo... deixar ele lá 
isolado... é muito sofrimento... 
 
141 
 
A16: o pai estava no rio... mas não estava sofrendo... 
A15: o que acontece... os filhos tão vendo o pai pra lá e pra cá dentro do rio 
e a dona Candinha não... 
A3: ela estava sofrendo porque qualquer coisinha era injeção... era castigo... 
era choque... era aquilo... 
A16: isso... qualquer coisa que ela falava era ameaçada... olha o choque... 
olha o choque! 
A15: tem o abandono da dona Candinha... que ela é largada lá no asilo e a 
filha não vai lá pra ver... né... 
A20: nem pra visitar ela vai... 
A15: mas... coitada da bichinha... moça... a bichinha tá presa num troço 
daquele lá... 
A3: ficou sozinha longe da filha... da família... afastada... 
(Trecho da gravação do dia 29 de maio de 2019). 
 
 Podemos observar que o letramento literário ocorre durante diversos momentos em que 
os/as participantes buscam relações entre o conto literário e o mundo que os cerca revivendo 
histórias, memórias e produzindo significações. Cosson (2012, p. 17) ressalta que “na leitura e 
na escritura do texto literário encontramos o senso de nós mesmos e da comunidade a que 
pertencemos.” Isso só é possível se, por meio da mediação do/a professor/a os/as estudantes 
compreenderem que não basta ler um texto, como os contos que apresentamos. É preciso 
também considerá-los como práticas cujos discursos devem ser vistos criticamente.  
Durante o debate das outras questões o/a participante A3 retomou como motivo principal 
para os problemas vividos entre os personagens, a falta de diálogo: 
 
(49) A3: na vida real mesmo... nas famílias... o problema maior é a falta de 
diálogo... o celular... o povo não fica mais para conversar e é cada um nos 
seus quartos trancados... hoje em dia é isso... os filhos batem nos pais... igual 
a gente na nossa casa... não tinha diálogo com nosso pai... mas a gente tinha 
respeito por eles... 
P: tinha diálogo? 
A3: pouco... com minha mãe sim... agora com nossa mãe sim... com o pai 
não... 
A16: com o meu pai nunca tive... 
A3: tem gente que abusa demais... não faz as obrigações de casa... 
(Trecho da gravação da aula do dia 29 de maio de 2019). 
 
 
Observamos no trecho transcrito acima as crenças e os valores do/a participante A3, cuja 
intenção era mostrar qual o melhor jeito para lidar com os conflitos da história lida, notamos 
que embora argumente sobre a necessidade de ter diálogo, ele/a defende que se deve ter o 
respeito, que quer dizer também obediência. Com o objetivo de provocar uma reflexão sobre o 
 
142 
 
que seria o diálogo, perguntamos se ocorria o diálogo entre A3 e os pais ao que ele/a ficou 
pensativo/a e respondeu que pouco e apenas com a mãe. Isso foi para mostrar que não somente 
na história do conto, mas também na sociedade o diálogo não representa a obediência. 
Em seguida, fizemos a seguinte pergunta “O que esses discursos (abandono, solidão, 
constituição familiar, melancolia, depressão, ausência do diálogo) fora do conto querem dizer 
hoje em dia? O capitalismo influencia nesses discursos? Como?” Antes de responderem, 
explicamos o que é o capitalismo. A partir daí, os/as participantes fizeram diversas 
considerações. Segue abaixo a transcrição de um trecho: 
 
(50) A15: porque se você tem... você é alguma coisa... se você não tem... você 
não é nada... na história aí... a mulher tinha... o que a filha fez? pegou o que 
era dela... o cara dizia que era alguma coisa porque tinha o dente de ouro... 
A16: só vale o que tem... tirando isso você não vale mais nada... 
A15: hoje... você vale o que você tem... se você tem um carro... você pode 
estar devendo ele... pode dar busca e apreensão... você vale alguma coisa... 
se você tem um carro velho... você não vale nada... eu tô falando isso... 
porque eu já passei por isso... [...] eu tô dizendo assim professora... hoje... 
nos dias atuais... você vale o que você tem... se você tem um carro do ano... 
pode estar endividado até a alma... você é alguma coisa... ah... aquele cara é 
playboy... aquele cara tem dinheiro pra comprar um carro daquele... mas não 
sabe... que o carro tá com mil e tantas prestações atrasadas... o carro está em 
busca e apreensão... o que acontece... visa muito pelo que você tem... igual 
já aconteceu comigo... eu tinha um carro velho... a pessoa vira e diz assim... 
que diabo... que “disgrama” que você quer com esse carro velho... bota fogo 
nisso aí... vai comprar um carro novo... mas não sabe a condição da pessoa... 
é igual eu falo pra qualquer um...moço... eu prefiro o meu carro velho quitado 
do que eu entrar numa dívida e não dar conta de bancar... [...] 
 (Trecho da gravação da aula do dia 29 de maio de 2019). 
 
Em outra aula, dando continuidade às interpretações, solicitamos que examinassem a 
imagem presente no texto “Clínica de repouso” e que respondessem individualmente em uma 
folha de caderno as questões que escrevemos na lousa.  
 
 
143 
 
FIGURA 31 – Imagem do conto “Clínica de Repouso” 
 
Fonte: Disponível em https://br.depositphotos.com/39954955/stock-photo-old-people-holding-hands-
closeup.html 
 
Como amostra, apresentamos as atividades realizadas pelos/as participantes A16 e A9 
na Figura 32 a seguir (escolhidos por terem maior legibilidade): 
 
FIGURA 32 – Interpretação da imagem do conto “Clínica de repouso” 
  
Fonte: Acervo pessoal. 
 
A fim de facilitar a leitura, transcrevemos a seguir a interpretação que consta na Figura 
32: 
 
 
144 
 
 
 
Pela figura 32, percebemos que se basearam na leitura e interpretação do conto e no 
conhecimento de mundo para lerem as questões e respondê-las.  
Dando sequência, na quarta fase, intitulada “Contexto de produção e constituição do 
gênero conto”, prevíamos 3 aulas. O intuito dessa fase é que os/as participantes conhecessem 
as características, as especificidades e o contexto de produção do gênero conto. Para isso, 
primeiramente dividimos a turma em 3 grupos, solicitamos que estivessem com as cópias dos 
contos à disposição deles para consulta e /ou pesquisa para que pudessem responder a questões 
relacionadas às especificidades do gênero, segundo Bakhtin (2015) e Fairclough (2003): a 
construção composicional (que engloba a superestrutura, os tipos textuais ou os pré-gêneros, 
nos termos de Fairclough, que compõem o gênero, a dimensão, a constituição em verso ou em 
prosa, as linguagens que entram em sua constituição), o conteúdo temático, o estilo, as 
condições de produção (que se relacionam ao que Fairclough discute sobre condições da prática 
discursiva: produção, distribuição e consumo) e a função sociocomunicativa. 
Em seguida, distribuímos as perguntas das análises como no quadro a seguir: 
 
 
 
 
145 
 
QUADRO 5 – Contexto de produção e constituição do gênero 
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO CONSTRUÇÃO COMPOSICIONAL 
1. Quem produziu o conto? O que isso pode 1. O conto apresenta uma superestrutura 
indicar? recorrente: equilíbrio inicial, o conflito e o 
2. Quando ele foi produzido? O que isso pode desfecho? O que isso pode indicar? 
indicar? Pensando nisso responda: 
3.Em qual contexto histórico/literário podemos a. Qual a situação de equilíbrio? 
situá-lo? O que isso pode indicar? b. Qual é o conflito? 
4. Para quem ele foi produzido? O que isso pode c. E, por fim, qual o desfecho? 
indicar? 2. Qual(s) o(s) são o(s) espaço(s) existente(s) na 
5. Onde esse gênero circula? O que isso pode narrativa? 
indicar? 3. Quais pré-gêneros16 constituem o gênero e qual 
6. Qual a função sociocomunicativa desse gênero? é predominante no conto que leu (ex: narração, 
7. A que campo ou esfera social, o conto se vincula dissertação, descrição, exposição). 
(religiosa, científica, literária etc.)?  4. O texto é escrito em prosa ou em verso? 
8. Como essa esfera influencia na constituição do 5. O texto é constituído só pela linguagem verbal? 
gênero conto? 6. O texto pode ser considerado longo? 
 
CONTEÚDO TEMÁTICO ESTILO 
1. Do que trata o texto que vocês leram? 1. Há predominância de qual variedade 
2. Considerando os contos já lidos, o que se espera linguística? 
que seja dito no gênero conto?  2. Há mais frases afirmativas, negativas, 
 interrogativas ou exclamativas? Quais os efeitos 
disso?  
3. Há diálogos? Se sim, qual recurso é usado para 
organizá-los? 
4. Qual tempo verbal predominante e como se 
relaciona aos pré-gêneros que constituem o texto? 
5. Qual linguagem que prevalece no conto? 
Verbal ou não verbal? 
6. Há mais orações simples ou complexas? Como 
isso contribui para a fluidez do texto? 
7. Há mais períodos constituídos por coordenação 
ou por subordinação? Como isso contribui para a 
fluidez do texto? 
8. Quais as principais relações semânticas 
estabelecidas entre as orações (adição, contraste, 
conclusão, explicação, concessão, finalidade 
etc.)? 
9. Há metáforas no texto? Se sim, relacione isso 
às especificidades do gênero.  
10. Há marcas de tempo e de espaço no texto? 
Relacione às especificidades do gênero.  
11. O narrador é personagem ou observador? 
12. Quais os recursos lexicais predominantes no 
conto? 
13. O que predomina mais: o registro formal ou 
informal? 
Fonte: Elaborado pela pesquisadora. 
                                                     
16 O termo pré-gêneros é usado por Fairclough (2003), quando ele trata do nível de abstração na abordagem de 
gêneros. Segundo ele, os pré-gêneros estão em um alto nível de abstração, de modo que não é possível associá-los 
a uma prática social específica. Eles entram na composição de vários gêneros. São exemplos de pré-gêneros: 
narração, dissertação, descrição, exposição, injunção.  Nós podemos ter o pré-gênero narração, por exemplo, 
constituindo o gênero conto, crônica, romance, artigo de opinião, reportagem etc. Nós podemos associá-los do que 
conhecemos como tipo textual.  
 
 
146 
 
As fotos que constituem a Figura 33 ilustram esse momento: 
 
FIGURA 33 – Análises do gênero em grupos 
  
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Nesta tarefa, a mediação da professora foi fundamental, pois exigia leitura das perguntas, 
leitura do conto “A Caolha”, retomada das características do gênero conto que já havíamos 
estudado no bloco 317 e discussão entre os/as integrantes do grupo para a elaboração das 
respostas. Percebemos que todos interagiam para chegar às respostas e, principalmente, 
compreender as questões. O que nos causou surpresa, uma vez que geralmente a turma 
demonstrava apatia diante das primeiras atividades da proposta e, além disso, dificilmente 
estabelecem vínculos afetivos dentro da sala de aula da EJA entre todos/as os estudantes. 
Avaliamos que essa mudança possa ter relação com a confiança que passaram a ter sobre as 
respostas que foram dando diante das questões. Eles/as perceberam que não seriam corrigidos, 
mas ao contrário, o conhecimento de mundo deles/as estava ajudando a construir o 
conhecimento de todos/as. Freire (2002) afirma que a construção do conhecimento pelo sujeito 
se dá por um diálogo permanente entre todos. Isso inclui os/as participantes, o/a professor/a e 
os textos. Para Freire (2002) esse conhecimento precisa ser significativo, ser ampliado, fazer 
sentido e ser libertador. Para que seja possível, o/a professor/a deve assumir a posição de 
ouvinte, de mediador/a e de provocador/a, pois inicialmente, para os/as estudantes da EJA que 
chegam à escola com outras preocupações e prioridades (como a família e o trabalho) quase 
sempre esperam ouvir e não ser ouvidos, preferem apenas copiar e não pensar sobre algo. Por 
isso, concebemos essa mudança como um despertar de sentidos e significados. 
Ao final, percebemos que conseguiram elaborar um texto coeso e esperado com as 
principais questões do gênero contempladas. O resultado segue abaixo nas Figuras 34, 35 e 36: 
 
                                                     
17 O Bloco 3, assim como os demais Blocos da proposta, constam na íntegra, no Caderno Suplementar que 
acompanha esta Dissertação. 
 
147 
 
FIGURA 34 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 1 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Nessa Figura, o grupo discorre em forma de texto sobre as condições de produção (quem 
produziu, quando, para quem), o contexto-histórico da época, sobre a construção 
composicional. 
Levando em conta as dificuldades que a EJA tem com a leitura, a escrita e a 
interpretação, acreditamos que conseguiram desenvolver a análise de maneira bem acima do 
esperado. Isso se deve ao empenho do grupo em ler, reler e discutir com os/as colegas cada 
questão antes de colocar no papel. Outro destaque, foi a maneira como nos consultavam diante 
de alguma dúvida: em outras ocasiões queriam uma resposta e com a tarefa da análise, já com 
a resposta, queriam que confirmássemos ou não o que tinham feito. Essa autoconfiança é 
fundamental para dar segmento às próximas etapas. 
Durante toda a proposta, procuramos mostrar o quanto é importante responder às 
questões aproveitando parte da pergunta para a resposta, tornando-a completa e adequada para 
obter um texto. Pedimos também que pesquisassem nos celulares que eles tinham e com acesso 
à internet para que selecionassem um a dois fatos históricos do ano de produção do conto para 
responder a questão que tratava sobre o contexto histórico. Como consultaram o Google e havia 
 
148 
 
várias informações do ano de 1903 escolheram aquela que se aproximava aos conhecimentos 
prévios: sobre Santos Dumont. 
 
FIGURA 35 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 2 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Percebemos que este grupo, embora tenha discutido juntamente com a professora e entre 
eles/as, encontraram maior dificuldade para elaborar as respostas durante a escrita do texto. 
Várias perguntas não foram respondidas e apenas copiaram as perguntas e em alguns momentos 
se misturam como da linha 27 a 30. Isso pode ter ocorrido porque o grupo deixou um/a dos/as 
componentes do grupo para escrever as respostas e que apresenta maior dificuldade em leitura, 
escrita e interpretação. Avaliamos que poderíamos ter acompanhado não somente as discussões 
do grupo, mas também a escrita para que o texto produzido não ficasse tão confuso. 
 
 
149 
 
FIGURA 36 – Análise das especificidades do gênero conto feita pelo grupo 3 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Para facilitar a leitura da Figura 36 transcrevemos o texto da Figura 36 a seguir: 
 
“A variedade linguística e a formal 
Os recursos usados para organizar os diálogos que ocorrem dentro da narrativa e os 
parágrafos e os travessões, o que prevalece mais é a linguagem verbal xxxx (ilegível) tem uso 
de imagem. 
Sim porque não é notícia e sim uma fábula 
Pertence a literário.” 
 
O grupo responsável pelas questões relacionadas ao estilo era composto pelos/as 
estudantes mais jovens e faltosos. Embora tenham solicitado ajuda à professora, percebemos 
que o grupo queria ir embora, pois estas aulas ocorreram nos dois últimos horários. Durante as 
conversas, os/as participantes da pesquisa sabiam que o gênero era conto, mas, durante o 
registro, escreveram fábula. Posteriormente, pudemos fazer essas observações junto ao grupo.  
Ao final dessa análise, em outro dia, colocamos os textos no slide e distribuímos as 
folhas constando todas as perguntas. Depois, lemos cada questão e as respostas obtidas nos 
textos. Os/As participantes comentaram que com essa análise, foi possível ir além do texto e 
conhecer melhor sobre o gênero conto.  
Em outra aula, continuando os estudos sobre o gênero conto, realizamos em conjunto 
com toda a turma a análise. Para isso, solicitamos que novamente estivessem com os contos e 
com a folha de perguntas para análise à disposição para consulta. Assim, a cada pergunta que 
eles/as prontamente liam e também respondiam, fomos registrando no quadro e cada um 
copiando a sua folha.  Entretanto, ao perceber que estavam mais preocupados em escrever do 
que participar das questões, combinamos que para cada questão que corresponderia a um 
 
150 
 
parágrafo, um /a participante da pesquisa iria escrever em uma folha única. Assim, poderiam 
participar oralmente e na sua vez, escrever o parágrafo. Para essa análise, utilizamos o conto 
“A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa, mas aproveitamos também para mostrar que 
aquelas mesmas questões serviriam para qualquer outro conto, como “Clínica de repouso” e 
“Tchau” e “A cartomante”, pois se tratava de estudo do gênero conto. 
 
FIGURA 37 – Análise das especificidades do gênero conto coletivamente 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Os/As participantes da proposta, sem necessidade de escrever todo o texto do quadro, 
participaram ativamente de todas as questões relacionadas ao gênero.  
Quando terminaram de escrever a análise com discussões sobre o gênero, lemos e em 
seguida nos entregaram o registro copiado da lousa. 
 
 
151 
 
FIGURA 38 – Registro da análise das especificidades do gênero conto 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Com o conto “Clínica de repouso”, fizemos as perguntas coletivamente e oralmente. 
Avaliamos, juntamente com os/as participantes que as questões sobre o gênero foram 
 
152 
 
fundamentais para perceberem que embora cada conto tenha a sua história, há uma série de 
elementos que os aproximam e por isso pertencem ao mesmo gênero. 
Dando prosseguimento às fases, iniciamos a quinta, intitulada “Produção de Roteiro”. 
Dividimos essa fase em três partes: a primeira, consistia na familiarização com o gênero roteiro 
cinematográfico, com previsão de 2 aulas de 50 minutos, com os seguintes objetivos: 
familiarizar os/as estudantes com o gênero roteiro, apresentar as partes de um roteiro e as 
características desse gênero. A segunda parte, a produção de roteiros, com o tempo previsto de 
4 aulas de 50 minutos, com o propósito de produzir curtas-metragens referente aos contos lidos. 
A terceira parte, com o propósito de dividir as funções do roteiro, destinamos uma aula. 
Iniciamos a primeira parte perguntando se existiria algum gênero antes da produção de 
um filme, um curta-metragem, uma novela. Apenas o/a participante A15 disse que existia o 
roteiro. Aproveitando o que ele/a disse, escrevemos a palavra na lousa e perguntamos sobre o 
que seria esse gênero. A9 disse que não tinha nem ideia. Então explicamos que o roteiro é um 
gênero que “planeja” o que irá ocorrer durante as gravações de um filme, de um curta-
metragem, de uma novela, de um desenho animado. E que ele possui elementos e partes que 
são fundamentais para a adaptação do conto que eles iriam produzir. 
Após essas explicações, propomos a exibição de um vídeo que trata sobre roteiro 
(Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=2tGuA7t7jz8 tempo do vídeo 3min.51 
seg.), ele foi baixado para o notebook, mas o áudio não funcionou. Então partimos para uma 
apresentação no Power point criado para essa aula. Com explicações sobre o que é um roteiro, 
quais são as partes do roteiro, qual a sua finalidade etc. 
(https://drive.google.com/file/d/1grViiLF-
LaLjefAa9TLVYxYjePAVRlcR/view?usp=sharing). A explicação não foi extensa, pois a 
professora de Artes já havia dado uma aula sobre esse gênero. 
Como exemplo, entregamos aos/as participantes da pesquisa um modelo de roteiro de 
curta-metragem. Disponível em https://originaconteudo.com.br/arquivos/ta-na-cara-1e2ato.pdf 
Observamos, juntamente com os/as participantes, a maneira como as partes do roteiro são 
colocadas como cena, personagem, ato etc. (9 páginas), discutimos qual/is seria/m o/s melhor/es 
contos para fazer o roteiro. A professora de Artes já estava trabalhando com o conto “A caolha” 
durante as aulas dela para fazerem um roteiro e em seguida produzirem um curta-metragem. 
Segundo a professora, esse foi o conto que a turma escolheu porque gostaram muito do conto. 
A professora também relatou que a turma já havia relatado a história oralmente pra ela e 
estavam na fase de adaptações (segundo a professora, os/as participantes optaram em trazer o 
 
153 
 
personagem Antonico nascendo e tendo a Caolha uma vida normal com o marido) para 
escreverem o roteiro. O momento das explicações e exemplo de roteiro pode ser observado na 
Figura 39. 
 
FIGURA 39 – Explicando o gênero Roteiro 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Dentre os outros contos, apresentamos a sugestão de fazer o roteiro do conto “Tchau” 
de Lygia Bojunga por ser um conto que necessitaria de menos adaptações para fazer o enredo, 
pois já contém as cenas e os diálogos. Os/as participantes gostaram da ideia e aceitaram, pois 
já estavam fazendo durante a aula de Artes diversas adaptações no roteiro do conto “A caolha”. 
Colocamos o conto “Tchau” no Datashow e à medida que reliam o conto, iam sugerindo quais 
as adaptações seriam necessárias. 
Iniciamos a segunda parte na aula seguinte. Para a criação do Roteiro, os/as participantes 
da pesquisa foram conduzidos à sala de coordenação dos professores porque embora o 
Laboratório de Informática estivesse funcionando durante o dia, não conseguimos que 
funcionasse à noite nesse semestre (No semestre anterior tinha um professor responsável pela 
sala). 
A sala de professores tem disponíveis 5 computadores e um Datashow e é pouco 
utilizada pelos/as professores/as durante o noturno. Antes do início da tarefa, explicamos como 
poderiam fazer o roteiro, diretamente nos computadores e divididos em grupos. Para 
compreenderem, utilizamos slides para que visualizassem melhor e fizemos coletivamente as 
primeiras adaptações no conto para que o gênero roteiro fosse criado por eles/as. 
 
