UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA 
 
 
DANILO GOMES FERREIRA 
 
 
 
 
 
 
EXISTENCIALISMO E MARXISMO: 
A INTERLOCUÇÃO ENTRE SARTRE E LEFEBVRE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Uberlândia 
2014 
  
DANILO GOMES FERREIRA 
 
 
 
 
 
 
EXISTENCIALISMO E MARXISMO: 
A INTERLOCUÇÃO ENTRE SARTRE E LEFEBVRE 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Filosofia da Universidade Federal de 
Uberlândia, como requisito parcial à obtenção do 
título de Mestre em Filosofia. 
 
Área de concentração: Filosofia Moderna e 
Contemporânea  
 
Linha de pesquisa: Ética e Conhecimento 
 
Orientador: Prof. Dr. Simeão Donizeti Sass  
 
 
 
 
 
 
Uberlândia 
2014 
  
Danilo Gomes Ferreira 
 
 
 
 
Existencialismo e marxismo: 
A interlocução entre Sartre e Lefebvre 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Filosofia da Universidade Federal de 
Uberlândia, como requisito parcial à obtenção do 
título de Mestre em Filosofia. 
 
Área de concentração: Filosofia Moderna e 
Contemporânea  
 
Linha de pesquisa: Ética e Conhecimento 
 
 
 
Uberlândia, 31 de março de 2014 
 
 
 
 
Banca Examinadora 
 
 
 
 
 
________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Simeão Donizeti Sass – IFILO / UFU 
 
 
 
________________________________________________________________ 
Prof. Dr. José Carlos Souza Araújo – FACED/ UFU 
 
 
 
________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Malcom Guimarães Rodrigues – DCHF/UEFS 
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a toda a minha 
família, principalmente à minha mãe, 
Luiza Gomes Ferreira, que sempre me 
apoiou e me deu todas as possibilidades 
de concretizá-lo com êxito. 
  
AGRADECIMENTOS 
 
 
Agradeço à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG), que me 
apoiou financeiramente, custeando minha pesquisa e a todo o Instituto de Filosofia. Gratidão 
pelas aulas que tive no mestrado que foram de imensa importância para a realização desta 
dissertação e para minha vida, aos professores que foram de suma relevância para que este 
trabalho fosse executado, pois minha formação acadêmica e humana não se resume a este 
texto e sim como uma totalidade de minhas ações e convivência. Os professores: Dr. Alcino 
Eduardo Bonella, que sempre me ajudou e nunca se negou em sanar as minhas dúvidas, 
mesmo que não pertencesse à sua área, o Dr. Bento Itamar Borges, que tive o prazer de ter 
aulas com ele, me demonstrou uma visão diferente de se entender o marxismo e a teoria 
crítica, o Dr. Jairo Dias Carvalho, que participou de minha banca do TCC e enriqueceu muito 
meu trabalho, o Dr. Jakob Hans Josef Schneider, que sempre de maneira informal me apoiou e 
ensinou várias interpretações filosóficas, principalmente Hegel e Hobbes, o Dr. José Benedito 
de Almeida Jr., com sua irreverência e inteligência me apresentou ao caminho da docência, a 
eles meu muito obrigado. Agradecimento especial ao meu orientador, o Professor Doutor 
Simeão Donizeti Sass. Sua paciência e presteza foram sublimes, sendo de necessária 
importância para minhas pesquisas e solução das dúvidas pertinentes a um trabalho deste 
porte. De modo sumário, sem sua orientação este trabalho simplesmente não existiria. Por 
fim, agradeço aos meus pais, que desde sempre fizeram o possível para que minha formação 
como ser humano fosse a melhor possível, o trabalho deles foi feito, mas meus atos passam a 
ser de minha responsabilidade e não deles. Sem o empenho de minha mãe, no propósito de me 
transformar em um homem, eu não seria o que sou hoje. Sem ela, eu não existiria, tanto 
biologicamente, quanto moralmente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“O real não é imóvel, dado de uma só vez, 
pronto e acabado. Trata-se de um devir; 
portanto, de uma possibilidade”.  
(LEFEBVRE, 2011) 
 
“A liberdade é total e infinita, o que não 
significa que não tenha limites, mas sim que 
jamais os encontra”. 
(SARTRE, 2002) 
  
RESUMO 
 
 
Pensar a filosofia sartreana faz com que sempre lembremo-nos da máxima “a existência 
precede a essência”. Sartre tem uma concepção de homem totalmente diferente de filósofos 
idealistas e, principalmente, cristãos, pois ele inverte as noções de existência e essência, 
veremos isso em Existencialismo é um humanismo. Se para pensadores cristãos a essência, 
nossa forma de ser, o ser humano definido, precede a existência do homem no mundo, para 
ele esta ordem está invertida. Isto por que ele defende um ateísmo teórico, no qual é o próprio 
ser humano que define sua essência, através de seus atos. O homem é o que faz ao longo de 
sua vida. Por isso, temas como a liberdade, que é situada e concreta; a escolha, exercício da 
liberdade na vida; a responsabilidade, inerente às escolhas que devemos fazer constantemente; 
a angústia, pois somos nós mesmos que somos os criadores de nossos “destinos”, e, 
consequentemente, responsáveis por eles; e, por fim, a má-fé, que nada mais é do que a 
negação desta autenticidade livre e responsável do homem, são de extrema importância em 
Sartre. A relevância de Henri Lefebvre em seu Marxismo, recai no fato de que ele é 
extremamente neutro em relação ao marxismo. O pensador expõe seu marxismo de modo 
prático e eficiente, rejeita ideias abstratas e a prioristas, e afirma que somente levando em 
conta a realidade humana e uma metodologia dialética como substrato, teremos uma verdade 
válida. Tal realidade é contraditória e inóspita, e para termos conhecimento ou moral devemos 
partir dela. Sartre em Questões de Método não se opõe a Marx e sim a alguns marxistas, que 
tentam tornar as verdades históricas, concretas e práticas em Verdades eternas. Se notarmos 
bem, Marx, Sartre e Lefebvre rejeitam tal posição, pois o conhecimento (Saber) é a 
totalização dos saberes de pessoas (Ser) de um dado tempo, que vale e se remete a este tempo, 
que não é eterno. E a moral deve ser concreta e uma superação da alienação e ou dificuldades, 
de forma coerente e racional. 
 
 
 
Palavras-chave: Existencialismo. Marxismo. Conhecimento. Moral. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
ABSTRACT 
 
 
Think about Sartre’s philosophy remind us the aphorism “existence precedes essence”. Sartre 
had a totally different conception about men when compared to idealistic philosophers and 
mainly the christians ones. Because he inverts the notions of existence and essence and we 
can see this in Existentialism is a humanism. If for christian thinkers the essence, our way of 
being, the defined human being, precedes the existence of men in the world, for him this order 
is inverted. He defended a theoretical atheism, in which is the human being itself is who 
defines his existence through his acts. A man is what he does along his life. Therefore themes 
like freedom, which is situaded and concrete, the choice, exercise of liberty in life, the 
responsibilityinherit choices we must make constantly; the anguish for being ourselves 
makers of our “destiny” and consenquently responsible for them; and finally bad-faith which 
is nothing short of denying over free authenticity and responsibility of men, are very 
important in Sartre’s literature. The importance of Henri Lefebvre in his Marxism remains in 
the fact that he’s extremely neutral upon marxism. The thinker expose his maximum on 
pratical and efficient way, rejects abstract and to priori thinkers, he afirms that only 
considering human reality and dialectical methodology as susbtrate we will have a valid truth. 
Such reality is contradictory and inhospitable, and in order to reach knowledge and moral we 
should assume from it. Sartre in Search for a Method do not object to Marx but to some 
marxists, who try to turn historical truths, pratical and concrete into eternal truths. If we notice 
carefully Marx, Sartre and Lefebvre reject such position, because knowledge (Know) is the 
totalization of people knowledge (Being) from a period, which values and remits to this 
period which is not eternal. Moral should be concrete and an alienation and difficulties 
overcoming in racional and consistentway.  
 
 
 
Keywords: Existentialism. Marxism. Knowledge. Moral. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
SUMÁRIO 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9 
 
1 O EXISTENCIALISMO HUMANISTA ........................................................................... 16 
1.1 Críticas ............................................................................................................................ 16 
1.2 Teoria humanista existencial ........................................................................................ 20 
1.3 Subjetividade, moral e liberdade ................................................................................. 29 
 
2 O MARXISMO DE HENRI LEFEBVRE ......................................................................... 44 
2.1 Críticas e concepção de mundo .................................................................................... 44 
2.2 Materialismo Dialético .................................................................................................. 51 
2.3 Alienação e moral .......................................................................................................... 59 
 
3 ANÁLISE SARTREANA DO MARXISMO .................................................................... 73 
3.1 Antecedentes................................................................................................................... 73 
3.2 Marxismo e Existencialismo ......................................................................................... 83 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 97 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 103 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
De modo geral, este trabalho visa apresentar as teorias: existencialista, contida no 
Existencialismo é um humanismo de Jean Paul Sartre
1
 e marxista, pesquisada no Marxismo de 
Henri Lefebvre
2
. Depois, o entendimento de Sartre sobre o marxismo e seu embate com 
alguns marxistas ortodoxos – aqueles que colocam os conceitos marxistas como verdades 
absolutas –, dentre eles Lukács, abordado em Questões de método. Busca ainda, demonstrar e 
explicar as principais ideias, conceitos e argumentos contidos nestas obras. 
Para isto, é preciso considerar, inicialmente, que para Sartre não há como fundamentar 
pensamentos filosóficos desvencilhados da realidade. Para o pensador, ou a filosofia dá conta 
dos problemas do homem, a partir de seu próprio mundo, ou ela torna-se uma retórica 
falaciosa. Isto é, a filosofia tem de compreender que a realidade humana está inserida nela 
própria. Não há um âmbito para a filosofia e outro para a convivência humana, os dois estão 
no mesmo campo do concreto. 
Assim, no primeiro capítulo, intitulado de Existencialismo Humanista, abordamos a 
teoria humanista existencial de Sartre. Na qual o pensador trabalha vários de seus principais 
conceitos e tenta se defender de inúmeras críticas, principalmente, as marxistas e cristãs. Os 
marxistas o reduz a um defensor de um humanismo que isola o homem em si, sem deixar 
sequer uma brecha para a socialização humana.  
Tal crítica é derivada do fato que Sartre, assim como Husserl, parte de uma 
subjetividade consciente. A consciência se intenciona para entender ou conhecer algo, ou 
alguém. Mas, veremos que a subjetividade que Sartre usa não é pautada somente no 
cartesianismo, o cogito, é uma subjetividade relacional, que precisa da vivência para ser. 
O existencialista francês parte de uma subjetividade que define o homem como 
totalidade de suas realizações, um querer e fazer-se a si próprio ao longo de sua existência. 
Este homem não pode ser confundido com qualquer outro objeto, há uma diferenciação 
ontológica. Um objeto não possui consciência reflexiva de si próprio, do mundo e dos outros, 
somente as pessoas humanas. 
Já a crítica cristã recrimina Sartre por ele ser ateu, o que supostamente resulta no fato 
de que toda e qualquer ação, por mais cruel e injusta que seja não pode ser taxada de imoral, 
                                                 
1
Jean-Paul Charles Aymard Sartre, mais conhecido por Sartre, nasceu em 21 de Junho de 1905, na cidade de 
Paris e faleceu em 15 de Abril de 1980. Foi além de um grande filósofo, um inconfundível escritor e um coerente 
crítico. Defendia e fundamentava seu existencialismo de forma concisa e racional. 
2
Henri Lefebvre nasceu em 16 de junho de 1901 na cidade de Hagetmau, França e faleceu em 29 de junho de 
1991em Navarrenx, cidade francesa. Foi filósofo marxista e sociólogo. Sartre o destaca por sua neutralidade 
perante a teoria marxista. 
10 
 
visto que, não existe Deus para criar os valores e virtudes que guiem os passos humanos. 
Tudo está liberado para se fazer o que quiser. Não há regras para manter a ordem e a 
civilidade das pessoas. 
Observaremos que não é bem assim, o existencialista francês apenas muda a 
responsabilidade perante os valores. Se para a Igreja Deus é responsável pelos valores, para 
ele os homens é que são. A “existência precede a essência”, em primeiro lugar o homem 
existe, nasce, aparece no mundo e toma consciência de si, e depois é que se define (essência).  
Diante deste princípio do existencialismo sartreano o homem passa a ser responsável 
por sua ética, moral e ações. Não existe Deus, o homem está só no mundo, onde tem que 
viver, trabalhar e ser, com todas suas dúvidas e conflitos. Com isso, cabe a ele, somente a ele 
e a nada mais e a ninguém, se definir enquanto existente e ser humano. Tudo que ele escolher 
fazer é de plena e inteira responsabilidade dele. 
Isto se deve ao fato de que, nas palavras de Sartre, o homem está condenado a ser 
livre. O homem nasce em liberdade e é assim que ele realiza todas as suas ações em 
sociedade. Suas escolhas são providas dele, em todo seu abandono divino, tudo o que ele 
escolher vai gerar certas consequências, que nem sempre são boas. O ser humano é 
responsável por si, por suas escolhas e pelos seus próximos.  
Nesta perspectiva, a escolha é então a aplicação prática da liberdade, que é situada e 
concreta, e não um conceito abstrato e metafísico. Daí se torna inerente uma concisa 
responsabilidade que deve ser abrangida ao máximo possível. Perante todo este quadro 
conflitante aparece no ser humano a angústia, que é um sentimento posterior a todo este 
processo de liberdade responsável.  
A angústia não pode ser encarada como algo causal da escolha e sim como 
consequência. Ela não pode ser uma parede que nos separa da ação. Mesmo que pareça que 
todo o peso do mundo recai sobre nossos ombros, nunca podemos deixar de realizar nossas 
ações, nossos projetos e nosso ser. Por mais que estejamos angustiados, as escolhas estão 
sempre aí, para “serem escolhidas”. Quando recusamos a escolha é o mesmo que “escolher 
não escolher”. 
O projeto do homem é outro conceito relevante em Sartre. O homem se projeta, 
conscientemente, elaborando com toda atenção seus passos que serão dados em determinado 
tempo posterior. Isto é uma transcendência consciente e subjetiva do ser humano num futuro, 
que ele antes planejou. Não é um salto incerto, pelo mesmo ter uma noção daquilo que ele 
deverá fazer. 
A negação ou distorção de todos estes conceitos sartreanos é uma rejeição de seu 
11 
 
próprio ser. Recusar a liberdade, com a escolha, a responsabilidade e a angústia é, sem 
dúvidas, a negação da própria existência humana. Quem faz isso está agindo de má-fé
3
 e se 
recusando ser o que é. Um ser humano que se compromete em suas ações, de modo coerente e 
moral, não cai neste erro. 
Por conseguinte, a discussão proveniente das críticas, uma das quais Sartre é 
interpelado por Naville, serão postas em notas de rodapé visando reforçar o entendimento de 
sua teoria, fazendo, a partir disto, uma reflexão sobre os aspectos diversos abordados por 
Sartre, para tentar elucidar de forma clara as questões pertinentes, amplas e complexas sobre a 
existência do homem em seu âmbito filosófico.  
No segundo capítulo, Marxismo de Henri Lefebvre, abordaremos a visão do marxista 
francês sobre o próprio marxismo. Tal perspectiva é considerada por Sartre uma das mais 
neutras, nela é tratado o marxismo na sua forma mais pura, sem corrupções teóricas. O 
marxismo de Marx, aquele que realmente tem fundamentações práticas e que defende um 
conhecimento provindo da práxis. 
Em primeiro lugar Lefebvre distingue filosofia de concepção de mundo, a primeira 
está e faz parte da segunda, que é uma visão totalizadora da sociedade de determinado tempo. 
É uma ação e não uma “atitude filosófica”. A ação é algo que independe de uma conceituação 
teórica.  
Depois, ele apresenta as únicas três concepções de mundo existentes, segundo ele
4
. A 
primeira é a cristã, estabelecida de forma mais crítica pelos teólogos católicos, que coloca os 
interesses de políticos ou governos como dogmas, ou seja, os sacerdotes defendem aquilo que 
é conveniente aos que dominam. 
A segunda é a concepção individualista, que se inicia no fim século XVI, da qual 
Montaigne é o principal expoente, esta é a posição do liberalismo. Aqui o indivíduo se torna a 
razão, o que é de extrema importância nesta vertente, pois ela se apresenta como um liame 
entre os interesses individuais e gerais em todos os aspectos. O indivíduo se torna o foco nesta 
vertente. 
A terceira, e mais importante, é o marxismo, a concepção de mundo na qual Lefebvre 
se inclui e é defensor. Ele recusa as duas posições anteriores. Não recorre a explicações 
                                                 
3
 Cf. (SASS, 2011, p. 47) O professor Simeão Donizeti Sass expressa de forma precisa este termo: “Ao abordar o 
comportamento da má-fé, Sartre procura demonstrar que o ser humano também é capaz de agir negativamente 
em relação a si mesmo. Esse posicionamento de Sartre é importante para revelar que todo ato de negação só se 
viabilizará se estiver esclarecido o modo como o homem pode suportar tal possibilidade”. 
4
 Trataremos apenas deste posicionamento de Lefebvre, que pode vir a ser influenciado por Lucien Goldmann, 
nascido em Bucareste, Romênia em 1913 e faleceu em Paris em 1970, que foi um marxista que também abordou 
o termo visão de mundo. Para ele são quatro: cristã, liberal, positivista, que tem por ícone Comte, na primeira 
metade do século XIX e por fim a marxista. 
12 
 
fundadas em uma hierarquia de superioridade provinda de seres supremos e acima dos 
homens (metafísica) e nem em uma explicação na qual o indivíduo e sua consciência se 
apresentam como o fim de si mesmo e de uma concepção de mundo. 
Seguindo isto, Lefebvre vai explicar a teoria materialista dialética, que se fundamenta 
nas contradições contidas na práxis e sob o solo denso e firme da metodologia dialética e da 
razão dialética. Apresenta também a alienação, conceito de extrema relevância em Marx, que 
é situação opressora a qual o proletariado se encontra, a de ser explorado e não ter valor 
moral, nem na participação do capital. Ele participa da produção das riquezas, mas não tem 
uma justa recompensa e ainda, não se reconhece em seu produto. 
A Moral seria a superação desta repressão selvagem e descomedida. A alienação, que 
estipula até denotações do tipo, humano e desumano, é o obstáculo a ser ultrapassado. As 
morais antes postas, por inúmeros pensadores, sempre defendiam ou princípios abstratos 
como valores a serem seguidos, ou ideologias que servem de instrumentos de dominação dos 
burgueses; e tais doutrinas devem ser repensadas, afirma Lefebvre. 
O terceiro e derradeiro capítulo, A análise sartreana do marxismo, resulta da pesquisa 
feita em Questões de método. Obra em que Sartre, além de abordar seu entendimento sobre a 
teoria marxista, se defende de algumas interpelações, esclarece e critica a algumas posições de 
“certos” marxistas. Nesta obra vemos que Sartre considera positivamente o pensamento de 
Lefebvre. 
Para ele não existe “a Filosofia”, nos moldes de ciência eterna e axiomática, na qual 
seus princípios são absolutos. Existem filosofias, que são situadas, históricas e uma 
totalização dos conhecimentos de um tempo. Assim, o filósofo se apresenta como um 
elemento ativo de transformação da realidade, com isto, ele transcende sua teoria, pois propõe 
saídas para aqueles que as querem e caminhos diferentes para os que necessitam, e tudo isso 
de forma racional e metódica. 
Antes de adentrar no terreno do marxismo, propriamente dito, ele traça um caminho de 
algumas teorias que o antecedeu. Estas defendem posições diferentes ou menos completas em 
relação ao materialismo dialético, que segundo ele, é a filosofia insuperável de seu tempo – na 
medida em que as situações que o engendraram ainda não foram superadas.  
Destaque para o idealismo hegeliano (Georg Wilhelm Friedrich Hegel, 1770, Stuttgart 
- 1831, Berlim, Alemanha), que dá ao Conhecimento um movimento histórico e uma 
objetividade para o Ser, mas tende muito para um abstratismo conceitual, isto é, os conceitos 
se tornam ideias eternizadas. O espírito absoluto é o repouso de todos os conceitos presentes 
numa determinada sociedade, os quais se tornam separados e acima dela. 
13 
 
Já a teologia de Søren Aabye Kierkegaard (1813-1855, Copenhague, Dinamarca) dá 
uma concretude ao ser e ao conhecimento, mas remete e subordina tudo ao metafísico, não há 
superação humana por ele próprio. Os conceitos dependem das sensações, só se sabe o que é o 
amor amando, porém, também é relativo a Deus. A noção de mediação é rejeitada pelo 
dinamarquês.  
Jaspers (Karl Theodor Jaspers, 1883 Oldemburgo, Alemanha - 1969, Basileia, Suíça), 
outro filósofo citado por Sartre, tenta retomar um existencialismo subjetivista abstrato. Assim, 
ele o joga para um âmbito muito subjetivo e quase sempre sem representatividade ou 
relacionamento com o real.  
Diante disto, parece ser necessário que encontremos uma teoria que resolva o 
problema, e esta pode ser o marxismo, se for tratado como fez Lefebvre. É uma teoria que 
realmente nos fornece uma luz no fim do túnel para a questão do conhecimento e o estatuto do 
ser. 
O problema é que nem todos pensam como o marxista francês. Alguns marxistas 
“ortodoxos” separam o Ser do Conhecimento. Eles colocam de um lado a práxis e de outro o 
Saber. Em outras palavras, transformam os conceitos em coisas meramente abstratas e a 
vivência em coisa somente concreta. E isto nos parece ser um erro. 
Se tanto para Sartre, como para Marx, a filosofia só pode ser devinda do real, o 
conhecimento também deve ser. O erro aparece no momento em que estes marxistas 
dogmáticos fazem com que os seus conceitos, relativos à história em que foram produzidos, 
tornem-se conceitos eternos e absolutos. Não remetem ao concreto para averiguar a 
aplicabilidade de tais conceitos e os tomam como universais. 
Entretanto, Lefebvre retoma o marxismo “puro”, sem os preconceitos adquiridos ao 
longo dos tempos. Ele reescreve e relembra esta teoria da práxis, abordando o método 
dialético e a importância das contradições no mundo em que os homens se encontram. Sartre 
refere-se e elogia a Lefebvre por esta sua imparcialidade perante a teoria marxista. 
Pontuados os passos que serão dados ao longo deste texto podemos, a partir disso, 
demonstrar algumas outras ponderações. Para Sartre, assim como para Lefebvre, estes 
conceitos têm o intuito de defender que o ser humano não deve ficar procurando em coisas 
que estão além de si respostas para sua vida e anseios. Com isso, só pode haver uma espécie 
de moral, aquela fundada na concretude da vivência humana. Os princípios metafísicos 
podem até serem produtores de ações, mas a moral praticada é o ser humano que a inventa, a 
faz. 
Este tema foi escolhido porque, especialmente quando se estuda Sartre, observa- se 
14 
 
que em sua obra existe a possibilidade de se encontrar respostas fundadas na razão referente a 
perguntas alusivas ao homem. Essa teoria é uma das vertentes que busca explicar conflitos 
existenciais, muitas vezes experienciados pelos seres humanos ao longo de suas vidas, 
respostas dadas às dúvidas inquietantes sobre a essência e a existência do homem em relação 
aos outros seres humanos. 
Sendo assim, deve haver uma explicação coerente sobre os homens em seu sentido 
existencial, não desmerecendo outras teorias que norteiam-se por aspectos não tão racionais e 
lógicos quanto a teoria de Sartre. É por isso que Sartre pode ser considerado um dos filósofos 
mais importantes da filosofia contemporânea, pois ele problematiza teorias que muitos 
consideravam corretas, dando aos homens escolhas em suas existências e suas vidas. 
Nesta perspectiva, Sartre demonstra ser um autor de grande capacidade filosófica e 
realidade teórica, com uma profunda preocupação humanista, tornando-se um filósofo 
sublime no quadro histórico da filosofia, visto que, ele descreve e tenta entender de forma 
fundamental os conflitos existenciais dos homens. Deste modo, nota-se que o humanismo 
existencial pode ser considerado uma corrente filosófica inovadora, no tocante à sua 
capacidade de modificar vários paradigmas, que antes eram considerados concretos e 
irrefutáveis, e que muito contribuiu para as reflexões sobre o homem em um contexto 
contemporâneo.  
Este trabalho é uma construção de tempos de pesquisa e esforço acadêmico. Ao longo 
de tal processo apareceram várias indagações, a principal é a seguinte: como duas teorias, a 
marxista e a existencialista, que fixam seus conceitos na práxis ou que são situados, podem 
vir a ser, às vezes opostas? Pretende-se neste texto entender e demonstrar como Lefebvre está 
presente no pensamento de Sartre. 
Empregaremos um esforço para apontar uma possibilidade de relação entre os dois 
filósofos, que abordam as relações humanas e a noção de conhecimento numa perspectiva 
situada e prática. Isto é, como numa visão sartreana e lefebvriana podemos encontrar um 
entendimento concreto da coexistência humana (Ser e moral) e do conhecimento (Saber), 
visto que, não existe nenhum Deus que estabeleça Verdades, nem um homem perfeito (Ideal), 
muito menos valores fixos num céu ou conceitos abstratos.  
Dito de outro modo, como Sartre apresenta o existencialismo numa visão humanista e 
tendo a presença de Henri Lefebvre, um marxista que defende uma teoria de Marx, sem 
preconceitos. Este existencialismo seria uma espécie de idealismo contra o idealismo, pois 
visa tratar do Saber de forma concreta sem deixar de lado, a história, a subjetividade, as 
contradições e a dialética no mundo. 
15 
 
Em suma, tentaremos pensar e apresentar uma possibilidade de pensar a moral que 
tanto para Sartre
5
, como para Lefebvre deve vir da concretude situada da vida humana. O 
mesmo se aplica ao conhecimento, que não é mais aceito como princípio metafísico, 
tendencioso ou verdade eterna. O Ser e o Saber devem vir da realidade e não de conceitos 
abstratos e metafísicos para definir a práxis. 
Especificamente esta dissertação de mestrado, pretende entender o por que acontece a 
querela entre Sartre e estes preconceituosos marxistas, e, principalmente como é estabelecido 
o entendimento do filósofo existencialista em relação ao pensamento de Marx na perspectiva 
de Lefebvre. Desejamos, em suma, investigar de que forma ocorre a congruência entre as 
teorias de Sartre e Lefebvre. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
                                                 
5
 Cf. (SARTRE, 1985, p. 7) “O homem, que detém o poder da consciência, na longa jornada que se estende de 
Hegel a Sartre, transpõe, sem maiores tropeços, a rampa de todos os anti ou pós-humanismos. O processo 
determinativo da consciência, conforme o seu inconfundível corte sartreano – consciência-no-mundo, ‘situada’ –
, preserva a conhecida altivez”. 
16 
 
1 O EXISTENCIALISMO HUMANISTA 
 
 
Se notarmos bem, o texto O Existencialismo é um Humanismo se apresenta como um 
instrumento utilizado por Sartre para, além de esclarecer de modo acessível e racional sua 
teoria existencialista ateia, também e principalmente, defender-se de algumas críticas. Neste 
sentido, Maciel se torna importante em nosso trabalho porque explana de forma simples a 
importância desta obra sartreana. Maciel afirma: 
 
A conferência de Sartre O existencialismo é um Humanismo é a exposição 
mais conhecida do existencialismo. Sua repercussão foi imensa. Sua fórmula 
“a existência precede a essência” é usada em quase todos os novos manuais 
de filosofia para definir o existencialismo (MACIEL, 1967, p. 122). 
 
Por esta razão, Sartre aborda alguns dos principais conceitos contidos em seu 
pensamento filosófico. Seguindo tal percurso, ele acaba demonstrando que determinados atos 
podem proporcionar aos homens um relacionamento menos conflituoso na vida social. O 
filósofo francês tenta fundar sua filosofia nos conflitos e no cotidiano humano, ou seja, na 
concretude da existência humana. Por isso, ele intitula a sua teoria um “existencialismo 
humanista”.  
 
 
1.1 Críticas 
 
 
As críticas endereçadas ao existencialismo partem de várias frentes, principalmente 
cristãs e marxistas. Os comunistas basicamente censuram Sartre por sua teoria levar as 
pessoas a um “imobilismo do desespero”, de ser uma filosofia contemplativa e burguesa. 
Sendo assim, o existencialismo seria um ato meramente soberbo, pois, segundo eles, neste 
campo, as ações humanas não seriam possíveis e estariam fechadas, necessariamente, todas as 
portas. 
Recriminações são elencadas devido ao fato de o existencialismo evidenciar uma 
espécie de maldade humana, ou seja, tratar apenas do lado sórdido de sua existência. Alguns o 
repreendem por ele, além de não confirmar, negar uma “solidariedade humana”, admitindo o 
isolamento do homem em si próprio. Assim, o homem se bastaria enquanto realização de seu 
ser, não precisando de nada e ninguém. 
Isto ocorreria porque, segundo os marxistas, esta teoria sartreana partiria da 
subjetividade pura, encontrada no cogito de Descartes, isto é, com o eu penso cartesiano o 
homem atingiria a si próprio, ficando isolado do mundo exterior, impossibilitado de 
17 
 
relacionar-se solidariamente com os outros que existem no mundo, pois, no interior do cogito 
são incapazes de serem alcançados. 
Os cristãos censuram Sartre por despertar um sentimento de gratuidade pura nas ações 
humanas, pois não existindo Deus, o homem estaria livre de qualquer ordenamento moral ou 
valores a priori de conduta, visto que Deus é a origem primeira de todos eles. Sendo assim, 
imperaria uma enorme desordem (pandemônio) moral, na qual todos fariam qualquer ato, não 
podendo, por conseguinte, homem algum subjugar atos de outros tendo como paralelo os seus 
próprios. 
Para responder a estas acusações Sartre tenta descrever uma relação concreta de 
convivência humana, partindo das próprias pessoas. Toda e qualquer ação humana seria 
exercida necessariamente por um homem em seu cotidiano, ou seja, uma ação seria 
condicionada pela subjetividade. Sendo assim, vejamos como o próprio Sartre define este 
existencialismo numa visão humanista: 
 
Em todo o caso, o que desde já podemos dizer é que entendemos por 
existencialismo uma doutrina que torna a vida possível e que, por outro lado, 
declara que toda a verdade e toda a acção implicam um meio e uma 
subjetividade humana (SARTRE, 1973, pp. 9-10). 
 