 
154 
 
FIGURA 40 – Produção do Roteiro 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Ao começar a fazer o roteiro nos slides, rapidamente os/as participantes perceberam que 
o verbo deveria ser modificado para o tempo presente e que as cenas deveriam ser descritas 
junto aos títulos. Depois, eles/as foram divididos em grupos de 3 ou 4 e cada um desses grupos 
ficou responsável por criar o roteiro de um dos subtítulos do conto “tchau”. Como o conto 
possui 6 subtítulos e eram 5 computadores, disponibilizamos o notebook para dar certo. 
Também criamos uma pasta em cada um dos computadores contendo o arquivo do conto em 
Word para que pudessem abrir e fazer as adaptações. A Figura 41, a seguir, mostra alguns 
momentos da produção do roteiro. 
 
FIGURA 41 – Uso dos computadores para a produção do Roteiro 
 
  
   
   
 
Após 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
155 
 
Antes de serem divididos em grupos, perguntamos quais/as participantes tinham mais 
facilidade com o uso dos computadores. Dessa forma, garantimos que em cada grupo houvesse 
pelo menos um/a integrante com essa facilidade. Percebemos que os/as participantes mais 
jovens ficaram bastante interessados e motivados em realizar a tarefa. E que também, aqueles/as 
participantes que disseram ter facilidade junto aos computadores, apresentaram algumas 
dificuldades com o Word como copiar, colar, deletar, destacar partes etc. Ao final da tarefa, 
afirmaram que gostaram de ter feito o roteiro daquela forma, pois era bem rápido e compararam 
com o que estavam fazendo na aula de Artes que era manuscrito. Disseram que iriam sugerir 
para a professora que fizessem do mesmo jeito com o conto “A caolha”, no computador. 
Após a escrita do roteiro, juntamos todos os arquivos em um só e exibimos no Datashow 
o trabalho final. À medida que iam lendo foram notando alguns erros ortográficos, 
especialmente nos verbos que tiveram que ser adaptados. Na mesma sala de professores, 
imprimimos os roteiros. Os/As participantes levaram as cópias para casa para ler e verificar se 
poderiam apresentar mais alguma sugestão ou se perceberiam algum erro no roteiro. 
Para a terceira parte, com o roteiro em mãos, verificamos juntamente com os/as 
participantes se havia alguma sugestão ou correção. Disseram que não queriam que houvesse 
qualquer alteração. Assim, solicitamos que fizessem as divisões de papéis conforme o roteiro. 
Para isso disponibilizamos as perguntas na lousa: 
 
 Quem serão os personagens? 
 Quem dentre os/as estudantes será o/a diretor/a? 
 Quem dentre os/as estudantes irá filmar a história? 
 Quais os locais da escola serão utilizados de acordo com o roteiro produzido? Esses 
locais deverão ser adaptados? Em caso afirmativo, de que forma? 
 Conforme o roteiro, como os personagens devem estar caracterizados (figurino)? 
 Que objetos devem constar durante a filmagem conforme o roteiro? 
 
Diante das perguntas os/as participantes foram se organizando. Percebemos que apenas 
um dos/as participantes se candidatou para ser um dos personagens. Os demais eram 
“chamados” para exercerem os papéis. Queriam que uma das participantes que não estava 
presente fosse uma das personagens, mas pontuamos que deveriam dividir com quem estava 
presente, pois não haveria tempo de reorganizar os papéis.  
 
156 
 
 A sexta fase, “produção de curta-metragem”, com previsão de 6 aulas de 50 minutos, 
foi dividida em duas partes. A primeira, “familiarização com o gênero audiovisual curta-
metragem” com os objetivos de familiarizar os/as estudantes ao gênero curta-metragem e 
apresentar as características desse gênero. A segunda parte, “produção de curtas-metragens do 
lido e vivido/analisado”, cujo objetivo era produzir curtas-metragens referentes aos contos 
lidos. 
Iniciamos a primeira parte dessa fase perguntando o que os/as participantes sabiam sobre 
curtas-metragens. Os/As participantes A4 e A15 disseram que se tratava de filmes pequenos. 
O/A participante A4 lembrou que havíamos assistido a um curta-metragem no início do ano 
letivo “Meu amigo Nietzsche”. Aproveitamos, então para lembrar porque aquele filme era 
chamado de curta-metragem. A9 disse que poderia ser porque são “curtinhos”. Concluíram 
então, após as explicações da professora, que eram vídeos curtos. 
Em seguida, a turma assistiu a três curtas-metragens animados para se familiarizarem 
com o gênero: “Geris Game”: Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=dMUZf-
Ej6ec , com o tempo do vídeo de 4 min.32 seg.; “A carta”. Disponível em 
https://www.youtube.com/watch?v=MxfGFEwqDtE  , com o tempo do vídeo de 5 min.11 seg.; 
“Um garoto, um videogame, um presente, um cachorro e uma deficiência!” Disponível 
em https://www.youtube.com/watch?v=WWZjICLzKnY , com o tempo do vídeo de 3 min.19 
seg. 
 
FIGURA 42 – Familiarização com o gênero curta-metragem 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Após assistirem ao vídeo, solicitamos que fizessem três grupos, distribuímos folhas A3 
e canetinhas coloridas e solicitamos que respondessem as seguintes perguntas da lousa nas 
folhas que receberam: Os curtas-metragens se assemelham em algum aspecto aos contos lidos? 
Explique. / Quais os recursos semióticos são necessários para a produção desses curtas-
 
157 
 
metragens? (Som, imagem, áudio, roteiro, programa etc.)? / Qual é a função sociocomunicativa 
de um curta-metragem? 
Ao final da tarefa apresentaram as respostas para toda a sala. Concluímos com os/as 
participantes que o curta-metragem pode conter histórias ficcionais, podem ser criados com a 
intenção de informar, como os documentários e que precisam ser curtos (até 30 minutos). 
 Para a segunda parte, que consistia na filmagem do curta-metragem, discutimos sobre 
os espaços da escola necessários para a produção do filme e, alguns participantes levantaram 
um problema que não havíamos considerado: como filmar na escola com tantas pessoas indo e 
vindo e a sequência de ruídos comuns no espaço escolar? Devido a esse fator, resolveram que 
a filmagem deveria acontecer mais cedo. Assim, combinamos com cada participante da 
filmagem, chegar na escola 40 minutos mais cedo. 6 pessoas participaram da produção do curta-
metragem (personagens: mãe, filha, pai; diretor/a; filmador/a; contrarregra). Foram necessários 
3 dias para a filmagem e, verificamos que não somente quem iria filmar chegava cedo, mas 
muitos/as docentes, funcionários/as e estudantes. Dessa forma, os ruídos foram menores que o 
horário normal, mas inevitáveis. Todos os objetos e figurinos descritos no roteiro foram 
providenciados pela professora e organizados pelo/a contrarregra. 
Acreditamos que a parte mais divertida da proposta foram as filmagens para a produção 
dos contos. Nos dias em que chegamos 40 minutos mais cedo, todos/as já estavam no portão à 
espera. Os erros, as repetições de dramatização de cenas e até mesmo a presença de outros/as 
docentes observando o que os/as participantes faziam, tornaram a tarefa muito interessante. 
Essa experiência foi, sem dúvidas, a efetivação do protagonismo, defendido por Freire (2005), 
Rojo (2012), Bakhtin (1992).  
Iniciamos a sétima fase, edição dos vídeos, com a previsão de 2 aulas. O objetivo dessa 
fase era conhecer o programa Wondershare e criar os curtas - metragens. Para desenvolvê-la 
levamos o notebook com o programa instalado e com as filmagens nos arquivos do computador. 
Inicialmente, perguntamos se conheciam algum programa de computador ou aplicativo de 
celular que possibilitava criar curtas-metragens. Diante da negativa, dissemos que procuramos 
e instalamos um programa de computador que seria bem fácil de organizar os vídeos. Em 
seguida, abrimos o programa para que pudessem ver como seria criado o vídeo. Perguntamos 
se algum/a participante queria organizar os vídeos. Prontamente, os/as participantes A4 e A15 
disseram que conseguiriam fazer o vídeo. Para que toda a turma acompanhasse e apresentasse 
sugestões, deixamos o notebook ligado ao Datashow para que todos/as acompanhassem o 
trabalho conforme pode ser visto na Figura 43. 
 
158 
 
FIGURA 43 – Apresentação do programa Filmora Wondeshare 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
A seguir, os/as participantes da pesquisa que pesquisaram sobre o programa A15 e A4 
foram inserindo as imagens, as músicas, o tempo, os efeitos. Para isso, utilizaram o Datashow 
e som da sala, o notebook da professora, pen drive e internet da escola. Foram necessários dois 
horários para essa atividade. Como não tínhamos pensado em uma música para a escolha do 
fundo musical, deixamos que os/as participantes sugerissem. A participante A8 sugeriu a 
música Stand By me mostrando a letra e a tradução contida no caderno, que segundo ele/a foi 
apresentada durante uma aula de inglês do semestre anterior. Assim, abrimos um vídeo que 
continha a música no You tube com a tradução onde os/as participantes ouviram a música com 
a tradução para ver se realmente tinha alguma relação com o curta-metragem. (Disponível em: 
https://www.youtube.com/watch?v=AxCE3lmrBb0 ).  
 
FIGURA 44 – Escolha do fundo musical do curta-metragem 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Todos/as gostaram da música e acharam que deveria compor o fundo musical para o 
curta-metragem. Ao final da produção, resolveram mudar para um som instrumental da mesma 
música, pois o áudio do cantor se misturava às falas dos personagens. 
 
 
159 
 
FIGURA 45 – Produção e edição do curta-metragem 
   
   
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Com o tutorial do programa, os/as participantes conseguiram editar o vídeo rapidamente: 
Passo a passo para usar o programa Wordershare Filmora: 
 
1. Abrir o programa; 
2. Clicar em modo completo; 
3. Clicar em arquivo e a seguir em arquivo, importação de mídia e em importar mídia; 
4. Importar todos os arquivos que serão utilizados para a produção do curta-metragem, inclusive músicas; 
5. Clicar no primeiro arquivo que comporá a sequência do curta-metragem e arrastá-lo até a linha do tempo; 
Visualizar o arquivo, realizar corte se necessário. 
6. Fazer o mesmo processo com todos os outros arquivos; 
7. Incluir músicas na linha do tempo destinada a elas, caso tenham sido planejadas, arrastando-as da mesma 
maneira que fizeram com os vídeos; 
8. Clicar em filtro; 
9.  Clicar em sketch e arrastar em todo a extensão do vídeo para que as imagens virem desenhos; 
10. Caso queiram, clicar em áudio para alterar a voz; 
11. Inserir textos caso tenham planejado; 
12. Clicar em remasterizar para que o vídeo seja produzido com maior rapidez; 
13. Clicar em exportar; 
14. Exportar para um arquivo do computador e pen drive(s); 
15. Exportar para a conta de You tube (pode ser do/da professor/a). 
Importante: 
I. Observar o tempo que não poderá ultrapassar os 15 minutos; 
II. Rodar todo o vídeo antes de exportar observando a qualidade do áudio e das imagens. 
 
Como os/as participantes não tinham conta no you tube sugerimos que a exportação do 
vídeo foi feita na conta do You tube da professora. O vídeo produzido encontra-se disponível 
em https://www.youtube.com/watch?v=km08r1kA9Vk&t=12s.  
Em seguida, demos início à oitava fase, que consistia em preparativos para exibição de 
um festival de curta-metragem, disponibilizamos 2 aulas. Com a intenção de organizar e agilizar 
o tempo disponível, disponibilizamos aos seguintes itens para discutir com a turma: 
 
 
160 
 
 Qual o dia do calendário poderá ocorrer o evento? Verificar a data junto à equipe de Coordenação e 
equipe Gestora. 
ï‚· Em que lugar o evento pode ocorrer? 
 Quais as turmas poderão participar do evento? 
 Quem mais poderá ser convidado/a participar? 
 De que forma o convite pode ser feito? Sugerir que dois ou três estudantes passem nas salas fazendo o 
convite oralmente. 
 Quem poderá confeccionar o convite/folder? (Imagens, dia, local, data e demais elementos gráficos) 
 Até que dia o convite deve estar pronto? 
 Em que lugares o Folder poderá ser fixado? 
 De que forma ocorrerá o evento? Sugerir que confeccionem um percurso pedagógico mostrando por meio 
de cartazes e fotos desde o início da proposta e que já deixem estudantes responsáveis por fixar o percurso 
e organizar o local. 
 Quem falará sobre o que é esse evento no dia do Festival para todas as turmas? 
 Haverá pipoca e refrigerante? Em caso afirmativo, quem ficará responsável por todo o processo inclusive 
distribuição? 
 Quem ficará responsável pelos equipamentos a serem utilizados (pen-drive com o curta-metragem, 
computador, som, Datashow, dentre outros) e exibição dos curtas-metragens. 
 Quem irá entregar e recolher uma folha avaliativa dos curtas-metragens exibidos? 
 Pedir que um/a estudante anote todas as decisões para que possam consultar e manter a organização para 
o dia do Festival. 
 Quem irá cuidar da arrumação do espaço ao final do Festival deixando o ambiente utilizado limpo e 
organizado conforme estava inicialmente? 
 
 
A turma decidiu que o/a participante A20 deveria escrever as decisões no caderno, caso 
fossem necessárias consultas sobre as decisões. Decidimos que a melhor data para o evento de 
letramento seria na última semana de junho, pois culminaria no encerramento do semestre. Ao 
consultarmos a direção, verificamos que o evento não poderia coincidir nem com as datas das 
provas dos/as estudantes do ensino médio e nem no dia da festa junina (25/06), restando apenas 
o dia 26 de junho. Os/As participantes decidiram que deveria participar do evento apenas os/as 
estudantes da EJA inclusive do primeiro segmento. Pelas justificativas, ficaram temerosos com 
o comportamento desses/as estudantes durante o festival e alegaram que não teriam respeito 
pelo trabalho desenvolvido pela turma. Resolvemos deixar dessa forma, pois a sala de vídeo 
comporta apenas 4 turmas e, no caso da participação do Ensino Médio seria necessário mais de 
uma sessão. Nenhum dos /as participantes quis confeccionar o folder, pois acharam o tempo 
curto e disseram não ter computador em casa para criar. Disponibilizamos o computador da 
escola e assim o/a participante A4 com muita insistência dos/as colegas disse que compareceria 
à escola mais cedo para confeccionar. Entretanto, além de não comparecer no horário 
combinado, faltou por 3 dias seguidos. Assim, a professora fez o folder e o percurso pedagógico 
e imprimiu, pois percebeu que a tarefa seria muito difícil para eles/as considerando o pouco 
tempo disponível. Segue abaixo a Figura 46: 
 
 
161 
 
FIGURA 46 – Folder do festival do curta-metragem 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Dessa forma, os/as participantes colaram os folders nos murais da escola e passaram nas 
salas da EJA fazendo o convite para o festival. Além disso, colaram as partes do percurso 
pedagógico organizando-as para o dia do evento. Conforme segue a Figura 47: 
 
FIGURA 47 – Organização do evento  
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Dando continuidade, a nona fase consistia em apresentar o festival de curtas, cujo 
objetivo era dar visibilidade ao curta-metragem produzido, para esse evento estimamos duas 
aulas de 50 minutos. 
Para o dia do evento, os/as participantes da pesquisa ajudaram a organizar a sala onde 
aconteceria a exibição do curta, fixaram os cartazes do percurso que fizeram durante o projeto 
pedagógico, dividiram as tarefas: 3 participantes iriam explicar o percurso, 4 participantes iriam 
distribuir as pipocas e os refrigerantes e o restante cuidaria da arrumação da sala após o evento. 
Colamos nas paredes os papéis contendo fotos e informações sobre a proposta formando um 
percurso pedagógico para que os/as convidado/as compreendessem as etapas antes de 
assistirem o curta-metragem. 
   
      
 
162 
 
 
    
  
   
 
 
 
FIGURA 48 – Exibição do curta-metragem 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
      
   Como a sala estava bastante cheia (67 pessoas – 51 convidados/as e 16 participantes da 
pesquisa) dividimos os visitantes (estudantes das outras turmas em dois grandes grupos). 
Assim, eles/as passavam por um corredor pedagógico que continha todos os passos da 
sequência básica de Cosson (2012) com resumos e fotos e, ao final dele, recebiam as pipocas e 
o refrigerantes comprados pela professora. Assim que o público terminou o percurso, ainda 
explicamos um pouco mais sobre o trabalho realizado e a seguir todos/as os/as presentes 
puderam assistir ao curta-metragem.  
A seguir, distribuímos uma avaliação para todos /as os/as presentes para avaliarem o 
conto assistido (APÊNDICE D) e uma avaliação para os/as participantes da pesquisa 
(APÊNDICE E). O resultado a seguir, foi acomodado em uma tabela que contém a porcentagem 
das avaliações realizadas pelos /as convidados/as ao término do evento: 
 
 
163 
 
TABELA 1 – Avaliação dos/as convidados/as sobre o curta-metragem 
PERGUNTAS ÓTIMO BOM REGULAR 
                                         RESPOSTAS 
 
Qualidade e criatividade da edição (Som) 44% 47% 9% 
Qualidade e criatividade da edição (Imagem) 30% 49% 21% 
Originalidade  44% 50% 6% 
Atuação dos personagens 45% 39% 16% 
Adequação, criatividade das roupas, cenário e 46% 30% 18% 
adereços ao tema proposto 
Fonte: Dados gerados a partir da avaliação dos/as convidados. 
 
Consideramos que a reação do público ao curta-metragem exibido foi positiva, uma vez 
que cerca de 45% avaliou o filme como ótimo para boa parte dos itens, ficando apenas o item 
imagem, com 30%. Talvez o filtro escolhido pelos/as participantes da pesquisa tenha deixado, 
sob o ponto de vista deles/as, a qualidade da imagem ruim e por isso, o público visitante tenha 
avaliado esse item como bom, 49%. 
Para a questão aberta “O que mais chamou a atenção”, 15 convidados/as deixaram em 
branco e os /as demais apresentaram as seguintes respostas no Quadro 6: 
 
QUADRO 6 – Avaliação dos/as convidados/as sobre os curtas-metragens 
 
Fonte: Resultado da avaliação dos/as convidados/as. 
 
 
164 
 
As diversas respostas dadas são relevantes, pois elas apontam que o enredo do curta-
metragem foi compreendido pelo público. Identificamos, dentre as respostas dadas, que foram 
citadas as três partes do curta-metragem: o enredo do conto “Tchau”, trecho da palestra do 
Conselheiro Tutelar, os erros de filmagem ao final. 
Para melhor compreensão, disponibilizamos os resultados em gráficos e, pretendíamos 
mostrar os resultados da pesquisa aos/as participantes, entretanto não houve tempo hábil para 
essa atividade para que pudessem ter uma visão crítica do trabalho que fizeram e ver como os/as 
outros/as colegas avaliaram este trabalho. 
Os/As participantes da pesquisa responderam ao questionário contendo 9 questões 
fechadas e 1 aberta. Dos 16 participantes, 12 entregaram o questionário. Para as respostas, 
elaboramos uma tabela na qual inserimos as perguntas e as respostas em porcentagem. 
 
TABELA 2 – Avaliação dos/as convidados/as sobre o curta-metragem 
PERGUNTAS Ótimo Bom Regular 
                                                           RESPOSTAS 
Técnica de montagem e edição a partir do Wondershare Filmora 75% 25% 0% 
Adequação do curta-metragem ao roteiro criado 67% 33% 0% 
Escolha do fundo musical  83% 17% 0% 
Qualidade e criatividade da edição (Som) 67% 25% 0% 
Qualidade e criatividade da edição (Imagem) 75% 17% 8% 
Originalidade  75% 8% 17% 
Adequação, criatividade das roupas, cenário e adereços ao tema 83% 17% 0% 
proposto 
Atuação dos personagens 83% 17% 0% 
Fonte: Dados gerados pela avaliação do curta-metragem pelos/as participantes da pesquisa. 
 
Para a questão aberta “O que mais chamou a atenção/aprendeu entre a produção do 
roteiro e a produção do curta-metragem”, 2 participantes deixaram em branco e os /as demais 
apresentaram as seguintes respostas: 
 
 
165 
 
QUADRO 7 – Avaliação dos/as participantes sobre os curtas-metragens 
 
Fonte: Acervo pessoal. 
 
Dentre as respostas dadas na questão aberta aos /às participantes da pesquisa, chama a 
atenção aos aspectos considerados por eles importantes como a qualidade, a criatividade. Essas 
palavras positivas dos/as participantes da proposta, ao final do semestre mostram que é 
fundamental ajudar os/as estudantes da EJA a buscar o protagonismo. Quando eles sentem que 
são fundamentais na produção do conhecimento, a autoestima volta a ser resgatada. 
 
3.1.5 Bloco 5 - Avaliação 
 
Para esse Bloco destinamos 1 aula. O propósito desse Bloco foi refletir sobre o que os/as 
participantes aprenderam a partir das aulas sobre os contos, sobre a produção de roteiros e 
curtas-metragens e conduzi-los/as a pensar sobre como os novos conhecimentos foram sendo 
adquiridos. Para isso, realizamos uma entrevista semiestruturada, com cada participante 
individualmente que compareceu às aulas no final do semestre que pode ser observado nos 
trechos dos excertos a seguir: 
 
(51) A12: eu aprendi sobre os contos que eu não sabia... eu não sabia diferenciar 
conto com romance... com essas outras coisas então... eu não entendia... né... 
hoje eu sei diferenciar o que é um conto de um romance pra outras coisas... 
eu aprendi muita coisa sobre o curta-metragem... sobre os roteiros que eu 
também não sabia... sobre a palestra que eu gostei também do Lucas que 
falou sobre o conselho tutelar... porque o Conselho Tutelar tá muito 
importante assim... é uma coisa que está mexendo muito com a gente hoje 
porque as crianças estão sendo vítimas na mão dos adultos hoje que não estão 
sabendo cuidar... então eu gostei dessa palestra... gostei também da palestra 
 
166 
 
daquela menina.. da Sandra falando sobre os autistas que eu não sabia... 
então... muitas coisas que eu não sabia... hoje eu posso dizer que eu sei... sei 
diferenciar uma coisa de outra... 
P: e sobre a leitura e a escrita... você sente que você melhorou em algum 
aspecto? 
A12: a leitura eu melhorei também... eu tenho que ler mais... pra eu melhorar 
a minha leitura eu tenho que ler mais... sobre a escrita... minha letra também 
melhorou bastante... e vamos aprender daqui pra lá... na outra escola a gente 
sabe que vai ter dificuldade... não vai ser fácil... porque nós vamos pegar 
coisas mais difíceis que a gente não tem nem noção do que vai ser e aí a 
gente vai empurrando... seja o que Deus quiser... 
A3: é difícil a gente falar... uma coisa é a gente conhecer... ouvir e aprender... 
outra é saber que existe... mas não saber certinho como... assim... a gente 
aprendeu agora... sobre a Clínica de Repouso, a gente sabe que existe... mas 
não da maneira que a gente estudou um pouco mais... que ficou mais claro 
na nossa mente... todas chamaram atenção... mas sobre aquela do Lucas... 
sobre a criança... aquela do tchau... sobre o casal com a filha... todos eles 
chamaram a atenção... mais um pouco... porque eu ouvia falar sobre o 
Conselho Tutelar... mas tipo assim... que ele falou que trabalha na área... 
essas coisas... me tocou mais... o que envolve as pessoas além das crianças... 
pais inclusive que não têm responsabilidade e as crianças que sofrem nessa 
jogada né... 
A17: então... esse projeto me ajudou muito... até mesmo inclusive pra me 
expressar melhor... na minha entrevista eu me saí muito melhor porque eu 
consegui falar... responder as perguntas com mais certeza do que eu queria 
meus objetivos... então... me ajudou muito... 
A5: pra mim professora ajudou muito... pra eu perder minha timidez... eu 
tinha muita vergonha de ler... eu gaguejava e aqui não... aqui eu aprendi 
muito o que eu tenho que aprender pra mostrar pro meu medo que eu sei ler 
e escrever... então eu tenho que perder esse meu medo e mostrar que eu não 
sou qualquer pessoa... eu tô ali pra aprender com os professores... perder esse 
medo... eu fico com vergonha na hora... mas depois passa... depois eu rio de 
onde eu errei... começo a rir... onde eu sei que eu tô aprendendo... errando 
que a gente aprende... 
P: dos contos algum deles interferiu na sua maneira de pensar? 
A5: em mim... foi o do pai ter abandonado o filho... porque mesmo que o pai 
esteja vivo... ele estava ali do lado e a gente que perde os pais... a gente sente 
muita falta... eu perdi os dois... até hoje eu não aceito ainda... é muito triste 
e a gente sente muita falta dos pais em tudo... quando você está estudando... 
que você chega e fala para ele que passou... é uma alegria imensa... quando 
você começa a trabalhar... você chega e quer contar a novidade... que você 
está voltando a trabalhar... voltando a estudar... conquistando tudo que 
quando a gente era pequena não podia trabalhar ou estudar porque tinha que 
ajudar os pais... depois de casada que a gente tenta terminar os estudos... pra 
mim a maior felicidade é essa... eu mostrar... onde eles estão agora... eles 
estão vendo... que eu voltei a estudar pra eles e voltei a trabalhar também e 
eu pretendo terminar meus estudos e tentar fazer uma enfermagem... alguma 
coisa... porque eu gosto muito de enfermagem... porque eu sempre cuidei 
dos meus pais... meu pai quebrou a perna e fui eu que fiz o curativo... quando 
 
167 
 
minha mãe teve câncer de mama eu que cuidei dos seios dela e quando a 
minha sogra fez uma cirurgia no retro... mais de cinquenta pontos... eu que 
cuidei do curativo também... por isso eu tenho vontade... exatamente... não 
sei... mas as minhas irmãs falam que na hora eu teria coragem porque eu vou 
lembrar-me da minha mãe que eu passei mal e meu pai também passou mal 
na minha frente... mas a gente é ser humano... médico uma hora cai... hora 
levanta... mas eu pretendo com fé em Deus eu pretendo formar em 
enfermagem... exatamente... eu não estudei o ano passado por causa da 
minha mãe... cuidava dela... mas ela sempre falava... volta a estudar e esse 
ano eu voltei a estudar... entrei em depressão por causa deles... mas hoje o 
estudo me ajudou muito... professora... com essa depressão eu ficava só 
dentro de casa... não saía pra lugar nenhum... não comia... quando eu voltei 
a estudar... voltei com outra cabeça e eu sinto falta quando não venho pra 
escola... às vezes... esqueço até os problemas de dentro de casa... volto mais 
feliz pra casa... 
P: qual dessas partes você mais gostou? 
A5: professora... pra falar a verdade eu gostei de todos... não tem nem como 
escolher... eu gostei do começo até o fim... que foi um trabalho pra gente... 
primeira vez que a gente lança um filme... a gente fica assim ansioso na hora 
se alguém vai gostar... se não tem algo errado... alguma coisa... mas foi muito 
bom... não tenho em que reclamar... pra mim foi uma maravilha... gostei 
muito... pra mim todas foram boas... 
A3: do curta-metragem... 
P: e qual o conto que você mais gostou? 
A3: da menina que foi embora... da que tinha filho... dá pra pensar as coisas 
né... tem o conto lá do menino que o pai dele foi embora e tudo mais... 
 
A15: eu acredito que com essa criação do projeto que a senhora propôs pra 
sala... os alunos resolveram se reunir pra poder debater... pra poder fazer a 
criação daquele projeto... porque normalmente o pessoal tem os seus grupos 
e lá fica e quando colocaram o projeto pra todo mundo fazer... todo mundo 
trocou opinião... todo mundo entrou com seu trabalho... com seu esforço e 
pode se ver que o trabalho deu certo... porque ficou um trabalho legal com a 
ajuda de todo mundo... uns ajudaram na edição... outros ajudaram na parte 
da gravação... tudo foi correndo assim e todo mundo foi ajudando porque foi 
legal foi isso... porque se fosse em outras matérias ninguém estava nem 
ligando e ia fazer de qualquer jeito e pronto e acabou... todo mundo se 
empenhou muito pra poder fazer um negócio que valesse a pena e ficou 
muito legal... de vez em quando eu fico rindo quando eu me lembro da 
gravação... eu aprendi bastante coisa... eu aprendi como editar um texto... 
editar o texto pra roteiro... eu não tinha costume de ler contos... leio bastante 
contos... muito boa a leitura... eu gostei mais da parte da apresentação... da 
edição... dos contos que fizemos da edição do roteiro... como depois da 
edição do vídeo montado... gostei bastante da parte que todos os alunos 
entraram em consenso pra ver quais partes foram mais legais pra fazer a 
montagem do curta-metragem... eu gostei muito... eu acredito que melhorei 
bastante porque era muito ruim em Português... vou ser bem sincero... eu 
aprendi bastante como pontuação... como parágrafo... essas coisas assim... 
algumas palavras e os locais corretos dela serem colocadas e assim... 
gostei...foi um aprendizado muito bom com a senhora... com os alunos da 
 
168 
 
sala... foi muito bom... foi um aprendizado muito bom... pelo tempo também 
que eu não estudava... mas gostei bastante... 
A8: olha... ajudou a ver as coisas de modo diferente... eu gostei dos contos 
que eu havia lido que eu participei do grupo aqui com os colegas de classe e 
eu gostei de todos os contos que a gente leu e eu aprendi que como o conto 
da Caolha mesmo... eu aprendi que não existe só no conto... existe também 
na vida real... o conto da Caolha mexeu muito comigo... mas eu gostei de 
todos eles... eu gostei da margem do rio... eu gostei de todas... todas foram 
muito marcantes... muito bom... eu gostei... eu não tenho nem como poder 
escolher um... 
A13 :vamos dizer a escrita... porque melhorou muito... a minha letra... o que 
mais professora... me ajuda aí... ah... sim... até eu falei mesmo pra professora 
né... que com a professora de Artes... ela sempre colocava a gente na frente 
e eu era assim um pouco tímida... mas... depois eu fui me soltando... uma 
vez eu passei até mal... e aí eu fui me soltando... fui pra frente... já fui lendo 
já... mais segura do que eu estava falando... então eu melhorei nesse sentido 
sim... 
A24: ajudou... é importante... livro... é bom a gente aprender coisas novas... 
sempre é bom né... 
A20: muito bom... gostei bastante... aprendi muito... foi muito ótimo... mais 
o texto do “Tchau” que me agradou... mas ficou muito bom... eu adorei 
aquilo ali... achei muito excelente o trabalho da senhora... foi muito bacana... 
e não só eu... professora... minha menina também achou muito bom... 
P: é... ela assistiu?... 
A20: assistiu... ela vai copiar aquele modelo que você fez do livrinho... 
porque ela também é professora... eu tenho minha filha que é professora 
também... ela vai copiar aquele modelo e fazer com os alunos dela... 
P: ah... que legal.. ela é professora onde?... 
A20: na creche da Santa Luzia... você não sabe a creche ali embaixo... ela é 
professora de lá.... teve daquela imagem do rio né... pra mim foi ótimo... eu 
entendi normalmente... pra mim achei legal a forma do conto... é bom porque 
a gente desenvolve mais o estudo... mais a leitura... pra mim foi 
maravilhoso... eu acho que desenvolveu muito... com certeza... a gente só 
aprende lendo né... igual a senhora fala... quanto mais você lê... mais o seu 
desenvolvimento aumenta... então eu achei bacana... achei muito bom 
mesmo... 
(Trecho da gravação da entrevista semiestruturada do dia 28 de junho de 2019). 
 
Conforme os excertos da entrevista, podemos notar o quanto o comportamento e a visão 
das aulas de LP mudaram. Tornaram-se falantes, críticos de si mesmos e conseguem enumerar 
uma série de aprendizados considerando a aplicação da proposta. Esta proposta, com base nos 
pressupostos metodológicos da ADC, voltada para as práticas de multiletramentos e para os 
Letramentos Críticos, proporcionaram aos/às estudantes a apropriação da multiplicidade de 
linguagens e de semioses, os estudantes apropriaram-se de uma multiplicidade de linguagens, 
de modos e de semioses e de multissemioses. Pelos relatos, perceberam que o curta-metragem 
 
169 
 
produzido teve visibilidade e reconheceram que as etapas da sequência Básica de Cosson, 
permitiram esse crescimento. 
 
3.2 Reflexão sobre a pesquisa 
 
Com base nos aportes teóricos e metodológicos dessa pesquisa, a ADC, o Letramento 
Literário, o Letramento Crítico e os Multiletramentos, denominada como triangulação 
metodológica, sistematizadas para contribuir para o ensino de LP destinada à EJA e à 
modalidade de ensino regular do Ensino Fundamental, defendemos que é preciso também haver 
discussão, análise e reflexão para que a educação alcance os níveis de qualidade esperados por 
todos/as os/as profissionais de ensino e a sociedade. 
Tarefa árdua e difícil, se levarmos em conta as condições reais que se encontram as 
escolas públicas do país, como salas lotadas, equipamentos sucateados e/ou obsoletos, falta de 
materiais pedagógicos, professores sobrecarregados, desvalorizados e sem a formação 
continuada, dentre outros tantos problemas que interferem no ensino e aprendizagem dos/as 
estudantes. Esse panorama adverso não impede que diversos professores, como mediadores do 
saber, fomentem um ensino voltado para as práticas sociais e provoquem reflexões críticas junto 
aos/às estudantes, de maneira que se sintam capazes de mudar a própria história. 
Para tanto, é imprescindível que o/a professor/a desenvolva estratégias pautadas em 
conhecimentos teóricos e metodológicos que visem a elaboração de um material didático que 
considere os multiletramentos, o letramento crítico, procurando intervir na sala de aula para o 
alcance dos objetivos. 
Essas metodologias sistematizadas permitiram que alcançássemos os objetivos geral e 
específicos da pesquisa apresentada, e consequentemente, os resultados esperados. O Profletras, 
Mestrado Profissional em Letras, além de indicar os meios adequados para desenvolver as 
propostas didáticas, também qualifica e instrumentaliza os/as mestrandos durante o curso para 
que possam inovar as práticas de ensino durante as aulas de LP no ensino fundamental. 
Elaborar e aplicar a proposta, coletar, analisar e refletir os dados obtidos é uma 
responsabilidade complexa, pois o/a professor/a acumula concomitantemente o exercício da 
prática docente e a pesquisa, gerando sobrecargas que dificultam aplicação e análise dessas 
propostas de intervenção. 
Diante dessas reflexões, consoante à pesquisa e à proposta desenvolvida nesta 
dissertação, identificamos um problema social com características semióticas e criamos 
 
170 
 
estratégias pedagógicas, seguindo o arcabouço teórico, que conduzisse os/as participantes da 
pesquisa a um comportamento social que prima pelo diálogo e pela criticidade. 
Para tanto, ao percebemos as dificuldades que os/as estudantes encontram no processo 
de leitura e escrita, seguimos a triangulação metodológica, com o propósito de examinar os 
empecilhos e reduzi-los. Como visto, estudamos sobre o problema, sobre o público EJA, a atual 
conjuntura do ensino de LP no Brasil, sobre a ADC, o Letramento Literário, o Letramento 
Crítico, a pedagogia dos Multiletramentos, os gêneros discursivos contos, roteiros e curtas-
metragens, entre outros, que juntos, fundamentaram a elaboração sequência Básica com o 
propósito de amenizar os problemas detectados no que tange à leitura e à escrita. 
A ADC, além de se debruçar sobre as questões linguísticas e de se ocupar das relações 
entre a sociedade e a língua, tornou-se a espinha dorsal de toda a pesquisa e, graças a ela, pelo 
corpus investigado, foi capaz de revelar como ocorrem as relações de poder, como o lido e o 
vivido são transpassados pela cultura e como as representações discursivas e identificações dos 
personagens podem servir para se conhecer melhor. 
Com o exposto, o nosso interesse é que, com a pesquisa realizada, com a nossa 
participação e dos demais participantes, os aprendizes da EJA sejam capazes de atuarem de 
forma crítica, nos mais diversos contextos de interação comunicativa. Além disso, esperamos 
que essa pesquisa, somada a tantas outras desenvolvidas no âmbito do PROFLETRAS, possam 
trazer alguma contribuição social, apontando caminhos que possam ser seguidos, com vistas à 
uma transformação social e formação de indivíduos críticos. Destacamos, também, que esses 
estudos, discussões e reflexões teóricas não cessam por aqui. Cabe aos/às professores/as 
realizarem as adaptações que considerarem pertinentes, de acordo com o contexto e realidade 
escolar vividos, planejando intervenções que possam ser adequadas, a partir da leitura desta 
dissertação e/ou do caderno suplementar.          
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
171 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS  
 
Essa dissertação é fruto de uma construção árdua, de reflexões e de práticas 
pedagógicas que levam em consideração a leitura, o conhecimento dos/as estudantes para a 
produção de sentidos. Os /As participantes, estudantes da EJA puderam tornar-se atores sociais, 
protagonistas de uma proposta que consideramos audaciosa, uma vez que deveriam sair da 
passividade e do “silêncio”, para uma atitude responsiva ativa. Nossa pesquisa questionou como 
uma proposta interventiva, centrada na leitura e na análise linguística e semiótica crítica de 
contos e na produção (escrita e multissemiótica) de diferentes gêneros, poderia contribuir para 
a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica dos 
discentes  da EJA em diversas práticas sociais constituídas por diferentes linguagens, e assim , 
levá-los a estabelecer relações entre o que leem e o que vivem, aproximando-os do texto 
literário, e para a exploração da multissemiose e a integração das   Tecnologias Digitais da 
Informação e Comunicação (TDIC). 
Com base nos estudos realizados, na construção e execução de uma proposta, na geração 
e análise dos dados produzidos, constatamos todo esse conjunto articulado e organizado, 
viabilizou que os/as participantes, alunos da 8ª série da EJA, percebessem-se capazes de ler, de 
interagir e de produzir textos, analisar as representações discursivas e identificações presentes 
nos contos e as relacionarem à maneira como se representam, se identificam e representam o 
mundo. 
A pesquisa reforçou nossa crença de que o uso de Tecnologias Digitais é um forte 
instrumento para o ensino das aulas de Língua Portuguesa, tanto para os momentos de leitura, 
quanto para as produções, como as do roteiro e do curta-metragem. Dessa forma, acreditamos 
que essa sequência básica contribuiu para que, posteriormente, os/as estudantes tivessem uma 
concepção de si mesmos mais positiva, com êxito, como puderam dizer nas suas próprias 
entrevistas.   
Nesse caminho metodológico, contribuímos para a promoção do Letramento Crítico e 
dos multiletramentos, ao aplicarmos essa proposta para o público EJA. Pelo exposto até o 
momento, podemos afirmar que, alcançamos os nossos objetivos, dado que os/as estudantes 
leram e produziram textos, seguindo as convenções de diferentes gêneros, e levaram em conta 
a multissemiose e a integração das tecnologias digitais de forma reflexiva, significativa e crítica, 
considerando o que reza a BNCC. Eles  leram 5 contos da literatura brasileira, analisaram e 
discutiram as representações discursivas e identificações dos personagens neles construídas por 
 
172 
 
meio de recursos linguístico e semióticos; investigaram as representações e identificações de si 
construídas ao longo da aplicação da proposta e relacionaram as representações e as 
identificações dos personagens nos contos, articulando culturas, o lido e o vivido; em diversos 
momentos assumiram o protagonismo produzindo leituras em áudios, roteiro ,curta- metragem, 
festival de curta-metragem. 
Elaboramos e aplicamos uma proposta que buscou os conhecimentos e as experiências 
que os/as estudantes da EJA possuem, respeitando os seus saberes. Dessa forma, os/as 
estudantes demonstraram interesse, durante todas as etapas da aplicação, gerando relações 
intertextuais e interdiscursivas, identificando a si e aos outros, construindo, portanto, novos 
discursos e sentidos. 
Reconhecemos que  enfrentamos algumas dificuldades no decorrer da proposta, como 
equipamentos que não funcionam de uma hora para outra e  outras situações inesperadas que 
interferiram durante a pesquisa, tais como reuniões solicitadas pela direção, paralisações de 
professores/as, reduções de horários, saídas de campo, sem planejamento prévio, e até mesmo 
as saídas dos/as participantes da escola mais cedo .Tudo isso contribuiu para que o calendário 
previsto fosse alterado estendendo até o final do semestre letivo, mas não inviabilizou o 
desenvolvimento de nossa pesquisa.  
Podemos asseverar que, mesmo com tais dificuldades enfrentadas, contribuímos, assim, 
para o desenvolvimento da competência discursiva dos/as participantes. Por conseguinte, ao 
fomentar a leitura, estimulados ao hábito de ler, percebemos que os/as estudantes, no decorrer 
da pesquisa, foram se sentindo mais confiantes, autônomos, críticos e atuantes. Passaram a 
identificar-se com as leituras e foram capazes de estabelecer relações entre o que liame o que 
vivem, conseguiram repensar a vida, com vistas a mudar a própria história.  
Este estudo possibilitou também, aos alunos que estudam na EJA, a oportunidade de 
participarem de práticas sistematizadas de leitura e de escrita, motivados a ler e a escrever de 
maneira atenta, crítica e reflexiva, estabelecendo uma relação com aquilo que lê e aquilo que 
vivencia no cotidiano, observando as marcas linguístico-discursivas presentes no texto 
(materialização do discurso social), as representações, identidades e crenças que são construídas 
e os diferentes modos de significação que atuam na construção de sentidos. Além disso, essa 
pesquisa poderá ajudar aos professores que são regentes em turmas da EJA a reconsiderarem 
novas estratégias de leitura e escrita, para melhoria da educação básica, bem como adotarem o 
uso de novas tecnologias para facilitar a aprendizagem. 
 