Contudo, a principal crítica enfrentada pelo existencialismo sartreano é, sem dúvida, a 
de enfatizar o lado negativo da humanidade, ou seja, não mostrar o lado bom do homem, 
somente sua maldade, aliando-o a uma feiura, sendo que, para Sartre, o existencialismo 
espanta, causa indignação, repercute mais do que o próprio naturalismo. Porém, os críticos, 
que chamam o existencialismo de pessimista, proferem frases que traduzem um enorme 
sentimento de tristeza, e eles são os mesmos que acham atos baixos e repugnantes muito 
humanos. Assim, censuram o existencialismo não por um pessimismo, mas sim por um 
otimismo duro. 
Logo, por que ocorre este temor do existencialismo? Seria porque Sartre aborda uma 
posição onde é o próprio homem quem escolhe suas possibilidades? São estas questões e 
críticas pertinentes ao existencialismo que Sartre se propõe a responder ao longo de sua obra, 
e para isto, se vale de um posicionamento lógico e concreto.  
Assim, devemos nos ater ao fato de que o existencialismo humanista, em algumas 
vezes, pode ser mal interpretado ou tendenciosamente compreendido. Este texto seria também 
uma forma de esclarecer de maneira simples esta teoria. A filosofia sartreana tem como 
objetivo abranger o máximo de pessoas possível, visto que, uma filosofia que tenta entender 
sua época e ser uma visão de mundo, deve ser totalizadora. 
18 
 
Uma grande dificuldade encontrada na definição do existencialismo é que ele se 
vulgarizou
6
 e se transformou num modismo, ou seja, as pessoas utilizavam algumas frases, 
que as definiam como existencialistas, mas na verdade, não sabiam realmente o que 
significavam ou se tais frases se adequavam ao que realmente era.  
Segundo Sartre, esta é uma teoria fundamental, muito rigorosa e é própria para os 
filósofos, porém, não é de difícil definição. O que dificulta a definição do existencialismo é 
que existem duas formas fundamentais desta teoria.  Uma é definida como existencialismo 
cristão e a outra, o existencialismo ateu. Esta última é a que Sartre assume, nesta forma 
admite-se que a “existência precede a essência” e parte-se da subjetividade. 
Para entender melhor este posicionamento teórico de Sartre em relação à existência e à 
essência, é preciso observar o que ele entende por visão técnica do mundo, que é: a produção, 
um misto de conceitos e modo de se produzir algo, precedendo a existência, a coisa fabricada.  
Isto é, para um artesão fabricar um objeto específico, como uma bola de futebol, ele 
terá de inspirar-se em conceitos e teorias para a fabricação de bolas e produzi-la sob uma 
técnica referente a este conceito, na qual procedimentos somados formariam uma espécie de 
“fórmula” para se fazer bolas.  
Então, produzir uma bola é produzi-la sob um modelo de produção, para que ela tenha 
uma serventia (praticar um esporte) definida. Com isso, a essência – técnicas, conceitos e 
finalidade para se produzir algo – precede a existência do objeto (bola) propriamente. Tal 
visão seria uma espécie de visão funcionalista do mundo, no qual tudo que é fabricado, é 
antes um esboço que possui determinada função. 
Do mesmo modo, quando se concebe um Deus criador, anterior a tudo e a todos, o 
homem se vê como uma criação Dele, igualmente. Este “Artesão supremo” teria em sua 
onipotência, o conceito, as técnicas e a finalidade para a fabricação de homens e, com sua 
onipresença, determinaria e saberia o que criou, toda e qualquer ação, vontade e desejo dos 
homens, seriam a consolidação destes conceitos. Esta visão era adotada, por exemplo, por 
                                                 
6
 Cf. (SARTRE, 1987a, pp. 22-23). Questão posta a Sartre: “Não sei se o desejo que você tem de ser 
compreendido o tornará mais claro ou mais obscuro, mas acho que o artigo de divulgação publicado no Ação 
induz o leitor a um mau entendimento”. Resposta: “Sinceramente, acho que é possível que, no Ação, minhas 
teses tenham ficado um pouco enfraquecidas; acontece, freqüentemente, que pessoas não qualificadas venham 
fazer-me perguntas. Encontro-me, então, diante de duas soluções possíveis: recusar-me a responder ou aceitar a 
discussão ao nível da vulgarização. Escolhi a segunda porque, no fundo, quando expomos teorias no colégio, 
numa aula de filosofia, aceitamos enfraquecer uma idéia para torná-la inteligível, e não é tão ruim assim. Se a 
teoria é uma teoria do engajamento, temos de engajar-nos até o fim. Se, realmente, a filosofia existencialista é 
uma filosofia que diz: ‘a existência precede a essência’, ela deve ser vivida para ser verdadeiramente sincera. 
Viver como existencialista é aceitar pagar por essa doutrina e não impô-la através de livros. Quem deseja que 
essa filosofia seja um engajamento de verdade, deve justificá-la perante aqueles que a discutem no plano político 
ou moral”. 
19 
 
filósofos do século XVII. 
Segundo Sartre, o existencialismo ateu que defende é mais coeso nesta relação entre 
existência e essência, porque não existindo um Deus superior e criador, deveria existir um ser 
originário, que não é produzido como essência e cuja essência lhe é posterior. Isto é o que 
define o existencialismo ateu, “[...] se Deus não existe, há pelo menos um ser no qual a 
existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer 
conceito, e que esse ser é o homem [...]” (SARTRE, 1978, p. 216). 
A “existência precede a essência” no sentido de que, primeiro o homem existe, nasce, 
aparece no mundo e toma consciência de si, para depois se definir (essência). Para o filósofo 
francês, o homem não se define imediatamente após sua existência, mas apenas depois que ele 
for se realizando a si próprio no decorrer de sua vida. Com isto, não haveria previamente uma 
natureza humana
7
 estabelecida por um Deus, visto que ele não existe para realizá-la, Sartre 
afirma que 
 
O homem é tão-somente, não apenas como ele se concebe, mas também 
como ele se quer; como ele se concebe após a existência, como ele se quer 
após esse impulso para a existência. O homem nada mais é do que aquilo 
que ele faz de si mesmo: é esse o primeiro princípio do existencialismo 
(SARTRE, 1987a, p. 6). 
 
Sartre parte da subjetividade que define o homem como totalidade de realizações, um 
querer a si próprio ao longo de sua existência. Sendo este homem uma diferenciação 
existencial de qualquer outro objeto, pois não existe nenhum objeto que tenha uma 
consciência reflexiva de si próprio. Esta existência subjetiva do homem, com o intuito de se 
definir, é projetada para um futuro. Este projeto do homem, que é consciente de si próprio, é 
anterior a tudo, ou seja, o homem é um projeto subjetivo que ele próprio estabelece. Postas as 
críticas e estas primeiras considerações, veremos como Sartre apresenta e fundamenta sua 
teoria humanista existencial e rebate aos críticos.  
  
                                                 
7
 Cf.(SARTRE, 1987a, p. 24) Sartre: “O homem apresenta-se como uma escolha a ser feita. Muito bem. Ele é, 
antes de mais nada, a sua existência no momento presente e está fora do determinismo natural; ele não se define 
anteriormente a si mesmo, mas em função do seu presente individual. Não existe natureza humana superior ao 
homem, mas uma existência específica lhe é dada em determinado momento”. 
20 
 
1.2 Teoria humanista existencial 
 
 
Tentaremos explicar agora, de forma esclarecedora e compreensível, os conceitos que 
norteiam a proposta de Sartre, para entender um pouco melhor algumas questões relativas ao 
tema. Para iniciar a abordagem, devemos salientar que Sartre introduz a noção de 
responsabilidade. Se, como vimos antes, no homem “a existência precede a essência”, ele é 
responsável por si próprio, não existe Deus como seu criador. Cada homem deseja posicionar 
o outro no âmbito de sua existência e conferir-lhe plena responsabilidade pelo que é, não 
apenas para com ele mesmo individualmente, mas para com toda humanidade. 
Para Sartre, existem dois sentidos para o termo subjetividade – tais sentidos serão 
tratados de maneira pormenorizada mais adiante – o primeiro é aquele no qual o homem se 
encontra incapacitado de ultrapassar o alcance da subjetividade humana, pois suas escolhas 
são individuais e pessoais. O segundo é a escolha individual do homem relacionada a todos os 
outros, quer dizer, quando cada homem escolhe a si próprio ele o faz com o intuito de 
escolher por toda humanidade. 
Todo e qualquer ato humano é feito visando definir algo, a maneira como cada um 
quer ser. Com isto, se desenvolve, igualmente, uma imagem de homem, que é admitida como 
aquilo que deve ser. O ser humano se define e cria uma imagem para a humanidade quando 
escolhe um valor. Sartre esclarece esta ação do homem que condiciona a humanidade 
advertindo: 
 
Escolher ser isto ou aquilo é afirmar, concomitantemente, o valor do que 
estamos escolhendo, pois não podemos nunca escolher o mal; o que 
escolhemos é sempre o bem e nada pode ser bom para nós sem o ser para 
todos. Se por outro lado, a existência precede a essência, e se nós queremos 
existir ao mesmo tempo que moldamos nossa imagem, essa imagem é válida 
para todos e para toda nossa época (SARTRE, 1987a, pp. 6-7). 
 
Sartre quer atribuir à escolha um caráter de comprometimento, pois ela envolve um 
valor ético, é auto-valorativa no sentido de que afeta necessariamente todos os homens. Deste 
modo, o ser humano levando em conta as consequências de seus atos, nunca deseja o mal, 
pois ele sempre busca o bem que lhe parece mais viável e agradável. E a imagem moral que o 
homem constrói ao longo de sua vida é válida não somente para todos, mas também para o 
presente tempo de sua existência. 
Então a escolha é concreta, diferente de sonhar ou desejar fazer algo: “É preciso 
observar, contudo, que a escolha, não sendo idêntica ao fazer, pressupõe um começo de 
realização, de modo a se distinguir do sonho e do desejo” (SARTRE, 2002, p. 595). Intenção 
21 
 
se confunde com ação, pois assim como nossas palavras expressam nossas ideias, nossas 
ações demonstram nossas intenções. Neste quadro conceitual, a responsabilidade atribuída ao 
homem é bem mais abrangente, pois ela envolve a humanidade inteira. Não há ação nenhuma, 
de ser humano algum, que não envolva a humanidade e que não seja de inteira 
responsabilidade da pessoa que a fez. Decorrente disto, o homem cria certa imagem de si que 
é válida para todos os homens. Sendo, por conseguinte, responsável plenamente por esta 
imagem, isto é, escolhendo-se, ele escolhe o homem. 
Com isto, pode-se entender melhor termos como a angústia
8
, que Sartre define deste 
modo: 
 
O existencialista declara freqüentemente que o homem é angústia. Tal 
afirmação significa o seguinte: o homem que se engaja e que se dá conta de 
que ele não é apenas aquele que escolheu ser, mas também um legislador que 
escolhe simultaneamente a si mesmo e a humanidade inteira, não consegue 
escapar ao sentimento de sua total e profunda responsabilidade (SARTRE, 
1987a, p. 7). 
 
O homem se define como angústia. Isto significa que toda e qualquer escolha humana, 
por mais particular que seja, envolve não apenas a ele somente, mas a todos os seres 
humanos; com isto, não há meio de se esquivar desta constante responsabilidade plena. 
Porém, o autor de uma determinada ação pode tentar mascarar a ansiedade, para si próprio, 
achando que suas ações envolvem apenas ele mesmo. Mas, tal ação maléfica é de extrema 
ineficiência ou tolice. Sartre afirma: 
 
A conseqüência essencial de nossas observações anteriores é a de que o 
homem, estando condenado a ser livre, carrega nos ombros o peso do mundo 
inteiro: é responsável pelo mundo e por si mesmo enquanto maneira de ser. 
Tomamos a palavra “responsabilidade” em seu sentido corriqueiro de 
“consciência (de) ser o autor incontestável de um acontecimento ou de um 
objeto” (SARTRE, 2002, p. 678). 
 
Com o intuito “covarde” de escapar desta responsabilidade alguns indivíduos dizem 
que nem todos fazem tais atos. Contudo, deve-se pensar o oposto. Pergunta Sartre: como seria 
se todos os homens fizessem o mesmo? Ou seja, se todos os homens tentassem escapar desta 
responsabilidade como ficaria a humanidade? 
                                                 
8 
(Cf. SARTRE, 1987a, p. 22) Indagação a Sartre: “As palavras ‘desespero’, ‘desamparo’, têm uma ressonância 
muito mais forte num texto existencialista. Parece-me que, para você, o desespero ou a angústia são mais 
fundamentais do que, simplesmente, a decisão do homem que se sente só e é obrigado a decidir. É uma tomada 
de consciência da condição humana que não acontece a todo momento. Que nós escolhemos a toda hora, é ponto 
pacífico, mas a angústia e o desespero não se produzem constantemente”. Resposta: “Não quero evidentemente 
dizer que, ao escolher entre um mil - folhas e uma bomba de chocolate, escolho com angústia. A angústia só é 
constante no sentido em que minha escolha original é uma escolha constante. De fato, na minha opinião, a 
angústia é a ausência total de justificativas e simultaneamente, a responsabilidade perante todos”. 
22 
 
Quem tenta fugir destas questões e da responsabilidade está agindo de má-fé. Estas 
pessoas, Sartre caracteriza como:  
 
Quem mente e se desculpa declarando: nem toda a gente faz assim, é alguém 
que não está à vontade com a sua consciência; porque o facto de mentir 
implica um valor universal atribuído à mentira. Ainda quando a disfarçamos, 
a angústia aparece (SARTRE, 1978, p. 222). 
 
Sartre afirma que quem não vive numa angústia ansiosa, vive disfarçado, convicto de 
que suas ações não interferem na humanidade, mas afeta apenas a si, não admitindo esta 
responsabilidade para com todos. Tentam esconder-se covardemente em uma atitude de má-fé. 
Estas pessoas que agem de má-fé, que mentem para si, não estão tranquilas com suas próprias 
consciências. 
Esta angústia é semelhante a que Kierkegaard define como angústia de Abraão, na 
qual um anjo manda que ele mate seu próprio filho. Aqui Sartre nos apresenta Abraão como 
um ícone da angústia, pois todos devem se colocar em seu lugar perante os seres humanos. 
Mas, parece quase inerente a todos a inquietante dúvida a respeito da autoridade e veracidade 
deste anjo. Se o Abraão que ele comanda para exercer tal ato é realmente este Abraão, quer 
dizer, além da dúvida que ele pode ter sobre sua fé, Abraão pode se perguntar: será que fui eu 
o eleito para inscrever na humanidade o que eu entendo por homem e que a minha própria 
escolha é realmente um ideal a ser seguido? 
Com todas estas dúvidas, é o próprio homem, mesmo não tendo prova alguma de 
quem ele é, que escolhe se existe anjo ou não, se tal ação é certa ou errada. Ele deve agir 
sempre de forma exemplar, como se todos se espelhassem em cada ação para nortear seus 
atos, ou melhor, cada homem deve afirmar para si próprio: serei eu que operarei de tal forma, 
que regularei as ações da humanidade inteira.  
Isto significa que o ser humano necessita agir de forma mais adequada o possível 
(moral), como se fosse um regulador das ações da humanidade, como se todos fossem 
norteados pelos seus atos. Cada um deve agir como um exemplo de homem correto a ser 
seguido, como um espelho de conduta para a humanidade inteira. Cada ser humano deve ser 
um parâmetro de homem a ser adotado por todos. Sendo assim, a angústia é constituinte 
condicional de sua ação. A angústia faz parte da ação, da decisão consciente e subjetiva de 
uma pessoa, pois quando se escolhe uma ação em uma multiplicidade de possibilidades, essa 
escolha tem valor por si própria, ela se torna auto-valorativa na medida em que a ação 
escolhida foi eleita perante um enorme número de ações possíveis. 
A angústia não é algo que nos afasta da escolha, ela surge desta imensa sensação de 
23 
 
responsabilidade para com a humanidade. Ela é também um elemento participativo da 
escolha: 
 
Esta espécie de angústia, que é a que descreve o existencialismo, veremos 
que se explica, além do mais, por uma responsabilidade direta frente aos 
homens que ela envolve. Não é ela uma cortina que nos separa da ação, mas 
faz parte da própria ação (SARTRE, 1973, p. 14). 
 
Sartre, ao afirmar a inexistência de Deus, busca demonstrar um total desamparo 
(solidão) humano, visto que, não existe Deus nem qualquer valor moral último, como 
honestidade ou bondade, anterior e acima do homem. Os valores humanos não estão 
prescritos num céu inteligível. Esta posição sartreana é oposta à moral laica e ao racionalismo 
francês, que aderem à ideia da não existência de Deus, mas defendem a existência prévia de 
valores humanos abstratos e idealistas, que lhes são anteriores e superiores. 
O existencialismo sartreano afirma que é até desconfortável a não existência de Deus, 
pois, assim sendo, não haveria nenhum ponto de apoio ético em que os homens principiariam 
suas condutas. Não existindo Deus, como consciência perfeita e infinita para pensar os 
valores e o bem, não haveria valores a priori e céu superior inteligível aos seres humanos, ou 
seja, não existiria nenhuma norma que declararia ao ser humano o que ele deve fazer ou não. 
É neste ponto que surge a frase de Dostoiewsky, afirmando que “se Deus não existisse 
tudo seria permitido”. É esta liberdade plena nas ações humanas que Sartre toma como ponto 
de partida de sua teoria humanista existencial, pois não existindo Deus, o homem ficaria 
abandonado e não teria onde se apoiar, a não ser em si mesmo e nunca em outras coisas.  
Segundo Sartre, “o homem é liberdade”, pois se no ser humano a “existência precede a 
essência”, não haveria uma natureza humana criada, concebida e imutável, não haveria algo 
que o comandasse. Sem a existência de Deus, não teriam as pessoas valores impostos para 
legalizar suas condutas, não ocorreriam desculpas e justificações. Com isto, o ser humano, por 
não se criar a si próprio, está condenado a ser solitariamente livre – solitário, no sentido de 
não existência de um Deus superior a humanidade.  Contudo, mesmo tendo esta liberdade 
completa, ninguém pode escapar da plena e abrangente responsabilidade vinculada aos outros 
homens: 
 
Estamos sós, sem desculpas. É o que posso expressar dizendo que o homem 
está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si mesmo, e 
como, no entanto, é livre, uma vez que lançado no mundo, é responsável por 
tudo o que faz (SARTRE, 1987a, p. 9). 
 
Sartre não aceita o argumento de que as paixões humanas (anseios e sensações) sejam 
24 
 
fundamento para os atos das pessoas, já que elas não podem ser usadas como desculpas para 
os erros de alguém, são frutos da responsabilidade do homem e não a causa primeira. Nem os 
sinais manifestados na terra podem servir de desculpas, pois eles podem ser interpretados da 
maneira mais benéfica para cada ser humano. Podem se tornar tendenciosos e parciais. 
A partir disto, Sartre define que o homem está só e sem auxílio, deve se inventar 
constantemente, a cada instante de sua vida. Em outras palavras, qualquer pessoa no mundo 
tem de realizar seu futuro, mas não um futuro previamente destinado, concebido e conhecido 
por Deus e sim um futuro projetado pelo homem, à espera dele, intocado. Neste contexto o ser 
humano se encontra desamparado e abandonado. 
Para melhor compreensão deste abandono, Sartre nos apresenta o exemplo de um 
jovem que tem de escolher entre ajudar sua mãe, que vivia sozinha, que foi deixada pelo 
marido, amargurada e que possuía apenas ele como filho, pois o outro tinha sido morto na 
guerra; ou, escolher ir para a guerra numa espécie de vingança de seu irmão morto em 
combate. 
O jovem, apoiando sua mãe – que sem sua ajuda poderia vir até morrer, devido ao 
desgosto pelo seu desaparecimento ou morte na guerra – e ficando com ela adota uma ação 
que pode até ser justificável, visto que, ele é importante para a vida de sua mãe. Em 
contrapartida, se o jovem escolher ir para guerra por vingança, esta atitude está arriscada a se 
tornar ambígua, pois ela pode até concretizar sua ação de vingança, mas há também, a 
possibilidade de ele ser nomeado secretário administrativo no comando de guerra, em 
atividade meramente burocrática, com isso, não praticaria a ação antes pretendida. 
Como se observa, há para o jovem dois tipos de ação, totalmente divergentes: 
ajudando a sua mãe, ele faria uma ação mais concreta, eficiente, mas que diria respeito apenas 
a uma restrita pessoa. Porém, escolhendo ir para a guerra, ele ampliaria seu ato, atingindo 
mais pessoas, mas sendo indefinido, pois com sua morte ou sua impossibilidade de ação, 
devido a uma designação burocrática, esta ação se tornaria inútil. Do mesmo modo, o jovem 
se depararia com duas formas de moral, uma fundada na afeição e atenção individual e outra 
abrangente e de resultados incertos. Mas, afinal, o que ou quem poderia auxiliar o jovem nesta 
complexa escolha?  
Uma opção é a teoria cristã, que prega: amai ao próximo no sacrifício e escolhei o 
caminho mais duro. Todavia, segundo Sartre, não é a teoria apropriada para solucionar este 
dilema do jovem, pois apresenta algumas inconveniências como: qual o caminho mais duro 
dentre os dois, quem seria o irmão a ser amado, a mãe ou os soldados da guerra? O que seria 
mais útil? Ajudar alguém a viver ou lutar em uma guerra? 
25 
 
Sartre define que ninguém pode decidir a priori sobre o que fazer e que não há 
nenhuma moral, previamente proposta, não há condições de afirmar com certeza e precisão 
qual é a melhor escolha. A moral de Kant propõe que não se deve tratar ninguém como meio e 
sim como fim. Mas, se o jovem escolher ficar com sua mãe, pode estar tratando-a como fim e 
os soldados da guerra como um meio, escolhendo ir para a guerra significa tratar os soldados 
como fim e sua mãe como meio. 
Poder-se-ia então levar em conta uma terceira posição, como os instintos, para 
determinar as ações de alguém, pois, como vimos, os valores além de amplos são incertos, 
como os deterministas defendem. Contudo, não há como derivar valores de sentimentos, dado 
que, somente é entendido o que se sente em determinada ação no momento em que ela for 
praticada, não há como prever o que se sentirá numa ação futura antes que ela ocorra. Os 
sentimentos são definidos pelos atos praticados e não o inverso, isto é, tentar derivar valores 
de sentimentos pode se transformar em um círculo vicioso, pois somente se sente algo se isto 
tiver sido feito. 
Segundo Sartre, é quase impossível separar o sentimento da ação (vivência), ou seja, 
dizer que se ama alguém é o mesmo que exercer uma ação que demonstre, de alguma forma, 
este amor. O sentimento deriva da ação, com isso, não se pode partir dele como princípio de 
uma conduta. Porém, poder-se-ia cogitar a ideia de alguém que estaria apto a aconselhar outro 
em uma determinada ação. Independente de quem seja o conselheiro, mesmo quando alguém 
escolha a sugestão de certas pessoas, há necessariamente o comprometimento consigo mesmo. 
Isto significa que, quando se decide procurar algum conselho, se sabe mais ou menos, qual 
será a direção apontada pelo conselheiro.  
Neste ponto, Sartre é taxativo: seja livre
9
, faça sua própria escolha, invente. Não existe 
uma moral abstrata e pré-estabelecida, por meio de um princípio de virtude a priori, que 
apresente ao ser humano a solução antecipada e precisa de sua conduta, sobre o que é preciso 
fazer a respeito de algo. O mesmo se aplica aos sinais que a Igreja católica afirma existirem 
no mundo.  
Alguém por infortúnio e fracasso que sofre na vida, como desamores, dificuldades 
                                                 
9 
Cf. (SARTRE, 1987a, p. 31). Naville: “Você deu um exemplo, longamente desenvolvido, o do jovem que o 
procurou”.  Sartre: “Não estava ele no plano da liberdade?” Naville: “Você devia ter-lhe dado uma resposta. Se 
eu tivesse no seu lugar, teria tentado informar-me do que ele era capaz, qual a sua idade, quais as suas 
possibilidades financeiras, teria tentado examinar as relações que ele tinha com a mãe. É possível que eu tivesse 
emitido uma opinião provável, mas teria certamente tentado definir um ponto de vista preciso, que talvez até se 
revelasse falso ao nível da ação, mas eu o teria com certeza levado a se engajar, de alguma forma”. Sartre: “Se 
ele veio pedir-lhe um conselho, é porque já escolheu a resposta. Em termos práticos, é claro que eu poderia ter-
lhe dado um conselho; mas, já que ele procurava a liberdade, quis deixá-lo decidir sozinho. Aliás, eu já sabia o 
que ele ia fazer, e foi o que ele fez”. 
26 
 
econômicas, dentre outras coisas, vê-se inclinado a atribuir tais acontecimentos a aparentes 
sinas sob a terra. Para estas pessoas, o rumo de suas vidas está necessariamente ligado a estes 
sinais, como se suas vidas fossem definidas por eles. Mas, para Sartre, a vida de cada homem 
é como ele escolheu ser e de responsabilidade exclusiva dele próprio, assim como as 
interpretações destes sinais são, consequentemente, de sua inteira responsabilidade.  
Temos, assim, um sentimento de imenso desamparo. Tal noção é paralela à de 
angústia, no qual esta confere ao próprio ser humano a escolha da definição em seu ser. É o 
próprio homem que se define enquanto ser humano. Sobre o desespero, Sartre define que para 
a conclusão de uma ação o homem pode contar apenas com o que está condicionado por sua 
vontade ou por um grupo de possibilidades, as quais não são produzidas pelos seus atos, uma 
vez que, para as pessoas há um determinado número de elementos possíveis, a partir do qual 
sua vontade deve ser exercida.  
O ser humano tem que desejar algo dentro deste grupo delimitado de possíveis. Sartre 
quer dizer com isto que não adianta ninguém querer realizar uma ação num âmbito 
independente destes limites dos possíveis, pois nenhuma pessoa vai conseguir adaptar o 
mundo às suas vontades e a suas ações. Com isso, todas as escolhas e o que fazer em dada 
circunstância, devem ser realizados de acordo com suas possibilidades. O homem é limitado 
assim como suas ações, dentro de um restrito grupo de prováveis realizações. Ninguém pode 
buscar escolher algo além de seu limitado campo de atuação. 
Sartre explicita esta limitação das escolhas possíveis da seguinte forma: 
 
A partir do momento em que as possibilidades que considero não são 
rigorosamente determinadas pela minha acção, devo desinteressar-me, 
porque nenhum Deus, nenhum desígnio pode adaptar o mundo e seus 
possíveis à minha vontade (SARTRE, 1978, pp. 237-238). 
 
Contrariamente a isto, alguns marxistas, dogmáticos, bem como Lukács, dentre outros, 
dizem que o homem deve contar com os outros e que as ações humanas somente são limitadas 
pela morte. Neste sentido, qualquer homem deve contar, invariavelmente, com outros seres 
humanos e de qualquer parte do mundo, onde todos farão o possível para auxiliá-lo e mesmo 
após sua morte, continuarão seus propósitos. Se esta confiança não for estabelecida, segundo 
estes marxistas, o homem não estará agindo de forma ética. Mas, para Sartre, os únicos 
“companheiros” são aqueles que estão comprometidos, “engajados” num objetivo concreto e 
comum. Sendo assim, este homem está contando com uma possibilidade dentro de um grupo 
de possíveis, no qual são cabíveis decisões mais prováveis. Aqui é possível saber mais ou 
menos os rumos que serão tomados, visto que, o número de participantes se torna menor e 
27 
 
mais conhecido. 
Contudo, é impossível alguém contar com pessoas que ele nem conhece, se valendo de 
uma possível “bondade humana” ou se apoiando numa inclinação humana para um bem-estar 
social, pois, como vimos, o homem é livre e não existe uma natureza humana a priori, na qual 
através dela seja possível conhecer plenamente uma pessoa, saber se ela é boa ou má e se é 
possível contar com ela na defesa de uma causa, por exemplo.  
Para Sartre, um ser humano deve confiar apenas no que ele vê e percebe hoje, não há 
como ter certeza de que seus projetos serão retomados e realizados após sua morte, os homens 
são livres para decidirem o que será do homem amanhã, e, a decisão tomada pode ser 
totalmente oposta ao que foi antes projetado. Não há como determinar o indeterminado, o que 
hoje é estritamente errôneo, no futuro, pode vir a ser um acerto. O existencialismo sartreano 
sempre opera entre o determinado e o indeterminado. 
Aqui, todos os homens devem se comprometer com seus ideais projetados e agir 
independente de esperança
10
, porque para se prender a um propósito não é necessário ter 
esperança em nada. Mesmo que um projeto não seja realizado de forma precisa, como se 
desejava, o ser humano deve ater-se ao fato de que ele fez todo o possível para sua perfeita 
realização (comprometimento). Não há como conhecer, de forma indubitável, os resultados 
futuros de uma ação proposta. Os homens devem agir independentes de uma esperança 
qualquer, sendo isto a única coisa em que alguém pode confiar. 
Como se observa, o pensador francês desenvolve sua teoria no âmbito da prática, 
contida nas ações humanas, estado em que o homem é a realização de seus propósitos, ou 
seja, Sartre define o homem como ação, ele somente é (existe) na medida em que realiza 
todas as suas ações projetadas com comprometimento total. A vida de um homem é definida 
por seus atos e dentro de seus limites ele pode agir de inúmeras formas. Com isso, Sartre tenta 
demonstrar que sua teoria é um duro otimismo e não uma metafísica imobilista: 
 
A doutrina que vos apresento é justamente a oposta ao quietismo, visto que 
ela declara: só há realidade na ação; e vai aliás mais longe, visto que 
acrescenta: o homem não é senão o seu projeto, só existe na medida em que 
se realiza, não é, portanto, nada mais que o conjunto de seus atos, nada mais 
que sua vida (SARTRE, 1973, p. 19). 
 
Eis aqui um ponto que pode ser crucial para algumas pessoas
11
, que não interpretam 
esta teoria de modo correto, por terem aversão ao existencialismo. Elas tentam, na maior parte 
                                                 
10
 Posição que foi alterada ao longo do tempo. Cf. a entrevista A Esperança agora, proferida no ano de sua 
morte. 
11 
Emmanuel Mounier, Jackes Maritain, Pierre Naville e Roger Garaudy. 
28 
 
das vezes, se justificarem argumentando que as circunstâncias em determinada ação lhes 
foram adversas, julgaram que poderiam ser melhores do que eram, afirmaram que não 
encontraram amizades e amores sinceros, por não terem achado as pessoas corretas para 
preencher tais desejos. Não tiveram uma vida intelectual produtiva devido à falta de tempo 
livre, se não tiveram filhos foi por causa de não terem encontrado a pessoa certa que 
compartilhasse seus anseios. Com isto, tentam afirmar que estão nelas, cristalizados 
potencialmente, valores superiores aos que os seus atos lhes conferem. De outro modo, 
justificam seus erros ou inatividade com possibilidades que podem ser desenvolvidas, se 
desculpam afirmando que seus verdadeiros valores estão em atuações potenciais e não em 
suas ações realizadas. Estas pessoas, que agem desta forma, estão de inteira má-fé. 
Se a teoria humanista existencial sartreana é concreta e ativa, “o homem é o que ele 
faz”, o amor é construído, não existe um amor em potencial, ele só existe na medida em que 
vai sendo realizado por meio de uma subjetividade humana, não existe o sentimento de amor 
a priori. Alguém só pode ser considerado como um intelectual, se exercer sua capacidade 
intelectiva, um filósofo o é por ter expressado suas teorias em obras filosóficas, a vida de um 
escritor é a totalidade de suas obras. Não se pode levar em conta obras que poderiam vir a ser 
escritas, prejulgando que elas estariam de maneira potencial em alguém. O homem se define 
na sua própria vida, isto é, ele esboça uma figura dele mesmo e não existe nada além dessa 
figura. O ser humano só pode se definir em sua realidade e não através de sonhos e 
esperanças. Isso o levaria a uma definição negativa e parcial, que é a pessoa acreditar que 
somente se define em seus fracassos e languidez adquiridos em sua vida, pois não é só um 
aspecto que define o homem e sim a totalidade de sua vida. De modo sumário, não são 
somente as obras de um filósofo que o define como tal, sem sombra de dúvidas, são uma parte 
importante de seu ser, mas não todo ele, há inúmeras outras atividades e realizações que o 
compõe da forma como ele é. É a definição positiva do homem: “O que queremos dizer é que 
um homem nada mais é do que uma série de empreendimentos, que ele é a soma, a 
organização, o conjunto das relações que constituem estes empreendimentos” (SARTRE, 
1987a, p. 14). 
É, principalmente, neste ponto que acusam o existencialismo de ser uma teoria 
pessimista, pois quando ela expõe um fraco ou medroso, ela o faz não baseada apenas numa 
imposição do meio, por um convívio social ou uma delimitação psicológica e biológica, mas 
pautada no princípio de que todo homem é responsável por sua definição. Quer dizer que o 
fraco é responsável por sua fraqueza e o mesmo se aplica ao medroso. Mesmo estando em 
uma dada circunstância o ser humano pode se inventar e não meramente se conformar com 
29 
 
sua situação. Segundo Sartre, isto não pode ser caracterizado como um pessimismo e sim 
como um otimismo duro, pois aqui o próprio homem é o responsável por si. Exemplificando, 
uma pessoa é covarde não por implicações temperamentais ou por ter o organismo covarde. 
Existem temperamentos nervosos e não covardes, a covardia é fruto de seus atos e não de uma 
constituição fisiológica covarde. Uma pessoa é covarde porque se construiu assim ao longo de 
sua vida, através de suas ações. Porém, existe a possibilidade de ele deixar de ser o que é, 
basta que se comprometa totalmente em todas as suas ações e que elas sejam exercidas com o 
intuito de se tornar corajoso perante os outros, em ato concreto. 
Neste ponto, Sartre acredita ter respondido a algumas das críticas iniciais referentes à 
teoria humanista existencial, visto que, ela não pode ser considerada como uma teoria que 
leva o ser humano a um imobilismo, pois ela define o homem por ação, totalidade dos atos. 
Não pode ser também pessimista em relação ao homem, pois para ela é o próprio homem que 
determina seu “destino”. Mas, como ela pode ser definida como uma teoria que desencoraja 
as ações do ser humano? Para ela não existe fundamento na esperança, salvo na ação que é a 
única coisa que é admitida e faz sentido na vida do homem. Neste sentido, parece que Sartre 
está diante de uma conduta humana fundada na ação e no compromisso. 
 
 
1.3 Subjetividade, moral e liberdade 
  
 
A crítica feita ao subjetivismo, que isola o homem em si, prendendo-o num 
individualismo, se dá devido a uma interpretação errônea da teoria sartreana. A subjetividade 
como ponto de partida do humanismo existencial é entendida no sentido fenomenológico, 
que, em síntese, define a existência do reconhecimento reflexivo da consciência por ela 
própria (consciência de si) e também pela relação com o outro e o mundo, consciência 
irrefletida (consciência do externo).  
Sartre admite a existência não só da consciência, mas do mundo como um polo que se 
dá somente na sua correlação com o outro. Neste sentido, ele tenta incorporar o cogito 
cartesiano na realidade mundana
12
, não sendo mais apenas a coisa pensante (res cogita) 
isolada em si. Com isto, a fenomenologia deve dar conta da dialética entre o homem, seus 
                                                 
12 
Cf. (SARTRE, 1987a, p. 28) Sartre descreve: “Mas onde começa e onde termina esse mundo cuja definição, 
aliás, é inteiramente arbitrária e que não se ajusta de forma alguma aos dados científicos modernos? Em nossa 
opinião, não começa nem termina em parte alguma, pois a segregação a que o existencialismo pretende submetê-
lo relativamente à natureza, ou melhor, à condição humana, é irreal. Existe apenas um mundo, um único mundo 
diante de nós, e a totalidade desse mundo – homens e coisas, se você faz questão dessa distinção – pode ser 
afetada, em certas condições variáveis, pelo signo da objetividade”. 
30 
 
semelhantes e o mundo.  
Neste sentido, Sartre parte não de uma subjetividade isolada em si, mas de uma 
postura que propicia a verdade: 
 
 
Como ponto de partida, não pode existir outra verdade senão esta: penso, 
logo existo; é uma verdade absoluta da consciência que apreende a si mesma. 
Qualquer teoria que considera o homem fora deste momento em que ele se 
apreende a si mesmo é, de partida, uma teoria que suprime a verdade pois, 
fora do cogito cartesiano, todos os objetos são apenas prováveis e uma teoria 
de probabilidades que não esteja ancorada numa verdade desmorona no 
nada; para definir o provável, temos de possuir o verdadeiro (SARTRE, 
1987a, p. 15). 
 
A verdade absoluta (independente de qualquer coisa) só pode ser encontrada no penso, 
logo existo cartesiano, ela é o reconhecimento da consciência de si própria. Fora desta 
consciência tudo é provável e não imediatamente verdadeiro. Qualquer teoria de possibilidade 
que pretenda definir seu objeto tem, necessariamente, que se fundar na verdade, do contrário, 
ela se torna meramente provável. Afirma Sartre: 
 
Em um objeto particular podemos sempre distinguir qualidades como cor, 
odor, etc. E a partir delas, sempre pode-se determinar uma essência por elas 
compreendida, como o signo implica a significação. O conjunto “objeto-
essência” constitui um todo organizado: a essência não está no objeto, mas é 
o sentido do objeto, a razão da série de aparições que o revelam (SARTRE, 
2002, p. 19). 
 
O cogito
13
 cumpre esse papel de desvendar a verdade absoluta. Em síntese, é 
necessária a verdade absoluta – totalizadora, a consciência é necessária para que se tenha 
qualquer tipo conhecimento – para que se encontre qualquer outra espécie de verdade. A partir 
disto, se torna notória a diferença entre sujeito e objeto, consciência e matéria. A atitude 
natural materialista trata o homem equivalente a um objeto, no qual este segue determinado 
padrão e suas reações são definidas dentro de um conjunto delimitado, não havendo diferença 
                                                 
13
 Cf. (SARTRE, 1987a, pp. 29-30) Resposta de Sartre a crítica em relação ao cogito subjetivo: “Você declarou 
que é em nome da dignidade humana que o homem se recusa a tratar o homem como objeto. Está errado. É por 
uma razão de ordem filosófica e lógica: se você postular um universo de objetos, a verdade desaparece. O mundo 
do objeto é o mundo do provável. Você tem de admitir que toda teoria, quer seja científica ou filosófica, é 
provável. A prova disso está em que as teses científicas, históricas variam e que elas se formulam sob forma de 
hipótese. Se admitirmos que o mundo do objeto, o mundo do provável, é único, não teremos mais do que um 
mundo de probabilidades, e assim, como é necessário que a probabilidade dependa de certo número de verdades 
adquiridas, de onde provém a certeza? [...] Se você não define a verdade, como podemos conceber a teoria de 
Marx de outra forma que não seja a de uma doutrina que surge, desaparece, se modifica e que tem apenas o valor 
de uma teoria? Como fazer uma dialética da história se não se começar por estabelecer certo número de regras? 
Encontramo-las no cogito cartesiano; não podemos encontrá-la senão situando-nos no terreno da subjetividade. 
Nós jamais discutimos o fato de que, constantemente, o homem é um objeto para o homem, mas reciprocamente 
é necessário, para apreender o objeto enquanto tal, que haja um sujeito que se apreenda como sujeito”. 
31 
 
entre as ações humanas e as dos objetos, tudo se define em fenômenos. Confundem e colocam 
no mesmo patamar consciência e objeto. 
Porém, o humanismo existencial atribui ao homem uma excelência que o diferencia 
dos objetos, pois o ser humano é o único, que, como vimos, consegue se reconhecer 
conscientemente (ter consciência reflexiva). Com isto, se tornam diferentes os valores 
humanos e os valores dos objetos não humanos. Existe, sem dúvidas, uma correlação entre 
sujeito e objeto, o primeiro percebe ativamente e subjetivamente o segundo, que é passivo e 
não possui subjetividade. 
Devido a esta aceitação filosófica da existência do outro, que também possui uma 
consciência de si e do mundo, no cogito encontramos não apenas nós mesmos, mas também o 
outro, pois assim como eu tenho consciência dele ele tem de mim, ele se torna tão verdadeiro 
para mim como eu mesmo. Sendo assim, diferentemente de Descartes, o outro é uma condição 
para a minha existência, visto que, me torno outro para a consciência dele e passo a existir 
para ele. Tenho, portanto, a minha existência duplamente comprovada: por mim (consciência 
reflexiva) e pelo outro que tem consciência de mim. É neste sentido que Sartre entende a 
subjetividade. 
Diante disto, o outro se torna importantíssimo, pois é pelo seu juízo que se dá minha 
definição de forma imparcial. Uma pessoa só saberá se é boa se atendo também na 
consideração do outro. Em outras palavras, alguém só pode alcançar uma verdade total a seu 
respeito se levar em conta a análise do outro. Ele se torna necessário para minha existência e 
para meu próprio reconhecimento. Neste ponto, a minha reflexão me revela a liberdade do 
outro como um obstáculo para mim, que age contra ou a meu favor. Com isso, há a descoberta 
do campo da intersubjetividade. Neste contexto, o homem vislumbra seu ser na relação com 
os outros, quer dizer, o ser humano determina simultaneamente o que ele é e o que os outros 
são. 
Posta esta importância ontológica do outro, Sartre demonstra algumas peculiaridades 
desta relação eu-outro. Os dois estão no mesmo patamar de valor. Há uma igualdade no valor, 
tanto moral, quanto de existência. Tudo que se refere a mim se refere igualmente ao outro. É 
uma relação de equivalência. Mesmo assim, tal relação é fundada no conflito: 
 
Tudo que vale para mim vale para o outro. Enquanto tento livrar-me do 
domínio do outro, o outro tenta livrar-se do meu; enquanto procuro subjugar 
o outro, o outro procura me subjugar. Não se trata aqui, de modo algum, de 
relações unilaterais com um objeto Em-si, mas sim de reações recíprocas e 
moventes. As descrições que se seguem devem ser encaradas, portanto, pela 
perspectiva do conflito (SARTRE, 2002, p. 454). 
32 
 
 
Se não é possível encontrar uma natureza humana universal presente em cada homem 
singular, há, ao menos, uma universalidade da condição humana
14
. Condição é uma espécie de 
conjunto dos limites a priori que apresenta sua situação fundamental no universo, isto é, são 
determinações impostas ao homem sem a possibilidade de seu assentimento, por exemplo, 
nascer homem ou mulher, em determinado local não está em meu dominio.  
As circunstâncias históricas mudam para o ser humano. É possível alguém nascer 
escravo ou livre, por exemplo, mas não muda a necessidade de que sua presença no mundo 
seja real e situada, de exercer atividades relacionadas ao trabalho, de convivência com os 
outros e da vivência, da mortalidade. Estes limites não são nem subjetivos e nem objetivos. 
Na verdade, eles são o resultado dos dois aspectos. Objetivos: quando são abrangentes e 
reconhecíveis globalmente. Subjetivos: na medida em que são vividos, isto é, só existem 
limites subjetivos se o ser humano, livremente, se definir condicionado por eles.  
A unidade universal no projeto humano, que tem por principal anseio ultrapassar 
precisamente os limites da condição humana, seria a compreensão racional, possível a todos 
os seres humanos, do projeto dos outros. Existem vários projetos, de vários homens e de 
vários grupos humanos, mas qualquer um pode projetar seus limites com o intuito de 
reconhecer exatamente o que são. Podendo, assim, até refazer, com base nestes projetos, o seu 
                                                 
14
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 25) Sartre diz: “Se considerarmos as condições humanas como condições que se 
definem por um X, que é o X do sujeito, mas não pelo contexto natural dessas mesmas condições nem por sua 
determinação positiva, estamos perante outra forma de natureza humana: trata-se de uma natureza-condição, se 
você quiser, ou seja: a natureza humana não se define simplesmente como tipo abstrato de natureza mas revela-
se por meio de algo que é muito mais difícil de formular – por razões que, na minha opinião, são históricas. [...] 
E, efetivamente, quando o existencialismo fala de condição humana, está falando de uma condição que ainda se 
encontra verdadeiramente engajada naquilo que o existencialismo chama de projeto e que, conseqüentemente, é 
uma pré-condição. Trata-se de um pré-engajamento e não de um engajamento nem de uma verdadeira condição. 
De modo que também não é por acaso que tal condição se define, antes de mais nada, por seu caráter de 
humanismo geral. Aliás, quando, no passado, alguém falava de natureza humana, estava se referindo a algo mais 
delimitado do que uma condição em geral; pois a natureza já é outra coisa, é mais do que uma condição, em 
certo sentido”. E Também: Cf. (SARTRE, 1987a, pp. 25-26) “Aliás, seria necessário ampliar esta discussão 
relativa à natureza humana, pois é preciso introduzir também o ponto de vista histórico. A realidade primeira é a 
realidade natural, da qual a realidade humana é apenas uma função. Mas, para isso, temos de admitir a verdade 
da história, e o existencialismo, de modo geral, não admite a verdade da história nem da história natural em 
geral, nem mesmo da história humana; e, no entanto, é a história que faz os indivíduos; é a sua própria história, a 
partir do momento em que são concebidos, que faz com que os indivíduos não nasçam e não apareçam num 
mundo que lhes confere uma condição abstrata, mas surjam num mundo do qual sempre fizeram parte, para o 
qual estão condicionados, e que eles próprios contribuem para condicionar – do mesmo modo que a mãe 
condiciona seu filho e que esse filho a condiciona desde a gestação. É somente desse ponto de vista que temos 
direito de falar da condição humana como de uma realidade primeira. Seria mais correto dizer que a realidade 
primeira é uma condição natural e não uma condição humana. Estou apenas repetindo, aqui, opiniões correntes e 
banais mas que não me pareceram de modo algum refutadas pela exposição do existencialismo. Em suma, se é 
verdade que não existe uma natureza humana abstrata, uma essência do homem independente ou anterior à sua 
existência, é certo também que não existe uma condição humana em geral, mesmo que, por condição, você 
entender certo número de circunstâncias ou situações concretas – visto que, em sua opinião, elas não estão 
articuladas. De qualquer modo, o marxismo tem, a esse respeito, idéias diferentes: a da natureza no homem e do 
homem na natureza, o qual não está forçosamente definido de um ponto de vista individual”. 
33 
 
próprio. O projeto não define o homem, mas através dele é possível reconhecer a condição 
humana. 
A partir disto, há sempre um modo de compreender algum projeto, mas com o 
necessário esclarecimento. É aqui que vislumbra-se uma universalidade do homem, que é 
continuamente construída e não dada. Para construir este universal, o homem deve escolher-
se, baseado em seu entendimento do projeto do outro, afirma Sartre:  
 
É neste sentido que podemos dizer que cada um de nós é absoluto 
respirando, comendo, dormindo ou agindo de um modo qualquer. Não existe 
diferença alguma entre ser livremente, ser como projeto, como existência 
que escolhe sua essência, e ser absoluto; não existe nenhuma diferença entre 
ser um absoluto temporariamente situado, ou seja, que se localizou na 
história, e ser universalmente compreensível (SARTRE, 1987a, p. 17).  
 
Todavia, parece não estar resolvida a oposição ao subjetivismo, pois esta aparece de 
várias formas. A primeira atribui ao humanismo a ideia de que o homem pode fazer o que 
quiser, caracterizando-o como anarquista, prescrevendo que não se pode julgar os outros e 
também dizendo que na escolha tudo seria gratuito. Observando melhor, estas críticas não são 
tão relevantes.  
No que diz respeito à primeira, não está correto dizer que se possa escolher o que bem 
entender, em certo sentido é possível a escolha, o que é impossível é deixar de escolher, logo, 
mesmo que um homem não escolha, ele escolheu abdicar dela. Isso tem um aspecto muito 
relevante, pois restringe a fantasia e o capricho.  
Sendo verdade que em uma determinada circunstância o ser humano tem por 
obrigação escolher uma ação – implicada uma responsabilidade –, que unida a um 
compromisso
15
 engloba a humanidade inteira. Para Sartre, o homem sempre está em uma 
circunstância organizada, comprometendo-se e comprometendo a humanidade inteira, através 
de sua escolha.  
O existencialista francês vê alguns problemas nas morais universalistas e abstratas e 
afirma o seguinte: a forma é universal e sua aplicabilidade parecer ser variável. Kant acerta ao 
dizer: a liberdade quer-se a si própria assim como a dos outros. Porém, erra ao afirmar que a 
forma idealista e universalista é a totalidade de uma moral. Sartre nota que os princípios 
                                                 
15
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 28) Palavras de Sartre: “É por isso mesmo que, para o homem existencialista, o 
universo objetivo não passa de uma fonte de aborrecimentos, sem influência, no fundo indiferente, um provável 
perpétuo, ou seja, exatamente o contrário do que ele é para o materialismo marxista.
 
É por todas essas razões e 
outras mais que você não concebe o engajamento da filosofia senão como uma decisão arbitrária que você 
qualifica de livre. Ao dizer que Marx definiu uma filosofia você está desvirtuando a própria história de Marx, já 
que ele a engajou. Não, muito pelo contrário, o engajamento, ou, melhor, as atividades social e política foram 
determinantes para seu pensamento mais geral”. 
34 
 
muito abstratos são falhos para se determinar uma ação, pois em uma decisão prática não há 
como julgar se o que foi feito poderia ocorrer de uma forma totalmente diversa, as 
especificidades da ação nunca são expostas em um âmbito abstrato e universalista.  
A aplicação é sempre concreta e suas consequências não são totalmente previsíveis. 
Neste ponto, o coerente é inventar, levando em conta se a invenção foi exercida em consenso 
com a liberdade. A escolha moral
16
 é comparável à construção de uma obra de arte. Na arte, 
um pintor, por exemplo, não tem um quadro definido antes de ser feito, não existem, pré-
estabelecidas, regras a priori para a inspiração. Não existem valores estéticos a priori, mas 
eles são vistos na coesão do quadro, no relacionamento entre a vontade de criar e o produto. 
Não se pode avaliar um quadro sem que ele esteja pronto. 
Segundo Sartre, o homem está na mesma situação criadora, nesta relação entre moral e 
arte, um quadro de determinado pintor nunca é o resultado de uma gratuidade. Compreende-se 
que o pintor é o que ele faz no momento que pinta. E a soma de suas obras faz parte de sua 
vida. O mesmo ocorre na moral, ela é semelhante à arte de um pintor, por exemplo, pois tanto 
na arte quanto na moral existem criação e invenção, por isso não podemos decidir a priori 
sobre o que fazer.    
O homem pode se pautar por uma espécie de moral abstrata, mas quem escolhe o que 
fazer é ele próprio. Neste sentido, ele escolhe sua moral. Devido à imposição presente nas 
situações, é necessário que se faça uma escolha entre um caminho e outro, o homem está 
impossibilitado, contudo, de não escolher uma moral. O ser humano não se realiza 
imediatamente no começo, ele é definido em relacionamento com um compromisso. Sendo, 
portanto, um absurdo, dizer que na escolha há gratuidade: 
 
O homem faz-se; não está realizado logo de início, faz-se escolhendo a sua 
moral, e a pressão das circunstâncias é tal que não pode deixar de escolher 
                                                 
16
 Cf. (SARTRE, 1987a, pp. 23-24) Indagação a Sartre: “A escolha original de Marx é uma escolha 
revolucionária”. Resposta: “Aquele que for capaz de dizer que ele se escolheu primeiro revolucionário e em 
seguida filósofo ou primeiro filósofo e depois revolucionário, pode considerar-se um espertalhão. Ele é filósofo e 
revolucionário: é um todo. O que significa dizer que sua escolha original foi ser revolucionário?” Afirma o 
questionador: “O Manifesto Comunista não me parece uma vulgarização mas uma arma de combate. Não posso 
crer que não seja um ato de engajamento. Uma vez que o Marx filósofo chegou à conclusão de que a revolução 
era necessária, seu primeiro ato foi o Manifesto Comunista, que é um ato político. O Manifesto Comunista 
constitui a ligação entre a filosofia de Marx e o comunismo. Qualquer que seja a moral que você tenha, a relação 
lógica entre essa moral e a sua filosofia não é tão sensível quanto a que existe entre Manifesto Comunista e a 
filosofia de Marx”. Resposta de Sartre: “Trata-se de uma moral da liberdade. Se não existir contradição alguma 
entre essa moral e a nossa filosofia, nada mais se pode exigir. Os tipos de engajamento diferem em função das 
épocas. Numa época em que engajar-se era fazer a revolução, era preciso escrever o Manifesto. Numa época 
como a nossa, em que existem vários partidos que se dizem revolucionários, o engajamento não consiste em 
aderir a algum deles, mas em procurar esclarecer os conceitos, para definir com mais rigor a posição de cada um 
desses diversos partidos revolucionários e, simultaneamente, tentar agir sobre eles”. 
 
35 
 
uma. Não definimos o homem senão em relação a um compromisso. É 
portanto absurdo acusarem-nos de gratuidade na escolha (SARTRE, 1978, p. 
258). 
 
Dando continuidade ao que foi dito acima, quando alguém argumenta que é impossível 
para o homem julgar os outros, em certo sentido pode-se dizer que é verdade, pois nenhuma 
pessoa deixará de escolher o seu projeto – independentemente de qual seja ele –, que teve um 
enorme comprometimento; para escolher um projeto de outro homem, visto que, a escolha 
comprometida e de seu projeto foi feita de maneira racional e autêntica. 
Porém, como vimos, há uma interdependência nas escolhas humanas, com isto, o 
homem pode julgar logicamente (juízo lógico) os outros, pois é pela face deles que nós 
escolhemos. Vejamos o que Sartre diz sobre o ato de julgar os outros: 
 
Pode-se julgar um homem dizendo que ele está de má-fé. Se definirmos a 
situação do homem como uma escolha livre, sem desculpas e sem auxílio, 
todo o homem que se refugia na desculpa que inventa um determinismo é 
um homem de má-fé (SARTRE, 1973, p. 25). 
 
Nesta acepção de má-fé as pessoas que afirmam a existência de valores pré-
estabelecidos, que tentam justificar suas ações, estão se contradizendo, pois a escolha em 
determinada circunstância não pode ser previamente definida, ela é exercida na própria ação e 
toda ação que se assume enquanto tal é um modo de boa fé e não de má-fé. A tentativa de agir 
de forma prejudicial, inautêntica, já implica uma ação de inteira má-fé.  
Isso quer dizer que, a má-fé é uma ação consciente. Assim, quem a pratica quer 
esconder algo para si mesmo, seja uma “verdade desagradável” ou um “erro agradável”. É a 
própria consciência que se infecta de má-fé, não é um estado. Sartre precisa assim a má-fé: 
 
A má-fé tem na aparência, portanto, a estrutura da mentira. Só que – e isso 
muda tudo – na má-fé eu mesmo escondo a verdade de mim mesmo. Assim, 
não existe neste caso a dualidade do enganador e do enganado. A má-fé 
implica por essência, ao contrário, a unidade de uma consciência (SARTRE, 
2002, p. 94). 
 
Luiz C. Maciel destaca que existe para a má-fé duas estruturas fundamentais, na qual 
nos dois momentos a principal finalidade desejada é a transferência da responsabilidade. A 
primeira define-se em: livrar-se da necessidade de escolher em uma dada circunstância, 
transferindo-a para outro, ou seja, aqui o agente da má-fé se esquiva de decidir a respeito de 
alguma ação, fazendo com que outra pessoa decida por ele. 
A segunda estrutura ocorre no momento em que um ser consciente apenas encena o 
papel de ser um objeto, deixa sua subjetividade de lado e se apresenta apenas como um ser 
36 
 
que os outros desejam que ele seja. Neste sentido, ele se vê apenas “pelos olhos dos outros”, 
passa a ser uma coisa determinada por outro, não sendo autêntico consigo mesmo. 
Maciel relembra também que o existencialismo sugere que a essência dos seres 
humanos é construída através de seus atos, pois sendo livre, o homem é apenas o que ele faz 
de si mesmo. Isto implica que a essência do homem é desenvolvida com a realização de seu 
projeto e das escolhas exercidas ao longo da sua existência.  
Nota-se, assim, que tal obra tem por principal foco a exposição de um posicionamento 
ético do existencialismo, visto que, sendo livre, o homem, é responsável por todas as suas 
ações e, escolhendo-se, ele escolhe, de maneira implícita, todos os outros. Em outras palavras, 
se alguém se define de tal modo específico, estabelece, ao mesmo tempo, o que é o humano 
em sua concepção universal.  
Nesta perspectiva, cada um inventa a humanidade, partindo de seu projeto e escolhas e 
se tornando responsável por elas. Se, para Sartre, a essência humana se define através de 
ações, quer dizer, tudo está em ato e não em potência, o ser humano é forçado a agir, fazendo, 
consequentemente, da moral existencialista uma moral da ação e não do quietismo. Posto que 
a liberdade é o fundamento de todos os valores éticos, todo homem deve assumi-la e afirmá-
la, do contrário, ele pode ser acusado de má-fé. 
Este assumir e afirmar a liberdade não deve ficar restrito apenas a um indivíduo, deve 
ser estendido a uma universalidade, pois se não há natureza humana há, todavia, uma 
condição humana, que por sua vez é comum a todos, isto implica uma universalidade de todos 
os projetos humanos. Com isto, tanto a afirmação da liberdade quanto a acusação de má-fé 
devem ocorrer no âmbito universal. 
Perdigão salienta que da liberdade procedem duas espécies de angústia, uma temporal 
e outra ética. As duas derivam da impossibilidade de o homem se preparar de maneira 
absoluta em relação ao procedimento que cada escolha feita soma para a realização de seu ser 
e que uma nova escolha a ser feita também, potencialmente, realizará seu ser. 
Sobre a angústia temporal, ele destaca a independência entre passado, presente e 
futuro. Em outras palavras, o ser humano é o presente, suas escolhas do passado não 
interferem, necessariamente, em seu presente, do mesmo modo, suas escolhas de hoje não 
definirão, inevitavelmente, o que ele será no futuro. Com isto, cada escolha não tem por 
obrigação ser definitiva, ou seja, o ser humano está em plena mudança (devir), ele nunca é 
imutável e absoluto. Isto implica que, tudo que se escolhe não é uma escolha acabada em si; 
sendo assim, as escolhas correm um imenso risco de não permanecerem como tais, pois não 
se conhece o futuro.  
37 
 
Por exemplo, o rapaz que tem de decidir entre ir para a guerra ou cuidar da mãe, 
escolhe uma das ações, porém, isto não o impede de que ele, no meio do caminho, opte pela 
outra alternativa, visto que é livre para agir de uma dada maneira e excluir outra ou vice-
versa.  
A angústia de cunho ético é bem definida nas palavras de Perdigão:  
 
No caso da angústia ética, constatada nossa liberdade, advém a incerteza de 
que os valores morais têm como único fundamento possível a nossa decisão 
de criá-los. A vida é permanente escolha, e, com cada uma de nossas 
escolhas, escolhemos o que somos, definimos a nós mesmos, por nós 
mesmos. A cada instante temos de optar por um valor, uma regra de conduta. 
O que nos angustia é saber que não temos a que recorrer para orientar a 
nossas escolhas (PERDIGÃO, 1995, p. 113). 
 