173 
 
Considerando o trabalho com o gênero discursivo conto, retomamos o que a BNCC 
(2017, p.138) defende sobre os gêneros literários, à qual destaca o poder humanizador, 
transformador e mobilizador que o texto literário possui, além de garantir a formação de um 
“leitor - fruidor” capaz de se implicar na leitura dos textos e também de desvendar os diversos 
sentidos, além de responder as próprias demandas. Isso pode ser percebido durante as 
interpretações e análises que os/as estudantes fizeram a cada conto lido.  
Refletimos também que para cumprir toda a proposta do caderno Suplementar que 
acompanha esta dissertação, é necessário que o/a docente esteja disposto a tornar-se de fato um 
mediador/ provocador e, mais que isso, um aprendiz. Percebemos que exercer a escuta não é 
uma tarefa fácil, pois, como docentes, estamos acostumados mais em falar durante as aulas do 
que ouvir. Portanto, trata-se de um aprendizado neste sentido. Além do mais, o público EJA 
possui conhecimentos de mundo e experiências de vida que valem a pena serem ouvidos, 
refletidos e registrados.  
Avaliamos também que algumas etapas podem ser adaptadas e organizadas de maneira 
que os/as participantes sintam-se mais autônomos tais como: estimular que eles/as sugiram 
contos que possam ser trabalhados, inclusive contos que ouviram na infância ou aqueles que 
pertencem ao realismo fantástico; para as palestras, os/as participantes podem organizá-las e 
criar as perguntas dirigidas ao/à convidado/a, exercendo mais ainda o protagonismo; e, se 
possível, realizar visitas e/ou pesquisas de campo que possam ter sido despertadas durante a 
leitura dos contos. Percebemos que os/as participantes queriam realizar uma visita em uma casa 
de repouso para idosos/as e na ocasião não foi possível. 
Outro aspecto relevante, é o uso de modalizadores que, muitas vezes inconscientemente 
são usados pelos/as professores/as e que intimidam e coíbem a participação dos/as alunos/as e 
que são comuns no dia a dia escolar, tais como “deixar”, “permitir”, “mandar”, “dar”. Algumas 
vezes, como pesquisadora e professora usamos essas expressões vocabulares demonstrando 
uma atitude autoritária e contrária ao esperado. Isso ocorre porque estamos acostumadas/os, no 
ambiente escolar, a sermos a autoridade dentro da sala de aula e que também não é desejável. 
Visto isso, pela proposta apresentada e realizada, devemos estar atentas/os ao uso desses 
modalizadores, uma vez que almejamos a participação, a parceria, a autonomia, o protagonismo 
dos/as estudantes. 
Outro desafio, é a produção do gênero acadêmico que possui características bem 
distintas e que está intimamente ligado ao científico. Os/As cursistas do PROFLETRAS são 
professores/as que estão retornando às Universidades, muitas vezes depois de mais de uma 
 
174 
 
década, e por isso, encontram dificuldades para escrever os projetos, as dissertações, as 
propostas, os artigos. Isso ocorre porque a docência torna-se o centro de nossas atividades e 
deixamos de ser pesquisadores após o término da graduação. Ficando o gênero acadêmico 
distante do nosso dia a dia. Somente com a ajuda dos professores orientadores, as leituras das 
obras indicadas, as aulas presenciais de mestrado, a participação em Simpósios, Congressos e 
Seminários, conseguimos superar e concluir a dissertação de mestrado utilizando a linguagem 
adequada, mas ainda com dificuldades.  Dessa forma, concluímos que após a conclusão do 
curso, devemos, além de levar os conhecimentos adquiridos ao longo da nossa formação para 
a sala de aula, continuarmos como pesquisadores/as, participando de formações continuadas, 
fóruns e demais atividades que pertencem a esse universo e praticar a escrita acadêmica 
publicando sempre que possível, por exemplo, artigos. 
Ao término do curso, podemos afirmar que o PROFLETRAS é um programa que nos 
proporcionou: conhecermos diversas teorias e metodologias que poderão fundamentar e 
organizar a nossa prática pedagógica; aprendermos a criar sequências didáticas que irão cumprir 
com os propósitos de ensino alinhados à BNCC; aplicarmos e divulgarmos as propostas 
didáticas disponíveis a qualquer professor da educação básica, nos repositórios das 
Universidades que oferecem o curso PROFLETRAS e portais voltados à educação, dentre 
outros benefícios. 
Acreditamos que os cursistas, desse programa de pós-graduação, ingressam com muitas 
perguntas e angústias sobre o ensino de LP e saem com as respostas suficientes para transformar 
a sua prática docente: qualificados para atuarem na comunidade como professor/a de LP, 
seguros para ajudarem aos colegas da área que não tiveram a mesma oportunidade e cientes que 
devem continuar em busca de caminhos para uma prática comprometida com a leitura e a 
escrita, pois a formação continuada não cessa. O PROFLETRAS é um curso de pós-graduação 
ligado à prática, ao dia a dia do professor e do aluno e alcança diversas esferas sociais. E por 
isso, a cada ano, esse programa deve ser fortalecido e ampliado nas Universidades Públicas do 
país. 
 
 
 
 
 
 
 
175 
 
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APÊNDICES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
186 
 
APÊNDICE A – Questionário – diagnóstico inicial 
 
1. O que você costuma ler durante a semana fora da escola? 
2. O que você costuma ler durante a semana dentro da escola? 
3. Dessas leituras feitas dentro e fora da escola, do que você mais gosta? 
4. Você vê relação entre o que lê nos textos dentro da escola com aquilo que você vive? 
Justifique 
5. Você gosta de ler livros literários? Se sim, lembra-se de algum, cuja história tenha 
ficado marcada em sua memória? Comente sobre isso. 
6. Você considera que a leitura de textos pode ajudá-lo na sua vida? Se sim, como? 
7. Você tem o hábito de falar sobre si mesmo fora da escola? Se sim, o que isso significa 
para você? 
8. Você tem oportunidade de falar de si mesmo na escola? Se sim, como isso acontece e 
qual o significado disso para você? 
9. Você tem o hábito de escrever sobre a sua vida? Se sim, onde escreve? 
10. Você considera que quem lê mais possui maior capacidade de se expressar 
verbalmente? 
11. Para você o que é uma leitura proveitosa? 
12. De que modo a leitura tem ajudado na sua vida? 
13.       Você sabe o que é um conto? Já leu algum? 
14.       Você já leu algum roteiro? 
15.   Você já produziu algum roteiro para a construção de algum filme, documentário ou curta-
metragem? 
16.Você gosta de curta-metragem? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
187 
 
APÊNDICE B – Roteiro de entrevista semiestruturada 
 
1)    O que a sua participação no desenvolvimento da proposta de leitura e de produção de 
textos significou para você e para sua aprendizagem? 
2)   Como a leitura interfere ou interferiu na maneira de você pensar / viver a partir da sua 
participação desse trabalho? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
188 
 
APÊNDICE C – Roteiro criado pelos/as participantes 
 
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL 
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL 
SUBSECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA 
COORDENAÇÃO REGIONAL DE ENSINO DE SAMAMBAIA 
CENTRO DE ENSINO xxxxxxxx 
Diretor: xxxxxxxx                 
Vice-diretora: xxxxxxx 
Supervisor Pedagógico: xxxxxxxxxxx 
Professora Orientadora: Profa. Dra. Maria Aparecida Resende Ottoni 
Professora pesquisadora: Marcela Cristiane da Silva (Língua Portuguesa) 
Parceria: xxxxxxxxxxx (Artes) 
 
 
Adaptação do Conto 
“Tchau” de Lygia Bojunga 
Pelos estudantes da EJA - 8ª série 
 
 
 
 
Roteiro de curta-metragem de ficção 
 
 
DIRETOR: A20 
CÂMERA: A23 
FIGUTINISTA: A8 
 
ELENCO 
MÃE: A24 
REBECA: A1 
PAI: A15 
 
189 
 
Junho de 2019 
CENA 1- O BUQUÊ: PORTA DA CASA DA REBECA- INTERIOR -DIA 
A campainha toca. Rebeca corre pra abrir a porta.  Admira o buquê tão bonito. 
REBECA 
- Mãe! (Gritando) chegou flor pra você. 
 
A Mãe vem correndo da cozinha e pega o buquê. Tem um envelope preso no papel; a Mãe tira 
depressa um cartão lá de dentro, lê. O telefone toca; a Mãe larga tudo e vai atender. 
Rebeca tenta ler o cartão. Mas está escrito em língua estrangeira. Olha pra assinatura: 
 
REBECA 
-Nikos. (Lê baixinho) 
 
Bota devagarinho o cartão em cima do envelope; vai chegando disfarçada pra perto do 
telefone, sem tirar o olho da Mãe. Franze a testa: a Mãe estava parecendo nervosa (come as 
unhas). A conversa no telefone acaba. 
A Mãe pega o buquê. 
 
MÃE 
- Coisa linda esse buquê, não é Rebeca? 
 
REBECA 
-É. 
 
MÃE 
- Com esse calor é melhor botar ele logo dentro d'Água. (Vai indo para encher o vaso 
de água na cozinha). Você não quer me ajudar a arrumar o vaso? 
 
Rebeca fica parada. A mãe olha para ela; para também: assim meio abraça com o buquê. 
E durante um tempo as duas ficam se olhando. Rebeca vai indo distraída rumo ao vaso. 
E as duas arrumam as flores devagar, sem falar nada; sem levantar o olho do vaso. 
 
CENA 2- O QUEBRA - CABEÇAS: FINAL DO DIA – INTERIOR 
 
As duas no chão da sala montando um quebra-cabeças em silêncio. 
MÃE 
- Rebeca, eu vou me separar do pai: não tá dando mais pra gente viver junto. 
 
Rebeca fica com a peça do quebra-cabeças no ar olhando assustada para a mãe. 
 
MÃE 
-Neste último ano tudo ficou tão ruim entre o pai e eu. Eu sei que ele sempre teve 
paixão por música, eu já conheci ele assim. Mas desde que o Donatelo nasceu que ele só vive 
às voltas com aquele violino! é só tocar, estudar, compor, ensaiar; ele me deixou sozinha 
demais. (Pega a mão da Rebeca, mas Rebeca tira a mão). 
 
REBECA 
- Sozinha, como? e eu? e o Donatelo? a gente tá sempre junto, não tá? nós três. E 
 
190 
 
quando o pai não tá com a orquestra, ele também tá sempre em casa. Então? nós quatro. 
Sozinha por quê? 
 
MÃE 
- E` que... eu não sei como é que eu te explico direito, mas... ah, Rebeca, eu ando tão 
confusa! –  
 
Aperta a boca e fica olhando para uma peça do quebra-cabeças. Rebeca olhando para a 
mãe. 
A Mãe fica de joelhos, agarra as duas mãos da Rebeca: 
MÃE 
- Eu me apaixonei por um outro homem, Rebeca. Eu estou sentindo por ele uma coisa 
que nunca! nunca eu tinha sentido antes. Quando eu conheci o teu pai eu fui gostando cada 
dia mais um pouco dele, me acostumando, ficando amiga, querendo bem. A gente construiu 
na calma um amor gostoso e foi feliz uma porção de anos. E mesmo quando eu reclamava que 
ele gostava mais da música do que de mim, eu era feliz... 
 
REBECA 
- O pai adora você! você não pode... 
 
MÃE 
-...e mesmo no tempo que o dinheiro era super apertado a gente era feliz... 
 
REBECA 
- Ele gosta de você! ele gosta demais de você. 
 
MÃE 
-...mas este último ano a gente tá sempre discutindo, a gente briga a toda hora. 
 
REBECA 
- Por quê? 
 
MÃE 
- Não sei; quer dizer, eu sei; eu sei mais ou menos, essas coisas a gente nunca sabe 
direito, mas eu sei que eu fui me sentindo sozinha... vazia... vazia de amor. Amor assim... de 
um homem. E claro que isso não tem nada a ver com o amor que eu sinto por você. E pelo 
Donatelo então nem se fala. 
 
REBECA 
- Não se fala por quê? você gosta mais do Donatelo que de mim? 
 
MÃE 
- Não, não, Rebeca! entende: é porque ele é tão pequeno ainda, e você já está ficando 
uma mocinha: então é um amor do mesmo tamanho mas um pouco diferente que eu sinto por 
vocês dois. Mas isso não tem nada a ver com... ah, Rebeca, como é que eu te explico? como é 
que eu te explico a paixão que eu senti por esse homem desde a primeira vez que a gente se 
viu. 
 
191 
 
 
REBECA 
- Ai! não aperta a minha mão assim. 
MÃE 
- Se ele me diz vem te encontrar comigo, mesmo não querendo, eu vou; se ele fala que 
quer me abraçar, mesmo achando que eu não devo, eu deixo; tudo que eu faço de dia, cuidar 
de vocês, da casa, de tudo, eu faço feito dormindo: sempre sonhando com ele; e de noite eu 
fico acordada, só pensando, pensando nele. 
 
REBECA 
- Ai, não... 
 
MÃE 
- Ele diz eu gosto do teu cabelo é solto, eu digo é justo como eu não gosto, e é só ir 
dizendo isso pr'eu já ir soltando o cabelo; ele diz ás 5 horas eu te telefono, eu digo NÃO! eu 
não atendo, e já bem antes das 5 eu to junto do telefone esperando; só de chegar perto dele eu 
fico toda suando, e cada vez que eu fico longe eu só quero é ir pra perto, Rebeca! Rebeca! eu 
tô sem controle de mim mesma, como é que isso foi me acontecer, Rebeca?! Ele me disse que 
vai voltar pra terra dele e me levar junto com ele, eu disse logo eu não vou! sabendo tão bem 
aqui dentro que não querendo, não podendo, não devendo, é só ele me levar que eu vou. 
A Mãe bota de palma pra cima as duas mãos da Rebeca e enterra a cara lá dentro. Ficam 
assim por um tempo. 
 
REBECA 
- Isso é que é paixão? 
- 
A Mãe sacode os ombros. Quietas de novo. 
 
REBECA 
- Como é que... como é que ele se chama? esse cara. 
 
MÃE 
- Nikos. 
 
REBECA 
- Que nome esquisito. 
 
MÃE 
- Ele é grego. 
 
REBECA 
- Grego? e você entende o que ele fala? 
 
MÃE 
- A gente conversa em francês. Rebeca fica olhando o quebra-cabeças e vai 
desmanchando. 
 
192 
 
Suspira. 
 
REBECA 
-E ainda mais essa! com tanto homem no Brasil. 
 
CENA 3 -NO SOFÁ DA SALA: DIA – INTERNO 
 
A Mãe corre pra sala e se joga no sofá chorando. 
Rebeca ouve a Mãe soluçando. Levanta. Olha pro Donatelo na carrinho ao lado: dormindo. 
 
REBECA 
- Que foi?! 
 
A Mãe tapa o choro com a almofada; o corpo fica sacudindo. 
REBECA 
- Mãe, que foi, que foi! 
 
O Pai chega na sala. Rebeca escorrega pro chão e puxa o carrinho de bebê para perto e fica 
meio escondida atrás do sofá. O Pai chega perto e fala com uma voz de raiva, de mágoa: 
 
PAI 
- Você tá chorando por quê? Quem tem que chorar sou eu e não você. Não sou eu que 
tô abandonando a minha família, é você; não sou eu que tô deixando os meus filhos pra lá: É 
você! 
 
A Mãe tira a almofada da cara; a voz sai metade soluço, metade fala: 
 
MÃE 
- Você não tá querendo entender: eu não tô deixando a Rebeca e o Donatelo: um dia 
eu volto pra buscar os dois. 
 
PAI 
- Você vai embora com esse estrangeiro pra viver lá do outro lado do mundo... 
 
MÃE 
- Eu juro que eu volto! 
 
PAI 
-...mas o estrangeiro não quer as crianças, só quer você. 
 
MÃE 
- Eu sei que eu acabo convencendo ele... 
 
PAI 
- E se um dia você convence ele, aí você vem buscar a Rebeca e o Donatelo, não é? 
Lindo! 
 
 
193 
 
MÃE 
- O que que eu posso fazer? ele não quer que eu leve as crianças agora. 
 
PAI 
- ELE NÃO QUER(Gritando)!! Então ele agora manda em você. Ele é um deus que 
desceu do Olimpo pra dizer o que ele quer e o que ele não quer que você faça. 
Pois eu também não quero, viu? eu não quero o que você quer. E você vai ter que 
escolher: ou fica ou leva as crianças com você agora. 
 
MÃE 
- Mas eu não... 
 
PAI 
- Se você não leva elas agora, eu não deixo você levar nunca mais. Abandono do lar, 
da família, de tudo: a lei vai estar do meu lado. Então você escolhe: ou ele ou as crianças. 
 
CENA 4: NA MESA DO BOTEQUIM:  DIA- INTERIOR 
 
Rebeca com um Todinho e vem tomando ele pela rua. Para em frente do botequim da esquina 
e fala sozinha: 
REBECA 
-Ué é meu pai? Ela entra. Oi, pai. 
 
O Pai levanta cara do copo e olhou pra Rebeca feito custando pra lembrar quem é que 
ela era(bêbado) 
 
PAI. 
- Oôôooooo filhinha, o que que você tá fazendo por aqui? 
REBECA 
- Eu, nada, e você? 
PAI 
- Nada. 
O sorvete pinga na mesa. O Pai fica olhando triste pro pingo. (Bêbado) 
 
Rebeca senta. O Pai bebe enquanto Rebeca toma o sorvete. O Pai suspira. 
 
PAI 
A tua mãe não gosta mais de mim. 
 
Rebeca olha pra mesa: cheia de copo vazio.  
 
PAI 
E eu gosto tanto dela! Agora então que ela vai me deixar parece até que eu gosto mais. 
Duvido que esse gringo goste dela do jeito que eu gosto. Nem metade, aposto. Nem 
metade da metade da me... Fica olhando pra Rebeca. 
REBECA 
Que que você tá me olhando assim, pai? parece até que você nunca me viu. 
 
194 
 
 
PAI 
Como você se parece  com ela! Tudo. A boca, o cabelo, o jeito de olhar. E agora que eu to 
percebendo: o teu nariz também é igualzinho ao dela, até um pouco de sarda na ponta ele tem; 
engraçado, eu ainda não tinha reparado.  Debruça  mais na mesa pra olhar pro nariz da 
Rebeca, derruba um copo no caminho; desiste. 
 
Rebeca debruça também: 
 
REBECA 
Eu vou pedir pra mãe não ir. Eu vou pedir tão forte, que ela não vai, você vai ver. O 
Pai fecha o olho. 
PAI 
Eu queria que o tempo já tivesse passado e que eu já tivesse me esquecido dela. 
 
REBECA 
Eu vou pedir pra ela não ir embora; deixa comigo, pai. 
PAI 
Eu queria que você e o Donatelo já fossem grandes. O que que eu vou fazer com vocês 
dois? me diz, me diz! Eu não tenho jeito com criança. 
REBECA 
Eu vou pedir. 
PAI 
O que que eu faço com vocês dois, Rebeca? 
REBECA 
Deixa comigo, pai, eu te prometo que eu não deixo a mãe dizer tchau pra gente. 
PAI 
Promete? 
REBECA 
Prometo. E agora para de beber, tá? 
 
PAI 
-Tá. 
CENA 5 :A MALA: INTERNO - DIA 
 
Rebeca olha pra mala da mãe já quase pronta pra fechar. 
Senta ao lado da mala. 
Pega uma folha e um barco. 
Vai riscando no papel com força, o lápis pra cá e pra lá cada vez com mais força, tlá! a 
ponta quebra. 
Fica olhando a mãe ir pra lá e pra cá arrumando a mala. 
Quando a mãe sai corre na ponta do pé pra espiar, ah! a mala já está fechada no chão. 
Pronta pra sair. 
A mãe pega o celular e chama um Uber, explicando que era pro aeroporto. 
De rabo de olho vê a Mãe chegar perto do carrinho de bebê de  Donatelo. Ela fica 
olhando ele dormir. Cobre ele melhor do frio com uma manta. Rebeca fica observando. 
Ela coloca o chapéu. 
A Mãe e fica sem se mexer. 
Rebeca fica que nem a Mãe: sem se virar, sem falar, sem perguntar. 
 
195 
 
O tempo passa.  
Até que de repente o Uber chega e a Mãe levanta num pulo de susto. 
Rebeca se vira ao mesmo tempo que a Mãe. E as duas se olham com medo, e a Mãe 
corre e abraça Rebeca com força, bem apertado. 
REBECA 
Ai! Rebeca fecha o olho. 
A Mãe larga a Rebeca, corre pra sala, abre a porta. Mas Rebeca já estava atrás dela; e 
puxou a mala: 
- REBECA 
- Mãe; não vai! eu já te pedi tanto, que eu não ia pedir mais, mas você tá indo mesmo e 
eu tenho que pedir de novo, não vai não vai não vai!! 
 