Como visto anteriormente, os valores morais não são postos e dados a priori aos 
homens. Não se encontra uma moral universal em um “céu inteligível” que conduza com 
precisão os seres humanos, não existe uma regra moral geral que aponte ao homem como ele 
deve agir ou o que ele pode fazer em uma determinada circunstância. Todas as regras gerais 
são na maioria das vezes abstratas. Do mesmo modo, não existem virtudes em si como 
bondade e honestidade – ditas fundamentais para a conduta humana. Sendo assim, os valores 
existenciais são subjetivos, são escolhas que se transformam em valores objetivos devido ao 
ato de exercer tal escolha. Nota-se desta maneira que não há nada que certifique a uma pessoa 
que ela deva tomar tal decisão ao invés de outra qualquer e também nada pode justificar a 
posição de ter decidido por A e não por B. Se, conforme Sartre, somente a liberdade pode ser 
aceita como fundante da moral, pois sou eu, enquanto ser consciente quem estabelece os 
valores, é o próprio ser humano quem cria sua ética, ao homem não há imposições morais e é 
ele que impõe, constrói e determina os valores que serão seguidos. Isto se explica devido ao 
fato de que são os próprios seres humanos que dão significados às coisas e julgam suas 
próprias ações, se algo está correto ou não.  
Os valores são o que são por causa da decisão que os homens tomam. Para existir o 
certo ou o errado é necessária a intencionalidade de uma consciência que os tomem como tais, 
isto é, os valores são julgados e têm sentido para uma consciência que os designam serem 
assim. Não existe um método para fazer valores, eles são feitos no próprio ato de escolher 
uma ação, valor e escolha se confundem, pois para o existencialismo humanista não existem 
valores eternos para predicar o que se deve fazer. Então, cabe a nós escolhê-los.  
Devemos salientar que a liberdade que Sartre explica nesta obra deve ser diferenciada 
daquela entendida pelo senso comum. Ser livre aqui está estreitamente e diretamente ligado 
38 
 
ao que se entende por comprometimento. Se não levarmos isso em conta, a própria noção de 
liberdade perde sentido. Assim, somos livres na medida em que somos comprometidos em 
nossas ações. Vejamos: 
 
É necessário, além disso, sublinhar com clareza, contra o senso comum, que 
a fórmula “ser livre” não significa “obter o que se quis”, mas sim 
“determinar-se por si mesmo a querer (no sentido lato de escolher)”. Em 
outros termos, o êxito não importa em absoluto à liberdade (SARTRE, 2002, 
p. 595). 
 
Ser livre não é meramente conseguir o que se deseja, mas ter a possibilidade de se 
determinar enquanto ser humano e aí sim poder escolher o que se deseja. A liberdade não é 
um conceito metafísico, algo em si, é a “autonomia da escolha”. Com isso, não se pode dizer 
que um indivíduo preso é sempre livre para sair do presídio, ou satisfazer seu desejo de 
libertação, todavia ele tem a liberdade para tentar escapar da prisão ou se tornar livre.      
Reafirmando Sartre, Perdigão diz que a liberdade é a intenção da consciência de 
transpor os limites impostos pelo corpo – que nos confere a obrigação de agir entre os objetos 
presentes no mundo, que podem nos apresentar adversidades ou proveitos –, projetando-se 
para um possível futuro.  
Apenas o homem se coloca no âmbito da liberdade consciente
17
, toda a natureza, ao 
contrário, se encontra governada pelo determinismo. A liberdade dá prova de sua existência, 
de maneira concreta, em ato, isto é, ela se apresenta no ato de escolher, de tomar decisões. Em 
outras palavras, a liberdade é exercida na forma de escolhas, que são requeridas a todo o 
momento. Isto é a manifestação de nossa finitude e individualidade, visto que, só podemos 
escolher uma ação diante de um determinado grupo de atuações possíveis. Não é possível 
escolher tudo em todas as circunstâncias que implique uma escolha apenas.  
Por exemplo, um agente ambientalista não poderia escolher, ao mesmo tempo, ir para 
a mata e ficar em um escritório despachando panfletos de conscientização ambiental. Se isso 
fosse possível não seríamos livres, visto que, apenas “não passaríamos de um desenrolar em 
série infinita de todos os possíveis e desapareceríamos como individualidade” (PERDIGÃO, 
                                                 
17
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 27) Sartre esclarece: “Não é verdade que o homem tenha liberdade de escolha no 
sentido em que, através da escolha, ele confere à sua atividade um significado que ela não teria de outro modo. 
Não basta dizer que homens podem lutar pela liberdade sem saber que estão lutando pela liberdade; ou então, se 
atribuirmos um sentido pleno a tal reconhecimento, isso significa que homens podem engajar-se e lutar por uma 
causa que os domina, ou seja, podem agir num quadro que os ultrapassa e não apenas em função de si mesmos. 
Pois, afinal de contas, se um homem luta pela liberdade sem o saber, sem formular para si mesmo, lucidamente, 
os meios que utiliza e os objetivos que pretende atingir, isso significa que os seus atos vão determinar uma série 
de conseqüências que se insinuam numa trama casual cujo princípio e fim ele não capta, mas que, apesar de 
tudo, encerra sua ação e lhe confere um sentido, em função da atividade dos outros; e não apenas dos outros 
homens mas do meio natural em que esses homens agem”. 
39 
 
1995, p. 87).  
Neste sentido, a liberdade humana é exercida em sua própria realidade, ela não é pura 
abstração e transcendência, ela é situada no mundo, como vimos, o ser humano não é somente 
consciência, mas ele tem, do mesmo modo, um corpo que o liga com a realidade dos objetos 
(facticidade). Sendo assim, a liberdade do ser humano é exercida perante as adversidades 
mundanas. Não existe um âmbito para a liberdade e outro para a facticidade.  
O homem executa a sua liberdade na sua própria realidade, onde estão as oposições e 
pressões que são partes integrantes de sua vida. Se não existissem os obstáculos postos aos 
homens, suas vidas seriam apenas um cumprir de tarefas já postas, não haveria a necessidade 
de escolher, pois tudo já estaria previamente determinado, a liberdade seria tão limitada 
quanto as escolhas. Dito isto, para se ter liberdade é preciso aceitar as adversidades.  
Perdigão explicita a necessidade da ação e da circunstância para se ter a liberdade da 
seguinte forma: 
 
A situação e a ação mostram-se tão indispensáveis à liberdade quanto, no 
tocante à temporalidade, a permanência é necessária à mudança. Assim 
como a mudança temporal não pode ser absoluta, mas exige uma relação 
com algo que permanece, também a liberdade exige alguma coisa que a 
contrarie. Em outros termos: a liberdade precisa de um campo de resistência 
do mundo. Sem obstáculo não há liberdade (PERDIGÃO, 1995, p. 87). 
 
Aceitando que a liberdade é o fundamento de todos os valores morais existencialistas, 
pois é em liberdade que o homem exerce todas as suas ações objetivas, deve ser aceito 
também que é com ela que se estabelecem todos os valores humanos e em total abandono, ou 
seja, a conduta moral do homem, só existe em sua liberdade, nas ações dos seres humanos e 
não de forma abstrata – como ideal a ser perseguido e nunca alcançado – e independente desta 
realidade.  
Partindo disto, todos os atos de homens de boa fé são executados com o intuito de 
salvaguardar a liberdade em ato e em cada situação particular de sua vida:  
 
Além disso, posso fazer um juízo moral. Quando declaro que a liberdade, 
através de cada circunstância concreta, não pode ter outro objetivo senão o 
de querer-se a si própria, quero dizer que, se alguma vez o homem 
reconhecer que está estabelecendo valores, em seu desamparo, ele não 
poderá mais desejar outra coisa a não ser a liberdade como fundamento de 
todos os valores. Isto não significa que ele a deseja abstratamente. Mas, 
simplesmente, que os atos dos homens de boa fé possuem como derradeiro 
significado a procura da liberdade enquanto tal (SARTRE, 1987a, p. 19). 
 
Um ser humano, quando executa uma ação determinada, pretende chegar a uma 
finalidade concreta, mesmo que isto condicione um desejo abstrato de liberdade, tal anseio é 
40 
 
apenas um meio para se conseguir uma finalidade, que é a conclusão da ação proposta. É por 
isto que se almeja a liberdade em cada momento característico. Quando um ser humano 
procura sua liberdade, descobre que ela está condicionada por todos os outros homens e 
necessariamente a liberdade dos outros condiciona a sua. Quando há a relação de 
compromisso, o ser humano é forçado a querer tanto a sua liberdade quanto a dos outros. É 
somente em liberdade que há a relação humana de conduta e de existência. Neste sentido, a 
liberdade de um indivíduo só será considerada como um fim se ele considerar a de todos 
como fim igualmente. Esta “escolha universal”, que vincula a humanidade inteira, não é 
exercida em forma de imposição, isto é, não é por causa de determinada decisão de uma 
pessoa que todos têm por obrigação agir como ela. É oferecido um possível modelo de boa 
conduta e não a imposição de agir como tal.  
O que Perdigão quer reforçar é que o homem, ao inventar sua vida, estabelece também 
a imagem que ele entende ser o melhor para a conduta da humanidade, ou como o indivíduo 
deve ser. Neste sentido, o ato de um implica a todos, pois ele decide a seu ver o que é mais 
conveniente para a humanidade em relação aos valores. De modo sumário, cada um age como 
se fosse o regulador das ações humanas (legislador universal). É angústia moral devido ao 
fato de que somos inevitavelmente livres, e, cabe a cada um de nós saber o que fazer desta 
“assombrosa liberdade”. 
A angústia, então, decorre da dependência dos valores em relação ao nosso modo de 
ser livre, que é exercido com a intenção de agirmos de determinada forma. Os valores são 
inventados frente a uma coerência de cada um consigo mesmo, não sendo gratuitos, no qual 
todos assumem as consequências de suas decisões. O que pode ocorrer é o arrependimento em 
face de uma ação executada, que depois há a possibilidade de ser modificada, colocando em 
dúvida os valores antes tidos como corretos, mudando também, se necessário, o projeto de 
quem a realizou. Isto demonstra que o homem é totalmente responsável, não somente por seus 
atos, mas também pelo sentido do mundo, que tem seus valores atribuídos por uma 
consciência humana. Esta imensa responsabilidade provém desta dependência entre 
significado do mundo em relação à humanidade, desta forma, o mundo se apresenta a mim 
(consciência) e sou eu que lhe confiro sentido. O “meu mundo” é o reflexo da imagem das 
minhas escolhas livres e conscientes. 
Assim sendo, em um plano de autenticidade (aceitação de sua condição de ser, no qual 
é o próprio homem que se define enquanto tal) total, o homem é reconhecido como um ser 
que a “existência precede a essência”, é livre porque deseja a sua liberdade e necessariamente 
a dos outros. Para realizar seu o projeto o homem deve comprometer-se em suas ações e 
41 
 
perpassar todas as adversidades impostas ao longo do percurso. Neste ponto é que se 
manifesta a liberdade, mesmo que as forças opositoras sejam muito fortes e incisivas, se ele 
crê realmente em seu projeto, terá uma imensa chance de realizá-lo. O homem é livre no 
sentido de que pode agir sempre considerando as resistências. 
Devido a esta relação recíproca entre as liberdades, entre os homens, Sartre afirma que 
pode formar um juízo acerca das pessoas que buscam esconder de si próprias a inteira 
gratuidade da sua existência e a sua plena liberdade. Em outras palavras, para negar sua 
liberdade e suas consequências, o agente de má-fé tem obrigatoriamente que ser livre, pois 
somente em liberdade é possível executar uma ação qualquer. 
A liberdade é ilimitada e se houvesse limites somente ela os colocaria a si própria: 
 
A liberdade só encontra no mundo os limites que ela mesma colocou. É ela 
que estabelece os obstáculos com os quais por ventura irá se defrontar. 
Somente ela opõe limites a si própria. Se limites externos existem, são 
postos pela liberdade mesma: a consciência não padece, mas, ao contrário 
elege tais limites. Em outras palavras: apenas a liberdade pode limitar a 
liberdade (PERDIGÃO, 1995, p. 104). 
 
Aos que mascaram para si próprios, com desculpas, a sua total liberdade, Sartre os 
nomeia de covardes; aos que tentam provar que as suas existências são necessárias na terra 
como seres absolutos, quando elas não passam de contingentes e temporárias, são os safados, 
mas, como o próprio filósofo francês afirma, esses nomes só podem ser atribuídos a eles num 
âmbito de total autenticidade.  
Perdigão destaca a tendência dos seres humanos de recusar a liberdade: 
 
Por sermos livres, somos angústia. Para mascará-la, precisamos disfarçar a 
liberdade que somos, e, neste sentido, usamos cotidianamente diversos 
expedientes e truques. Mentimos a nós mesmos para acreditar que não 
somos livres ou responsáveis por nossos atos. Pode-se dizer, de modo geral, 
que há uma tendência do homem de se negar como liberdade (PERDIGÃO, 
1995, p. 116). 
 
Todas as justificações e desculpas, bem como religiosas, psicológicas, teóricas, 
científicas e ideológicas são o empenho dos indivíduos em recusar, tanto sua liberdade quanto 
suas responsabilidades em relação a seus atos. Existem algumas doutrinas que pregam que os 
seres humanos são seres acabados, nos quais estão intrínsecos de modo a priori arquétipos, 
que são o que propulsiona as ações humanas. Em outras palavras, existe uma “essência 
imutável” a todos que fixa a personalidade e determina o futuro dos homens (destino). Os 
seres humanos são assim por terem nascido assim e não há nada que possam fazer para mudar 
suas essências preestabelecidas. Todavia, como vimos, todos podem mudar seus “destinos”, 
42 
 
pois, diferentemente de um objeto, o homem é dotado de consciência – liberdade de escolha – 
e não tem seu ser pronto e acabado, ele está sempre por se fazer, somente é definida a 
essência do ser humano quando ele deixa de existir.  
No que diz respeito à objeção de que a escolha no existencialismo humanista é 
licenciosa, sem implicações e consequências, não é completamente verdadeira e nem 
totalmente falsa, visto que, num âmbito de comprometimento total e livre, contido num 
campo de possibilidades, pode-se escolher qualquer coisa, dentre as alternativas dadas. Em 
relação ao fato de que na escolha não há uma reciprocidade, dado que sempre se espera uma 
ação, mas se exerce outra; Sartre defende que os valores parecem não ser tão sérios, pois o 
homem escolhe um ou outro valor para sua conduta, porém esta volatilidade tem uma 
utilidade em suprir a ideia de Deus como criador de fins. É tirar dos homens essa dependência 
metafísica para sua existência e essência. É forçoso que o homem invente os seus próprios 
valores e enfrente a concretude das coisas em sua própria realidade.  
A partir desta relação valorativa, na qual o homem cria seus valores, podendo formar 
uma “comunidade humana” ou vivência coerente entre si, 
 
[...] dizer que nós inventamos os valores não significa outra coisa senão que 
a vida não tem sentido a priori. Antes de alguém viver, a vida, em si mesma, 
não é nada; é quem a vive que deve dar-lhe um sentido; e o valor nada mais 
é que esse sentido escolhido (SARTRE, 1987a, p. 21). 
 
Sobre a definição do existencialismo como um humanismo, Sartre, para explicar como 
isto é possível, aponta que existem dois tipos de humanismo
18
. Um que toma o homem como 
fim e valor supremo, ou seja, mesmo que um ser humano não tenha executado um ato de 
grandeza, ele, na qualidade de homem, seria responsável por atos particulares. Nesta vertente 
é possível identificar que os valores humanos são definidos por atos mais altos e nobres de 
indivíduos.  
Este humanismo é incoerente, pois, relembrando, ninguém pode predicar um juízo 
valorativo ao homem tomando-o como um fim necessário a todos. Não se pode tomar um 
                                                 
18
 Cf. (SARTRE, 1987a, pp. 26-27) Sartre explica os possíveis tipos de humanismo:
 “Humanismo é infelizmente 
hoje em dia um termo que serve para designar diversas correntes filosóficas, desdobrando-se não somente em 
dois sentidos, mas em três, quatro, cinco, seis. Todo mundo é humanista, em nossos dias, mesmo certos 
marxistas, que descobriram ser racionalistas clássicos, são humanistas no sentido insípido do termo, derivado das 
idéias liberais do século passado: o sentido de um liberalismo refratado por toda a crise atual. E assim como os 
marxistas podem pretender ser humanistas, as diversas religiões – a cristã, a hindu e muitas outras – também 
pretendem ser, antes de mais nada, humanistas; e, por sua vez, o existencialismo, e também, de modo geral, 
todas as filosofias. Do mesmo modo, muitas das correntes políticas atuais afirmam sua filiação humanista. Tudo 
isso converge para uma espécie de tentativa de  estabelecimento de uma filosofia que, no fundo e apesar de sua 
pretensão, recusa engajar-se, e recusa engajar-se não apenas ao nível político e social mas também num sentido 
filosófico profundo”. 
43 
 
homem por ideal, pois ele está sempre num constante devir, ele está sempre se fazendo. Isto o 
levaria a um humanismo fechado em si mesmo, individualistas. Se os homens tivessem seus 
ideais pré-definidos não precisariam de uma relação concreta entre si para a definição dos 
valores. 
O outro tipo de humanismo, o existencial, é mais coerente: 
 
[...] o homem está constantemente fora de si mesmo, é projetando-se e 
perdendo-se fora de si que ele faz existir o homem e, por outro lado, é 
perseguindo fins transcendentes que ele pode existir; sendo o homem esta 
superação e não se apoderando de objetos senão em referência a esta 
superação, ele vive no coração e no centro desta superação. Não há outro 
universo senão o universo humano, o universo da subjetividade humana 
(SARTRE, 1978, pp. 268-269). 
 
O homem é a superação feita com o ato de projetar-se para fora de si próprio, 
buscando fins transcendentes com o intuito de se fazer existir. O ser humano vive no ato da 
superação, que está fundada no universo da subjetividade humana em relação com o outro.  
O Humanismo existencial provém da relação de transcendência, que instiga o homem 
e a subjetividade. Ele intenciona sua subjetividade em busca do outro, visando definir-se na 
própria humanidade, isto é, transcender os limites da sua própria subjetividade para adquirir 
um caráter de escolha universal por se comprometer e se responsabilizar pela própria 
humanidade. 
  
44 
 
2 O MARXISMO DE HENRI LEFEBVRE 
 
 
2.1 Críticas e concepção de mundo 
 
 
Na obra Marxismo de Henri Lefebvre, temos uma tentativa de defesa e de exposição 
do marxismo, o materialismo histórico, por parte do autor. Ele apresenta algumas ideias 
básicas da teoria. Na obra há um destaque para a crítica cristã ao marxismo, que o taxa de 
“sistema totalitário”. E também a crítica de alguns oponentes mais “encarniçados”, como ele 
próprio afirma. Para o autor, o marxismo é sim uma concepção de mundo, mas como “uma 
visão conjunta da natureza e do homem, uma doutrina completa” (LEFEBVRE, 2011, pp. 9-
10). Assim, pode-se dizer que uma filosofia seria o mesmo que uma visão de mundo de seu 
tempo. Todavia, Lefebvre afirma que a segunda é mais ampla e abrangente que a primeira. 
Isso porque: 
 
Em primeiro lugar toda concepção de mundo implica uma ação, isto é, 
alguma coisa mais do que uma “atitude filosófica”. Mesmo que tal ação não 
seja formulada e incluída expressamente na doutrina, mesmo que seu elo 
permaneça sem ser formulado e que a ação implicada não dê lugar a um 
programa, nem por isso deixa de existir (LEFEBVRE, 2011, p. 10). 
 
Com isso, vemos que para ele a ação é diferente e se sobrepõe à noção de atitude. A 
ação é algo que independe de uma conceituação teórica, doutrina ou tese. Mesmo que ela não 
faça parte de uma doutrina ou teoria filosófica, ela existe como tal. Ela é concreta e situada. 
Elaborar uma concepção de mundo é exercer uma ação que leve a este fim.  
Já a concepção de mundo dos cristãos repousa na autoridade de seus “sacerdotes”. A 
ação não é racional e sim política. As decisões são tomadas conforme os anseios daqueles que 
mandam na igreja, não tendo assim uma lógica como ponto de partida ou fundante da ação. 
Neste sentido, a ação está diretamente ligada a uma parcialidade proveniente de interesses. 
Para o marxismo a ação tem um sentido mais amplo. Ou seja, a ação está pautada na 
racionalidade e leva em conta um conjunto de teorias, para aí sim, de forma imparcial, propor 
um “programa político”. Em outras palavras, a ação, para o marxismo, não depende de 
caprichos e/ou de vontades de autoridades tendenciosas da Igreja. A política seria um 
construto racional e sem preconceitos. Em seguida, ele afirma: 
 
Em segundo lugar, uma concepção de mundo não é forçosamente a obra 
deste ou daquele “pensador”. Ela é acima de tudo a obra e expressão de uma 
época. Para atingir e formular uma concepção de mundo, é necessário 
estudar as obras daqueles que a formularam, mas deixar de lado as nuances e 
45 
 
detalhes; é preciso esforçar-se para atingir o conjunto (LEFEBVRE, 2011, p. 
10). 
 
Uma filosofia ou doutrina é fruto de seu tempo. O filósofo é um gênio de seu tempo e 
suas ideias não perduram eternamente, ad infinitum. Cada filosofia está situada e representa 
as ideias de sua época. Para entender ou se construir uma concepção de mundo é necessário 
levar em conta as teorias dos pensadores que a realizaram, as concepções anteriores e ainda 
analisar as obras por completo, não se importando com especificidades deste ou daquele 
pensador. Deve-se buscar o todo da teoria.  
Com isso, Lefebvre atenta para o fato de que não devemos estudar a filosofia em si, as 
teorias e ou a história da filosofia em si mesmas, pois se assim fizermos, serão enfatizadas 
cada vez mais as especificidades divergentes ou convergentes entre os filósofos ou 
pensadores. Destaca-se mais a pessoalidade do autor do que seu pensamento. Devemos ter 
uma visão mais abrangente, nos atendo à concepção de mundo de determinado tempo e 
espaço, para, de forma concisa, entendermos uma determinada época.  
Entendida esta parte, o autor destaca três grandes concepções de mundo e afirma 
existir somente estas três. A primeira é a cristã, estabelecida de forma mais crítica pelos 
teólogos católicos. A segunda é a concepção individualista, que se inicia no fim século XVI, 
da qual Montaigne é o principal expoente. A terceira é o marxismo, teoria na qual Lefebvre se 
inclui e a defende. 
A concepção cristã se fundamenta, essencialmente, na noção de hierarquia. É uma 
concepção medieval, formulada com um grande rigor teórico, próprio desta época, descrita, 
principalmente, por São Tomás de Aquino. Aqui temos uma hierarquização estática dos seres 
e coisas como um todo. Deus, o Ser supremo é perfeição pura, é o cume. Esta é uma posição 
que busca enfatizar uma visão de conjunto de universo. Para alguns, se apresenta como válida 
até hoje. 
Na concepção individualista de mundo observamos uma inversão de papéis, o 
indivíduo se torna a realidade essencial, possuindo em si mesmo a razão – que é a junção 
entre o individual e universal – e a hierarquia antes posta pela concepção cristã, que é deixada 
de lado. A razão é de extrema importância nesta vertente, pois ela se apresenta como um liame 
entre os interesses individuais e gerais, em todos os aspectos. 
Esta é uma posição do liberalismo, da burguesia, isto é, substitui-se o fundamento 
pessimista (hierárquico e metafísico) por um otimista (harmonia natural dos homens e uma 
funcionalidade sistêmica humana). A burguesia se volta mais para um aspecto pessimista, 
hierárquico e autoritário do que o otimista, devido ao seu declínio atual, ou seja, parece mais 
46 
 
fácil se explicar os fracassos pelo além, do que pelas ações realizadas. 
Terceira e última concepção, a marxista. Vejamos a definição de Lefebvre: 
 
Por fim, vem a concepção marxista do mundo. O marxismo se recusa a 
aceitar uma hierarquia exterior aos indivíduos (metafísica); mas, por outro 
lado, não se deixa encerrar, como o individualismo, na consciência do 
indivíduo e no exame isolado dessa consciência. É ciente de realidades que 
escapam ao exame da consciência individualista: são as realidades naturais 
(da natureza, do mundo exterior), práticas (trabalho e ação), sociais e 
históricas (estrutura econômica da sociedade, classes sociais etc.) 
(LEFEBVRE, 2011, p. 12). 
 
Em outras palavras, o marxismo nega as duas concepções anteriores. Não aceita 
explicações pautadas em uma hierarquia de superioridade provinda de seres supremos e acima 
dos homens (metafísica), nem em uma explicação na qual o indivíduo e sua consciência se 
apresentam como o fim de si mesmo e de uma concepção de mundo. Para ele, nem todas as 
realidades podem ser apreendidas pela consciência individualista – realidades como as 
naturais, práticas, sociais e históricas. 
O marxismo rejeita de forma veemente uma possível submissão a priori e natural de 
um homem pelo outro, isto se aplica a uma perspectiva social e objetiva, ou seja, não é porque 
uma sociedade ou pessoa se julgam superiores por querências subjetivas ou possuem mais 
bens materiais que outros que podem se sobrepor aos demais. Do mesmo modo, não aceita 
uma harmonia espontânea entre os seres humanos, ao contrário, notam-se contradições, e 
muitas, entre os desejos individuais e os gerais, que se chocam quase sempre.  
Para Lefebvre há uma dicotomia entre os anseios individuais das pessoas, grupos ou 
classes sociais e a Razão, conhecimento e ciência. De forma alguma existe uma concordância 
espontânea e harmônica. A harmonia entre natureza e homem é uma crença infundada, tal 
relação é conflituosa. O homem deve lutar com o intuito de dominar e transformar a natureza, 
isso só é possível pelo trabalho e utilizando-se do conhecimento científico. Assim, 
transformando a natureza o ser humano pode transformar a si mesmo. 
Neste sentido, quando se trata de contradições, deve-se ater a problemas e soluções. 
Luta e ação são dois caminhos que juntos podem levar ao progresso. Devido a esta posição o 
marxismo se esquiva tanto do pessimismo metafísico cristão, operando com a ação e as 
relações sociais, quanto do otimismo individualista, por não aceitar a consciência solipsista 
como fundamento da realidade totalizadora.  
O marxismo desvendou que a tomada de consciência do mundo real, com todas suas 
contradições, é posterior à realidade natural histórica e à lógica destas contradições. Lefebvre 
afirma isso para destacar a luta incessante do homem com a natureza, que não é fácil nem 
47 
 
ingênua. Para ele, o marxismo é a teoria que enfatiza as contradições da realidade social, a 
saber, o sistema capitalista, que deixa bem claro o papel dos seres humanos em suas 
sociedades, onde uns possuem o domínio do capital (burgueses) e outros, a maioria, são 
dominados por não deterem o “poder”, e são obrigados a vender sua mão-de-obra 
(proletariados). 
Lefebvre explica o surgimento do marxismo junto à sociedade “moderna” trazendo 
suas contradições e tentando ser uma resposta válida:  
 
Assim, o marxismo apareceu junto com a sociedade “moderna”, com as 
grandes indústrias e com o proletariado industrial. Apresentou-se como a 
concepção de mundo que exprime o mundo moderno – suas contradições, 
seus problemas – trazendo soluções racionais para esses problemas 
(LEFEBVRE, 2011, p. 14). 
 
Se para ele, como vimos, só existem três concepções de mundo, toda e qualquer teoria 
deve, inevitavelmente, “encaixar-se” em uma delas. Assim, segundo ele, o existencialismo é 
um individualismo, que defende que consciência e liberdade do individuo é um absoluto (tal 
posição será debatida de forma pormenorizada e racional mais à frente em nosso estudo). 
Desta forma, o existencialismo, para Lefebvre, somente renova a essência do individualismo 
clássico. Acaba por tratar da consciência individual e a descrição da existência como verdade 
absoluta. Na opinião do marxista francês: 
 
Por exemplo, o existencialismo, tão em moda hoje em dia, coloca no centro 
de suas preocupações a consciência e a liberdade do indivíduo tomadas 
como um absoluto. O existencialismo, visto sob esse ângulo, não é mais do 
que um substituto tardio e degenerado do individualismo clássico. Sabemos 
que ele repudia o otimismo fácil; também sabemos que ocasionalmente, para 
se “modernizar” e difundir como sendo novas algumas temáticas já 
envelhecidas, ele se recobre de uma tintura de marxismo. Mas isso não muda 
em nada o essencial, isto é, o esforço para obter uma pretensa verdade 
absoluta a partir de uma descrição da “existência” e da consciência 
individuais (LEFEBVRE, 2011, p. 14). 
 
O problema do individualismo é que ele tenta fundamentar a verdade pela consciência 
individual – por exemplo, pelo cogito cartesiano –, se tornando assim algo universal, que por 
sua vez se impõe sobre o individual, como o Estado para os hegelianos de direita. Não há uma 
reciprocidade entre individual e universal e nem coerência entre os individualistas. É por isso 
que para ele as concepções individualistas estão fadadas ao fracasso. 
Já o catolicismo é uma doutrina política, que não possui uma fundamentação lógica e 
racional. Conceitos religiosos como alma, além e morte parecem não se adequar às noções 
postas pelo Estado e pela estrutura social, ou seja, a ligação entre uma realidade metafísica e a 
48 
 
vivência humana não podem ser explicadas pela razão. A verdade repousa num além abstrato, 
que é o topo da hierarquia das “substâncias”. Nessa concepção de mundo, a ligação entre 
política e princípios metafísicos é fraca. Por mais que um Estado respeite as leis divinas, ele 
não deve criar as suas se baseando somente nelas, mesmo porque, as teorias cristãs, 
principalmente, justificam uma hierarquização de dominação sistemática. Pode dizer-se que 
há uma aplicação da teoria à prática, uma comprovação irracional para a estrutura social 
capitalista. Do contrário, as teorias metafísicas cairiam no ostracismo teórico. 
A finalidade da concepção de mundo cristã é atualmente política. Mas quando a teoria 
se parece com a prática política, ela está no âmbito da teologia, uma força religiosa 
sobrepondo-se ao Estado. Nesta vertente não há como estabelecer, de forma racional e crítica, 
uma relação entre a teoria e a prática. Pelo contrário, desta forma, abre-se um grande campo 
licencioso para se realizar manobras e acordos nem sempre morais ou coerentes. 
E o marxismo?  É a teoria que surge para resolver racionalmente tais contradições e 
erros. Como Lefebvre o define? Como o marxismo trata a relação de ação com teoria de modo 
diferente das que vimos até então, a saber, cristã e individualista? Vejamos a definição nas 
suas próprias palavras: 
 
O marxismo aparece de início como expressão da vida social, prática e real 
em seu conjunto, em seu movimento histórico, com seus problemas com 
suas contradições, portanto nele está compreendida a possibilidade de 
ultrapassar sua estrutura atual. As propostas concernentes à ação política se 
encaixam aberta e racionalmente com suas preposições gerais. São teoremas 
políticos subordinados a um conhecimento racional da realidade social; 
portanto, subordinados a uma ciência. O marxismo se apresenta, pois, sob 
esse ângulo, como uma sociologia científica com consequências políticas, 
enquanto que a concepção de mundo que se opõe a ele é uma política 
abstratamente justificada por uma metafísica (LEFEBVRE, 2011, p. 18). 
 
O marxismo, então, seria a única teoria que demonstra de forma “nua e crua” a 
realidade humana, com todas as suas contradições e problemas, sem se pautar por misticismos 
ou idealismos. Ele é fundado sob o solo rígido do conhecimento cientifico. É a única vertente 
capaz de proporcionar ao homem a superação de seu sistema opressor.  
A política aqui é posterior, consequência deste processo racional e não fundada numa 
metafísica tendenciosa e manipuladora. Não se pode tentar definir o marxismo como uma 
doutrina que justifica a política em um patamar secundário, como interpretação de mundo, 
isto é, a política é consequência relacional de várias deduções racionais, que levaram à sua 
definição ou sua realização.   
Ao aceitarmos o marxismo como uma concepção de mundo, como visão de sua época 
49 
 
(moderna) conflituosa e não harmônica, devemos nos ater ao fato de quer o “marxismo” não 
se reduz às obras e textos de Karl Marx. Não se deve limitar o marxismo, taxando-o como 
uma teoria provinda exclusivamente do pensamento ou filosofia de Marx. A noção de 
concepção de mundo deve ser elevada a um patamar, o mais abrangente possível, não se 
apegando a detalhes e sim, ao todo. 
Se remetermos a Marx, nenhuma época histórica ou teoria filosófica, por exemplo, 
aparecem do nada, como uma cisão independente de sua história anterior. Essa visão mais 
racional – bem como o próprio marxismo – dos dados da experiência e do pensamento 
moderno não foi criada somente por Marx. Primeiro, porque algumas teorias que o 
antecederam, como as dos grandes economistas (Perry, Smith e Ricardo), já tratavam do 
trabalho como relação ativa do ser humano com a natureza. Segundo, pois alguns filósofos 
materialistas do século XVIII e XIX pesquisavam a natureza colocando-a como origem do 
homem e realidade objetiva. Terceiro, os filósofos franceses do século XIX já estudavam os 
grupos, classes e lutas sociais. Quarta posição, a cisão de mundo entendido como relação 
harmoniosa, da metade para o final do século XVIII – destaque para Hegel, que abordou a 
complexidade das contradições humanas, tanto na história, quanto na natureza. Quinta 
asserção, os socialistas franceses do século XIX analisaram problemas novos, referentes à 
economia, classes e políticas operárias e problemas humanos de toda espécie. A sexta e mais 
importante influência ou antecessora, recai no valor de Friedrich Engels para as obras 
marxistas, que salientou as questões referentes à economia e à situação de opressão vivida 
pelos proletariados. Aqui temos a imensa importância de Engels nos escritos de Marx. 
Todos estes elementos destacados culminaram na formação do marxismo. Mas Marx, 
segundo Lefebvre, contribuiu de forma mais original e somatória. Vejamos como o marxismo 
pode ser considerado uma teoria que sintetiza e atualiza todas estas, postas anteriormente. 
Para Marx tudo se relaciona, não há nada isolado, nem fatos, nem ideias. Para ele, é uma 
teoria que possibilita o progresso, uma realidade e um raciocínio mais elevados, mais 
abrangentes, por fim, mais complexos e mais detalhados. 
Lefebvre reafirma sobre a obra de Marx o seguinte: 
 
Também lhes devemos a compreensão nítida e clara da importância dos 
fenômenos econômicos e a afirmação nítida e clara de que tais fenômenos 
econômicos devem ser realçados através de um estudo científico, racional e 
metodicamente orientado, embasados em fatos objetivos e determináveis. É 
isso que chamamos de materialismo histórico, o alicerce de uma sociologia 
científica (a bem dizer, os dois termos são equivalentes e designam dois 
aspectos de uma mesma pesquisa) (LEFEBVRE, 2011, p. 22). 
 
50 
 
Deste modo, Marx tenta fundamentar sua teoria como ciência metódica e racional, 
analisando fatos objetivos e previsíveis. Assim, materialismo histórico e sociologia científica 
se misturam. Para ele, os fenômenos econômicos devem ser analisados numa roupagem 
objetiva, racional e crítica. 
Outro fato que deve ser atribuído a Marx é a contradição inerente ao próprio 
capitalismo, isto é, na sociedade capitalista o proletariado vende sua força de trabalho para 
que seu patrão (burguês) obtenha os lucros provenientes deste trabalho, o trabalhador produz 
o capital, mas não participa dele de modo justo e equivalente. Recebe um mísero salário e 
produz para seu algoz – que o oprime e o explora – a mais-valia. O marxismo desvenda a 
posição histórica do proletariado e vislumbra a possibilidade de fazer política e transformar 
politicamente as relações sociais. Pode-se dizer que a teoria marxista dá chance de os 
oprimidos se “livrarem” das amarras de seus opressores, por meio da ação racional e crítica. 
Vejamos o que Lefebvre, de modo similar a Marx, define acerca de tal conhecimento 
científico e racional:  
 
Em todo conhecimento racional, a demonstração dos resultados atingidos 
modifica e, algumas vezes, inverte a ordem segundo a qual tais resultados 
foram obtidos. Ainda que os resultados (os conhecimentos efetivamente 
alcançados) não possam separar do processo de pensamento que os obteve, 
não é menos verdadeiro que o essencial se encontra no final desses (sic) 
processos. As etapas intermediárias não têm outra importância que a de 
haverem servido para preparar o resultado final. Elas permitem compreender 
melhor o caminho seguido pelo pensamento, mas a exposição pode dispensá-
las porque os conhecimentos atingidos já as ultrapassaram (LEFEBVRE, 
2011, p. 24). 
 
Em outras palavras, mesmo que o materialismo dialético, por se tornar o que é, 
perpasse e utilize algumas premissas de outras teorias, ele as ultrapassa. O marxismo é a 
concepção de mundo de seu tempo e o resultado totalizante de outras teorias anteriores a ela. 
Lefebvre quer demonstrar que o marxismo é a teoria insuperável, tentando se tornar ciência de 
validade. Para demonstrar isso ele vai aprofundar a discussão de conceitos e noções do 
marxismo.    
51 
 
2.2 Materialismo Dialético 
 
 
O marxismo, sendo tratado como filosofia
19
, apresenta duas feições principais. Uma, a 
mais importante e fundamental para a filosofia marxista, é a parte metodológica. É o 
momento lógico e racional, desenvolvido desde Hegel, fazendo uso da Razão de forma 
metódica. Marx retoma e aprofunda a lógica hegeliana e desenvolve o método dialético. Marx 
utiliza o conceito hegeliano de história geral da Consciência Humana descrito na obra 
Fenomenologia do espírito, para poder transformar a fenomenologia hegeliana em uma teoria 
concreta, a saber, a alienação, que é a outra parte da teoria marxista. O conceito de alienação 
marxista, deste modo, é criado sob um fundamento metodológico. Por isso, Lefebvre chama a 
atenção para a importância deste aspecto (metodológico) do marxismo, pois somente com ele 
pode-se conceber o conceito de alienação numa perspectiva racional e científica.  
Neste sentido, para se entender melhor como se estabelece a filosofia marxista, sendo 
uma doutrina baseada na racionalidade e logicidade, Lefebvre, explicará de forma breve, mas 
eficiente, o que são: o método dialético, propriamente dito; e o significado do conceito de 
alienação. 
Toda a história da filosofia e toda disputa relativa a conceitos parecem estar 
estabelecidos sob o campo do confronto de teorias opostas. Isso se apresenta como um ponto 
coerente e aceitável da filosofia. O problema das teses filosóficas que se enfrentam recai nos 
pensadores que fundamentam suas teorias em erros e reflexões fracas, insuficientes para 
tornar suas teorias coesas. 
Se os filósofos fossem empenhados, tivessem a capacidade de superar os erros de suas 
teorias e possuíssem em si mesmos os dons (intuição ou gênio) notariam, logo de início, a 
verdade e não cairiam nestas longas e cansativas disputas. Assim sendo, generalizar, dizendo 
que o pensamento humano é incompleto, não é necessariamente verdadeiro. Quem faz isso 
pode estar caindo em um erro indutivista, ou seja, considera que as contradições encontradas 
em um pensamento são premissas para postular que o pensamento humano é parcial e 
contraditório. Lefebvre diz: 
 
Essa teoria, adotada por muitos filósofos e também pelo julgamento da 
maioria, atribui, portanto, as contradições do pensamento exclusivamente às 
deficiências desse pensamento, ao fato de que todo pensamento humano 
permanece incompleto (LEFEBVRE, 2011, p. 27). 
 
                                                 
19
 Cf. (LEFEBVRE, 2011, p. 26) “Isto é, até o ponto que responde aos problemas que costumam ser 
denominados como filosóficos”. 
52 
 
Porém não devemos desprezar categoricamente tal afirmação. Se pensarmos bem, 
podemos analisar as contradições contidas em uma teoria e tentar saná-las, de forma coerente 
e lógica, estabelecendo com isso um acordo. Todavia, teorias que se pautam por essa máxima 
são insuficientes para resolver problemas por não levarem em conta dois aspectos cruciais. O 
primeiro, nas palavras de Lefebvre: 
 
Inicialmente, as teses que se enfrentam não são apenas diferentes ou 
divergentes. São opostas e, algumas vezes, contraditórias. É por esse motivo 
que se enfrentam. Para tomar um exemplo mais simples: se um diz “branco” 
e o outro diz “negro”, eles se compreendem, porque estão discutindo sobre a 
mesma coisa, ou seja, a cor de um objeto. Certamente uma inspeção mais 
cuidadosa desse objeto permite discernir se é branco ou negro; ainda assim, 
nem sempre é fácil, porque pode ser cinzento, ou mostrar sombra ou mudar 
de nuance etc. Além disso, para que a discussão seja possível, é necessário 
que haja objetos dessa classe que sejam negros e outros brancos! Em 
conseqüência, as teses contraditórias presentes não têm sua origem única e 
exclusiva no pensamento daqueles que discutem (em sua consciência 
“subjetiva” como dizem os filósofos) (LEFEBVRE, 2011, pp. 27-28). 
 
Isto é, o objeto a ser analisado por duas ou mais teorias que defendem posições 
diferentes, é o mesmo, o que possibilita o entendimento linguístico e racional acerca dele. O 
que muda é sua significação e/ou conceituação. Outro bom exemplo que podemos citar é em 
relação às perspectivas de leituras de uma mesma obra. Pensadores podem descrever um 
mesmo conceito de maneiras diferentes. 
Confrontar teses não pode ser considerado algo irrelevante. Para um entendimento 
verdadeiro de determinado assunto ou objeto, analisar teorias opostas pode propiciar 
caminhos que solucionem as dicotomias contidas em tais doutrinas. Ficar pensando 
abstratamente na existência de um ser puro, que possui uma consciência essencialista das 
coisas, é um sonho ou uma idealização da verdade.  
Lefebvre afirma que todo e qualquer ser humano, inclusive e principalmente os 
filósofos, tem por obrigação buscar a verdade (teleologia). Para que isso seja possível, 
devemos confrontar as teorias que temos até então, os conhecimentos postos e as hipóteses, 
com todas as suas contradições. Seguindo tal caminho podemos evoluir, gradativamente, até a 
verdade de fato. Então, poderemos concluir: 
 
As contradições no pensamento humano (que se manifestam em todas as 
partes e a cada instante) apresentam um problema essencial. Elas têm 
origem, pelo menos parcialmente, nas deficiências do pensamento humano, 
que não pode captar de uma só vez todos os aspectos de uma coisa e precisa 
quebrar (analisar) o conjunto em suas partes constituintes antes de poder 
compreendê-lo. Mas essa unilateralidade de todo processo não basta para 
explicar as contradições; é preciso admitir que as contradições têm um 
53 
 
fundamento nas próprias coisas e que estas são o ponto de partida. Em outros 
termos, as contradições do pensamento e das consciências subjetivas dos 
homens apresentam um fundamento objetivo e real. Se existem “pró e 
contra”, “sim e não”, é porque as realidades apresentam não somente 
aspectos múltiplos, mas facetas imutáveis e contraditórias. Desse modo, o 
pensamento humano, que não consegue captar de uma só vez, se vê obrigado 
a tatear e caminhar através de suas próprias dificuldades e contradições até 
atingir as realidades movediças e instáveis e as contradições reais 
(LEFEBVRE, 2011, pp. 28-29). 
 
Neste trecho vemos o problema principal contido nas contradições presentes no 
pensamento humano. Elas existem porque o próprio pensamento humano é deficitário, pois 
ele não tem a capacidade de perceber e entender um objeto como uma unidade (todo). O 
pensamento humano deve decompor uma coisa em partes, para aí sim estabelecer um 
entendimento. Além disso, as contradições estão também nas próprias coisas. Com isso, o 
esclarecimento das contradições, em geral, deve passar não somente pelo pensamento, mas, 
pelas coisas, pela concretude, que são o ponto de partida. 
 As discussões ou conflitos teóricos só existem porque as coisas não são imutáveis e 
imóveis. Estão sempre mudando suas qualidades e aspectos. Por isso, é difícil estabelecer um 
conhecimento indubitável sobre algo em pleno movimento. O ser humano (pensamento) que 
nota as coisas, levando em conta apenas suas partes constituintes e não o todo, acaba caindo 
em realidades parciais e incertas.  
Lefebvre quer aferir às contradições, tanto do pensamento, quanto das coisas, um 
fundamento objetivo e real. É na realidade objetiva que tudo ocorre, conhecimento, filosofia, 
ciência e vivência humana (moral). Não há lugar para imaginações metafísicas que 
fundamentem tal realidade. Então, como prosseguir diante de tal problema? A saber, se as 
contradições existem e objetivamos a verdade, somos obrigados a buscá-la. O que fazer? 
Podemos ignorar todas as contradições taxando-as de incoerentes, equivocadas e de 
um extremo absurdo. Sendo indiferentes a elas, condenando-as de parciais e levianas, cujo 
fundamento nada mais é do que um erro ou falha da intelectualidade humana e imperfeição 
ou limitação, posto que não podemos apreender a verdade como um todo, apenas suas partes. 
Mas isso não poderia ser um pouco perigoso? 
Aceitando tal posição excludente, poderíamos cair numa metafísica. Ora, aqui a 
verdade teria um viés abstrato e idealista, pois ela existiria por si e em si mesma, a priori e 
externa ao ser humano e a sua realidade. Ou seja, seria uma verdade eterna, imutável e imóvel 
– bem como Aristóteles definia –, e para acessá-la, deveríamos ser afetados por uma intuição 
ou revelação de seres superiores a nós. 
Essa atitude metafísica intenciona negar o empenho humano em buscar o 
54 
 
conhecimento. Em resumo, não leva em conta “as condições concretas do esforço humano em 
direção ao conhecimento” (LEFEBVRE, 2011, p. 29). Parece que esta não é a melhor opção. 
É confusa e misteriosa (mística), e foge do campo da concretude da vida humana. 
Em contrapartida, podemos assentir que as contradições têm relevância na busca pela 
verdade. O pensamento humano, se valendo das contradições para alcançar a verdade, na qual 
elas próprias estão no âmbito da objetividade, teria um fundamento na realidade e não na 
metafísica. Seguindo tal premissa, deixaríamos de recusar as contradições, proeminentes em 
nossa realidade, e passaríamos a analisá-las em seus fundamentos objetivos.  
Lefebvre propõe que a razão dialética é a investigação densa dos métodos 
tradicionais. Devemos definir a verdade e a objetividade de forma racional, mas não sob 
qualquer razão e sim sobre a mais radical e profunda, a razão dialética. Isso nos remete a uma 
dicotomia, aceitar “ou isso, ou aquilo” como resposta e não “a Resposta” – axiomas ou a 
Verdade idealista.  
A razão dialética é um caminho que nos leva à verdade por meio do estudo que se 
empenha em entender, segundo Lefebvre (2011, p. 30), “as condições concretas da pesquisa e 
os caracteres concretos do real”. Ela tenta entender a realidade, por ela e nela mesma, com 
suas condições e dados do próprio real. Para Lefebvre, Marx foi o primeiro a utilizar o método 
dialético. Ele investigou a realidade com todas as suas contradições e aspectos de uma 
existência que possui uma objetividade determinada.  Marx estava comprometido com a tarefa 
de encontrar a verdade nesse devir humano, sem um imobilismo metafísico. Tal resolução 
parte do seguinte pressuposto: “Após ter distinguido os aspectos ou os elementos 
contraditórios, sem negligenciar seus liames, sem esquecer que se trata de uma única 
realidade, ele a refaz em sua unidade, isto é, no conjunto de seu movimento” (LEFEBVRE, 
2011, p. 29). 
Isso significa que encontrar e entender as contradições contidas em nossa realidade é 
de suma importância no trajeto rumo à verdade. Que, por sua vez, é uma unidade de uma 
multiplicidade. Este devir na realidade humana é fundamento para uma verdade, realmente 
válida, visto que, é retirada do mundo real e concreto do ser humano. 
Marx salienta que o primordial, no tocante à metodologia, é tentar decifrar como se 
dão as mudanças e desenvolvimentos nos fenômenos pesquisados, se existem regras 
recorrentes nos dados, mas isso não só em determinadas ocasiões. Tenta estabelecer leis 
universalizáveis que possibilitam um conhecimento válido cientificamente. 
Neste sentido, é prudente diferenciar “método de pesquisa” de “método de 
demonstração”.  O primeiro se apresenta da seguinte maneira: é estudar o objeto em questão, 
55 
 
de forma pormenorizada, tentando compreender seus componentes internos, ou seja, tentar 
estabelecer um entendimento que contemple o objeto como um todo, com todas suas relações 
interiores. Vejamos nas palavras do próprio Lefebvre tal procedimento: 
 
O método da análise deve convir ao objeto estudado. É necessário evitar o 
emprego em economia política dos métodos que permitiram a descoberta das 
leis físicas ou químicas. Mais ainda: cada período histórico possui suas 
próprias leis. A análise dos fatos sociais demonstra que entre os organismos 
sociais há diferenças tão profundas como as existentes entre os organismos 
vegetais e animais, e que um fenômeno está submetido a leis diferentes de 
acordo com o conjunto dentro do qual figura (LEFEBVRE, 2011, p. 30). 
  
Posta esta explicação sobre o que vem a ser a análise, passemos para a exposição. Se 
ela for bem dirigida, tanto a existência da coisa, como a sua evolução, serão refletidas nas 
ideias expostas. Assim, expor algo é: aquilo que é exposto pode ser vislumbrado numa ideia 
ou num conceito e não o oposto, que é “crer” que a coisa só é ela mesma pelo seu significado, 
que o sentido é a posteriori em relação à coisa como tal. Devemos conhecer primeiro para 
depois demonstrar. 
Muitos pensadores, ao longo da história da filosofia, já propuseram regras ou leis para 
analisar, de forma objetiva e lógica, o conhecimento com bases científicas, Descartes, Kant e 
Auguste Comte, são alguns exemplos. Mas Marx se destacou no seguinte sentido: de início, 
quanto mais se radicaliza a investigação, mais se observa que as contradições estão presentes 
em nossa realidade. Sendo assim, Marx traz como novidade o fato de que ao pesquisar a 
realidade de modo crítico, atingem-se aspectos contraditórios. 
Hegel já tinha observado isso. Contudo, Marx desenvolveu as hipóteses que ele havia 
elencado no estudo das realidades (econômicas, sociais e políticas) para chegar à verdade 
profunda – radical e racional presente na vida concreta –, que só pode vir das contradições 
intrínsecas à sociedade humana. Reiterando, a inovação apresentada por Marx recai no fato de 
que pesquisar a realidade, de maneira crítica, nos leva a descobertas de dimensões 
contraditórias da existência. 
Outro ponto importante é, relembrando: a metodologia é de suma importância no 
pensamento marxista, para ele, sua teoria se esforça bem mais em entender um dado 
primordial do que aquelas que o antecederam. A realidade está sempre em movimento. Isso 
quer dizer que, para se chegar a ela, devemos nos valer da análise, que representa a parte 
lógica do assunto e da exposição, que é o lado que possibilita remontá-la. 
 A análise marxista pode romper com este movimento da realidade. Com o intuito de 
chegar a seus elementos, ela pode encontrar, como diz Lefebvre (2011, p. 32) “um conjunto 
56 
 
de abstração”. Por exemplo, do mesmo modo que um médico isola um determinado órgão 
para estudá-lo e recuperá-lo, a análise marxista faz o mesmo com a realidade, pois ela 
possibilita a remontagem não somente do todo, mas também do movimento. 
Mas como fazer tal procedimento? Lefebvre explica que, 
 
[...] o método marxista afirma que é possível a reconstituição não só do todo 
como também do movimento. É claro que ela apenas pode ser atingida pela 
abstração prévia dos elementos; para chegar a esse resultado, eles tem de ser 
primeiro separados e isolados. Entretanto, desde que a análise tenha sido 
bem conduzida, ela apenas separa os elementos para descobrir quais são as 
conexões existentes entre eles, as relações internas que compõe o todo. De 
maneira semelhante, ela apenas compara e descobre as analogias para 
discernir melhor as diferenças. Assim, a reconstituição do conjunto, isto é, 
do todo em movimento, não é incompatível com a análise, ou seja, a 
dissecação anatômica com o todo. Ao contrário (LEFEBVRE, 2011, p. 32). 
 
Vemos aqui que Marx propõe algo que tem a finalidade de alcançar o todo da 
realidade e seu movimento. Para que isso seja possível devemos primeiro descrever os 
elementos que compõe a realidade, isolando-os e separando-os. Após este passo, pode-se 
desvendar como eles se relacionam entre si e com o todo. Devemos separar bem os elementos 
para que possamos conhecer como se dão suas desigualdades. A partir disso, pode-se remontar 
ao todo, pois suas partes são conhecidas. 
Última consideração: o marxismo supera as outras teorias no sentido de que ele dá 
mais ênfase à originalidade (qualidade) dos objetos analisados e também de cada um dos 
objetos, de forma individual. Visto que, para Lefebvre, cada coisa contém em si qualidades e 
diferenças específicas. Um bom e coerente pesquisador deve encontrar a lei particular dessa 
coisa: “seu devir, sua forma de autotransformação”. 
Ao realçar as peculiaridades da alteridade, das diferenças, Marx afirma que nunca 
devemos nos desvencilhar do movimento da realidade e mantermos sempre o trato conectivo 
com o objeto, um trato prático com ele: “Nada substitui o contato com o próprio objeto, com 
sua análise, com a captura de sua realidade, de sua matéria” (LEFEBVRE, 2011, p. 33). 
Nesta perspectiva, Marx define o peso do método e valora a realidade e suas 
contradições. Afirma o método como um guia, um orientador na busca pelo conhecimento do 
todo da realidade:  
 
De cada realidade é preciso capturar as suas contradições particulares, o seu 
movimento individual (interno), a sua qualidade e as suas transformações 
bruscas. A forma (lógica) do método deve, então, subordinar-se ao conteúdo, 
ao objeto, à matéria estudada; ela permite abordar de forma eficaz seu 
estudo, captando os aspectos mais gerais dessa realidade, mas não substitui 
jamais a pesquisa científica por uma construção abstrata (LEFEBVRE, 2011, 
57 
 
p. 34). 
 
Segundo ele, o resultado obtido, e exposto, de uma reconstrução subjetiva apresenta-se 
como superficial, uma “aparência”, reflexos do mundo surgidos a partir da análise, da 
pesquisa. Mas, a face abstrata sucumbe perante a pesquisa na prática, a qual gera edificações 
baseadas no contato com o mundo real:  
 
Assim, as idéias que se tem sobre as coisas – o mundo das idéias – não são 
mais do que o mundo real, material, expresso e refletido na cabeça das 
pessoas, isto é, são edificadas a partir da prática e do contato ativo com o 
mundo exterior por meio de um processo complexo de que participa toda a 
cultura (LEFEBVRE, 2011, p. 34). 
 
Karl Marx ascende à sociologia científica, a investigação da concretude, focalizando 
um contexto, uma realidade específica, não se confundindo com o que nos é apresentada em 
uma simples dedução ou descrição, que não expõe uma totalidade histórica com sua 
constituição. Ela não possui em si o entendimento racional daquilo que ela descreve, ou seja, 
somente a análise consegue fundamentar um conhecimento.  
O destaque dado à análise é legítimo e bem sustentado, pois é ela que fará emergir os 
detalhes e as diferenças que definem os traços das tão ressaltadas classes sociais: 
 
A análise encontra por toda parte, então, elementos ao mesmo tempo 
contraditórios e indissolúveis (produção e consumo, conjunto social e classes 
sociais etc.) e precisa de estabelecer as distinções entre eles sem deixar 
escapar seus liames. Além, disso, ela atinge conceitos cada vez mais simples, 
mas que são, por assim dizer, engajados e incorporados na contextualidade 
complexa da realidade social, da qual são, portanto, os elementos reais: valor 
e preço, divisão do trabalho etc. (LEFEBVRE, 2011, p. 35). 
 
Em outras palavras, a análise seria uma espécie de conjectura conceitual, ela tem a 
capacidade de unificar vários aspectos, até contraditórios, da realidade. Economistas e 
sociólogos pecaram ao se limitarem aos dados, não realçando as relações dialéticas existentes, 
harmônicas ou conflituosas, dentro de um contexto. Não captaram algo inseparável de um 
movimento social. A burguesia e o proletariado se relacionavam distintamente. As lutas e os 
conflitos são o fomento às transformações da realidade. 
Além disso, eles se alicerçavam e se satisfaziam com traços e conceitos abstratos, não 
visualizando e nem se conectando ao concreto, assim descrito por Lefebvre: 
 
Não compreendiam que sua análise não era mais do que a primeira parte de 
uma pesquisa científica e que, a seguir, era necessário, sem arbitrariedades, 
sem reconstruções fantasiosas da realidade, refazer o caminho em sentido 
contrário e recobrar o todo, o concreto, somente agora analisado e 
compreendido (LEFEBVRE, 2011, p. 36). 
58 
 
 
A complexidade do concreto gera atritos teóricos. Hegel admitiu a diversidade de 
aspectos e elementos, acreditando alcançar a totalidade desta através apenas da consciência, 
analisando o pensamento desconecto da realidade. O pensamento teria em si a força e o 
movimento necessário para ser passível de conhecimento totalizador, isolando-se do todo 
poder-se-ia conhecê-lo de modo indubitável. Assim, Hegel erra em tentar fazer uma análise 
somente abstrata e daí, consequentemente, obtém-se somente uma síntese abstrata.  
Em contrapartida, Marx apega-se à concretude da realidade: “A exposição do todo 
concreto a partir de seus elementos é, segundo Marx, o único método científico” 
(LEFEBVRE, 2011, p. 36). “É somente o segundo método que permite reproduzir o real (sua 
estrutura e seus movimentos) no pensamento” (LEFEBVRE, 2011, p. 36). 
O método marxista passa a compreender que o subjetivismo dos elementos possuem 
qualidade, um sentido e uma existência concreta, assume que dentro do desenvolvimento 
histórico os traços “reais”, o trabalho, o capital, a produção, são os pilares da formação 
econômica social, até hoje.  
O movimento histórico, a amplitude da realidade, demonstra o peso da concretude de 
um contexto, de um simples comércio, de “humildes” mercadores à “magnatas” de um 
capitalismo elaboradíssimo. Somente uma pesquisa de traços abstratos não é suficiente para 
investigar tal transformação. O aprofundamento e o “contato” com o concreto, à sua 
complexidade, realça os detalhes que molduram tal mudança dentro da história e 
complementa a definição do nosso contexto social atual. O destaque à análise “prática” é vista 
nos dizeres de Lefebvre:  
 
A análise permite assim reencontrar o movimento real em seu conjunto, 
portanto o expõe e compreende a totalidade concreta vigente na atualidade, 
isto é, a estrutura econômica e social atual. O conhecimento dessa totalidade, 
através de seus movimentos históricos e de seu devir, é um resultado do 
pensamento, mas não se trata absolutamente de uma reconstrução abstrata 
obtida por um pensamento que acumularia conceitos externos aos fatos, às 
experiências e aos documentos (LEFEBVRE, 2011, p. 38). 
 
Dentro de todo este emaranhado envolvendo o marxismo e seu método, cabe lembrar 
sempre do cerne de toda discussão: o Homem. Desde a antiguidade discute-se o contexto 
envolto ao homem e a sua realidade, mas o que mais gera debates são as tentativas de se 
realçar a complexidade do ser humano, a saber, todas as contradições e conflitos aos quais ele 
está vivenciando. Lefebvre diz:  
 
O humano é um fato: o pensamento, o conhecimento, a razão e também 
59 
 
certos sentimentos, tais como a amizade, o amor, a coragem, o sentimento de 
responsabilidade, o sentimento da dignidade do homem ou a veracidade 
merecem, sem contestação possível, esse atributo. Eles se distinguem das 
impressões fisiológicas dos animais, e mesmo que se admita a existência de 
seres subumanos, é inteiramente necessário conceder ao ser humano o seu 
domínio próprio (LEFEBVRE, 2011, p. 38). 
 
 
 
2.3 Alienação e moral 
 
 
Lefebvre analisa também a noção ou conceito de alienação do homem. Investigar a 
face humana do homem faz expor-se uma contradição de longa data, o embate contra o 
desumano. A palavra desumano nos remete a algo ruim: injustiça, opressão, crueldade, etc., 
mas tais noções necessitam de maior esclarecimento. 
A relação entre humano e desumano já se apresentou turva. Adentrando em alicerces 
metafísicos, a razão é vista como mediadora, como o corte que segrega os traços humanos dos 
desumanos, o que gerava confusão entre as duas faces opostas, depreciavam a paixão e o 
prazer, por exemplo. Platão apontava a vida e a natureza como o lado “negativo” do 
Conhecimento. Buscaram embasar-se, mas moldaram-se limitados. 
O cristianismo sempre mostrou-se cauteloso, diferenciando veementemente as virtudes 
dos vícios e pecados. Aqui, evapora-se a complexidade do homem, não há como 
“esquematizar-se” ou determinar com precisão o que é humano e o que é desumano. O 
marxista francês expõe o seguinte: 
 
É uma profunda contradição que a teologia não tem condições de resolver. O 
humano e o desumano não se distinguem: o homem completo é afetado por 
uma imundície fundamental. Tanto a ciência como a injustiça, tanto a revolta 
como a violência opressiva são colocadas entre as consequências do pecado 
original. O humano e o desumano aparecem como uma alienação da verdade 
eterna, como uma queda da condição divina (LEFEBVRE, 2011, p. 39). 
 