: 
MÃE 
- Por favor, Rebeca me perdoa, me entende, eu tenho que ir, é mais forte que tudo. Mas 
eu já te prometi: que eu volto. 
REBECA 
- Diz pra ele que você não vai. 
A Mãe pega a mala. Rebeca não larga. 
A Mãe puxa a mala. Rebeca puxa também. 
A Mãe puxa mais forte. Rebeca fica agarrada na mala. 
O Uber buzina de novo. As duas se olham. O olhar da Mãe pedindo por favor. O olhar 
da Rebeca também. 
Mas Rebeca não se solta da mala e vai sendo arrastada no puxão. 
A buzina do Uber de novo, e mais comprido dessa vez. 
A Mãe solta a mala; fecha o olho; aperta a testa com a mão sentindo uma tonteira ou 
uma dor de cabeça muito forte. 
E outra vez a buzina toca. 
A Mãe abre o olho (parece que a tonteira tinha passado) 
MÃE 
- Tchau. E sai correndo. 
 
CENA 6 :O BILHETE: INTERNO –NOITE 
 
 O pai chega e encontra um bilhete em cima da mesa e lê: 
 
 (VOZ DA REBECA) Querido pai 
Não deu para eu cumprir a promessa. A Mãe foi mesmo embora. 
Mas a mala dela ficou. E eu acho que assim, sem mala, sem roupa para trocar, sem 
escova de dente nem nada, não vai dar para a Mãe ficar muito tempo sem voltar. Não sei. Vamos 
ver. Eu arrastei a mala e escondi ela debaixo da sua cama, viu?  
Um beijo da Rebeca. 
 
 FIGURINO   CENÁRIO 
CENA Menina :Roupas de menina e vestido da Celular, Flores, cozinha, jarro 
1 mãe longo 
CENA Menina :Roupas de menina e vestido da Quebra-cabeças, chão da sala 
 
196 
 
2 mãe longo 
CENA Pai (roupa social)  Sofá, almofadas, lápis de cor papel, 
3 Mãe: vestido longo carrinho de bebê    
Filha: vestido floral 
CENA  pai-Blusa xadrez, sandália de couro, Em um bar, mesa, cadeira, cachaça, 
4 calça, violão Rebeca- vestido rosa, copos, dono do botequim, sorvete 
sandália, tiara. 
CENA Mãe: vestido de viagem, blusa de frio, Bolsa, mala, papel, lápis, carrinho 
5 cachecol ou chapéu de bebê , manta 
Filha: vestido ou short e blusa 
CENA Pai: roupa da cena 4  sofá da sala, Carta  
6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
197 
 
APÊNDICE D – Avaliação do curta - metragem 
 
EXIBIÇÃO DO 1 CURTA-METRAGEM DOS ALUNOS DA 8ª SÉRIE –EJA – XXXXX DE SAMAMBAIA 
Nome:_______________________________________________ Data:___/___/____ 
Avaliação do curta-metragem (Assinalar com um x): 
Curta-Metragem: Adaptação do conto “Tchau” de Lygia Bojunga Regular Bom Ótimo 
Qualidade e criatividade da edição (Som)    
Qualidade e criatividade da edição (Imagem)    
Originalidade     
Adequação, criatividade das roupas, cenário e adereços ao tema    
proposto 
Atuação dos personagens    
O que mais chamou a atenção 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
198 
 
APÊNDICE E – Avaliação pelos/as participantes da pesquisa sobre a produção do curta-
metragem 
 
PRODUÇÃO / EXIBIÇÃO DO 1 CURTA-METRAGEM DOS ALUNOS DA 8ª SÉRIE –EJA – XXXXX DE 
SAMAMBAIA 
Nome:_______________________________________________ Data:___/___/____ 
Avaliação dos alunos participantes da montagem e exibição curta-metragem (Assinalar com 
um x): 
Curta-Metragem: Adaptação do conto “Tchau” de Lygia Bojunga Regular Bom Ótimo 
Técnica de montagem e edição a partir do Wondershare Filmora    
Adequação do curta-metragem ao roteiro criado    
Escolha do fundo musical (Stand by me – Trad.:Fique comigo de    
John Lennon)  
Qualidade e criatividade da edição (Som)    
Qualidade e criatividade da edição (Imagem)    
Originalidade     
Adequação, criatividade das roupas, cenário e adereços ao tema    
proposto 
Atuação dos personagens    
O que mais chamou a atenção/ aprendeu entre a produção do roteiro e a produção do curta-
metragem: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
199 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ANEXOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
200 
 
ANEXO A – Termo de consentimento livre e esclarecido para responsável legal por menor de 
18 anos 
  
Considerando a sua condição de responsável legal pelo(a) menor, apresentamos este 
convite e solicitamos o seu consentimento para que ele(a) participe da pesquisa intitulada “Era 
uma vez.... Um conto que virou curta-metragem: uma sequência básica de ensino de gêneros 
pautada na análise de discurso crítica e na pedagogia dos multiletramentos”, sob a 
responsabilidade das pesquisadoras Profa. Dra. Maria Aparecida Resende Ottoni (orientadora) 
e Profa. Especialista Marcela Cristiane da Silva (orientanda). 
Nesta pesquisa nós estamos buscando desenvolver uma proposta de leitura e análise de 
contos e de produção de curtas-metragens. Com isso, objetivamos contribuir para o 
desenvolvimento do gosto pela leitura de textos literários, especialmente dos contos e para o 
desenvolvimento da capacidade dos discentes de interpretar e analisar criticamente os textos 
com os quais têm contato na sociedade, de falar e de escrever sobre si e de perceber relações 
entre o que leem e o que vivem.  
Este Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido, antes da coleta e da 
geração de qualquer dado, pela pesquisadora Prof.ª Especialista Marcela Cristiane da Silva, na 
escola onde os/as alunos/alunas estudam, durante reunião a ser realizada com a pesquisadora 
mestranda e pais e/ou responsáveis pelos menores participantes do estudo. Você disporá do 
tempo que lhe for adequado para a tomada de uma decisão autônoma. 
Na participação do(a) menor sob sua responsabilidade, ele/a fará leituras de contos de 
vários escritores (em material impresso e digital), responderá a algumas questões de 
compreensão e estudo, as quais serão analisadas, participará das discussões em sala de aula e 
no laboratório de Informática sobre os textos lidos. Além disso, responderá a um questionário 
inicial sobre a proposta e participará de uma entrevista. Todo esse material será coletado e 
analisado. Após a transcrição da entrevista, o material será desgravado. 
Em nenhuma fase, nem o(a) menor nem você serão identificados. Os resultados da 
pesquisa serão publicados e ainda assim a identidade dele(a) e a sua serão preservadas. 
Nem ele(a) nem você terão gastos nem ganhos financeiros por participar na pesquisa. 
Os riscos da participação na pesquisa consistem na possibilidade de identificação do/a 
aluno/a e/ou de seu/sua responsável legal e na possibilidade de o/a participante sentir-se 
constrangido ao falar ou escrever sobre si, a partir do estudo dos contos. Para evitar isso, será 
garantido o sigilo quanto à identidade do/a aluno/a e de seu/sua responsável legal e quanto ao 
nome da Instituição onde o/a participante estuda. Além disso, será dada total liberdade aos/às 
discentes para escreverem ou falarem de si apenas se se sentirem confortáveis para isso e 
desejosos de fazer isso.  
Quanto aos benefícios, esta pesquisa possibilitará aos/às alunos/as que estudam na EJA 
a oportunidade de participar de práticas sistematizadas de leitura e de análise crítica de contos 
e de produção de relatos pessoais. Isso poderá contribuir para: o desenvolvimento da capacidade 
dos discentes de ler, de analisar e de produzir textos de forma crítica e reflexiva, atentando-se 
para as escolhas linguístico-discursivas e para as especificidades dos textos e para como elas 
constroem diferentes representações do mundo; o estabelecimento de relações entre o que leem 
e o que vivem; a reflexão sobre como representam o mundo, como se representam e se 
identificam. Além disso, esta pesquisa poderá beneficiar muitos outros professores de Língua 
Portuguesa, atuantes em diferentes níveis de ensino, especialmente na EJA, uma vez que gerará 
um material didático-pedagógico que poderá subsidiar esses docentes especialmente no 
trabalho com contos e com a produção de curtas-metragens.   
 
201 
 
A qualquer fase, você poderá retirar o seu consentimento para que o(a) menor sob sua 
responsabilidade participe da pesquisa. Garantimos que não haverá coação para que o 
consentimento seja mantido nem que haverá prejuízo ao(à) menor sob sua responsabilidade. 
Até a fase da divulgação dos resultados, você também é livre para solicitar a retirada dos dados 
do(a) menor sob sua responsabilidade da pesquisa. 
O(A) menor sob sua responsabilidade também poderá retirar seu assentimento sem 
qualquer prejuízo ou coação. Até a fase da divulgação dos resultados, ele(a) também é livre 
para solicitar a retirada dos seus dados da pesquisa. 
Uma via original deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ficará com você. 
Em caso de qualquer dúvida a respeito desta pesquisa, você poderá entrar em contato 
com: Maria Aparecida Resende Ottoni, à Avenida João Naves de Ávila, 2121, bloco U, sala 
220, telefone (34) 3239-4162, ou com Marcela Cristiane da Silva, Telefone (61)3022-6064. 
Você poderá também entrar em contato com o CEP - Comitê de Ética na Pesquisa com Seres 
Humanos na Universidade Federal de Uberlândia, localizado na Av. João Naves de Ávila, nº 
2121, bloco A, sala 224, campus Santa Mônica – Uberlândia/MG, 38408-100; telefone: 34-
3239-4131. O CEP é um colegiado independente criado para defender os interesses dos 
participantes das pesquisas em sua integridade e dignidade e para contribuir para o 
desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos conforme resoluções do Conselho 
Nacional de Saúde. 
Uberlândia,        de     de  2019. 
____________________________________________________________ 
Assinatura das pesquisadoras 
Eu, responsável legal pelo (a) menor _________________________________________ 
consinto na sua participação no projeto citado acima, caso ele (a) deseje, após ter sido 
devidamente esclarecido. 
_____________________________________________________________ 
Assinatura do Responsável pelo (a) menor participante da pesquisa 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
202 
 
ANEXO B – Termo de Assentimento para o menor entre 12 e 18 anos incompletos 
 
 
Você está sendo convidado (a) para participar da pesquisa intitulada “Era uma vez.... 
Um conto que virou curta-metragem: uma sequência básica de ensino de gêneros pautada na 
análise de discurso crítica e na pedagogia dos multiletramentos”, sob a responsabilidade das 
pesquisadoras Profa. Dra. Maria Aparecida Resende Ottoni (orientadora) e Profa. Especialista 
Marcela Cristiane da Silva (orientanda). 
Nesta pesquisa nós estamos buscando desenvolver uma proposta de leitura e análise de 
contos e de produção de curta-metragem. Com isso, objetivamos contribuir para o 
desenvolvimento do gosto pela leitura de textos literários, especialmente dos contos e para o 
desenvolvimento da capacidade dos discentes de interpretar e analisar criticamente os textos 
com os quais têm contato na sociedade, de falar e de escrever sobre si e de perceber relações 
entre o que leem e o que vivem.  
Este Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido, antes da coleta e da 
geração de qualquer dado, pela pesquisadora Profa. Especialista Marcela Cristiane da Silva, na 
escola onde você estuda, durante reunião a ser realizada com a pesquisadora mestranda e pais 
e/ou responsáveis pelos menores participantes do estudo. Você disporá do tempo que lhe for 
adequado para a tomada de uma decisão autônoma. 
Na sua participação, você fará leituras de contos de vários escritores (em material 
impresso e digital), responderá a algumas questões de compreensão e estudo, as quais serão 
analisadas, participará das discussões em sala de aula e no laboratório de Informática sobre os 
textos lidos. Além disso, responderá a um questionário inicial sobre a proposta e participará de 
uma entrevista. Todo esse material será coletado e analisado. Após a transcrição da entrevista, 
o material será desgravado. 
Em nenhuma fase você será identificado/a. Os resultados da pesquisa serão publicados 
e ainda assim a sua identidade será preservada. 
Você não terá nenhum gasto nem ganho financeiro por participar na pesquisa. 
Os riscos da participação na pesquisa consistem na possibilidade de você ser 
identificado/a e de se sentir constrangido ao falar ou escrever sobre si, a partir do estudo dos 
poemas. Para evitar isso, será garantido o sigilo quanto à sua identidade e quanto ao nome da 
Instituição onde você estuda. Além disso, será dada a você total liberdade para escrever ou falar 
de si apenas se se sentir confortável para isso e desejoso de fazer isso. 
Quanto aos benefícios, esta pesquisa possibilitará aos/às alunos/as que estudam na EJA 
a oportunidade de participar de práticas sistematizadas de leitura e de análise crítica de contos 
e de produção de relatos pessoais. Isso poderá contribuir para: o desenvolvimento da capacidade 
dos discentes de ler, de analisar e de produzir textos de forma crítica e reflexiva, atentando-se 
para as escolhas linguístico-discursivas e para as especificidades dos textos e para como elas 
constroem diferentes representações do mundo; o estabelecimento de relações entre o que leem 
e o que vivem; a reflexão sobre como representam o mundo, como se representam e se 
identificam. Além disso, esta pesquisa poderá beneficiar muitos outros professores de Língua 
Portuguesa, atuantes em diferentes níveis de ensino, especialmente na EJA, uma vez que gerará 
um material didático-pedagógico que poderá subsidiar esses docentes especialmente no 
trabalho com contos e com a produção de curtas-metragens.   
Você é livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer fase sem qualquer prejuízo 
ou coação. Até a fase da divulgação dos resultados, você também é livre para solicitar a retirada 
dos seus dados da pesquisa. Mesmo seu responsável legal tendo consentido, você não é 
obrigado a participar da pesquisa se não quiser. 
Uma via original deste Termo de Assentimento ficará com você. 
 
203 
 
Em caso de qualquer dúvida a respeito desta pesquisa, você poderá entrar em contato 
com: Maria Aparecida Resende Ottoni, à Avenida João Naves de Ávila, 2121, bloco U, sala 
220, telefone (34) 3239-4162, ou com Marcela Cristiane da Silva, Telefone (61)3022-6064. 
Você poderá também entrar em contato com o CEP - Comitê de Ética na Pesquisa com Seres 
Humanos na Universidade Federal de Uberlândia, localizado na Av. João Naves de Ávila, nº 
2121, bloco A, sala 224, campus Santa Mônica – Uberlândia/MG, 38408-100; telefone: 34-
3239-4131. O CEP é um colegiado independente criado para defender os interesses dos 
participantes das pesquisas em sua integridade e dignidade e para contribuir para o 
desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos conforme resoluções do Conselho 
Nacional de Saúde. 
Uberlândia,        de     de 2019. 
____________________________________________________________ 
Assinatura das pesquisadoras 
 
Eu ________________________________________________aceito participar do projeto 
citado acima, voluntariamente, após ter sido devidamente esclarecido. 
_____________________________________________________________ 
Assinatura do/a Participante da pesquisa 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
204 
 
ANEXO C – Termo de Consentimento livre e esclarecido 
 
  Você está sendo convidado (a) para participar da pesquisa intitulada “Era uma vez.... Um 
conto que virou curta-metragem: uma sequência básica de ensino de gêneros pautada na análise 
de discurso crítica e na pedagogia dos multiletramentos”, sob a responsabilidade das 
pesquisadoras Profa. Dra. Maria Aparecida Resende Ottoni (orientadora) e Profa. Especialista 
Marcela Cristiane da Silva (orientanda). Nesta pesquisa nós estamos buscando desenvolver uma 
proposta de leitura e análise de contos e de produção de curta-metragem. Com isso, objetivamos 
contribuir para o desenvolvimento do gosto pela leitura de textos literários, especialmente dos 
contos e para o desenvolvimento da capacidade dos discentes de interpretar e analisar 
criticamente os textos com os quais têm contato na sociedade, de falar e de escrever sobre si e 
de perceber relações entre o que leem e o que vivem.  Este Termo de Consentimento Livre e 
Esclarecido será obtido, antes da coleta e da geração de qualquer dado, pela pesquisadora Profa. 
Especialista Marcela Cristiane da Silva, na escola onde você estuda, durante reunião a ser 
realizada com a pesquisadora mestranda e pais e/ou responsáveis pelos menores participantes 
do estudo. Você disporá do tempo que lhe for adequado para a tomada de uma decisão 
autônoma. Na sua participação, você fará leituras de contos de vários escritores (em material 
impresso e digital), responderá a algumas questões de compreensão e estudo, as quais serão 
analisadas, participará das discussões em sala de aula e no laboratório de Informática sobre os 
textos lidos. Além disso, responderá a um questionário inicial sobre a proposta e participará de 
uma entrevista. Todo esse material será coletado e analisado. Após a transcrição da entrevista, 
o material será desgravado. Em nenhuma fase você será identificado/a. Os resultados da 
pesquisa serão publicados e ainda assim a sua identidade será preservada. Você não terá 
nenhum gasto nem ganho financeiro por participar na pesquisa. Os riscos da participação na 
pesquisa consistem na possibilidade de você ser identificado/a e de se sentir constrangido ao 
falar ou escrever sobre si, a partir do estudo dos poemas. Para evitar isso, será garantido o sigilo 
quanto à sua identidade e quanto ao nome da Instituição onde você estuda. Serão também 
utilizados códigos para substituir os nomes dos participantes. Além disso, será dada a você total 
liberdade para escrever ou falar de si apenas se se sentir confortável para isso e desejoso de 
fazer isso.  Quanto aos benefícios, esta pesquisa possibilitará aos/às alunos/as que estudam na 
EJA a oportunidade de participar de práticas sistematizadas de leitura e de análise crítica de 
contos e de produção de relatos pessoais. Isso poderá contribuir para: o desenvolvimento da 
capacidade dos discentes de ler, de analisar e de produzir textos de forma crítica e reflexiva, 
 
205 
 
atentando-se para as escolhas linguístico-discursivas e para as especificidades dos textos e para 
como elas constroem diferentes representações do mundo; o estabelecimento de relações entre 
o que leem e o que vivem; a reflexão sobre como representam o mundo, como se representam 
e se identificam. Além disso, esta pesquisa poderá beneficiar muitos outros professores de 
Língua Portuguesa, atuantes em diferentes níveis de ensino, especialmente na EJA, uma vez 
que gerará um material didático-pedagógico que poderá subsidiar esses docentes especialmente 
no trabalho com contos e com a produção de curtas-metragens.   Você é livre para deixar de 
participar da pesquisa a qualquer fase sem qualquer prejuízo ou coação. Até a fase da 
divulgação dos resultados, você também é livre para solicitar a retirada dos seus dados da 
pesquisa. Uma via original deste Termo de Assentimento ficará com você. 
Em caso de qualquer dúvida a respeito desta pesquisa, você poderá entrar em contato com: 
Maria Aparecida Resende Ottoni, à Avenida João Naves de Ávila, 2121, bloco U, sala 220, 
telefone (34) 3239-4162, ou com Marcela Cristiane da Silva, Telefone (61)3022-6064. Você 
poderá também entrar em contato com o CEP - Comitê de Ética na Pesquisa com Seres 
Humanos na Universidade Federal de Uberlândia, localizado na Av. João Naves de Ávila, nº 
2121, bloco A, sala 224, campus Santa Mônica – Uberlândia/MG, 38408-100; telefone: 34-
3239-4131. O CEP é um colegiado independente criado para defender os interesses dos 
participantes das pesquisas em sua integridade e dignidade e para contribuir para o 
desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos conforme resoluções do Conselho 
Nacional de Saúde.  
Uberlândia,       de     de 2019. 
____________________________________________________________ 
 Assinatura das pesquisadoras  
 
 
Eu aceito participar do projeto citado acima, voluntariamente, após ter sido devidamente 
esclarecido.  
_____________________________________________________________  
Assinatura do participante da pesquisa  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
206 
 
ANEXO D – “A cartomante” de Machado de Assis 
 
 
 
 
HAMLET observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa 
filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de 
novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a 
diferença é que o fazia por outras palavras. 
- Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela 
adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou 
a botar as cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma pessoa..." Confessei que sim, e então ela 
continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você 
me esquecesse, mas que não era verdade... 
- Errou! - interrompeu Camilo, rindo. 
- Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado por sua causa. Você 
sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria... 
Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, 
que os seus sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor 
cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas 
casas. Vilela podia sabê-lo, e depois... 
- Qual saber! Tive muita cautela ao entrar na casa. 
- Onde é a casa? 
- Aqui perto, na Rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; 
eu não sou maluca. 
Camilo riu outra vez: 
- Tu crês deveras nessas cousas? — perguntou-lhe. 
Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita 
cousa misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que 
a cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranquila e satisfeita. 
Cuidou que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também 
ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices que a 
mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa 
vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os 
ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total. Camilo não 
acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento: limitava-se a 
 