O embrião histórico do homem, aos olhos clericais, dita a nossa alienação perante a 
verdade, perante a Deus, afirma a nossa “obrigação” virtuosa de princípios, a nossa 
responsabilidade de manter a conduta “correta”. Para os metafísicos o homem, não sábio, 
apegando-se a algo que não seja o Conhecimento, está se alienando, tornando-se um absurdo, 
tornando-se desumano. 
Hegel reflete sobre a alienação, mas é Marx que lhe dá um sentido prático, dialético. 
Marx visualiza tal tensão entre o humano e o desumano, destacando que apenas uma punição 
moral não dá cabo da negação do desumano, ele afirma a necessidade de solucionar tal 
60 
 
dilema:  
 
Isso prova unicamente que o conflito entre o humano e o desumano (sua 
contradição) entra num período de tensão extrema, o que significa que se 
aproxima de sua solução, porque ingressa na consciência, e a consciência 
pressiona, reclama e exige essa solução (LEFEBVRE, 2011, p. 40). 
 
Uma pessoa não poderia evoluir somente acreditando numa vivência harmônica, não 
possuiria novas habilidades se valendo apenas de suas vontades e anseios. O humano 
desenvolveu-se através da história e o desumano também, ambos se refinaram. O homem 
nunca progrediu pacificamente, ele não é apenas humano. Sempre houve e sempre haverá 
tensões: 
 
A desumanidade é um fato e o humano também o é. A história mostra-os 
indiscernivelmente misturados, até a reivindicação fundamental da 
consciência moderna. Essa constatação vem a ser explicada pela dialética, 
que a eleva à posição de verdade racional. O homem só poderia ter se 
desenvolvido através de contradições; portanto, o humano só poderia ter se 
formado em oposição ao desumano, inicialmente misturado com ele, para 
enfim ser discernido através de um conflito e dominá-lo pela resolução desse 
conflito (LEFEBVRE, 2011, p. 41). 
 
Vemos aqui que a contradição é inerente à própria noção de realização de ser do 
homem, ou seja, o ser humano só se faz, se realiza perante os conflitos de sua existência. As 
relações humanas são fundadas sobre o terreno áspero das contradições, não há harmonia e 
sim um enorme embate tanto interior, como exterior. Neste sentido o ser possui duas partes: 
uma se encontra no humano e a outra no desumano. Cada um se esforça em suprir suas 
necessidades, mesmo que de modos diferentes.  
A solução deste embate começa a se constituir ao se afirmar o “negativismo” da 
alienação e a sua complexidade dentro do contexto cotidiano do homem: 
 
O humano é o elemento positivo. A história é a história da humanidade, de 
seu crescimento e de desenvolvimento. O desumano não é mais do que seu 
elemento negativo: é a alienação (aliás, inevitável) do humano. É por isso 
que o homem finalmente humano pode e deve dominá-lo, por meio do 
controle de sua alienação (LEFEBVRE, 2011, p. 41). 
 
Então o humano é a parte positiva da realidade. O desumano é seu oposto. Os dois são 
situados em um tempo e espaço. A alienação só pode ser exaurida pela superação do 
desumano. A história é o que pode fundamentar este conflito dualista. Isto significa que, para 
progredirmos e nos tornarmos humanos, devemos ultrapassar essa negação de nós mesmos 
(desumanos). 
Marx pretende desembaraçar a vasta alienação do homem dentro de sua realidade, 
61 
 
dentro da vida social
20
. Destaca a alienação do trabalho, a distinção das classes sociais, a 
dominação do Estado, a contradição envolta à riqueza: a pobreza da maioria frente à minoria 
“esbanjadora”. 
Teoricamente falando, a alienação é algo abstrato, mas nas mãos de uma minoria que 
almeja privilégios a “todo custo”, ela se torna concreta. O homem como molde de sua própria 
atividade. Segundo Lefebvre (2011, p. 43): “O abstrato torna-se assim, abusivamente, um 
concreto ilusório e, todavia, demasiado real, que oprime o concreto verdadeiro: o humano”. 
Aqui, temos uma enganação por parte do abstrato, isto é, o ideal é algo metafísico que se 
concretiza na medida em que se impõe ao real.  
Por fim, o que é alienação? Como Lefebvre a define? Como algo concreto e real: 
 
A alienação do homem se descobre assim em sua extensão terrível e em sua 
real profundeza. Longe de ser somente teórica (metafísica, religiosa e moral, 
em resumo, ideológica), ela é também, e acima de tudo, prática, econômica, 
social e política (LEFEBVRE, 2011, p. 43). 
 
Sob um prisma filosófico, a história da humanidade se desenvolve em um constante 
devir: “Inicialmente, é incontestável que existe a história da humanidade, isto é, 
desenvolvimento, formação ativa, crescimento em direção a um desabrochar” (LEFEBVRE, 
2011, p. 43). A “eclosão” do homem destaca a possibilidade deste agir frente à natureza e não 
se rebaixar perante a ela, um âmbito de atitude e consciência que garante a transformação 
social, a qual deve ser o fio condutor de uma investigação histórica sobre o embate homem-
natureza:  
 
Quaisquer que sejam os resultados dessa pesquisa, um fato já está 
estabelecido: o homem (a espécie humana), que luta contra a natureza e a 
subjuga no decorrer de seu próprio devir, não pode separar-se dela. A própria 
luta é um relacionamento e um liame, o mais íntimo de todos (LEFEBVRE, 
2011, p. 44). 
 
O homem se relaciona com algo que está em si mesmo, com a natureza. Através de seu 
trabalho criativo o homem intensificou sua relação com a natureza, renovando, refinando e 
desenvolvendo este conflito dentro da história. Os laços dialéticos do homem com a natureza 
demonstram a consolidação de um mundo humano:  
                                                 
20
 Cf. (LEFEBVRE, 2011, p. 42) “Ele demonstra que a alienação do homem não se define religiosa, metafísica 
ou moralmente. Ao contrário, os metafísicos, as religiões e as morais contribuem para alienar o homem, para 
arrancá-lo de si mesmo, para afastá-lo de sua natureza real e de seus verdadeiros problemas. A alienação do 
homem não é teórica e ideal, ou seja, algo que se represente exclusivamente no plano das idéias e dos 
sentimentos; ela também é, acima de tudo, prática e se encontra em todos os domínios da vida prática. O trabalho 
é alienado, escravizado, explorado, tornado exaustivo e esmagador. A vida social, a comunidade humana, 
tornou-se dissociada pelas classes sociais, arrancada de si mesma, deformada, transformada em vida polít ica, 
enganada e empregada como um meio de dominação do Estado”. 
62 
 
 
Suas atividades somente se exercem e progridem ao fazer surgir no centro da 
natureza um mundo humano. É o mundo dos objetos, dos produtos das mãos 
e do pensamento humano. Tais produtos não são o ser humano, mas somente 
seus “bens” e seus “meios”. Existem somente por ele e para ele: não são 
nada sem ele, porque são exclusivamente a obra da atividade humana. 
Reciprocamente, o ser humano não é nada sem os objetos que o rodeiam e o 
servem. No transcurso de seu desenvolvimento, ele se exprime e cria a si 
mesmo, através desse “outro” de si mesmo, formado pelas coisas 
inumeráveis que o próprio homem confeccionou (LEFEBVRE, 2011, p. 44). 
 
Neste contexto de desenvolvimento, o homem passa a crer em uma existência 
“independente”, na qual “comanda” a conjuntura a seu redor. Em sua atividade criadora, ele 
gera bens e produtos que o auxilia dentro de sua realidade, em seu cotidiano, fato que desenha 
a instalação do desejo, do fetiche dentro da vida humana.  
A emersão da moeda é um dos pontos cruciais da “ambição” humana. O homem se 
torna “parcialmente servo” de seus próprios produtos e do dinheiro. Os bens produzidos no 
“reino humano” são um prisma protagonista em um enredo de exploração: a privação e a 
monopolização destes dão mostras de um “domínio elitista”, o que fomenta a exploração e a 
opressão, ressaltando traços condutores da alienação do trabalho. 
A alienação para Marx não surge da relação entre homem e bens, mas sim no 
relacionamento homem e fetiche, pregando a ruína do fetichismo como a derrota da alienação, 
conforme descreve Lefebvre:  
 
Em conseqüência, o relacionamento do ser humano com seus fetiches difere 
de seu relacionamento com seus bens. A relação dialética do homem com os 
bens se resolve normalmente e a todo momento, mediante uma tomada de 
consciência do homem de que tem uma vida própria e de que pode usufruir 
apropriadamente dessa vida, tomada como um poder sobre a natureza 
exterior e sua própria natureza interior. Mas o relacionamento do homem 
com os fetiches se manifesta como um desarraigamento de si e uma perda de 
si mesmo: é esse relacionamento que o marxismo denomina de alienação 
(LEFEBVRE, 2011, pp. 45-46). 
 
Mas o fluxo histórico destaca uma complexidade ímpar, a relação homem e natureza 
realça detalhes de sinergia, de simbiose. O homem evolui a partir de uma ativa tensão com a 
natureza. Ambos coexistem e são indissolúveis. O homem, mesmo caminhando ao SEU 
esplendor, com sua consciência em processo frenético de amadurecimento, não possui uma 
“existência a parte”, ele está inserido na natureza e ela nele: 
 
A história humana surge agora em sua complexidade. É um processo natural, 
no qual o homem não se separa da natureza e dentro do qual cresce como um 
ente dessa natureza. Mas é o processo de um ser que luta contra a natureza e 
conquista – por meio desse conflito e através de uma luta incessante, 
63 
 
batalhando com contradições, obstáculos, crises e saltos sucessivos – graus 
cada vez mais elevados de pujança e de consciência. [...] O homem só se 
torna humano criando um mundo humano. É dentro de sua obra e por meio 
dela que ele se torna ele mesmo, mas sem confundir-se com ela, embora não 
se separe dela (LEFEBVRE, 2011, p. 46). 
 
No interior do processo de desenvolvimento do “reino humano”, o homem passa a 
demonstrar uma capacidade racional e consciente de organizar suas ações. A vida social ganha 
força e o homem acelera o seu caminhar histórico. Mas o refinamento da sociedade é paralelo 
ao encorporamento da “face desumana” do homem, assim dito por Lefebvre: 
 
Em conseqüência, a história humana mostra a interpenetração e a interação 
incessantes de três aspectos ou elementos: o elemento espontâneo 
(biológico, fisiológico, natural), o elemento refletido (o nascimento da 
consciência, mal concebida inicialmente, todavia, desde o começo, real e 
eficaz) e o elemento aparente ou ilusório (o desumano da alienação e dos 
fetiches) (LEFEBVRE, 2011, pp. 46-47). 
 
Manifesta-se assim, o “esquema alienatório”, a junção de prismas que coexistem e se 
interagem. Neste, o homem se vê inserido em uma conjuntura melindrosa: em seu tenso 
embate frente à natureza, ele avista o seu desenvolvimento racional e social, mas traz em 
conjunto o aflorar da alienação. Dentro da jornada humana, a ilusão, a alienação, afirma-se 
“anexa” ao refinamento da vida humana. O lado humano desenvolve-se, mas o desumano 
também. O “poder dominante” ganha prestígio paralelamente a “evolução” da história 
humana. 
Apenas uma análise dialética pode auxiliar a elucidar tal embate dentro da História. A 
tríade conflituosa entre os traços naturais, espontâneos, os conscientes, subjetivos e os 
ilusórios podem ajudar a expressar a vasta abrangência da alienação e a tentar superá-la, de 
acordo com Lefebvre: 
 
O mesmo processo complexo de aspecto triplo – em que o elemento 
consciente sempre vem, no momento decisivo, dominar o elemento 
espontâneo e criticar o elemento ilusório – poderia mostrar-se em todas estas 
realidades práticas, históricas e sociais: a nação, a democracia, a ciência, a 
individualidade etc. (LEFEBVRE, 2011, p. 48). 
 
Expõe-se agora um dos marcos do marxismo, a sociologia científica. Marx afirma e 
destaca a “fragilidade” da filosofia que, segundo ele, se “sustenta” em prismas abstratos e 
delimitados, não se atentando a traços que assegurariam uma análise científica da amplitude 
do homem: 
 
Esse momento é aquele em que as múltiplas ilusões ideológicas devem ser 
criticadas, denunciadas e ultrapassadas. E, juntamente com elas, todos os 
64 
 
fetichismos, todas as formas das atividades humanas que se acham alienadas 
e voltadas contra o próprio homem (LEFEBVRE, 2011, p. 49). 
 
Apontando para um método “correto e aceitável” ao se investigar a jornada histórica 
da humanidade, Lefebvre, apoiando-se em Marx, afirma: “O comunismo científico se 
determina pelo inteiro movimento da história – pelo devir do homem considerado em sua 
totalidade” (LEFEBVRE, 2011, p. 48). Destaca-se então, a primazia do comunismo como o 
“sistema” que abarca, coerentemente, a “real”, concreta e complexa história humana, e que a 
justifica, a legitima, a expressa e a elucida. 
Seguindo tal linha “metodológica”, o âmbito racional do homem ganha uma ênfase 
maior e se exprime como um marco histórico: 
 
O conhecimento e a razão nascem inicialmente incertos, frágeis, sem 
energia; depois, vão se afirmando, confirmando, estendendo o setor que 
dominam, acabando por formular-se. Finalmente, chega um momento 
decisivo, um ponto crítico, cheio de problemas complexos: trata-se do 
momento em que a razão deve e pode dominar a totalidade das atividades 
humanas a fim de organizá-las de forma racional (LEFEBVRE, 2011, p. 49). 
 
Este momento histórico, o realce à razão, é inegável e descrito por Marx, que 
demonstra e descreve o “comunismo” como o cume da jornada histórica humana. Ele afirma o 
relacionamento consciente do homem com a natureza, onde a razão comanda seus passos, 
controla suas atividades, a expansão da sua vitalidade, mas com um poder limitado frente a 
um mundo “tosco”. 
Inserido em uma realidade de desenvolvimento do homem, a expressão da alienação 
se apresenta multifacetada, econômica, social, política ou ideológica, podendo ser superada, 
para Marx, através do comunismo, sistema que, segundo o próprio, “minimiza” as 
“diferenças” sociais do homem, que “capilariza” a riqueza produzida, minando as 
desigualdades e “nivelando” os homens em condições mais equilibradas. A superação da 
alienação, segundo o marxismo, depende da delimitação dos “desejos”: “A ultrapassagem da 
alienação implica a ultrapassagem progressiva e a supressão do mercado, do capital e do 
próprio dinheiro, em sua condição de fetiches que praticamente reinam sobre o humano” 
(LEFEBVRE, 2011, p. 50). 
Para o marxismo, um dos “pontos chaves” contra a alienação é direcionar a riqueza 
produzida ao interesse da sociedade, do comum, suprimindo a propriedade particular e a posse 
privada dos meios de produção, afirmando que somente assim o homem se desenvolverá de 
forma “humana”: 
 
65 
 
A propriedade privada dos meios de produção entra, efetivamente, em 
conflito com a apropriação da natureza pelo homem social. O conflito se 
resolve por meio de uma organização racional da produção, que retire dos 
indivíduos ou da classe monstruosamente privilegiada a posse dos meios de 
produção (LEFEBVRE, 2011, p. 50). 
 
O materialismo dialético, o marxismo, apresenta, neste ponto, um de seus traços mais 
célebres, a possível queda da burguesia. Afirma e ressalta a necessidade histórica da derrota 
da noção de classes, a saber, a dominação de uma pela outra de qualquer maneira: econômica, 
social e moral. Isto é preciso para que a alienação seja arruinada e a sociedade avance e se 
desenvolva, de forma mais justa e igualitária, ficando aqui apenas uma pequena menção do 
materialismo dialético. 
Após essa digressão, Lefebvre dedica algumas páginas à moral. E desenvolve aquilo 
que ele entende pelo assunto em viés marxista. Em todo este universo social do homem 
analisado e apresentado pelo marxismo passa a ser debatida a questão da moral. Assim, como 
para Sartre, o marxismo, na voz de Lefebvre, também critica as morais antecedentes, 
principalmente as fundadas em princípios abstratos (ideologias). 
Dita anteriormente como algo inerente à condição humana, como uma existência dada, 
a moral neste sentido seria uma espécie de posição reguladora dos desejos humanos, visto 
que, o seu poder de transformação da natureza e de si mesmo é muito limitado. Este processo 
regulador é consciente, mas possui infringências, no caso de o homem desobedecer às normas 
para partir ao extremo. Em outras palavras, do comedimento, ou moderação, o ser humano 
passaria ao excesso. 
Esta moral normatizadora é descrita assim por Lefebvre: 
 
Era necessário, portanto, dar a esse fato – a medida, o limite infligido aos 
indivíduos pelas condições da existência e pelo seu nível de 
desenvolvimento – o valor de uma regra e o sentido de uma disciplina social. 
Os indivíduos que infringiam as regras eram ora os menos dotados, os mais 
violentos e os mais brutais, ora os mais bem dotados. Criminosos e gênios 
recaíram sempre, portanto, sobre a mesma reprovação moral, que expressava 
o meio social: estavam fora do nível de desenvolvimento “médio” atingido 
(material e espiritualmente) pela sociedade considerada como um todo 
(LEFEBVRE, 2011, p. 51). 
 
Diante disto, notamos que pessoas consideradas de boa índole ou não, erram da 
mesma forma frente à decisão moral, e isto é um problema. No tocante a essa incerteza a qual 
as morais vigentes nos remete, a alienação parece ser uma parede entre ser bom ou ser moral, 
isto é, a própria noção de dominação do burguês sob o trabalhador castra qualquer intenção de 
ser ético por parte do dominado. 
66 
 
Vemos que Lefebvre critica veementemente as morais fundadas em princípios 
irracionais, abstratos e metafísicos. Aqueles que seguem tais valores eram bem vistos e bem 
quistos pela sociedade e aos olhos de Deus, do contrário, os que abdicam de seguí-las seriam 
marginalizados. A sociedade deveria seguir regras normativas fundadas sob um solo instável 
de fundo ideológico e metafísico.  
O marxista francês descreve assim tal argumentação: 
 
Quanto às ações que a ela não se conformavam, foram igualmente avaliadas 
segundo uma escala de valores de origem obscura e receberam, desse modo, 
os nomes bizarros de pecado, falha, imundície – entidades difíceis de definir 
com clareza, ao mesmo tempo materiais (brutalmente materiais) e místicas 
(LEFEBVRE, 2011, p. 52). 
 
Essas morais que se orientam por tais procedimentos Lefebvre as denominam de 
alienação moral. Inicialmente, aquilo que não se adequava aos padrões morais destas teorias 
éticas antigas instigava o homem a um imobilismo social. Os valores eram prescritos
21
 e 
quem os inovasse era discriminado, qualquer iniciativa inédita ou diferente das estabelecidas 
era prontamente desprezada e também represada, e, isso abarcava a toda a sociedade. 
A rejeição moral dos que não se adequavam iniciou-se com os homens que buscaram a 
inovação, procurando destruir o núcleo de tal ineditismo, almejando que o indivíduo e seus 
seguidores fossem extremamente coibidos, como maneira de manter a harmonia moral dada. 
E o exemplo pode ser averiguado ao longo da jornada histórica do homem. Todos os gênios 
de seu tempo (ou “criminosos”), a princípio, foram radicalmente interpelados, meramente por 
aquilo que fizeram. 
Seguindo a crítica, tais morais estabeleceram uma consciência ilusória, mistificando as 
ações e os pensamentos de seus seguidores. A ordem e a obediência eram imensamente 
prezadas e difundidas, a inércia social e moral eram divulgadas como virtudes inevitáveis e 
extremamente valoradas. Para se chegar a uma moral plena (teleologia moral) parece ser 
necessário algo semelhante a um “sacrifício”, por meio do qual é reconhecida a limitação 
humana. O ato de se romper com a moral estabelecida gerava um desconforto social paralelo 
a uma impossibilidade de reconhecimento geral. Vejamos: 
 
A expressão “grandeza moral” é enganadora, porque a moral não faz mais 
do que codificar e legalizar – e isso no interior do indivíduo, sob a forma de 
                                                 
21
 Cf. (LEFEBVRE, 2011, pp. 52-53): “Diante da moral, as iniciativas criminosas ou criadoras se confundiam 
necessariamente, e essa confusão perdura até hoje. A reprovação moral começou sempre por ferir ao indivíduo 
audacioso, buscando atingir muitas vezes o coração de seu pensamento, lançando sobre ele os escrúpulos, as 
dúvidas e a consciência pesada. Tanto a história das ações humanas como a de seus pensamentos são nossas 
testemunhas”. 
67 
 
consciência moral; e no exterior sob a forma de punição e de prédica – a 
prática social mediana em um momento (LEFEBVRE, 2011, p. 52). 
 
O contrário à moral vigente, era atacado imediatamente, mas o avanço humano se 
esforçou em superar tais amarras morais. Se as morais são uma espécie de conjuntos 
normativos a serem seguidos, como princípios virtuosos e superiores, como progredir frente a 
esta verdade posta? 
Parece que é prudente uma teoria (ou pensador) tentar adequar os valores já seguidos a 
novas situações presentes em nossa realidade. Esse é o grande desafio de pensadores que 
visam entender a moral ou fazê-la tendo como base a realidade concreta do homem. 
Por fim, a derradeira crítica lefebvriana às morais antigas recai sobre a usurpação da 
moral em proveitos individuais: “Em outros termos, as morais foram sempre ou sempre se 
transformaram em instrumentos de dominação de uma casta ou de uma classe social” 
(LEFEBVRE, 2011, p. 52). Aqui temos a moral como ferramenta justificadora da exploração. 
Marx afirma que nunca houve, em toda a história humana, uma moral que abrangesse 
de forma igualitária aos anseios tanto de dominados quanto de dominantes. Sempre 
prevaleceu a soberania das morais elitistas, que embasavam tal exploração, que se refinou e 
melhorou com o passar do tempo em moldes legais e religiosos. 
Os valores daqueles que possuíam a força de exploração foram sendo meticulosamente 
implantados no dia-a-dia do homem trabalhador, se transformando em hábito e virtude moral 
desta classe. A “veneração” ao trabalho foi entremeada aos costumes sociais, se apresentando 
como providencial e sutil forma de validar a dominação. O trabalho foi ressaltado como algo 
digno, como uma forma ativa de participação social e econômica, do mesmo modo que foi 
idealizado como um meio de ascensão social.  
Lefebvre, assim como Marx, é rigoroso ao criticar as morais antecessoras, que 
segundo os autores, não eram nada mais do que artifícios de manipulação de homens 
inescrupulosos, intelectuais e de posses, em proveito de si mesmos das regras morais. 
Transformando o que entendemos por moral propriamente dita, em imoralidade, visto que, se 
a “moral” predica o bem comum, a convivência mais harmônica possível, se valer dela para o 
bem próprio, individual e egoísta, não pode ser entendido como moral. 
O marxista francês é taxativo nesta crítica a esta forma de utilização irresponsável da 
moral: 
 
Foi a moral que criou a imoralidade desde o princípio, reduzindo ao domínio 
do imoral todo o ato excepcional e obrigando-o a esconder-se nas sombras, 
na zona maldita do anormal – e logo, porque junto as classes dominantes 
68 
 
transmitiram sempre muito bem os valores que elas concebiam para o uso 
dos oprimidos (LEFEBVRE, 2011, p. 54). 
 
Até então, toda forma de moral se inclinou a ser tendenciosa às classes dominantes 
que possuem influência econômica e política. Nesta perspectiva, a moral é uma arma 
histórica, ideológica, jurídica e religiosa. Então, poderíamos aferir ao marxismo a definição de 
uma teoria que detenha uma posição meramente crítica? 
O marxismo tenta demonstrar que o erro moral – se basear em morais abstratas e 
ideológicas para fins não morais – se constitui num processo contínuo, pois uma moral nasce 
na sua antecessora. E a crítica dialética propõe um esclarecimento deste erro constante e 
irracional. O materialismo dialético não se posiciona de forma cínica perante o problema 
dessas morais já estabelecidas, apenas as recusa e não assente tais normas. 
Lefebvre propõe o seguinte: 
 
O marxismo afirma que é necessário criar hoje em dia uma nova ética, 
libertada de toda a alienação moral e de toda a ilusão ideológica – 
recusando-se a apresentar valores por fora da realidade e buscando, em 
conseqüência, a fundamentação das avaliações morais dentro do próprio seio 
do real (LEFEBVRE, 2011, p. 55). 
 
Percebemos aqui, que o marxista francês defende uma ética provinda da realidade 
concreta do ser humano. Isto quer dizer que, toda ética em seu sentido lato da palavra, aquela 
que é ou pretende ser universal e indiferente a toda e qualquer hierarquização 
socioeconômica, deve vir, primordialmente, de um núcleo real, não de uma imagem 
ideológica mistificada ao bel prazer de alguma teoria tendenciosa, funcional. 
E de onde poderia emergir tal “nova ética”? Em uma sociedade onde o sistema 
capitalista definiu e estabeleceu apenas duas classes, uma ética válida (racional) só poderia vir 
de uma classe que detém uma posição extremamente privilegiada. Mas, as éticas anteriores já 
surgiram de uma classe de tal molde? Segundo Lefebvre, a classe excepcional é o 
proletariado, pois somente ela pode ultrapassar esta alienação moral imposta por seus 
dominadores, visto que, ela é quem sofre e convive com a opressão e a exploração. 
Lefebvre é enfático: 
 
Inicialmente, na sociedade moderna dividida em duas classes, uma dessas 
classes goza de um papel privilegiado no sentido profundo da palavra. Essa 
classe é o proletariado. Somente ele, através de suas ações pode dar fim à 
alienação humana, porque é ele que vive e sofre completamente seus efeitos. 
Somente ele pode liberar a sociedade e os seres humanos em geral, ao 
libertar-se a si mesmo, porque junto é ele que sofre todo o peso da 
exploração. Em sua condição de classe oprimida, o proletariado aceitou os 
valores morais que lhe eram impostos e os recebia em seu rebaixamento: 
69 
 
resignação, humildade, aceitação passiva etc. Enquanto fazia parte da classe 
escravizada, o indivíduo proletário encontrava na moral uma compensação 
fictícia e uma recompensa ilusória: era um pobre “merecedor”, um “bravo e 
honesto trabalhador”, desde que se dispusesse a aceitar sem protesto os 
limites estreitos de sua atividade. Finalmente, enquanto fazia parte da classe 
oprimida, o proletariado não chegava a criar seus valores próprios e menos 
ainda a admitir que os tivesse. O trabalho, e sobretudo o trabalho braçal, 
permanecia desprezado. De forma semelhante, em um plano analógico, se 
bem que um pouco diferente, as mulheres permaneciam em condição servil 
ou eram exploradas, a maternidade nunca era plenamente reconhecida com 
uma função e um valor social, e muito menos o trabalho doméstico era 
reconhecido como um trabalho social (LEFEBVRE, 2011, pp. 55-56). 
 
Só o trabalhador tem o poder de “desamarrar” aos seus semelhantes e se libertar, pois é 
ele que sente na pele a repreensão e a dominação. Ao longo de sua vida o sujeito oprimido 
suportou todas as espécies de valores morais, colocando-se em seu lugar, a saber, o mais 
baixo possível. Todavia, essa moral imposta lhe dava algum conformismo, no qual ele 
entendia, de modo passivo, sua “importância” na sociedade, isto é, trabalhar para produzir 
capital. 
Neste terreno inóspito, o famigerado trabalhador não tinha a noção de que tinham 
valores para si ou que simplesmente poderia inventá-los. E também notamos uma 
hierarquização de importância do trabalho. Trabalhos tidos como menos importantes, ou seja, 
que não careciam de muita reflexão ou mecanização, eram inferiorizados pela sociedade da 
época. Isso se aplica também às mulheres, que se fossem “meramente” donas de casa iriam 
para a base da hierarquia, quase sem relevância social. 
Mesmo diante de toda esta recriminação, os proletariados – Lefebvre e Marx já 
destacavam isto –, através de uma racionalidade, se superaram, romperam com os valores 
imagéticos que lhes eram determinados. Criaram seus próprios princípios morais adequados à 
sua realidade. Porém, explorados, dominados, tinham que ter cautela, serem comedidos, frente 
a tal momento desfavorável. 
Lefebvre destaca o papel emancipador do trabalhador: 
 
Mas, ao torna-se um indivíduo consciente de sua classe, ou seja, do papel 
histórico dessa classe, esse indivíduo tem necessidade de coragem, de um 
senso de responsabilidade, de entusiasmo: ele deve adquirir conhecimentos 
múltiplos e considerar a lucidez da ação e a inteligência das situações como 
valores (LEFEBVRE, 2011, p. 56). 
 
Assim como Sartre, o filósofo marxista francês defende uma moral fundada na ação, 
na responsabilidade, no raciocínio consequencialista e por fim, na concretude da vida humana. 
A contradição para este adestramento do indivíduo dominado, cujo consentimento é uma 
70 
 
virtude, recai no fato de que ele se movimenta, é a partir destas relações humanas que ele 
reconhece o que é verdadeiramente o valor. 
Tais valores devem ser conquistados e neste momento ele ultrapassa sua condição 
inerte e passa a ser um indivíduo ativo, na construção de uma nova ética, com isso ele auxilia 
a sua classe em prol da conscientização de que a alienação é algo danoso. Este procedimento 
do proletariado pode levar a uma resolução da dicotomia entre o individual e o social, isto é, 
tal dualidade é sanada quando o sujeito passa a levar em conta não só os seus anseios, mas os 
de todos da sociedade e passa a se preocupar com questões de cunho social (comunitário). 
A importância de Lefebvre incide na noção de que, como afirmava Marx, em certos 
momentos novos valores são mais relevantes do que a alimentação corriqueira, isto porque, o 
idealismo prioriza o ideal sobre o real. Os valores humanos se sobrepõem às ações humanas. 
Estão no âmbito metafísico e ilusório. Relembrando a práxis das relações humanas, o 
concreto não é imóvel. 
O que é entendido por real está sempre em movimento, aquilo que hoje é tido como 
aceito, como o caso, é o embrião de um futuro próspero ao homem, mas isso se a alienação 
for superada por ação e não por ideologia. Se isso for possível, a imobilidade como virtude 
cairá por terra. A atividade humana sobre a natureza mostra-se cada vez mais forte e renegar 
este fato, se escondendo em uma inércia criativa, parece se apresentar como um absurdo sem 
sentido. 
Lefebvre rejeita um marxismo humanista assistencialista: 
 
O marxismo não nos traz um humanismo sentimental e chorão. Marx não se 
inclinou para o proletariado oprimido para lamentar sua opressão. Ele 
demonstrou como e por que o proletariado pode libertar-se da opressão e 
abrir o caminho para todas as possibilidades humanas. O marxismo não se 
interessa pelo proletariado porque este é fraco, mas porque ele é uma força – 
não porque é ignorante, mas porque deve assimilar e enriquecer o 
conhecimento – não porque é rejeitado pela burguesia para o desumano, mas 
porque traz dentro de si o futuro do homem e rejeita como desumanas as 
vaidades burguesas. Em uma palavra, o marxismo vê no proletariado o seu 
devir e o seu possível (LEFEBVRE, 2011, pp. 57-58). 
 