207 
 
negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não formulava a incredulidade; 
diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando. 
Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, 
não só o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais 
que a repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga 
Rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela Rua das 
Mangueiras, na direção de Botafogo, onde residia; Camilo desceu pela da Guarda Velha, 
olhando de passagem para a casa da cartomante. 
Vilela, Camilo e Rita, três nomes, uma aventura e nenhuma explicação das origens. 
Vamos a ela. Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. 
Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai 
morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No 
princípio de 1869, voltou Vilela da província, onde casara com uma dama formosa e tonta; 
abandonou a magistratura e veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os 
lados de Botafogo, e foi a bordo recebê-lo. "É o senhor?", exclamou Rita, estendendo-lhe a 
mão. "Não imagina como meu marido é seu amigo, falava sempre do senhor." 
Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras. Depois, Camilo 
confessou de si para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, 
era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha 
que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. 
Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto 
Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os 
óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, 
nem intuição. Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe 
de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou 
do enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o 
faria melhor. 
Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar 
as horas ao lado dela, era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era 
mulher e bonita. Odor di femmina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo 
em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe a 
damas e o xadrez e jogavam às noites: ela mal; ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. 
Até aí as cousas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez 
os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. 
Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente e de Rita 
apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio 
coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades 
sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez 
passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. 
Assim é o homem, assim são as cousas que o cercam. Camilo quis sinceramente fugir, 
mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-
lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e 
subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura, mas a batalha foi curta 
e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí 
foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e 
pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do 
outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas. 
Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, 
e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, 
 
208 
 
começou a rarear as visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que 
o motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-
se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor 
próprio, uma intenção de diminuir os obséquios do marido, para tornar menos dura a aleivosia 
do ato. 
Foi por esse tempo que Rita, desconfiada e medrosa, correu à cartomante para consultá-
la sobre a verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe 
a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas 
semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas, que não podiam 
ser advertência da virtude, mas despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, 
por outras palavras mal compostas, formulou este pensamento: 
- A virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e 
pródigo. 
Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, 
e a catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível. 
- Bem, disse ela; eu levo os sobrescritos para comparar a letra com as das cartas que lá 
aparecerem; se alguma for igual, guarda e rasga... 
Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, 
falando pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso 
deliberaram. A opinião dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser 
até que lhe ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer depois 
de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia acautelarem-se, sacrificando--
se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem, em caso de necessidade, 
e separaram-se com lágrimas. 
No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, 
já à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, 
advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava 
matéria especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou 
todas essas cousas com a notícia da véspera. 
- Vem já, já à nossa casa; preciso falar-te sem demora —, repetia ele com os olhos no 
papel. 
Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela 
indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o 
para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso 
repugnava-lhe a ideia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia 
achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. 
Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a ideia de estarem descobertos parecia--
lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o 
ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas 
visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto. 
Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam 
decoradas, diante dos olhos, fixas, ou então (o que era ainda pior) eram-lhe murmuradas ao 
ouvido, com a própria voz de Vilela. 
"Vem já, já à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Ditas assim, pela voz do outro, 
tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já para quê? 
Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou 
o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar 
em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a precaução era útil. Logo 
 
209 
 
depois rejeitava a ideia, vexado de si mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do Largo da 
Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo. 
"Quanto antes, melhor", pensou ele; "não posso estar assim..." 
Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não 
tardaria a entestar com o perigo. Quase no fim da Rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar, 
a rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou o 
obstáculo, e esperou. No fim de cinco minutos, reparou que ao lado, à esquerda, ao pé do tílburi, 
ficava a casa da cartomante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na 
lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e 
pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino. 
Camilo reclinou-se no tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, 
extraordinária, e do fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as 
velhas crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar à primeira travessa, e ir 
por outro caminho: ele respondeu que não, que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... 
Depois fez um gesto incrédulo: era a ideia de ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, 
muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tornou a esvair-se no 
cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... 
Na rua, gritavam os homens, safando a carroça: 
- Anda! agora! empurra! vá! vá! 
Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras 
cousas: mas a voz do marido sussurrava-lhe a orelhas as palavras da carta: "Vem, já, já..." E ele 
via as contorções do drama e tremia. 
A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar. Camilo achou-se diante de 
um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas cousas. A voz da mãe 
repetia-lhe uma porção de casos extraordinários: e a mesma frase do príncipe de Dinamarca 
reboava-lhe dentro: "Há mais cousas no céu e na terra do que sonha a filosofia..." Que perdia 
ele, se... ? 
Deu por si na calçada, ao pé da porta: disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou 
pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão 
pegajoso; mas ele não, viu nem sentiu nada. 
Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve ideia de descer; mas era tarde, a 
curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três 
pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. 
Camilo disse que ia consultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada 
ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma 
janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, 
que antes aumentava do que destruía o prestígio. 
A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para 
a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma 
gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as baralhava, 
rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de 
quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas 
sobre a mesa, e disse-lhe: 
- Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto... 
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo. 
- E quer saber - continuou ela - se lhe acontecerá alguma cousa ou não... 
- A mim e a ela - explicou vivamente ele. 
A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas 
e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os 
 
210 
 
maços uma, duas, três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela curioso 
e ansioso. 
- As cartas dizem-me... 
Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não 
tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. 
Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor 
que os ligava, da beleza de Rita... Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu 
as cartas e fechou-as na gaveta. 
- A senhora restituiu-me a paz ao espírito - disse ele, estendendo a mão por cima da mesa 
e apertando a da cartomante. 
Esta levantou-se, rindo. 
- Vá - disse ela -; vá, ragazzo innamorato... 
E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a 
mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava 
um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando 
duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha 
um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço. 
- Passas custam dinheiro - disse ele afinal, tirando a carteira. - Quantas quer mandar 
buscar? 
- Pergunte ao seu coração - respondeu ela. 
Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O 
preço usual era dois mil-réis. 
- Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, 
vá tranquilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu... 
A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando com um 
leve sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto 
a cartomante, alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o 
tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote largo. 
Tudo lhe parecia agora melhor, as outras cousas traziam outro aspecto, o céu estava 
límpido e as caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos 
da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a 
ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que fizera mal em demorarse tanto; podia ser 
algum negócio grave e gravíssimo. 
- Vamos, vamos depressa - repetia ele ao cocheiro. 
E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer cousa; parece que 
formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta 
com os planos, reboavam-lhe na alma a palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o 
objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? 
O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do 
rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes 
queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e 
afirmativas, a exortação: - Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a barcarola da 
despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que formavam, com os antigos, 
uma fé nova e vivaz. 
A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora 
e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos 
para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, 
longo, longo, interminável. 
 
211 
 
Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e 
entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a 
porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela. 
- Desculpa, não pude vir mais cedo; que há? 
Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma 
saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: ao fundo sobre o canapé, 
estava Rita morta e ensanguentada. 
Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
212 
 
ANEXO E – “Tchau” de Lygia Bojunga 
 
 
1. O buquê 
 
A campainha tocou. Rebeca correu pra abrir a porta. Até se admirou de ver um buquê 
tão bonito. 
- Mãe! - ela gritou - chegou flor pra você. - Fechou a porta. 
A Mãe veio correndo da cozinha e pegou o buquê. Tinha um envelope preso no papel; 
a Mãe tirou depressa um carrão lá de dentro, leu. O telefone tocou; a Mãe largou tudo e foi 
atender. 
Rebeca quis ler o cartão. Mas estava escrito em língua estrangeira, era francês? Olhou 
pra assinatura: Nikos. Lembrou de unia voz estrangeira que andava telefonando, chamando a 
Mãe. Botou devagarinho o cartão em cima do envelope; foi chegando disfarçado pra perto do 
telefone, sem tirar o olho da Mãe. Franziu a testa: a Mãe estava parecendo nervosa, encabulada, 
mas muito mais bonita de repente! 
Rebeca foi se esquecendo de prestar atenção na língua estrangeira que à Mãe estava 
falando pra só ficar assim: olhando: curtindo a Mãe. 
A conversa no telefone acabou. 
A Mãe voltou logo pra junto das flores. 
- Coisa linda esse buquê, não é Rebeca? 
- É. 
- Com esse calor é melhor botar ele logo dentro d'Água. - Foi indo pra cozinha.- Você 
não quer me ajudar a arrumar o vaso? 
Rebeca ficou parada. 
 
213 
 
A mãe olhou para ela; parou também: assim meio abraça com o buquê. 
E durante um tempo as duas ficaram se olhando. Rebeca então foi indo distraída para a 
cozinha. 
A Mãe (distraída também) pegou um vaso, encheu de água. 
E as duas arrumaram as flores devagar, sem falar nada; sem levantar o olho do vaso. 
 
2. Na beira do mar 
 
As duas tinham saído pra fazer compras, a Mãe e a Rebeca. E na volta a Mãe falou: 
- Quem sabe a gente vai andando pela praia? 
Atravessaram a rua, tiraram o sapato, entraram na areia. E foram andando pela beira do 
mar. 
Rebeca a toda hora olhava pra trás pra ver o caminho que o pé ia marcando na areia. 
E a Mãe olhando pro mar e mais nada. 
Era de tardinha. Não tinha quase ninguém na praia. E teve uma hora que a Mãe 
convidou: 
- Vamos descansar um pouco? 
Sentaram. Rebeca logo brincou de fazer castelo. 
E a Mãe olhando pro mar. Olhando. Até que no fim ela disse: 
- Rebeca, eu vou me separar do pai: não tá dando mais pra gente viver junto. 
Rebeca largou o castelo; olhou num susto pra Mãe. 
- Neste último ano tudo ficou tão ruim entre o pai e eu. Eu sei que ele sempre teve paixão 
por música, eu já conheci ele assim. Mas desde que o Donatelo nasceu que ele só vive às voltas 
com aquele violino! é só tocar, estudar, compor, ensaiar; ele me deixou sozinha demais. - Pegou 
a mão da Rebeca. 
- Mas a mão da Rebeca escapou. 
- Sozinha, como? e eu? e o Donatelo? a gente tá sempre junto, não tá? nós três. E quando 
o pai não tá com a orquestra, ele também tá sempre em casa. Então? nós quatro. Sozinha por 
quê? 
- E que... eu não sei como é que eu te explico direito, mas... ah, Rebeca, eu ando tão 
confusa! - Apertou a boca e ficou olhando pro mar. 
Rebeca esperando. Esperando. 
De repente a Mãe ficou de joelhos, agarrou as duas mãos da Rebeca e foi despejando a 
fala: 
- Eu me apaixonei por um outro homem, Rebeca. Eu estou sentindo por ele uma coisa 
que nunca! nunca eu tinha sentido antes. Quando eu conheci o teu pai eu fui gostando cada dia 
mais um pouco dele, me acostumando, ficando amiga, querendo bem. A gente construiu na 
calma um amor gostoso e foi feliz uma porção de anos. E mesmo quando eu reclamava que ele 
gostava mais da música do que de mim, eu era feliz... 
- O pai adora você! você não pode... 
-...e mesmo no tempo que o dinheiro era super apertado a gente era feliz... 
- Ele gosta de você! ele gosta demais de você. 
-...mas este último ano a gente tá sempre discutindo, a gente briga a toda hora. 
- Por quê? 
- Não sei; quer dizer, eu sei; eu sei mais ou menos, essas coisas a gente nunca sabe 
 
214 
 
direito, mas eu sei que eu fui me sentindo sozinha... vazia... vazia de amor. Amor assim... de 
um homem. E claro que isso não tem nada a ver com o amor que eu sinto por você. E pelo 
Donatelo então nem se fala. 
- Não se fala por quê? você gosta mais do Donatelo que de mim? 
- Não, não, Rebeca! entende: é porque ele é tão pequeno ainda, e você já está ficando 
uma mocinha: então é um amor do mesmo tamanho mas um pouco diferente que eu sinto por 
vocês dois. Mas isso não tem nada a ver com... ah, Rebeca, como é que eu te explico? como é 
que eu te explico a paixão que eu senti por esse homem desde a primeira vez que a gente se viu. 
- Ai! não aperta a minha mão assim. 
- Se ele me diz vem te encontrar comigo, mesmo não querendo, eu vou; se ele fala que 
quer me abraçar, mesmo achando que eu não devo, eu deixo; tudo que eu faço de dia, cuidar de 
vocês, da casa, de tudo, eu faço feito dormindo: sempre sonhando com ele; e de noite eu fico 
acordada, só pensando, pensando nele. 
- Ai, não... 
- Ele diz eu gosto do teu cabelo é solto, eu digo é justo como eu não gosto, e é só ir 
dizendo isso pr'eu já ir soltando o cabelo; ele diz ás 5 horas eu te telefono, eu digo NÃO! eu não 
atendo, e já bem antes das 5 eu to junto do telefone esperando; só de chegar perto dele eu fico 
toda suando, e cada vez que eu fico longe eu só quero é ir pra perto, Rebeca! Rebeca! eu tô sem 
controle de mim mesma, como é que isso foi me acontecer, Rebeca?! Ele me disse que vai 
voltar pra terra dele e me levar junto com ele, eu disse logo eu não vou! sabendo tão bem aqui 
dentro que não querendo, não podendo, não devendo, é só ele me levar que eu vou. - Botou de 
palma pra cima as duas mãos da Rebeca e enterrou a cara lá dentro. 
Ficaram assim. 
- Isso é que é paixão? - Rebeca acabou perguntando. A Mãe meio que sacudiu o ombro. 
Quietas de novo. 
- Como é que... como é que ele se chama? esse cara. 
- Nikos. 
- Que nome esquisito. 
- Ele é grego. 
- Grego? e você entende o que ele fala? - A gente conversa em francês. Rebeca ficou 
olhando pro castelo desmanchado. Depois de um tempo suspirou: 
- E ainda mais essa! com tanto homem no Brasil. 
 
3. No sofá da sala 
 
A Mãe bateu a porta do quarto e correu pra sala. 
Já era tarde da noite, mas Rebeca estava acordada. Ouviu a Mãe soluçando. Levantou; 
olhou pro Donatelo na cama ao lado: dormindo. Correu pra sala. A Mãe estava jogada no sofá. 
- Que foi?! 
A Mãe tapou o choro com a almofada; o corpo ficou sacudindo. 
- Mãe, que foi, que foi! 
Estava escuro na sala. Mas o Pai abriu a porta do quarto e veio luz lá de dentro. Rebeca 
escorregou pro chão e ficou meio escondida atrás do sofá. O Pai chegou perto e falou com uma 
voz de raiva, de mágoa, uma voz que a Rebeca nunca tinha ouvido ele falar: 
 
215 
 
- Você tá chorando por quê? Quem tem que chorar sou eu e não você. Não sou eu que 
tô abandonando a minha família, é você; não sou eu que tô deixando os meus filhos pra lá: e 
você! 
A Mãe tirou a almofada da cara; a voz saiu metade soluço, metade fala: 
- Você não tá querendo entender: eu não tô deixando a Rebeca e o Donatelo: um dia eu 
volto pra buscar os dois. 
- Você vai embora com esse estrangeiro pra viver lá do outro lado do mundo... 
- Eu juro que eu volto! 
-...mas o estrangeiro não quer as crianças, só quer você. 
- Eu sei que eu acabo convencendo ele... 
- E se um dia você convence ele, aí você vem buscar a Rebeca e o Donatelo, não é? 
Lindo! 
- O que que eu posso fazer? ele não quer que eu leve as crianças agora. 
- ELE NÃO QUER!! Então ele agora manda em você. Ele é um deus que desceu do 
Olimpo pra dizer o que ele quer e o que ele não quer que você faça. 
Rebeca franziu a testa, ele é um deus que desceu de onde? E aí o Pai gritou: 
- Pois eu também não quero, viu? eu não quero o que você quer. E você vai ter que 
escolher: ou fica ou leva as crianças com você agora. 
- Mas eu não... 
- Se você não leva elas agora, eu não deixo você levar nunca mais. Abandono do lar, da 
família, de tudo: a lei vai estar do meu lado. Então você escolhe: ou ele ou as crianças. 
 
4. Na mesa do botequim 
 
Rebeca saltou do ônibus, comprou um sorvete de chocolate e veio lambendo ele pela 
rua. Parou em frente do botequim da esquina: ué: não era o Pai sentado bem lá no fundo? 
Espiou: era, sim: entrou. 
- Oi, pai. 
O Pai levantou a cara do copo e olhou pra Rebeca feito custando pra lembrar quem é 
que ela era. 
- Oôôooooo filhinha, o que que você tá fazendo por aqui? 
- Eu, nada, e você? 
- Eu, nada. 
O sorvete pingou na calça do Pai. 
O Pai ficou olhando triste pro pingo; depois falou: 
- Senta. - Mas logo se arrependeu: - Quer dizer, não senta porque isso aqui não é lugar 
pra criança. 
Mas Rebeca já tinha sentado, e o moço do botequim já tinha trazido um outro copo 
cheio pro Pai beber. O Pai bebeu enquanto Rebeca acabava o sorvete, comia a casquinha, dava 
uma lambida em cada dedo, enxugava eles na saia e suspirava de pena do sorvete ter acabado. 
O Pai suspirou também: 
- A tua mãe não gosta mais de mim. 
Rebeca olhou pra mesa: cheia de copo vazio. Será que era o Pai que tinha bebido aquilo 
 
216 
 
tudo? 
- E eu gosto tanto dela! Agora então que ela vai me deixar parece até que eu gosto mais. 
Rebeca olhou pro Pai; achou que o olho dele estava parecendo de vidro. 
- Duvido que esse gringo goste dela do jeito que eu gosto. Nem metade, aposto. Nem 
metade da metade da me... - Foi se esquecendo da outra metade; ficou olhando pra Rebeca. 
- Que que você tá me olhando assim, pai? parece até que você nunca me viu. 
- Como você é parecida com ela! Tudo. A boca, o cabelo, o jeito de olhar. E agora que 
eu to percebendo: o teu nariz também é igualzinho ao dela, até um pouco de sarda na ponta ele 
tem; engraçado, eu ainda não tinha reparado. - Debruçou mais na mesa pra olhar pro nariz da 
Rebeca, derrubou um copo no caminho; desanimou. 
Rebeca debruçou também: 
- Eu vou pedir pra mãe não ir. Eu vou pedir tão forte, que ela não vai, você vai ver. 
O Pai fechou o olho: 
- Eu queria que o tempo já tivesse passado e que eu já tivesse me esquecido dela. 
- Eu vou pedir pra ela não ir embora; deixa comigo, pai. 
- Eu queria que você e o Donatelo já fossem grandes. O que que eu vou fazer com vocês 
dois? me diz, me diz! Eu não tenho jeito com criança. 
- Eu vou pedir. 
- O que que eu faço com vocês dois, Rebeca? 
- Deixa comigo, pai, eu te prometo que eu não deixo a mãe dizer tchau pra gente. 
- Promete? 
- Prometo. E agora para de beber, tá? - Tá. 
5. A mala 
 
Rebeca fingiu que nem tinha visto a mala da Mãe aberta em cima da cama e já quase 
pronta pra fechar. 
Voltou pro quarto. Sentou. 
Fingiu que estava desenhando um barco. 
Fingiu que nem estava escutando a Mãe querendo se despedir do Pai, e o Pai não 
deixando a Mãe acabar de falar, saindo zangado, batendo com a porta. 
Foi riscando no papel com força, o lápis pra cá e pra lá cada vez com mais força, tlá! a 
ponta quebrou. 
Ouviu a Mãe indo na sala; depois no banheiro. 
Correu na ponta do pé pra espiar, ah! a mala. Já fechada. No chão. Junto da porta. Pronta 
pra sair. 
Voltou correndo pro quarto; sentou de novo; pegou o lápis, fez ponta depressa, o 
coração num toque-toque medonho; desatou de novo a riscar. 
Parou o lápis; escutou a Mãe discando telefone, chamando um táxi, explicando que era 
pro aeroporto. 
De rabo de olho viu a Mãe entrar no quarto, sentar na cama do Donatelo, ficar olhando 
ele dormir. 
Viu que a Mãe estava de meia, de sapato fechado, de capa de chuva, de bolsa a tiracolo, 
de cara lavada (de choro?), tão diferente de todo dia. 
Viu a Mãe alisando o cabelo do Donatelo; fazendo festa nele de leve; a mão indo e 
 
217 
 
vindo, bem de leve; indo e vindo. Viu tudo de rabo de olho e foi riscando forte, mais forte, mais 
tlá! a ponta do lápis quebrou outra vez. 
A Mãe parou de fazer festa na cabeça do Donatelo e ficou sem se mexer. 
Rebeca ficou que nem a Mãe: sem se virar, sem falar, sem perguntar. 
O tempo foi passando. Passando. 
Até que de repente a buzina do táxi tocou lá fora e a Mãe levantou num pulo de susto. 
Rebeca também. E se virou. Ao mesmo tempo que a Mãe se virava. E as duas se olharam 
com medo, e a Mãe correu e abraçou Rebeca com força, demorado, bem apertado, ai! Rebeca 
fechou o olho: que troço danado pra doer aquele abraço. 
A Mãe largou a Rebeca, correu pra sala, abriu a porta. Mas Rebeca já estava atrás dela; 
e puxou a mala: 
- Mãe; não vai! eu já te pedi tanto, que eu não ia pedir mais, mas você tá indo mesmo e 
eu tenho que pedir de novo, não vai não vai não vai!! 
A Mãe cochichou depressa: 
- Por favor, Rebeca, me entende, me perdoa, me entende, eu tenho que ir, é mais forte 
que tudo. Mas eu já te prometi: eu volto. 
- Diz pra ele que não! você não vai. 
A Mãe pegou a mala. Rebeca não largou. 
A Mãe puxou a mala. Rebeca puxou também. 
A Mãe puxou mais forte. Rebeca ficou agarrada na mala. 
O táxi buzinou de novo. As duas se olharam. O olho da Mãe pedindo por favor. O olho 
da Rebeca também: por favor. 
A Mãe estava de boca apertada; de testa enrugada. E não quis mais olhar pra Rebeca no 
olho; e puxou a mala com toda a força, querendo arrancar ela da mão da Rebeca. 
Mas Rebeca não se soltou da mala e foi sendo arrastada no puxão. 
A buzina do táxi de novo, e mais comprido dessa vez. 
A Mãe soltou a mala; fechou o olho; apertou a testa com a mão feito coisa que estava 
sentindo uma tonteira ou uma dor de cabeça muito forte. 
Rebeca aproveitou pra se agarrar na mala de um jeito que pra Mãe levantar a mala ia ter 
que levantar a Rebeca também. 
E outra vez a buzina tocou. 
A Mãe abriu o olho (parecia que a tonteira tinha passado), disse: 
- Tchau. - E saiu correndo. 
6. O pai volta tarde e encontra um bilhete no travesseiro  
 
Querido pai 
Não deu para eu cumprir a promessa. A Mãe foi mesmo embora. 
Mas a mala dela ficou. E eu acho que assim, sem mala, sem roupa para trocar, sem 
escova de dente nem nada, não vai dar para a Mãe ficar muito tempo sem voltar. Não sei. Vamos 
ver. Eu arrastei a mala e escondi ela debaixo da sua cama, viu?  
Um beijo da Rebeca. 
 