O marxismo não parte de um princípio de “pena”, mas de uma possibilidade real e 
racional. Vislumbra-se a potencialidade adormecida do proletariado, que é o único que possui 
em si o ensejo de mudar a realidade. Aqui vemos novamente uma congruência entre Sartre e 
Lefebvre, pois ambos tratam moral e conhecimento como movimento humano e possibilidade 
dentro de uma sociedade posta. 
Esta ética inédita fundada no devir concreto, na qual o homem desenvolve-se de forma 
71 
 
plena, possui duas facetas, uma de cunho científico e outra parte superativa. O primeiro se 
baseia na objetividade científica, que se sustenta em leis universalizáveis, que são encontradas 
nas ciências naturais. Na ciência social o fato humano interage com o direito, em seu devir, 
que não pode se contradizer com o outro. Em outras palavras, o valor não deve ser oposto pela 
regra técnica, que foi construída sobre um empirismo. 
O outro, dialeticamente falando, refere-se à noção de superação, que é observar as 
teorias morais já existentes, de forma lógica, racional e não preconceituosa e reconstruir, de 
maneira dialética e relacional, sua própria noção de ética. O francês marxista trata assim a 
ultrapassagem e superação: 
 
Ultrapassar-se é seguir em direção ao devir para alcançar o homem total. 
Significa, portanto, participar cada vez mais amplamente desse devir e 
dessas possibilidades em todos os seus domínios. A superação implica 
portanto, um imperativo de conhecimento, ação e realização crescentes. 
Concebido dessa maneira, o imperativo não intervém na vida e no real. Ele 
sai deles; torna-se a expressão ética do devir. Torna-se, desse modo, um ideal 
sem ilusões ideológicas ou idealistas (LEFEBVRE, 2011, p. 59). 
 
O sujeito deve tentar se superar num sentido real, por esforço em buscar a solução dos 
problemas não somente de si, mas de todos seus semelhantes, assim, ele se torna um 
indivíduo pleno. Ora, ultrapassar é estar em um movimento e compartilhar as possibilidades 
que lhe são oferecidas. Já superar é evoluir em seu meio de vivência, tornar-se exemplo real, 
para seu tempo. Tudo isso sempre se pautando por um viés prático. 
Mesmo admitido a individualidade, o homem difere em cada época, nas palavras de 
Sartre: o homem é situado em seu tempo e espaço. Isto implica que não há uma consciência 
pura, eterna e atemporal, para o ser humano existente e presente no seu tempo. O individual 
não perdura ad infinitum. 
O homem é um ser social, reafirma Lefebvre. Esta sociabilização humana pode ser 
posta em três distintos tipos: um biológico, a vida organizadamente dada, toda forma de 
estrutura a qual o ser humano é padronizado, espécie, raça, etnia, etc.; um consciente, no qual 
está presente toda forma de relação social, moral e cultural; por fim, temos um tipo imagético, 
que abarca todas as distorções de identidade, de ética e aspectos da mente (consciência). 
Este último, relembrando Descartes, é extremamente enganador, pois é o âmbito que 
vem reforçar todos os hábitos errôneos do ser humano em relação à moral. Todos seguiam 
valores postos de forma metafísica e já aceitos pela mera convenção social. Não ir contra “a 
moral e os bons costumes de sua época”. 
Lefebvre defende que até então, temos morais, ao mesmo tempo, individualista e 
72 
 
tendenciosa: 
 
Em particular, o individualismo de origem burguesa, a ilusão ideológica, 
moral, metafísica e religiosa tomou proporções assustadoras. Ainda que 
nunca tenha passado da situação de um esboço incerto, o indivíduo se 
acreditava realizado. A sociedade individualista (burguesa) exalta o 
indivíduo e a sua liberdade (LEFEBVRE, 2011, p. 60). 
 
O marxista francês é implacável contra o individualismo, que para ele era uma 
ferramenta do sistema capitalista de sua época. Nada mais é do que uma ideologia 
mistificadora. A burguesia se vale do individualismo para segregar toda e qualquer forma de 
organização contrária a seus interesses. O pavor que mais a assola é o proletariado, que 
sempre foi dominado, mas que vislumbra ao fim do horizonte uma possibilidade de romper 
com essa conjuntura alienatória. 
Para Marx, a liberdade de um indivíduo só pode ser aceita ou pensada se toda a 
sociedade também for livre. Neste ponto Lefebvre e Sartre também estão na mesma sintonia, 
para ambos, liberdade só pode ser conquistada individualmente se toda a sociedade humana 
também a possuir. Mas, em Marx, a liberdade está num comunismo (socialismo), Sartre a 
propõe na convivência humana atual. 
Notamos que Lefebvre, apoiado em Marx, critica as morais anteriores a ele e defende 
uma emancipadora. A moral não é idealista, ela é sim, concreta. As relações humanas no 
conflito diário são de suma importância para se entender e ou fazer uma moral. Assim como o 
conhecimento, segundo Lefebvre, no embate mundano, a moral também é conflituosa.  
O marxista francês nega toda e qualquer harmonia social, moral, prática e racional. A 
ideologia prega uma imobilidade conceitual, na qual a verdade é eterna e imutável, mas nem 
sempre encontramos tais predicações na concretude real da vida humana, que está num devir 
permanente. Os conceitos devem seguir e se adequar à realidade e não o contrário, a realidade 
se encaixar no conceito. 
  
73 
 
3 ANÁLISE SARTREANA DO MARXISMO 
 
 
3.1 Antecedentes 
  
 
Se, como vimos em Lefebvre, a filosofia faz parte de uma concepção de mundo, qual 
seria então a posição de Sartre? A filosofia é algo estruturado, na qual os sistemas filosóficos 
se iniciam e se acabam? Como se fosse um edifício, que, sem uma boa base cai? Seria como 
uma atitude, que depende de nós nos engajarmos ou não? Seria uma parte da cultura? Ou, 
como define Sartre, em Questões de Método, ela não existe, pois existem as filosofias: 
 
A nosso ver, a Filosofia não existe; sob qualquer forma que a considerarmos, 
esta sombra da ciência, esta eminência parda da humanidade, não passa de 
uma abstração hipostasiada. De fato o que há são filosofias. Ou melhor – 
pois não encontrareis nunca, em um momento dado, mais do que uma que 
seja viva –, em certas circunstâncias bem definidas, uma filosofia se 
constitui para dar expressão ao movimento geral da sociedade; e, enquanto 
vive, é ela que serve de meio cultural aos contemporâneos (SARTRE, 1987a, 
p. 113). 
   
Tentar reduzir a filosofia à ciência parece um pouco perigoso. Se a filosofia é histórica 
e pertencente a seu tempo, ela não pode ser dominada pela ciência, pois ela é a visão 
totalizadora (conhecimentos) de uma determinada sociedade e em uma determinada época. 
Para Sartre, as filosofias são situadas, elas são o pensamento coletivo de uma sociedade em 
determinado tempo. É através das filosofias que o homem toma consciência de si, enquanto 
ser humano situado em um tempo e espaço, e pertencente a uma determinada sociedade. É 
uma “visão de mundo” de dada época. Aqui há a ruptura com a noção de filosofia eterna, na 
qual seus princípios perdurem de forma atemporal.  
Neste sentido, o conhecimento filosófico, para ser assentido como verdadeiro, precisa 
ser a totalização do Saber de seu tempo. O filósofo deve ser um agente unificador dos 
conhecimentos de seu momento histórico. Para isso, ele necessita se pautar em métodos e 
técnicas presentes em seu meio. Se não conseguir encontrar uma “verdade indubitável”, o 
filósofo necessita dar um estatuto mais próximo possível da Verdade para aquela unidade. 
Assim sendo, mesmo que cada elemento constituinte deste Saber seja refutado, a 
unidade continuará existindo, pois foi realizada por princípios, que são os liames destes 
elementos, ou seja, alguns elementos podem ser destruídos, mas a unidade que se funda em 
princípios racionalmente estabelecidos, não.  
Os princípios, de toda e qualquer teoria, seriam como conexões, que normatizam as 
filosofias (Kant). Sem um ponto de partida parece não haver meio de se estruturar uma teoria 
74 
 
filosófica. Mas assim, parece que Sartre estaria tomando partido das “doutrinas” abstratas e 
idealistas.  
Sartre defende um princípio situado, concreto e prático: 
 
É que uma filosofia, quando está em plena virulência, não se apresenta 
nunca como uma coisa inerte, como uma unidade passiva e já terminada do 
Saber; nascida do movimento social, ela própria é movimento e morde o 
futuro: esta totalização concreta é, ao mesmo tempo, o projeto abstrato de 
prosseguir a unificação até seus últimos limites; sob este aspecto a filosofia 
se caracteriza como um método de investigação e de explicação; a confiança 
que tem em si mesma e no seu desenvolvimento futuro apenas reproduz as 
certezas da classe que a sustenta. Toda filosofia é prática, mesmo aquela que 
parece, de início, a mais contemplativa; o método é uma arma social e 
política (SARTRE, 1972, p. 10). 
 
Uma filosofia, por mais que a imaginemos como abstrata e metafísica, é histórica. Ela 
está inserida em sua realidade concreta. Deve ser a unificação do saber existente em sua era. E 
isso pode ser pensado em um duplo sentido: abstrata, no sentido de operar com a razão, para 
conjecturar as partes do conhecimento; e concreta, pois é criada a partir da realidade na qual 
está presente, não há como desvencilhá-la de tal âmbito. 
Neste sentido, a filosofia desempenha seu papel formidavelmente, visto que, se situa 
na práxis que a gerou e esclarece os conhecimentos de sua realidade. Porém, uma filosofia 
pode superar sua era. Isso se torna possível quando ela fornece substrato para a ação de uma 
sociedade, que pode se livrar das amarras de seus opressores ou de outra sociedade que a 
domina. Possibilita uma mudança de rumo, no tocante a valores e a relações sociais. Sartre 
define essa possibilidade do seguinte modo: 
 
Assim, a Filosofia permanece eficaz enquanto vive a práxis que a 
engendrou, que a sustém e é por ela  iluminada. Mas se transforma, perde 
sua singularidade, despoja-se de seu conteúdo original e datado, na medida 
mesma em que impregna pouco a pouco as massas, para tornar-se nelas, e 
por elas, um instrumento coletivo de emancipação (SARTRE, 1987a, p. 114). 
 
 Então, a filosofia deve ser uma ação totalizadora, totalização do saber, método 
racional e princípios normativos, ferramenta de luta para a “salvação dos oprimidos”, “visão 
de mundo” de toda uma sociedade. Nesse processo de totalização, três momentos são 
destacados por Sartre, o primeiro é o de Descartes e Locke, o segundo de Kant e Hegel e o 
terceiro de Marx. 
Cada uma destas filosofias é uma junção das ideias particulares e da visão de cultura 
de sua época. Deste modo, são insuperáveis, pois no período da história em que estão situadas 
são a representação da concepção de mundo de sua sociedade, e enquanto não forem 
75 
 
superadas, cada uma delas é, a seu modo, a filosofia de seu tempo. Seguindo este 
delineamento, o marxismo é a filosofia insuperável de nosso tempo. E toda argumentação que 
tente refutar essa tese sempre se mostra inconsistente.  
Todavia, pode-se pensar o seguinte: a filosofia não existe mais. Não existe o 
movimento propulsor da própria filosofia. Então temos duas vias, a filosofia acabou ou está 
“em crise”, devemos enterrar todo e qualquer sistema filosófico, tratando-o como erro 
grotesco (a filosofia está morta), ou, estando em crise, a filosofia deve ser revisada, mas não 
por intelectuais doutos, aclamados por aqueles que vislumbram uma posição abstrata e irreal. 
É o próprio movimento das relações entre os homens, da sociedade, a ação dos seres 
humanos, que podem romper com este imobilismo criativo da filosofia, caminhando a passos 
largos para o desenvolvimento, tanto filosófico, como humano: 
 
Se este movimento da filosofia não existe mais, das duas uma, ou está morta 
ou está “em crise”. No primeiro caso não se trata de revisar mas lançar por 
terra um edifício apodrecido; no segundo caso, a “crise filosófica” é a 
expressão particular de uma crise social e seu imobilismo é condicionado 
pelas contradições que laceram a sociedade: uma pretensa “revisão” efetuada 
por “especialistas” não passaria, pois de uma mistificação idealista e sem 
alcance real; é o próprio movimento da História, é a luta dos homens em 
todos os planos e em todos os níveis da atividade humana que libertarão o 
pensamento cativo e lhe permitirão atingir seu pleno desenvolvimento 
(SARTRE, 1972, p. 12). 
 
Vemos que, para o existencialista francês, deve-se fixar essa reflexão em um chão 
firme, a saber, a realidade humana, a sociedade concreta. Os ideólogos são pessoas que se 
esforçam em estabelecer sistemas teóricos, para poderem atingir com métodos novos campos 
que eles não conhecem. Tentam atribuir às teorias conotações de cunho prático, 
transformando-as em ferramentas que podem tanto aniquilar, como edificar temas.  
Mesmo assim, não criaram suas teorias do nada, foram fundamentadas sob o terreno 
sólido de pensamentos que perduram das teorias que se foram. Tais pensamentos, que 
compõem sua cultura e seu futuro, são a base para aquilo que pesquisam e de suas 
concepções. Observamos que não há ruptura histórica entres as teorias filosóficas. Isto é, 
nenhum pensador produziu sua teoria independente de sua época. 
E onde se encaixa o existencialismo sartreano? Sartre (1987a, p. 114) afirma: “E, já 
que devo falar do existencialismo, compreender-se-á que o considero como uma ideologia: é 
um sistema parasitário que vive à margem do Saber, a que de início se opôs e a que, hoje, 
tenta integrar-se”.  O seu existencialismo não pretende ser “A Filosofia”, como aquela que 
retém em si a “Verdade”, eterna, imutável e imóvel. Pelo contrário. Acredita no devir das 
76 
 
coisas e dos seres humanos. O existencialismo tenta descobrir o conhecimento como algo 
implícito à realidade, que perpassa a consciência do homem. É objetivo, pois tem suas bases 
fixadas na concretude da vida subjetiva, visto que, é necessária uma consciência que desvele 
tal conhecimento. 
Sartre demonstra a importância de Hegel: 
 
A mais ampla totalização filosófica é o hegelianismo. Nele o Saber é alçado 
à sua dignidade mais eminente: ele não se limita a visar o ser de fora, mas o 
incorpora a si e o dissolve em si mesmo: o espírito se objetiva, se aliena e se 
retoma incessantemente, se realiza através de sua própria história. O homem 
se exterioriza e se perde nas coisas, mas toda alienação é superada pelo saber 
absoluto do filósofo (SARTRE, 1972, p. 13). 
 
Hegel conseguiu aferir ao saber um estatuto elevado, pois o liga a seu próprio tempo. 
E nesta totalização filosófica o saber está sempre em movimento. Assim, o filósofo pode 
construir um saber absoluto, que expressa a percepção englobante da sociedade de sua era, 
propiciando com isso a superação da alienação humana. O filósofo se apresenta como um 
agente transformador de uma realidade através de sua filosofia. 
Neste sentido, nossos problemas e inquietações são situações que se apresentam para 
serem superadas. Somos seres dotados de consciência reflexiva (sapientes), consciência de si 
e também, somos (sabidos) afetados pelo saber que se relaciona com os seres humanos, deste 
modo, somos “integrados vivos” fincados na “totalização suprema”. Assim, quando nos 
deparamos com uma experiência desagradável que pode nos levar a morte, o puro vivido “é 
absorvido pelo sistema como uma determinação relativamente abstrata que deve ser 
mediatizada, como uma passagem que conduz ao absoluto, único concreto verdadeiro
22
 
23” 
                                                 
22
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 115) na nota de rodapé (3): “É certo que se pode puxar Hegel para o lado do 
existencialismo e Hyppolite se esforçou neste sentido, não sem êxito, em seu Études sur Marx et Hegel. Não foi 
Hegel que primeiro mostrou ‘que há uma realidade da aparência enquanto tal’? E seu panlogicismo não se 
acompanha de um pantragicismo? Não se pode escrever com razão, que para Hegel, ‘as existências se encadeiam 
na história que fazem e que, como universalidade concreta, é o que as julga e as transcende’? Podemos fazê-lo 
facilmente, mas a questão não está aí: o que opõe Kierkegaard e Hegel é que, para o último, o trágico de uma 
vida é sempre superado. O vivido se dissolve no saber: Hegel nos fala do escravo e de seu medo da morte. Mas, 
este, que foi sentido, torna-se o simples objeto do conhecimento e o momento de uma transformação ela própria 
superada. Para, Kierkegaard, pouco importa que Hegel fale de “liberdade para morrer” ou que descreva 
corretamente alguns aspectos da fé, o que ele critica no hegelianismo é o fato de negligenciar a insuperável 
opacidade da experiência vivida. Não é somente, nem sobretudo no nível dos conceitos que está o desacordo, 
mas antes no da crítica do saber e delimitação do seu alcance. Por exemplo, é perfeitamente exato que Hegel 
marca profundamente a unidade e a oposição entre a vida e a consciência. Mas é verdade também que são 
parcialidades já reconhecidas como tais do ponto de vista da totalidade. Ou, para falar a linguagem da semiologia 
moderna: para Hegel, o Significante (a um momento qualquer da história) é um movimento do espírito (que se 
constituirá como significante-significado e significado-significante, isto é, absoluto-sujeito); o significado é o 
homem vivo e sua objetivação; para Kierkegaard o homem é o Significante: ele próprio produz as significações e 
nenhuma significação o visa de fora (Abraão não sabe se ele é Abraão); ele não é jamais o significado (mesmo 
por Deus)”.  
77 
 
(SARTRE, 1987a, p. 115). 
Kierkegaard, que recusa o título de filósofo, se torna importante na medida em que se 
opõe à Hegel. Para ele, o ser humano concreto não pode ser subsumido por um sistema 
idealista, pois o homem existente, por mais que tenha a capacidade de conceituar e pensar 
sobre sentimentos (sofrimento), quando sente aquilo que quer teorizar, no caso o sofrimento, 
não se limita ao saber, ou seja, aqui o sofrimento é sentido, em si e para si mesmo, o saber não 
consegue transformá-lo.  
Sartre expressa as palavras de Kierkegaard em relação a sua aversão a Hegel: 
 
O homem existente não pode ser assimilado por um sistema de idéias; por 
mais que se possa dizer e pensar sobre o sofrimento, ele escapa ao saber, na 
medida em que é sofrido em si mesmo, para si mesmo, onde o saber 
permanece incapaz de transformá-lo (SARTRE, 1987a, p. 116). 
 
Notamos que Kierkegaard quer defender a Igreja, o cristianismo. Para ele, Deus, o 
Todo Poderoso, está infinitamente distante dos homens, que não podem conhecê-lo por meio 
de uma objetividade racional e sim pela fé subjetiva. Isto é, Ele não pode ser conhecido pelo 
saber humano como objeto do conhecimento, não se enquadra em teorizações científicas, que 
tendem a validar seus resultados numa objetivação empírica. 
O mesmo se aplica à Fé. Ela não pode ser padronizada ou racionalizada objetivamente 
com o intuito de transformá-la num conceito científico. Ela é espontânea e subjetiva, não pode 
ser, segundo Kierkegaard, “superada ou classificada” como um conhecimento. Com isso, ele 
opõe, categoricamente, a “pura subjetividade singular” à objetividade universal da “evidência 
científica”. Pode-se dizer que ele apresenta o dilema entre a subjetividade da fé e a 
“universalidade objetiva da essência”. 
Para Sartre, o filósofo dinamarquês pretende de toda forma romper com a noção de 
mediação, mas acaba caindo em problemas. Hegel via esses erros como contradições próprias 
do desenvolvimento histórico. Definindo-as como “ideias truncadas”. De forma alguma 
Kierkegaard quer assentir uma relação absolutamente racional entre o homem e Deus, não 
poderia existir tal possibilidade: 
 
De fato, a vida subjetiva, na medida mesmo em que é vivida, não pode 
jamais ser objeto de um saber; ela escapa por princípio ao conhecimento e a 
relação do crente com a transcendência não pode ser concebida como forma 
de superação. Esta interioridade que pretende afirmar-se contra toda a 
filosofia, na sua estreiteza e profundidade infinita, esta subjetividade 
                                                                                                                                                        
23
 Cf. (SARTRE, 1985, p. 55) palavras de Hyppolite: “Não tenho muita coisa a acrescentar à intervenção de meu 
amigo Sartre, mas creio que 'um dos méritos do marxismo é colocar radicalmente as questões, pesquisar o 
porquê concreto da própria questão”.  
78 
 
reencontrada para além da linguagem como aventura pessoal de cada um em 
face dos outros e de Deus, eis o que Kierkegaard chamou de existência 
(SARTRE, 1972, p. 14). 
 
Então, existência para Kierkegaard é a vida subjetiva e consciente que tende a se opor 
à filosofia ou conhecimento metódico. Esta vivência subjetiva não pode ser abarcada pelas 
normas do conhecimento científico e racional. E não há superação no fato de transcender a 
Deus. Quem acredita em Deus, se fundamenta na fé, e buscá-lo não pode ser encarado como 
ultrapassagem de uma condição humana. 
Se pensarmos bem, o filósofo dinamarquês não se separa tanto assim de Hegel, pois 
esta repulsa ao sistema parece estar ligada a noção de “campo cultural”, apresentada pelo 
hegelianismo. A história e os conceitos se impõem a Kierkegaard a todo o momento, o 
deixando intimidado, e ele tenta se defender através de uma metafísica cristã frente a um 
racionalismo humanista da fé. Se não levarmos em conta a época de Kierkegaard poder-se-ia 
excluir seu pensamento facilmente, nomeando sua teoria de subjetivismo em face da dialética 
hegeliana, mas devemos situá-lo. 
Segundo Sartre os dois tem razão: 
 
Hegel tem razão: em lugar de obstinar-se, como o filósofo dinamarquês, em 
paradoxos cristalizados e pobres reenviam finalmente a uma subjetividade 
vazia, é ao concreto e verdadeiro que o filósofo de Viena visa por seus 
conceitos e a mediação apresenta-se sempre como um enriquecimento. 
Kierkegaard tem razão: a dor, a necessidade, a paixão, o sofrimento dos 
homens, são realidades brutas que não podem ser superadas nem 
modificadas pelo saber; é que seu subjetivismo religioso pode passar com 
razão pelo cúmulo do idealismo, mas em relação a Hegel ele marca um 
progresso em direção ao realismo, já que insiste, antes de tudo, na 
irredutibilidade de um certo real e no seu primado (SARTRE, 1987a, p. 116). 
 
Hegel está certo em criticar Kierkegaard, pois se pautando em contradições sem 
coesão, o filósofo dinamarquês acaba recaindo em uma “subjetividade vazia”, sem nexo com 
o “concreto e verdadeiro”, que é o que os conceitos e a mediação de Hegel propõem. Os 
conceitos assim são postos pelo filósofo alemão, como referentes racionais do real.  
Em contrapartida, Kierkegaard também acertou quando explica que os sentimentos 
humanos: dores, sofrimentos, paixões, etc., não podem ser restringidos a conceitos, são 
“realidades brutas”. O saber não pode ultrapassar ou mudar tais realidades. Seguindo esta 
posição, a existência definida por Kierkegaard é o trabalho realizado pela nossa vida interior, 
nossos anseios, lutas cotidianas. Mas este trabalho é oposto ao “conhecimento intelectual”. 
Foi Kierkegaard o pioneiro a apontar a “incomensurabilidade entre o real e o saber”, e ela 
pode ter origem num “irracionalismo conservador”. Aqui, a distância entre real e saber parece 
79 
 
ser insuperável. 
Este trabalho, operação subjetiva, é a forma de Kierkegaard tentar sair da objetividade 
da vida humana do âmbito concreto pensado racionalmente. Esse irracionalismo metafísico 
pode ser um caminho para se entender a filosofia desse ideólogo. Ele também poderia decretar 
a morte do idealismo absoluto, pois para se superar ou modificar um sentimento humano não 
se deve levar em conta somente as ideias ou conceitos.  
É necessário viver as sensações para modificá-las. As ideias são mudadas ou superadas 
pela vivência delas próprias, por exemplo, só poderíamos mudar um sofrimento sentindo-o na 
pele, aí sim teríamos condições de saber o que fazer para solucioná-lo. O conceito não 
expressa a vivência de seu objeto determinado. Vejamos o que a teoria de Kierkegaard faz ao 
idealismo, nas palavras de Sartre: 
 
Mas ela pode ser compreendida também como a morte do idealismo 
absoluto: não são as idéias que modificam os homens, não basta conhecer 
uma paixão pela sua causa para suprimi-la, é preciso vivê-la, opor-lhe outras 
paixões, combatê-la com tenacidade, enfim trabalhar-se (SARTRE, 1972, p. 
16). 
 
 Neste panorama, Marx também repreende Hegel. Mesmo que de modo diferente de 
Kierkegaard, ele o critica no tocante a confundir objetivação, “exteriorização do homem no 
universo”, com alienação, aquilo que volta contra o ser humano neste movimento de 
exteriorização. A objetivação seria uma espécie de eclosão, que daria ao homem uma 
possibilidade de “produzir e reproduzir” constantemente a sua vida, modificando-a, 
transformando a natureza. 
De outro modo, a objetivação seria: o homem próprio poder contemplar-se dentro do 
mundo que ele realizou. Já a alienação não pode ser derivada de uma formulação meramente 
conceitual. Ela só pode ser realizada a partir de uma “História real”. O homem só pode 
vislumbrar o sentido de alienação num contexto real e concreto e não através de conceitos 
abstratos. Sartre reproduz as palavras de Marx: 
 
Na produção social de sua existência os homens entram em relações 
determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; estas relações de 
produção correspondem a um grau de desenvolvimento dado de suas forças 
produtivas materiais; o conjunto destas relações de produção constitui a base 
real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual 
correspondem formas de consciência social determinadas (SARTRE, 1987a, 
p. 117). 
  
A consciência social do indivíduo é produto de várias relações sociais – postas, 
necessárias e que não dependem de suas ambições – vividas ao longo de sua existência. Estas 
80 
 
relações sociais são os fundamentos da justiça e da política. Aqui a consciência que temos 
(intencional ou subjetiva) é consciência social, tudo que pensamos, escrevemos é fundado 
pela consciência de nosso grupo ou classe social.  
Mas parece que hoje as forças produtivas e as relações de produção estão em guerra. O 
trabalho que o homem faz é alienado e ele não se reconhece no produto de seu esforço. Seu 
trabalho é extenuante e se apresenta sempre como seu opositor. Vemos assim, que o homem 
produz algo, que ele não reconhece como seu produto e que nesse processo ele se encontra 
oprimido e alienado. 
Diante disto, não há como reduzir a alienação a uma ideia, a alienação é concreta e 
ocorre neste conflito contido nas relações de trabalho (produção e não reconhecimento). O 
homem estranha sua própria “cria”. Ora, para os homens se livrarem desta opressão e se 
verem em seu trabalho, objetivando-se a si mesmos em seus produtos, eles não precisam só de 
uma consciência reflexiva de si mesma (cogito), necessitam de trabalho e práxis que mudem – 
revolucionem – a realidade que aí está posta. 
   Deste modo, Marx explica que: não se pode predicar um juízo sobre uma pessoa se 
atendo apenas à ideia que ela tem de si mesma, o mesmo se aplica a uma sociedade, não é 
prudente fazer um juízo sobre uma época, sobre um período e sobre uma inadequação 
revolucionária levando em conta somente a consciência que tal sociedade tem de si. Aqui, 
Marx quer deixar bem clara a sobreposição da ação (Trabalho, e práxis social) ao 
conhecimento (saber): 
 
Afirma ele, também, que o fato humano é irredutível ao conhecimento, que 
ele deve ser vivido e ser produzido; apenas não vai confundi-lo com a 
subjetividade vazia de uma pequena burguesia puritana e mistificada: dele 
faz o tema imediato da totalização filosófica e é o homem concreto que ele 
coloca no centro de suas pesquisas, este homem que se define 
simultaneamente pelas suas necessidades, pelas condições materiais de sua 
existência e pela natureza de seu trabalho, isto é, de sua luta contra as coisas 
e contra os homens (SARTRE, 1972, p. 16). 
 
Reforçando a posição de Marx, as ações e relações humanas não podem ser 
enquadradas somente em um conceito do saber. Todo sentimento deve ser sentido para que se 
possa assentir qualquer conhecimento acerca dele. Não é uma reflexão contemplativa que irá 
definir um sofrimento ou paixão, é a sua experimentação que proporcionará sua 
conceitualização. No fundo, Marx quer se esquivar de uma subjetividade vazia.  
A totalização da filosofia se dá no concreto e o homem se coloca no núcleo destas 
investigações marxistas, pois o ser humano se realiza em suas necessidades, condições 
materiais e pelo trabalho. É nessa conflituosa realidade que o ser humano vive um embate 
81 
 
contra os objetos mundanos e contra os outros. Rivaliza com tudo e contra todos. Parece 
assim que Marx pode estar certo, tanto contra Kierkegaard quanto contra Hegel: 
 
Assim, Marx tem razão ao mesmo tempo contra Kierkegaard e contra Hegel, 
já que afirma, com o primeiro, a especificidade da existência humana, e já 
que toma, com o segundo, o homem concreto na sua realidade objetiva. 
Pareceria natural, nestas condições, que o existencialismo, neste protesto 
idealista contra o idealismo, tivesse perdido toda sua utilidade, e não tivesse 
sobrevivido ao declínio do hegelianismo (SARTRE, 1987a, p. 117).  
 