 
 
 
 
 
 
 
218 
 
ANEXO F – “A caolha” de Júlia Lopes de Almeida 
 
 
 
A caolha era uma mulher magra, alta, macilenta, peito fundo, busto arqueado, braços 
compridos, delgados, largos nos cotovelos, grossos nos pulsos; mãos grandes, ossudas, 
estragadas pelo reumatismo e pelo trabalho; unhas grossas, chatas e cinzentas, cabelo crespo, 
de uma cor indecisa entre o branco sujo e o louro grisalho, desse cabelo cujo contato parece 
dever ser áspero e espinhento; boca descaída, numa expressão de desprezo, pescoço longo, 
engelhado, como o pescoço dos urubus; dentes falhos e cariados. 
O seu aspecto infundia terror às crianças e repulsão aos adultos; não tanto pela sua altura 
e extraordinária magreza, mas porque a desgraçada tinha um defeito horrível: haviam lhe 
extraído o olho esquerdo; a pálpebra descera mirrada, deixando, contudo, junto ao lacrimal, 
uma fístula continuamente porejante. 
Era essa pinta amarela sobre o fundo denegrido da olheira, era essa destilação incessante 
de pus que a tornava repulsiva aos olhos de toda gente. 
Morava numa casa pequena, paga pelo filho único, operário numa fábrica de alfaiate; 
ela lavava a roupa para os hospitais e dava conta de todo o serviço da casa inclusive cozinha. 
O filho, enquanto era pequeno, comia os pobres jantares feitos por ela, às vezes até no mesmo 
prato; à proporção que ia crescendo, ia-se a pouco e pouco manifestando na fisionomia a 
repugnância por essa comida; até que um dia, tendo já um ordenadozinho, declarou à mãe que, 
por conveniência do negócio, passava a comer fora… 
Ela fingiu não perceber a verdade, e resignou-se. 
Daquele filho vinha-lhe todo o bem e todo o mal. 
Que lhe importava o desprezo dos outros, se o seu filho adorado lhe pagasse com um 
beijo todas as amarguras da existência? 
Um beijo dele era melhor que um dia de sol, era a suprema carícia para o triste coração 
de mãe! Mas… os beijos foram escasseando também, com o crescimento do Antonico! Em 
criança ele apertava-a nos braços e enchia-lhe a cara de beijos; depois, passou a beijá-la só na 
face direita, aquela onde não havia vestígios de doença; agora, limitava-se a beijar-lhe a mão! 
Ela compreendia tudo e calava-se. 
O filho não sofria menos. 
 
219 
 
Quando em criança entrou para a escola pública da freguesia, começaram logo os 
colegas, que o viam ir e vir com a mãe, a chamá-lo – o filho da caolha. 
Aquilo exasperava-o; respondia sempre: 
– Eu tenho nome! 
Os outros riam e chacoteavam-no; ele se queixava aos mestres, os mestres ralhavam com 
os discípulos, chegavam mesmo a castigá-los – mas a alcunha pegou. Já não era só na escola 
que o chamavam assim. 
Na rua, muitas vezes, ele ouvia de uma ou outra janela dizerem: o filho da caolha! Lá 
vai o filho da caolha! Lá vem o filho da caolha! 
Eram as irmãs dos colegas, meninas novas, inocentes e que, industriadas pelos irmãos, 
feriam o coração do pobre Antonico cada vez que o viam passar! 
As quitandeiras, onde iam comprar as goiabas ou as bananas para o lanche, aprenderam 
depressa a denominá-lo como os outros, e, muitas vezes, afastando os pequenos que se 
aglomeravam ao redor delas, diziam, estendendo uma mancheia de araçás, com piedade e 
simpatia: 
– Taí, isso é para o filho da caolha! 
O Antonico preferia não receber o presente a ouvi-lo acompanhar de tais palavras; tanto 
mais que os outros, com inveja, rompiam a gritar, cantando em coro, num estribilho já 
combinado: 
– Filho da caolha, filho da caolha! 
O Antonico pediu à mãe que não o fosse buscar à escola; e muito vermelho, contou-lhe 
a causa; sempre que o viam aparecer à porta do colégio os companheiros murmuravam injúrias, 
piscavam os olhos para o Antonico e faziam caretas de náuseas. 
A caolha suspirou e nunca mais foi buscar o filho. 
Aos onze anos o Antonico pediu para sair da escola: levava a brigar com os 
condiscípulos, que o intrigavam e malqueriam. Pediu para entrar para uma oficina de 
marceneiro. Mas na oficina de marceneiro aprenderam depressa a chamá-lo – o filho da caolha, 
a humilhá-lo, como no colégio. 
Além de tudo, o serviço era pesado e ele começou a ter vertigens e desmaios. Arranjou 
então um lugar de caixeiro de venda: os seus colegas agruparam-se à porta, insultando-o, e o 
vendeiro achou prudente mandar o caixeiro embora, tanto que a rapaziada ia-lhe dando cabo do 
feijão e do arroz expostos à porta nos sacos abertos! Era uma contínua saraivada de cereais 
sobre o pobre Antonico! 
Depois disso passou um tempo em casa, ocioso, magro, amarelo, deitado pelos cantos, 
dormindo às moscas, sempre zangado e sempre bocejante! Evitava sair de dia e nunca, mas 
nunca, acompanhava a mãe; esta poupava-o: tinha medo que o rapaz, num dos desmaios, lhe 
morresse nos braços, e por isso nem sequer o repreendia! Aos dezesseis anos, vendo-o mais 
forte, pediu e obteve-lhe, a caolha, um lugar numa oficina de alfaiate. A infeliz mulher contou 
ao mestre toda a história do filho e suplicou-lhe que não deixasse os aprendizes humilhá-lo; que 
os fizesse terem caridade! 
Antonico encontrou na oficina uma certa reserva e silêncio da parte dos companheiros; 
quando o mestre dizia: sr. Antonico, ele percebia um sorriso mal oculto nos lábios dos oficiais; 
mas a pouco e pouco essa suspeita, ou esse sorriso, se foi desvanecendo, até que principiou a 
sentir-se bem ali. 
Decorreram alguns anos e chegou a vez de Antonico se apaixonar. Até aí, numa ou outra 
pretensão de namoro que ele tivera, encontrara sempre uma resistência que o desanimava, e que 
o fazia retroceder sem grandes mágoas. Agora, porém, a coisa era diversa: ele amava! Amava 
como um louco a linda moreninha da esquina fronteira, uma rapariguinha adorável, de olhos 
negros como veludos e boca fresca como um botão de rosa. O Antonico voltou a ser assíduo 
 
220 
 
em casa e expandia-se mais carinhosamente com a mãe; um dia, em que viu os olhos da morena 
fixarem os seus, entrou como um louco no quarto da caolha e beijou-a mesmo na face esquerda, 
num transbordamento de esquecida ternura! 
Aquele beijo foi para a infeliz uma inundação de júbilo! Tornara a encontrar o seu 
querido filho! Pôs-se a cantar toda a tarde, e nessa noite, ao adormecer, dizia consigo: 
– Sou muito feliz… o meu filho é um anjo! 
Entretanto, o Antonico escrevia, num papel fino, a sua declaração de amor à vizinha. No 
dia seguinte mandou-lhe cedo a carta. A resposta fez-se esperar. Durante muitos dias Antonico 
perdia-se em amarguradas conjecturas. 
Ao princípio pensava: – É o pudor. 
Depois começou a desconfiar de outra causa; por fim recebeu uma carta em que a bela 
moreninha confessava consentir em ser sua mulher, se ele se separasse completamente da mãe! 
Vinham explicações confusas, mal alinhavadas: lembrava a mudança de bairro; ele ali era muito 
conhecido por filho da caolha, e bem compreendia que ela não se poderia sujeitar a ser 
alcunhada em breve de – nora da caolha, ou coisa semelhante! 
O Antonico chorou! Não podia crer que a sua casta e gentil moreninha tivesse 
pensamentos tão práticos! 
Depois o seu rancor se voltou para a mãe. 
Ela era a causadora de toda a sua desgraça! Aquela mulher perturbara a sua infância, 
quebrara-lhe todas as carreiras, e agora o seu mais brilhante sonho de futuro sumia-se diante 
dela! Lamentava-se por ter nascido de mulher tão feia, e resolveu procurar meio de separar-se 
dela; iria considerar-se humilhado continuando sob o mesmo teto; havia de protegê-la de longe, 
vindo de vez em quando vê-la à noite, furtivamente… 
Salvava assim a responsabilidade do protetor e, ao mesmo tempo, consagraria à sua 
amada a felicidade que lhe devia em troca do seu consentimento e amor… 
Passou um dia terrível; à noite, voltando para casa levava o seu projeto e a decisão de o 
expor à mãe. 
A velha, agachada à porta do quintal, lavava umas panelas com um trapo engordurado. 
O Antonico pensou: “Ao dizer a verdade eu havia de sujeitar minha mulher a viver em 
companhia de… uma tal criatura?” Estas últimas palavras foram arrastadas pelo seu espírito 
com verdadeira dor. A caolha levantou para ele o rosto, e o Antonico, vendo-lhe o pus na face, 
disse: 
– Limpe a cara, mãe… 
Ela sumiu a cabeça no avental; ele continuou: 
– Afinal, nunca me explicou bem a que é devido esse defeito! 
– Foi uma doença, – respondeu sufocadamente a mãe – é melhor não lembrar isso! 
– E é sempre a sua resposta: é melhor não lembrar isso! Por quê? 
– Porque não vale a pena; nada se remedeia… 
– Bem! Agora escute: trago-lhe uma novidade. O patrão exige que eu vá dormir na 
vizinhança da loja… já aluguei um quarto; a senhora fica aqui e eu virei todos os dias saber da 
sua saúde ou se tem necessidade de alguma coisa… É por força maior; não temos remédio 
senão sujeitar-nos!… 
Ele, magrinho, curvado pelo hábito de costurar sobre os joelhos, delgado e amarelo 
como todos os rapazes criados à sombra das oficinas, onde o trabalho começa cedo e o serão 
acaba tarde, tinha lançado naquelas palavras toda a sua energia, e espreitava agora a mãe com 
um olhar desconfiado e medroso. 
A caolha se levantou e, fixando o filho com uma expressão terrível, respondeu com 
doloroso desdém: 
 
221 
 
– Embusteiro! O que você tem é vergonha de ser meu filho! Saia! Que eu também já 
sinto vergonha de ser mãe de semelhante ingrato! 
O rapaz saiu cabisbaixo, humilde, surpreso da atitude que assumira a mãe, até então 
sempre paciente e cordata; ia com medo, maquinalmente, obedecendo à ordem que tão feroz e 
imperativamente lhe dera a caolha. 
Ela o acompanhou, fechou com estrondo a porta, e vendo-se só, encostou-se cabaleante 
à parede do corredor e desabafou em soluços. 
O Antonico passou uma tarde e uma noite de angústia. 
Na manhã seguinte o seu primeiro desejo foi voltar à casa; mas não teve coragem; via o 
rosto colérico da mãe, faces contraídas, lábios adelgaçados pelo ódio, narinas dilatadas, o olho 
direito saliente, a penetrar-lhe até o fundo do coração, o olho esquerdo arrepanhado, murcho – 
murcho e sujo de pus; via a sua atitude altiva, o seu dedo ossudo, de falanges salientes, 
apontando-lhe com energia a porta da rua; sentia-lhe ainda o som cavernoso da voz, e o grande 
fôlego que ela tomara para dizer as verdadeiras e amargas palavras que lhe atirara no rosto; via 
toda a cena da véspera e não se animava a arrostar com o perigo de outra semelhante. 
Providencialmente, lembrou-se da madrinha, única amiga da caolha, mas que, 
entretanto, raramente a procurava. 
Foi pedir-lhe que interviesse, e contou-lhe sinceramente tudo o que houvera. 
A madrinha escutou-o comovida; depois disse: 
– Eu previa isso mesmo, quando aconselhava tua mãe a que te dissesse a verdade inteira; 
ela não quis, aí está! 
– Que verdade, madrinha? 
Encontraram a caolha a tirar umas nódoas do fraque do filho – queria mandar-lhe a roupa 
limpinha. A infeliz se arrependera das palavras que dissera e tinha passado a noite à janela, 
esperando que o Antonico voltasse ou passasse apenas… Via o porvir negro e vazio e já se 
queixava de si! Quando a amiga e o filho entraram, ela ficou imóvel: a surpresa e a alegria 
amarraram-lhe toda a ação. 
A madrinha do Antonico começou logo: 
– O teu rapaz foi suplicar-me que te viesse pedir perdão pelo que houve aqui ontem e eu 
aproveito a ocasião para, à tua vista, contar-lhe o que já deverias ter-lhe dito! 
– Cala-te! – murmurou com voz apagada a caolha. 
– Não me calo! Essa pieguice é que te tem prejudicado! Olha, rapaz! Quem cegou a tua 
mãe foste tu! 
O afilhado tornou-se lívido; e ela concluiu: 
– Ah, não tiveste culpa! Eras muito pequeno quando, um dia, ao almoço, levantaste na 
mãozinha um garfo; ela estava distraída, e antes que eu pudesse evitar a catástrofe, tu o 
enterraste pelo olho esquerdo! Ainda tenho no ouvido o grito de dor que ela deu! 
O Antonico caiu pesadamente de bruços, com um desmaio; a mãe acercou-se 
rapidamente dele, murmurando trêmula: 
– Pobre filho! Vês? Era por isto que eu não queria dizer nada! 
 
 
 
 
 
 
 
222 
 
ANEXO G – “A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa 
 
 
 
 
Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e 
menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. 
Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, 
conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente 
— minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma 
canoa. 
Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a 
tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida 
forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa 
mãe jurou muito contra a idéia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora 
para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais 
próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado 
que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia 
em que a canoa ficou pronta. 
Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. 
Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez a alguma recomendação. Nossa 
mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço 
e bramou: — “Cê vai, ocê fique, você nunca volte!” Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou 
manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas 
obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — 
“Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?” Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a 
bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para 
saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo — a sombra 
dela por igual, feito um jacaré, comprida longa. 
Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se 
permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não 
saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para. estarrecer de todo a gente. Aquilo que 
não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram 
juntamente conselho. 
Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso 
pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser 
pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia 
doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família 
dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, 
 
223 
 
até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em 
ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. 
Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, 
ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s’embora, para jamais, o que 
ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa. 
No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida 
furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de 
acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. 
Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso 
pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no 
fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o 
de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e 
orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa 
mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, 
sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava. 
Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou 
vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de 
margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o ‘dever de desistir da tristonha teima. De outra, 
por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai 
passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega 
ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e 
tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, 
aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a 
palmos, a escuridão, daquele. 
A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo 
nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, 
só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que 
era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele agüentava. De dia e de noite, com sol 
ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o 
chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir 
do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais 
em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da 
canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem 
dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um 
quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra 
do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, 
para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando 
no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e 
paus-de-árvore descendo — de espanto de esbarro. E nunca falou mais palavra, com pessoa 
alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia 
ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de 
novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos. 
Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se 
comia uma comida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas 
noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça para ir esvaziando a 
canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais 
parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, 
mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, 
mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia. 
 
224 
 
Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre 
que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — “Foi pai 
que um dia me ensinou a fazer assim…”; o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por 
verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, 
não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não-encontrável? Só ele soubesse. 
Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, 
todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do 
casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o 
guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos 
aí choramos, abraçados. 
Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, 
para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou 
indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de 
resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai 
carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão de seu feito. Seja que, 
quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-que-disseram: que constava que nosso 
pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, 
agora, esse homem já tinha morrido, ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada mais. Só 
as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do 
rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse 
o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. 
Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos. 
Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, 
sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de 
velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, 
cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, 
não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse 
sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da 
cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha 
tranquilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as 
coisas fossem outras. E fui tomando ideia. 
Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca 
mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, 
todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. 
Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de 
grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar 
a voz: — “Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto… Agora, o senhor vem, não carece mais… 
O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do 
senhor, na canoa!…” E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo. 
Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n’água, proava para cá, concordado. E eu 
tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de 
gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia… Por pavor, 
arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que 
ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão. 
Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, 
depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo 
abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, 
peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não para, 
de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio. 
 
225 
 
ANEXO H – “Clínica de Repouso” de Dalton Trevisan 
 
 
 
     Dona Candinha deparou na sala o moço no sofá de veludo e a filha servindo cálice 
de vinho doce com broinha de fubá mimoso. 
     Mãezinha, este é o João. 
     Mais que depressa o tipo de bigodinho foi beijar a mão da velha, que se esquivou à 
gentileza. O mocinho servia o terceiro cálice, Maria chamou a mãe para a cozinha, pediu-lhe 
que aceitasse por alguns dias. 
    Como pensionista? 
    Não, como hóspede da família. Irmão de uma amiga de infância, sem conhecer 
ninguém de Curitiba, não podia pagar pensão até conseguir emprego. 
     Dias mais tarde a velha descobriu que, primeiro, o distinto já estava empregado 
(colega de repartição de Maria) e, segundo, ainda que dez anos mais moço, era namorado da 
filha. A situação desmoralizava a velha e comprometia a menina. Dona Candinha discutiu com 
a filha e depois com o noivo, que achava a seu gosto a combinação. 
    Sou moço simples, minha senhora. Uma coxinha de frango é o que me basta. Ovo 
frito na manteiga. 
    Dona Candinha os surpreendia aos beijos no sofá. A filha saia com o rapaz, voltavam 
depois da meia-noite. Ás três da manhã a velha acordava com passos furtivos no corredor. 
    Você põe esse moço na rua. Ou tomo uma providência. 
    A senhora está louca. 
    Maria era maior, podia entrar a hora que bem quisesse, a velha estava caduca. Assim 
que a filha saiu, dona Candinha bateu na porta do hóspede, ainda de pijama azul de seda com 
bolinha branca: 
    - Moço, você ganha a vida. Tem como se manter. Trate de ir embora. 
    De volta das compras (delicadezas para o príncipe de bigodinho), a filha insultou dona 
Candinha aos gritos de velha doida, maníaca, avarenta. 
    Não vai me dar nem um tostão para esse pilantra. Ai, minha filha, como me arrependo 
do dia em que noivou. 
    Maria nem pode responder: 
    - Eu, sim, me arrependo do dia em que a senhora casou. 
    Sentiu-se afrontada a velhota, com palpitação, tontura, pé frio. Arrastou-se quietinha 
para a cama, cobriu a cabeça com o lençol: 
    - Apague a luz – ela gemeu – que vou morrer. 
 
226 
 
    Susto tão grande que o rapaz decidiu arrumar a mala. Manhã seguinte a velha pulou 
cedo, alegrinha espanou os elefantes coloridos de louça. A filha não almoçou e antes de bater a 
porta: 
    O João volta ou saio de casa. A vergonha é da senhora. 
    Dona Candinha fez promessa para as almas do purgatório. Tão aflita, em vez de rezar 
dia por dia, rematou a novena numa tarde só. 
     - Menina, não se fie de moço com dente de ouro. 
     - Lembre-se, mãe, a senhora me despediu. 
     -Vá com seu noivo. Depois não se queixe, filha ingrata. 
     De tanto se agoniar dona Candinha caiu de cama. 
     - A senhora não me ilude. Finge-se doente para me castigar. Com este calor debaixo 
da coberta. 
     - Muito fraca. Eu suo na cabeça. O pé sempre frio. 
     Deliciada quando a moça trazia chá com torrada. Terceiro dia, a filha inrompe no 
quarto, escancara a janela. Introduz o gordo perfumado: 
     - O médico para a senhora. 
     O doutor examinou-a e, para o esgotamento nervoso, receitou cura de repouso. 
     - A senhora vai por bem – intimou a filha – ou então à força. 
    Queria o convento das freiras e não o hospital, que lhe recordava o falecido, entrevado 
na cadeira de rodas. Umas colheradas de canja, cochilou gostosamente. Às duas da tarde, o 
aposento invadido pela filha, o noivo e um enfermeiro de avental sujo. 
    É já que vai para a clínica. 
    Eu vou se não for asilo de louco. Bem longe do doutor Alô. 
    Um táxi esperava na porta, o noivo sentou-se ao lado do motorista, ela apertada entre 
a filha e o enfermeiro. Quando viu estava no Asilo Nossa Senhora da Luz, perdida com doida, 
epilética, alcoólatra.         
Nunca entra sol no pavilhão, a umidade escorria da parede, o chão de cimento. De noite 
o maldito olho amarelo sempre aceso no fio manchado de mosca. 
    - Quem reclama – era o sistema do doutor alô – ganha choque! 
    Ao menor protesto ou queixume: 
    Olhe o choque, melindrosa! Olhe a injeção na espinha! Olhe a insulina na veia! 
    Um banheiro só e, depois esperar na fila, aquela imundície no chão e na parede. A 
louquinha auxiliava a servente que, essa, fazia de enfermeira. Intragável o feijão com arroz, 
dona Candinha sustentava- se a chá de mate e biscoito duro. Engolia com esforço o caldo ralo 
de repolho. 
     Vinte e dois dias depois recebeu a visita da filha, o noivo fumava na porta. 
     A senhora fazendo greve de fome? 
     Na minha casa o arroz é escorrido, o feijão lavado. 
     Só de braba não come. 
     Daí a tortura da sede. Servia-se da torneira no banheiro, não é que uma possessa 
vomitou na pia? Foi encher o copo, deu com tamanho horror. Embora lavada a pia, guardou a 
impressão e sofria a sede. 
    - Doidinha eu sou – disse uma das mansas – Meu lugar é aqui. Mas a senhora fazendo 
o quê? 
    Uma lunática oferecia-lhe bolacha e fruta. Mandou bilhete na sua letra caprichada, a 
filha só apareceu domingo seguinte. 
      A senhora não está boa. Nem penteia o cabelo. Não cumprimenta o doutor Alô. 
      Essa ingratidão não posso aceitar – e abafava o soluço no pavor do choque – Não 
sou maluca e sei me mandar. 
 
227 
 
     - Prove. 
     - Com o túmulo de seu pai. Já pintado de azul. 
     Instalado na casa, o noivo regalava-se com ovo frito na manteiga, coxinha gorda de 
frango. 
     Quem não come – advertia a servente – vai para o choque! 
     Dona Candinha encheu-se de coragem e choramingou para a freira superiora que não 
tomava sol, sofria de reumatismo, coma gritaria das furiosas que podia dormir? 
     Ao cruzar a enfermaria, a freira chamou uma das bobas 
     - Você é nova aqui? 
     - Entrei ontem, sim senhora. 
     - Se tiver alguma queixa, fale com dona Candinha. – e batendo palmas de tanta graça. 
– é a palhaça do circo.      
A servente largava o balde e o enxergão, sem lavar as mãos aplicava insulina na veia de 
uma possessa. Dona Candinha fingia tossir e cuspia a pílula escondida no buraco do dente.     
Chorando de manhã ao se lembrar do tempo feliz com o finado. À noite, chorava outra 
vez: menina tão amorosa, hoje feroz inimiga. Não doía ter sido internada. – culpa sua não sair 
da cama – Mas sabendo o que sofria, a moça não a tirasse dali. 
     Minha própria filha? Estalou baixinho a língua ressequida. – que não me acudiu na 
maior precisão?     Surpreendida rondando o portão, confiscaram-lhe a roupa, agora em camisola 
imunda e chinelo de pelúcia? Sem se aquecer ao sol, sobrevivendo aos golinhos de chá frio e 
bolacha Maria. Tão fraca nem podia ler, as letras embaralhadas mesmo de óculo. 
Olhe essa mulher, doutor – era a filha, vestido preto de cetim, lábio de púrpura, pulseira 
prateada. –domingo de sol, uma pessoa deitada? O dia inteiro chorando e se queixando. Aqui 
não falta nada, que mais ela quer? 
 - Vá-se embora – respondeu docemente a velha. Desapareça de minha vista. Você mais o dente 
de ouro. 
 -De dia o rádio ligado a todo volume. À noite, a gritaria furiosa das lunáticas. Sentadinha na 
cama, distrai-se a velha a espiar uma nesga de céu. Com paciência, amansa uma mosca nas 
grades, que vem comer na sua mão arrepiada de cócegas. Há três dias, afeiçoada à velhinha, 
não foge a mosca por entre as grades da janela. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
228 
 
ANEXO I – Termo de autorização de uso de imagem 
 
Eu, ___________________________________________________, portador da Cédula de 
Identidade nº _________________, inscrito no CPF sob nº ________________, residente em 
_____________________________, nº _______, na cidade de ____________________, 
AUTORIZO o uso de minha imagem (ou do menor _______________________________ sob 
minha responsabilidade) em fotos ou filme, sem finalidade comercial, para ser utilizada no 
trabalho pedagógico de criação de curta –metragem a partir de contos temáticos. A presente 
autorização é concedida a título gratuito, abrangendo o uso da imagem acima mencionada em 
todo território nacional e no exterior, em todas as suas modalidades e, em destaque, das 
seguintes formas: (I) home page; (II) cartazes; (III) divulgação em geral. Por esta ser a 
expressão da minha vontade declaro que autorizo o uso acima descrito sem que nada haja a ser 
reclamado a título de direitos conexos à minha imagem ou a qualquer outro. 
Brasília, ____ de _________________________ de 2019. 
_______________________________________________________  
Assinatura 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
229 
 
ANEXO J – Parecer Consubstanciado do CEP 
 
 
DADOS DO PROJETO DE PESQUISA 
 
Título da Pesquisa: "ERA UMA VEZ.... UM CONTO QUE VIROU CURTA-METRAGEM: UMA 
SEQUÊNCIA BÁSICA DE ENSINO DE GÊNEROS PAUTADA NA 
ANÁLISE DE DISCURSO CRÍTICA E NA PEDAGOGIA DOS 
MULTILETRAMENTOS" 
Pesquisador:  MARIA APARECIDA RESENDE OTTONI 
Área Temática: Versão:  1 
CAAE: 08086918.0.0000.5152 
Instituição Proponente: Instituto de Letras e Linguística  
Patrocinador Principal: Financiamento Próprio 
 
DADOS DO PARECER 
Número do Parecer: 3.234.339 
Apresentação do Projeto: Conforme apresenta o protocolo: 
É uma pesquisa para Mestrado no Instituto de Letras e Linguística da UFU.  
Amostra: 30 alunos 
O público escolhido para a pesquisa será uma turma de 9º ano do Ensino Fundamental da rede pública 
onde as pesquisadoras ministram aulas. 
 
A escolha da pesquisa voltada para o público EJA se deve ao fato de ser uma parcela educacional com 
diversos problemas e que precisam ser pesquisados, sendo o principal deles, a evasão. As pesquisadoras 
acreditam que o abandono escolar esteja, entre outras razões, ligado às práticas educativas desvinculadas das 
necessidades dessa parcela de estudantes. A partir das reflexões, a proposta tem por objetivo um fazer 
pedagógico diferenciado e voltado para as discussões e conflitos que permeiam a sociedade, por meio de 
histórias literárias. 
 
Situação do Parecer: Aprovado 
Necessita Apreciação da CONEP: Não 
UBERLANDIA, 29 de Março de 2019 
 
 
 
Assinado por:Karine Rezende de Oliveira (Coordenador(a)) 
 
 
230 
 
 
 
ANEXO K – Convenções do PETEDI para transcrição de Material Oral 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA 
INSTITUTO DE LETRAS E LINGUÍSTICA 
PETEDI- Grupo de pesquisa sobre texto e discurso.  
 
Pesquisa sobre gêneros orais.  
Convenções do PETEDI para transcrição de material oral 
 
 
1.  Quadro de Sinais de Transcrição 
Ocorrências Sinais Exemplos / Observações 
Sobre a grafia das   
palavras 
Nomes próprios em Iniciais maiúsculas • a festa foi na casa do João... 
geral OBS.:   Não   usar   maiúsculas    após   os 
seguintes sinais de pontuação: de 
interrogação e  exclamação,  reticências  etc. 
Nomes próprios que Não transcrever o • Doc.: Dona M., a senhora falou que 
identificam o nome e colocar o J., seu marido... 
informante ou pessoa apenas as 
do relacionamento iniciais 
do informante ou a maiúsculas. 
que ele se refira  
Nomes de obras Em itálico e grafia da • eu adorava ouvir Fascinação ...que 
(livros, revistas , língua de origem música ( (entonação de admiração)). 
jornais, filmes, etc) quando for o caso • meus alunos adoraram ler 
e/ou nomes comuns Grande Sertão  Veredas 
estrangeiros 
Marcadores Ocorrência seguida • ele me chamou para ir com ele, né? 
discursivos e de ponto de • olha eu não quero que você me 
conversacionais interrogação, quando entenda mal 
for o caso. • eu não quero sair com 
você... entendeu? 
• Fáticos: ah, Usa-se o ponto de • ah! ... que alívio... 
éh, eh, ahn, exclamação> • vixe! ixe! pô! nossa! 
ehn, uhn, ta, 
etc 
• Interjeições 
dicionarizada
Numes roauis  neã loe tras Por extenso • compareceram dez condôminos ... 
• aí ela disse... marque com um xis 
a alternativa bê... 
• não... escreve com jota ... 
 
231 
 
Siglas e abreviaturas Grafar conforme a Ex. 1: B.O., I.N.S.S., U.F.R..J ., 
Importante:  Siglas pronúncia do R.G., C.P.F. 
não se confunde com informante.  Se Ex. 2: USP, TAM, UFU, SUS, FAPEMIG. 
redução de palavras, pronunciada letra a 
como,  por exemplo, letra (ex.l), grafar 
depê, para em caixa alta 
"dependência”, que separando as letras 
devem ser grafadas por ponto. Se 
 a sua forma pronunciada como  
reduzida em palavra (ex. 2) , 
minúsculas seguir a grafia 
prevista pela 
ortografia , em caixa 
alta e sem pontos . 
Truncamento / (usar uma barra • ...ca /casou semana passada .... 
(palavras para marcar o • e aí comê/ quis começá a cantar ... 
incompletas , cuja truncamento)  Se 
pronuncia foi houver homografia , 
interrompida por usa-se acento 
qualquer razão) indicativo da tônica 
e/ou timbre. 
Citações literais ou "aspas duplas" • Pedro Lima... ah escreve na 
leitura de textos , ocasião... "O cinema falado em 
durante a gravação. língua 
estrangeira não precisa de nenhuma 
barreira  entre nós"... 
• Armstrong disse... "pequeno passo 
para o homem ... gigantesco salto 
para 
Sobre alguns   
a humanidade "... 
aspectos morfo- 
fonológicos 
Indicar as   
realizações  não 
previstas das 
preposições, 
quando houver, 
conforme a a h 
abaixo. 
a)   Contração da  c'a (=com+a) , c'o (=com+ o), c'um (=com 
preposição com  + um), c'uma (=com + uma) 
+ artigo  
b) Contração da  d'um (=de + um), d 'uma (=de+uma) 
preposição de +  
artigo indefinido Indicar a contração 
c) Contração da d'eu (=de+EU) 
com um apóstrofo 
preposição de + 
pronome eu 
d) Contração da d'oeste (=de + oeste) , d'água (=de 
preposição de + + água), d 'onde (=de +onde) 
palavra iniciada 
por vogal 
 
232 
 
e) Redução da Registrar a forma pra (sem acento), pa (sem acento) 
preposição para realizada 
f) Contração da Registrar a forma pra (= para + a), pa (=para+a), pro 
preposição para realizada (=para+o), po (=para+o), pr'um(a) 
reduzida + artigo (=pra+um(a)) , pum (=pa+um(a)) 
g) Modificação da Grafar como ela for • a gente vai muito ne no rio pa pescá 
preposição em realizada: ne, ni. • aí fui ni casa di Márcia.. 
h) Inserção / Registrar a forma • eu penso de que ele não deve ir... 
modificação de realizada • eu perguntei na onde ele morava ... 
preposição • eu pergunte daonde ele vinha... 
Sobre alguns   
elementos 
prosódicos 
Silabação Hífen entre as sílabas por motivo tran-sa-ção 
sem espaço. 
\Pausa Reticências OBS.: • ... ele...voltou feliz... 
Não se utilizam • são três motivos ... ou três razões ... 
sinais de pausa , que fazem com que se retenha 
típicos da moeda ... 
língua escrita, como existe uma... retenção... 
ponto-e-vírgula, 
ponto final, dois 
pontos, vírgula. As 
reticências marcam 
qualquer tipo de 
pausa. 
Enfase / Entoação CAIXA ALTA • ... ele almoçou com ELA. .. 
enfática • porque as pessoas reTÊM  moeda 
Alongamento ou Dois pontos • ao emprestarem os... éh::: ... dinheiro 
prolongamento  de digitados duas vezes. • ele a::cha... 
vogais e consoantes Quando o 
(como r, s) alongamento é bem . . 
maior usa-se mais 
dois pontos. 
Interrogação Usa-se o ponto de • e Banco... Central...certo? 
interrogação • você vai à festa? 
Sobre alguns   
aspectos da 
interação 
Identificação dos Doc.: Doc.: o senhor gosta de pesca? 
participantes da Documentador Inf.: eu não sei pescar... eu não aprendi ... 
interação 18Inf.: Informante 
Int.: Interveniente 
OBS.: Havendo mais 
de um informante 
deve-se numerar: Inf 
1, Inf 2 ...... Inf N. 
Início de turno Usa-se sempre letra Veja exemplo acima 
minúscula 
                                                     
18 O tipo de informante (comediante, leiloeiro, benzedor, narrador esportivo, etc. só será indicado na ficha de 
identificação do material) 
 
233 
 
Discurso direto Aspas duplas e ... ela disse -"vamos à festa" -eu 
travessão antes e respondi -"talvez" - 
depois do trecho em 
discurso direto 
Sequência de Separar por # Inf.: aí ele falou -"cadê o dinheiro?"- 
discurso direto (sustenido) cada um # -"tá lá atrás" -o outro falou 
dos turnos 
Mudança de fluxo Duplo underline: _ _ • ... eu não tinha _ _ fique quieto 
discursivo: kdkdkdkdk -- ((falando com o cachorro)) _ _ 
comentários que tempo 
quebram a sequência de estudar... 
temática; desvio • ... a demanda de moeda -- 
temático. vamos dar essa notação _ _ 
Superposição, Texto entre colchetes Inf.d1:eemu annãdo at idneh am soaeíddoa  dpeo lrá m...[oet ifvooi  
simultaneidade de m índice sobrescrito então...] 
vozes á esquerda do Doc.: 1[cê tava] em casa ainda Inf.1: eu 
colchete inicial. tava... e foi então que ele ligou... 
Todas as 
sobreposições devem 
ser indicadas 
sequencialmente em 
toda transcrição (1, 
2, 3, ... n. ) 
Intervenção do Se não houver Inf.: outro dia eu estava na casa do João 
documentador no sobreposição de [Doc.: ahan] quando... 
fluxo de fala do vozes 
informante Se houver sobreposição de vozes  
sobreposição de Inf. :  outro dia eu estava na casa do 
vozes ¹[João] ¹[Doc.: ahan] quando... 
Risadas simultâneas  Doc e Inf.2 (( risos)) 
de documentador e 
informante(s) 
Sobre os   
comentários do 
transcritor 
Hipótese do que se Entre parênteses   ...foi então que ele fez a prova... 
ouviu (hipótese)  (estou) meio preocupado com 
meu filho 
Comentário Entre parênteses  eu preciso ((tossiu))estudar 
descritivo do duplos e em itálico  (( fazendo um gesto de 
transcrito impaciência)) você não está me 
ouvindo.   
 você não vai me 
roubar((gritando)) 
OBS.: Nestes comentários serão 
registrados: a)gestos, b) expressões 
fisionômicas, c) risos, d) atitudes 
corporais, e) entonações específicas do 
trecho (carinhosa, nervosa, de deboche 
etc.), d) a cadência do trecho (ritmo, 
velocidade: cadenciado, falando muito 
rápido, etc), ou seja, todos os elementos 
de outras linguagens de uso concomitante 
 
234 
 
à língua e também qualquer dado que 
possa interessar a algum estudo que use o 
material. 
Incompreensão de (    ) Usar um do nível de renda... (   )  nível de renda 
palavras ou parênteses vazio com nominal ... 
segmentos 3 espaços.   
Indicação de que o (...) Usar um (...) nos vimos que existem... 
turno foi tomado ou parênteses com 3 
interrompido em pontos dentro no 
determinado ponto. lugar de tomada da 
Não no seu início, fala. 
por exemplo 
 
 
ATENÇÃO: 
1) Pode-se combinar sinais. Exemplo:oh::: ...(alongamento e pausa); 
 
Diagramação da transcrição 
 
A diagramação do material transcrito será feito numerando-se as linhas de 5 em 5, dando 
destaque à indicação dos informantes e o texto ficará à direita da indicação do documentador e 
informantes. 
Para facilitar esta diagramação deve-se usar a tabela abaixo, conforme exemplo posto. 
(0 exemplo apresentado é do material do NURC-RJ - Diálogo entre dois informantes, 
Inquérito número 158) 
 
Quadro para transcrição do material 
 
Linha Participante Texto transcrito 
1 Doe experiências pessoais basicamente ... vivências ...não é preciso que 
vocês não vão deixar nada teórico ... quanto menos vocês 
colocarem em termos do que vocês sabem a respeito ... mas 
colocarem em termos do que vocês viveram a respeito desse 
assunto ... mais interessante ... 
5 Inf. 1 bom ... como é que está o tempo? 
 Inf. 2 o tempo está feio... isto eu lhe garanto ... né ... agora...saindo do 
tempo pras viagens você disse que esteve em Recife... aonde você 
esteve? 
 Inf. 1 em Recife... 
 Inf. 2 bom ... mas você viu em Olinda? 
10 Inf.1 não... fui somente a Recife... fui padrinho de casamento de 
uma amigo meu em Maceió ... 
 
Dicas: 
a) Cada participante tem uma linha. Se a fala for longa, o espaço do texto não pode sair 
da célula relativa ao número do participante. É só ir digitando que o próprio computador 
já vai organizando a tabela e ampliando a célula do texto. 
 
235 
 
b) Depois de terminada a transcrição, pode-se eliminar as linhas de grade para dar mais 
visibilidade ao formato da transcrição. 
2. Sobre a identificação do material oral transcrito 
 
Cada material transcrito deve ser identificado da seguinte maneira. 
1) Dar um título da situação comunicativa e numerar com uma numeração 
sequencial para cada tipo de material da seguinte maneira: 
a) Leilão 1 gravado em _ / _!     
b) Leilão 2 gravado em / _!     
e)   etc. ou 
a) Narração esportiva 1 gravada em _ / _!    
 
b) Narração esportiva 2 gravada em _ / _!  
c)   etc. 
 
2) Registrar o maior número possível de informações sobre o material, sua forma de 
obtenção e sobre os informantes. de acordo com 
3) Indicar todos os dados possíveis sobre o material, como foi obtido, onde foi 
exibido (rádio, TV, internet, etc. quando se tratar de programas), nome do 
programa, horário em que foi exibido, onde foi gravado (no caso de gravações de 
indivíduos, como leiloeiros, pastores, narradores esportivos, benzedores, 
entrevistados, etc.), site onde está disponível, etc. Colocar também toda 
informação disponível sobre o informante: tipo de informante (entrevistado, 
narrador esportivo, comediante, pastor, benzedor, etc.) idade, sexo, local de 
nascimento, local onde reside na época da gravação do material e há quanto tempo 
reside neste local, grau de instrução (fundamental completo ou até série X, médio 
completo ou até série X, superior completo ou período em que está e qual o curso 
cursado ou em andamento, etc. Isto deve ser feito numa ficha cabeçalho com o 
modelo abaixo. 
 
ATENÇÂO:  O cd, fita, etc. onde o material foi gravado deve ser identificado com o rótulo 
dado ao material na primeira linha. 
 
Material Indicar o gênero e o número do material do gênero 
gravado. Por exemplo:  Narração esportiva 1/ Programa 
humorístico 2 / Benzeção 1 / Depoimento 1/ etc. 
Documentador Indicar dados do documentador 
Informante 1 Nome, tipo/profissão (comediante, leiloeiro, etc.), sexo, 
idade, escolaridade (indicar se é nível completo ou série), 
naturalidade (lugar onde nasceu), cidade em que foi feita a 
gravação e há quanto tempo mora aí. Outras infomações 
pertinentes 
Informante 2 Idem 
..........  
Informante N Idem 
Data do registro  
(gravação) 
 
236 
 
Duração em minutos  
Transcritor Indicar dados do transcritor 
Revisor( es) Indicar dado do(s) revisor(es) da transcrição, se houver. 
Site e outras informações  
pertinentes para o trabalho 
feito ou outros trabalhos 
que venham a usar o 
material.