Notamos que Marx vê em Kierkegaard a especificidade da existência dos seres 
humanos e em Hegel, utiliza “o homem concreto na sua realidade objetiva.”. Assim sendo, 
não haveria sentido algum em permanecer na análise do existencialismo, pois se ele é um 
idealismo que se revolta contra o próprio idealismo, e Marx apresenta esta perspectiva 
unificadora, o marxismo enfraquece o hegelianismo e leva junto consigo, para o declínio, a 
teoria existencialista. Parece que realmente o idealismo sofreu um obscurecimento neste 
combate contra o marxismo.  
Alguns célebres filósofos são fundamento do pensamento da burguesia, Kant, os pós-
kantianismos e Descartes, mas ele não se remete à Kierkegaard como participante de sua base. 
Todavia, parece que ele tomou as dores de tal vertente. Sartre (1972, p. 18) diz: “O 
dinamarquês reaparecerá no início do século XX, quando se decidiu combater a dialética 
opondo-lhe pluralismos, ambiguidades, paradoxos, isto é, a partir do momento em que, pela 
primeira vez, o pensamento burguês é reduzido à defensiva”. Como notamos, diante deste 
estado, Kierkegaard se vê impelido a se defender, atacando a dialética como propulsor da 
verdade. 
Nos anos posicionados entre as duas guerras aparece Jaspers
24
, com um 
existencialismo que busca a recuperação do transcendente. Com a posição kierkegaardiana, 
seus seguidores passariam a se enclausurar numa subjetividade intensa, na qual poderiam 
perceber uma imensa infelicidade sem a existência de Deus e tal fechamento poderia ser 
realizado por um “grande solitário”, que se abdica de se relacionar com os outros e assim, 
exerce “ações indiretas” para estimular seus semelhantes a fazerem o mesmo. Segundo Sartre, 
Jaspers não comenta sobre a Revelação relativamente ao hegelianismo, proposta por 
Kierkegaard como solução para as contradições, ele nos leva a um subjetivismo puro e formal 
através do descontínuo, do pluralismo e impotência, o oposto de um Deus. E em tal 
subjetividade se encontra a transcendência por meio de suas derrotas. Pode-se dizer então que 
                                                 
24
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 118), na nota de rodapé (5): “O caso de Heidegger é complexo demais para que possa 
expô-lo aqui”. 
82 
 
para sentir o transcendente devemos passar pelo fracasso.  
 A vitória seria, neste ponto, a objetivação que proporcionaria ao homem superar-se e 
ultrapassar suas insatisfações. A contemplação sobre os fracassos e insucessos é adequada a 
uma burguesia que se desanimou do cristianismo, porém possui saudades da fé, visto que, não 
está muito “crente” em uma ideologia racional e positivista. Kierkegaard, ao contrário de 
Jaspers, não acredita em vitória como trampolim da superação, ela “desafia o homem em si 
mesmo”. 
Já Kafka acredita, parecendo um pouco mais coerente, que nesse nosso mundo de 
alienação, uma pessoa singular não se reconhece como vencedor. Sempre deve se superar, do 
contrário, é esmagada por suas próprias exigências e pelas dos outros. Tais cobranças, de 
sempre ser vencedor em todos seus empreendimentos, agrava cada vez mais a alienação. 
Sartre descreve realmente o que é relevante para Jaspers: 
 
Mas o que importa a Jaspers é retirar daí um pessimismo subjetivo e fazê-lo 
desembocar num otimismo teológico que não ousa dizer seu nome; o 
transcendente, com efeito, permanece velado, não se prova senão pela sua 
ausência; não superamos o pessimismo, pressentimos a reconciliação, 
permanecendo ao nível de uma contradição insuperável e de um total 
dilaceramento; esta condenação da dialética, não mais visa Hegel, mas sim 
Marx. Não é mais a recusa do Saber e sim da práxis (SARTRE, 1972, p. 19). 
 
Como se vê, Jaspers quer promover uma rejeição à práxis. Quer substituir um 
pessimismo subjetivo por um otimismo teológico. E o transcendente que emana desta teologia 
é tímido, não deve ser dito, se prova pela sua não presença. Parece que o pessimismo não está 
superado, pois com todas as contradições presentes no mundo concreto e real, a censura à 
dialética parece recair sobre a práxis marxista. 
O que, então, pode ser extraído deste “conflito de interpretações”? Vejamos: 
 
Kierkegaard não queria figurar como conceito no sistema hegeliano, Jaspers 
recusa cooperar como indivíduo na história que fazem os marxistas. 
Kierkegaard realiza um progresso em relação a Hegel porque afirma a 
realidade do vivido, mas Jaspers regride em relação ao movimento histórico, 
uma vez que foge do movimento real da práxis, em direção a uma 
subjetividade abstrata, cujo único objetivo é atingir uma qualidade íntima 
(SARTRE, 1987a, p. 118). 
     
Diante disso, se Kierkegaard evolui em relação a Hegel, no tocante a propor ao vivido 
uma realidade, Jaspers deu um passo atrás, visto que, ele quis fugir de toda forma do 
movimento histórico, da práxis, querendo fundamentar uma subjetividade metafísica, num 
campo desconecto da realidade concreta. Jaspers propõe tal subjetivismo abstrato com a 
83 
 
finalidade de se chegar a uma qualidade íntima
25
. Assim o existencialismo de Jaspers parece 
refugiar-se num subjetivismo idealista, o qual não possui justificativas objetivas para ações no 
concreto. Ele se baseia em conceitos abstratos para fundamentar nossa vivência subjetiva.  
 
 
3.2 Marxismo e Existencialismo 
 
 
Doravante, nos passos seguintes de Questões de método, Sartre vai começar a situar, 
explicar e retomar o tipo de existencialismo no qual ele se engaja, aquele que não se opõe ao 
marxismo, e que se constrói ao seu lado:  
 
Por sua presença real, uma filosofia transforma as estruturas do Saber, 
suscita idéias e, mesmo quando define as perspectivas práticas de uma classe 
explorada, polariza a cultura das classes dirigentes e modifica-a. Marx 
escreve que as idéias da classe dominante são as idéias dominantes 
(SARTRE, 1972, p. 19). 
 
Uma filosofia tem o poder de modificar as fundações do conhecimento. Ela 
proporciona mudança na cultura e no modo de se entender a dominação entre as classes. Isto 
quer dizer que, conhecer é transformar a realidade, a natureza ou a si mesmo. As ideias de 
quem domina uma era (detentores do Capital) são as que predominam em seu tempo, são 
aquelas ideias que determinam e se impõem na sociedade de modo geral.  
Para Sartre, Marx está certo, no sentido formal, pois por volta de 1925, o conceito de 
dialética, tanto em Hegel, como em Marx, era extremamente ignorado pelas “academias”, 
ninguém “aconselhava” ou orientava estudos que tratavam de tal conceito. Com este 
desconhecimento não havia como dialogar com o materialismo dialético
26
 de Marx. Os 
estudos recaiam sobre os clássicos, como Aristóteles, a lógica era detalhadamente ensinada. 
Mesmo lendo alguns textos de Marx em sua fase inicial de aproximação do marxismo 
– principalmente o Capital e a Ideologia Alemã –, Sartre (1987a, p. 118) admite não ser 
afetado por tais obras, visto que: “Compreender é modificar-se, ir além de si mesmo: esta 
leitura não me modificava”. O que o modificava eram os movimentos sociais impulsionados 
pela leitura marxista, isso sim lhe chamou atenção. O marxismo não possuía o prestígio dos 
intelectuais. Sobre esse momento do pensamento francês, o existencialista francês diz: 
                                                 
25
 Cf. (SARTRE, 1972, p. 19) na nota de rodapé (6): “É esta qualidade ao mesmo tempo imanente (já que se 
estende através de nossa subjetividade vivida) e transcendente (já que permanece fora de nosso alcance), que 
Jaspers denomina de existência”.  
26
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 118), na nota de rodapé (7): “É o que explica o fato de que os intelectuais marxistas 
da minha idade (comunistas ou não) sejam tão maus dialéticos: voltaram, sem sabê-lo, ao materialismo 
mecanicista”. 
84 
 
 
Mas, quando ele se dava como uma determinação real do proletariado, como 
sentido profundo – para si mesmo e em si – de seus atos, ele nos atraía 
irresistivelmente sem que soubéssemos e deformava toda a nossa cultura 
adquirida. Repito-o: não era a idéia que nos perturbava; não era tampouco a 
condição operária, da qual tínhamos um conhecimento abstrato, mas não a 
experiência. Não: era uma ligada à outra, era, teríamos dito então em nosso 
jargão de idealistas com ruptura com o idealismo, o proletariado como 
encarnação e veículo de uma idéia (SARTRE, 1972, p. 21). 
 
Para Sartre, o trabalhador poderia enxergar na teoria de Marx uma possibilidade real e 
concreta de se pensar e agir filosoficamente. Ela dava um norte fundamentando as suas ações. 
O existencialista francês reafirma Marx, não são somente as análises sobre as condições de 
trabalhos, que eram entendidas só de forma abstrata sem a vivência real do fato pelas outras 
teorias. Segundo ele, o marxismo revela um nexo entre a experiência e o conceito abstrato 
referente aos operários.  
Nesta cisão de Sartre com o idealismo abstrato, ele afirma que o proletariado se 
apresenta como incorporação e condução da ideia (objetividade). E ele propõe, como 
complemento ao que defende Marx, que quando essa massa em movimento toma consciência 
de si mesma descontenta enormemente àqueles intelectuais que recusam uma ação como 
aplicação de uma ideia, que deveria ficar no âmbito abstrato, sem se corromper no concreto. E 
é por isso que o existencialista francês não aceita o “idealismo oficial”, pois ele desmerece o 
Trágico da vida
27
. Os operários desprezados por aqueles que os exploravam, que atuavam 
conscientemente, traziam latentes os conflitos que se negavam a ser solucionados pelos donos 
do poder. 
Vejamos nas próprias palavras de Sartre como pode ser pensado este complemento à 
teoria marxista: 
 
E creio que é preciso aqui completar a fórmula de Marx: quando a classe 
ascendente toma consciência de si mesma, esta tomada de consciência age à 
distância sobre os intelectuais e desagrada as idéias em suas cabeças. 
Recusamos o idealismo oficial em nome do trágico da vida. Este 
proletariado longínquo, invisível, inacessível mas consciente e atuante, 
fornecia-nos a prova – obscuramente para muitos dentre nós – de que não 
estavam resolvidos todos os problemas (SARTRE, 1987a, p. 119). 
 
Sartre destaca que sua geração pautava-se num “humanismo otimista”, tal humanismo 
burguês destruía e desprezava àqueles que não se adequavam em “seus valores” e que eram 
marginalizados para os arredores das cidades. Essa enorme massa, que fugia aos padrões, era 
                                                 
27
 Cf. (SARTRE, 1972, p. 21), na nota de rodapé (9): “[...] era uma expressão posta a moda pelo filósofo Miguel 
Unamuno. Certamente este trágico nada tinha em comum com os verdadeiros conflitos de nossa época”. 
85 
 
tratada de “sub-homens conscientes de sua sub-humanidade”. Esta hierarquização intelectual 
entre homens e “sub-homens”, neste momento, ainda era vista pelo existencialista francês de 
modo idealista, pois era a teoria exposta e aclamada em sua época. 
Mas este “espantoso” marxismo, que visava teorizar através da própria concretude da 
vida, instigou Sartre a tentar entender o homem em sua vivência situada, com seus anseios, 
decepções e dores reais. Isso culminaria na requisição de uma filosofia que abarcasse a 
totalidade da realidade, mas ela já estava aí e era ela que provocava essa reivindicação. O 
idealismo tão difundido pela burguesia, principalmente, agora se via perante um inimigo 
“concreto”. 
Parece inerente que a ideologia, apenas com conceitos abstratos, não dá conta destes 
homens concretos, que trabalham, lutam e vivem. O marxismo traz a novidade de destacar as 
contradições da realidade. Para Sartre o marxismo possibilita a saída de um pessimismo 
burguês: 
 
Assim, o marxismo como “filosofia tornada mundo” nos arrancava da 
cultura defunta de uma burguesia que vegetava sobre seu passado; 
enveredamos às cegas na via perigosa de um realismo pluralista que visava o 
homem e as coisas na sua existência “concreta”. Entretanto, permanecíamos 
no quadro das “idéias dominantes”: o homem que queríamos conhecer na 
sua vida real, não tínhamos ainda a idéia de considerá-lo, de início, como um 
trabalhador que produz as condições de sua vida (SARTRE, 1972, p. 22). 
 
Vemos que o marxismo dá ao existencialista francês, neste momento, uma espécie de 
catarse, o purifica de uma filosofia pautada apenas em ideias, que era a difundida em seu 
tempo e o “coloca” na realidade múltipla. Mesmo assim, Sartre ainda não havia rompido com 
suas noções filosóficas (idealistas). O idealismo que o havia impregnado, não lhe dava 
arcabouço teórico para ver o homem na sua realidade concreta. Não lhe proporcionava 
conceber o homem como um ser que se faz em sua existência situada. 
  Isto se deve ao fato de que ao longo do tempo foram confundidos, total e individual. 
Segundo Sartre o pluralismo fez com que a totalização dialética não fosse entendida. Nesta 
época estavam mais preocupados em tratar de essências (ideais) e coisas tomadas de modo 
isoladas e conceituais, do que tentar entender o devir de uma verdade originada da realidade e 
da história. Este idealismo cristalizado nas teorias deste tempo estava prestes a ser 
confrontado. 
Mas para isso foi necessário que ocorresse uma guerra, que demonstrasse 
violentamente que as coisas, sejam elas injustas ou corretas, acontecem no mundo real, não 
em ideias e conceitos. Perante esta brutalidade irracional era preciso agir e não meramente 
86 
 
pensar. Neste sentido, aquilo que pode ser posto como concreto está na história e na ação 
dialética e não em princípios abstratos (ideias).  
Visto por esse prisma, traçado pelo próprio Sartre, parece que o marxismo resolveu 
tudo. Que a filosofia da época seria o marxismo sem qualquer necessidade de reavaliação. 
Mas, Sartre pondera que o existencialismo tinha algo a dizer ao marxismo. Para ele, o 
existencialismo não se diluiu no marxismo, e ainda poderia reclamar para si uma autonomia. 
Ele expõe a ideia de Lukács sobre isso: 
 
A esta pergunta, Lukács acreditou responder num livrinho intitulado 
Existencialismo e Marxismo. Segundo ele, os intelectuais burgueses foram 
constrangidos a “abandonar o método do idealismo, embora salvaguardando 
seus resultados e seus fundamentos: daí a necessidade histórica de um 
terceiro caminho” (entre o materialismo e o idealismo) na existência e na 
consciência burguesa no curso do período imperialista (SARTRE, 1987a, p. 
119). 
 
Notamos neste trecho de Sartre comentando Lukács, que o existencialismo surgia 
como uma terceira via para se entender os conflitos e a realidade humana. Deste modo, o 
Existencialismo se apresentaria como uma espécie de terceiro aspecto teórico para o qual os 
pensadores burgueses da época poderia acorrer. Para ele, isso se deve ao fato de que o 
existencialismo se encontra entre o Materialismo e o idealismo, mas para isto deveria rejeitar 
o método e os resultados do idealismo, o que para o marxista oficial do Partido seria 
impossível. Lukács, segundo Sartre, avaliava que o existencialismo seria somente o último 
respiro da filosofia burguesa e que ele seria definitivamente exterminado pelo marxismo 
científico. 
Mas para Sartre esta resposta pode ser tomada como preconceituosa. Esta posição 
apressada de Lukács parece não levar em conta o que Sartre entende por existencialismo. Para 
o filósofo francês o marxismo apresenta-se como entendimento único e válido da história, 
pois é o mais coerente e completo e o existencialismo, por sua vez, surgiria como o único 
enfoque da realidade, visto que, estaria fundamentado na ação e escolha humana. Em suma, a 
filosofia marxista compreenderia a história de maneira coesa e racional e a outra, o 
existencialismo, trataria da realidade de forma concreta e concisa. Uma auxiliando a outra na 
tarefa de compreender a realidade e a transformá-la. 
Vejamos nas próprias palavras de Sartre tal posicionamento das teorias: 
 
Observemos simplesmente aqui que Lukács não dá conta absolutamente do 
fato principal: estávamos convencidos ao mesmo tempo de que o 
materialismo histórico fornecia a única interpretação válida da história e de 
que o existencialismo permanecia a única abordagem concreta da realidade. 
87 
 
Não pretendo negar as contradições desta atitude: verifico simplesmente que 
Lukács nem sequer suspeita de sua existência (SARTRE, 1972, p. 23). 
  
Sartre não deseja separar ou opor marxismo e existencialismo, ele pretende explanar 
que as duas teorias podem conviver na mesma época e contribuírem para a transformação da 
sociedade. Mesmo Sartre tendo esta predileção teórica pelo marxismo ele destaca alguns 
problemas. O marxismo está se distanciando um pouco dos pensadores e do conhecimento, 
pois parece que ele não se renova, não sacia mais a sede de compreender a nós mesmos em 
nossa própria realidade. 
Alguns “pensadores”, como Lukács, paralisaram o marxismo. Tentam estabelecer uma 
delimitada ruptura entre teoria e prática. Para Sartre parece que estes “marxistas” pretendem 
bipartir a realidade, numa está a teoria e na outra, a prática. Uma teoria que visa à 
transformação da realidade voltando-a para a totalização promove essa segregação, isso pode 
ser tratado como uma contradição. 
Vejamos nas próprias palavras de Sartre: 
 
O marxismo estacionou: precisamente porque esta filosofia quer transformar 
o mundo, porque visa “ao tornar-se-mundo da filosofia”, porque é e quer ser 
prática, operou-se nela verdadeira cisão que jogou a teoria de um lado e a 
práxis do outro (SARTRE, 1987a, p. 120). 
 
Tal afirmação pode nos levar a pensar de maneira mais ponderada. Toda teoria que 
tende ou pretende ser concreta deve se fundamentar na prática da realidade. Deve ser fruto, 
um construto da vivência humana, em sua época e no seu devir. Assim: “O pensamento 
concreto deve nascer da práxis e voltar-se sobre ela para iluminá-la: não ao acaso e sem 
regras, mas – como todas as ciências e todas as técnicas – em conformidade e princípios” 
(SARTRE, 1987a, p. 119). 
Depois ela deve retornar a esta concretude a qual foi engendrada, com o intuito de 
tentar entendê-la. Isto é, voltar-se a sua prática formadora, se esforçando em efetuar uma 
compreensão coesa, fundamentada e racional. Todo esse processo de retorno ao concreto deve 
ser orientado por uma gama de princípios, não de qualquer forma, ao bel prazer dos 
pensadores ou filósofos, deve-se ter método. 
Esta ruptura entre teoria e prática teve consequências negativas. A prática se reduziu a 
empirismo sem princípios e a teoria em Saber puro e cristalizado. Em outras palavras, a 
prática se transformou em experiências sem conceitos ou método de análise, descrição da 
realidade sem o crivo crítico de uma racionalidade reguladora e a teoria se restringiu ao 
conhecimento dogmático e abstrato, ideologia sem um referente do concreto objetivo, 
88 
 
metafísica vazia.  
Sartre elucida que: 
 
De outro lado, a planificação, imposta por uma burocracia que não queria 
reconhecer seus erros, tornava-se por isso mesmo uma violência feita à 
realidade, e já que se determinava a produção futura de uma nação nos 
gabinetes, amiúde fora de seu território, esta violência tinha por 
contrapartida um idealismo absoluto: submetiam-se a priori os homens e as 
coisas às idéias; quando a experiência não confirmava as previsões só podia 
estar em um erro (SARTRE, 1972, p. 24). 
 
A planificação, esta tentativa de estabelecer organização da economia de forma 
sistêmica, se demonstra errônea, pois se torna uma ação violenta contra o concreto na medida 
em que, baseada em um idealismo absoluto, subsume a realidade às ideias. Elabora 
regimentos programáticos perante conceitos idealistas, que não correspondendo à vivência, se 
demonstram atrofiados e enganados. Ela cria um conceito antes de experimentá-lo na 
realidade, a priori. 
Sartre destaca este método apriorístico para salientar que alguns marxistas podem estar 
indo no mesmo caminho do idealismo. Eles às vezes negam as experiências, fatos e dados em 
prol de causas políticas – como engajamento em partidos. Porém, deviam pensar corretamente 
os ideais de seus partidos e destes métodos preconceituosos, que são uma violência idealista 
contra a realidade concreta humana, para aí sim poderem aferir um juízo de valor ou 
conhecimento acerca de determinado assunto. Vejamos: 
 
O marxismo, enquanto interpretação do homem e da história, devia 
necessariamente refletir as opiniões pré-concebidas da planificação: esta 
imagem fixa do idealismo e da violência exercia sobre os fatos uma 
violência idealista. Durante anos, o intelectual marxista acreditou que servia 
a seu partido, violando a experiência, negligenciando os dados e, sobretudo, 
conceptualizando o acontecimento antes de tê-lo estudado (SARTRE, 1987a, 
p. 121). 
 
Na prática isso pode se transformar em um grande problema
28
. Continuar 
racionalmente confirmando e/ou fazendo algo incerto é incorreto ou absurdo. Essa 
                                                 
28
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 121): “No dia 4 de novembro, por ocasião da segunda intervenção soviética na 
Hungria e sem dispor ainda de qualquer informação sob a situação, cada grupo havia tomado partido: trata-se de 
uma agressão da burocracia russa contra a democracia dos Conselhos operários, de uma revolta das massas 
contra o sistema burocrático ou de uma tentativa contra-revolucionária que a moderação soviética soubera 
reprimir. Mais tarde, vieram notícias, muitas notícias: mas não ouvi dizer que um único marxista tivesse mudado 
de opinião. Entre as interpretações que acabo de citar, existe uma que mostra o método a nu, aquela que reduz os 
fatos húngaros a uma ‘agressão soviética contra a democracia dos Conselhos operários’. É ponto pacífico que os 
Conselhos operários são uma instituição democrática, pode-se mesmo afirmar que eles trazem em si o futuro da 
sociedade socialista. Mas isto não impede que não existissem na Hungria quando da primeira intervenção 
soviética; e sua aparição, durante a Insurreição, foi breve demais e por demais perturbada para que possa falar de 
democracia organizada. Não importa: houve Conselhos operários, uma intervenção soviética produziu-se”. 
89 
 
persistência no duvidoso pode fazer com que os marxistas recaiam naquilo que eles mais 
criticaram ao longo dos tempos, ou seja, que se torne um idealismo.  
Neste sentido, o marxismo aparenta ter um duplo esquema. Um deles conceitua as 
coisas antes de vivenciá-las, partindo de um indutivismo, a priori, isso é a conceptualização, 
e, não leva em conta de forma atenciosa os fatos e as contradições da experiência real e 
concreta. 
Sartre expressa assim tal problematização: 
 
A partir daí, o idealismo marxista procede as duas operações simultâneas: a 
conceptualização e a passagem ao limite. Estende-se a noção empírica até a 
perfeição do tipo, o germe até seu desenvolvimento total; ao mesmo tempo 
rejeitam-se os dados equívocos da experiência: eles só podem extraviar 
(SARTRE, 1972, p. 25). 
 
Parece que o filósofo francês quer alertar os marxistas para um fato, tentar tomar 
conceitos como referentes ideais das experiências sem levá-las em conta parece se tornar um 
procedimento um pouco impreciso e parcial. Um todo é um composto de vários particulares, 
em que estes se relacionam e se condicionam entre si. Com isso, quando há a mudança de um 
elemento o mesmo pode vir a ocorrer com os outros e com o todo. 
Isto quer dizer que, se as coisas não existem de forma individual, sem se relacionar 
com os outros de sua unidade constitutiva, uma verdade sobre este todo não deve ser 
encontrada como uma abordagem especificista de cada elemento, ou seja, estudar cada 
elemento de modo particular não transmite uma resposta coesa e verdadeira às perguntas do 
todo analisado. 
 
Ora, não se poderia duvidar de que a fecundidade do marxismo vivo vinha, 
em parte, de sua maneira de abordar a experiência. Convencido de que os 
fatos nunca são aparições isoladas, que, se eles se dão em conjunto, é sempre 
na unidade superior de um todo, que estão ligados entre si por relações 
internas e que a presença de um modifica o outro na sua natureza profunda 
(SARTRE, 1987a, p. 122). 
 
Seguindo esta perspectiva, toda hipótese conceitual se não for averiguada na 
experiência é uma previsão teórica daquilo que se quer conhecer. Um conceito só é válido 
concretamente se for aferido na realidade, do contrário é uma abstração, um esboço do que 
acontece na existência concreta. O procedimento compositivo de uma hipótese é 
universalizante, visa entender certas relações e dadas funções, mas não é totalizante, não 
representa uma totalidade concreta. 
 Uma universalização é a tentativa de abranger ao máximo possível, tornar-se axioma, 
90 
 
lei geral. Já a totalização é um conjunto unitário de particulares. O marxismo conseguia tratar 
da realidade se valendo dos dois aspectos. Aqui a totalização era feita de forma ordenada. A 
teoria propunha as perspectivas e certas ordens condicionantes. A partir disso, poder-se-ia 
pesquisar quadros particulares dentro de um conjunto unitário que estava em progresso. Ora: 
 
Sem dúvida, a hipótese do físico, antes de ser confirmada pela 
experimentação, é também um deciframento da experiência; ela rejeita os 
empirismos simplesmente porque ele é mudo mas o esquema constitutivo 
desta hipótese é universalizante; não é totalizante; determina uma relação, 
uma função e não uma totalidade concreta. O marxismo aborda o processo 
histórico com esquemas universalizantes e totalizadores. E, bem entendido, a 
totalização não era feita ao acaso; a teoria determinava a perspectivação e a 
ordem dos condicionamentos, estudava tal processo particular no quadro de 
um sistema geral em evolução (SARTRE, 1972, p. 26). 
 
Tentar analisar os elementos constitutivos de um conjunto, os elevando a importância 
primordial para o todo, pode ser arriscado, pois ao tratar de hipóteses particulares como único 
fundamento para a totalização concreta, poder-se-ia cair em uma totalização singular. Nesta 
perspectiva o marxismo pode se confundir com um indutivismo, algo que a ciência e ele 
próprio querem distância. Sartre é enfático em criticar esta posição de alguns marxistas de seu 
tempo, pois para ele estes intelectuais invertem a maneira de se chegar ao conhecimento. 
Tomam seus conceitos, que são históricos, como explicação absoluta e eterna para a 
experiência. Este procedimento fundado em hipótese, como construto formado por 
individualidades, que possuem suas significações particulares, parece se importar mais com as 
singularidades do que com a totalidade unificadora. 
Sartre reforça: 
 
Em outras palavras, dá a cada acontecimento, além de sua significação 
particular, um papel de revelador: já que o princípio que preside a pesquisa é 
o de procurar o conjunto sintético, cada fato, uma vez estabelecido, é 
interrogado e decifrado como parte de um todo; é sobre ele, pelo estudo de 
suas insuficiências e de suas “sobre-significações” que se determina, a título 
de hipótese, a totalidade no seio da qual reencontrará sua verdade. Assim, o 
marxismo vivo é heurístico: em relação à sua pesquisa concreta, seus 
princípios e seu saber anterior aparecem como reguladores (SARTRE, 1972, 
pp. 26-27). 
 
O problema é querer reduzir a totalidade aos fatos corriqueiros e disso defini-la como 
tal. A totalidade deve conter uma unidade de todos os acontecimentos, na qual ela não deve 
ser entendida como uma composição apenas de elementos singulares, que se alguns forem 
retirados ela deixaria de existir. Ela é: uma unidade de uma multiplicidade. 
     Neste ponto Sartre relembra a importância do conceito de análise tão destacado por 
91 
 
Lefebvre anteriormente. É por causa da análise da situação que o marxismo defende, 
principalmente Lefebvre, que pode se entender as totalidades, pois elas são vivas, concretas e 
reais. Elas são ativas no processo de estudo de si mesmas, Marx não aborda entidades, como 
indivíduos singulares. 
 Sobre este método da análise o existencialista francês salienta: 
 
É ponto pacífico, com efeito, que esta análise não pode ser suficiente e que é 
o primeiro momento de um esforço de reconstrução sintética. Mas torna-se 
visível também que ela é indispensável à reconstrução posterior dos 
conjuntos (SARTRE, 1987a, pp. 122-123). 
 
Esta espécie de análise parece não solucionar todo o problema da realidade, porém, se 
apresentou de forma providencial para remontar os conjuntos unificadores. A grande 
dicotomia encontrada, segundo Sartre, é que os mesmos marxistas que enchem a boca para 
falar sobre a importância crucial da análise a rebaixou para mera “cerimônia”. Não estudam 
mais os fatos em uma vertente abrangente do marxismo, eles deveriam ser um objeto de 
pesquisa desta teoria concreta num viés totalizador. 
Então notamos que alguns marxistas não encaram os fatos como ponto relevante para 
a pesquisa, com isto, não podemos ter um melhoramento no saber e um esclarecimento para 
se agir. Assim, a análise se reduz a uma espécie de ação desembaraçadora e indutivista, 
coagindo determinados conceitos e acontecimentos. Ela se empenha em tratar os fatos como 
algo não natural, se esforça em criá-los com um fundamento repousado em “noções 
sintéticas”, que nunca mudam e que são fetichizadas.  
Sartre expressa deste modo esta tendência de alguns intelectuais marxistas: 
 
Os conceitos abertos do Marxismo se fecharam; não mais são chaves, 
esquemas interpretativos: eles se põem para si mesmo como saber já 
totalizado. De tais tipos singularizados e fetichizados o marxismo faz, para 
falar como Kant, conceitos constitutivos da experiência. O conteúdo real 
destes conceitos típicos é sempre do Saber passado; mas o marxista atual faz 
dele um saber eterno. Sua única preocupação, no momento da análise, será a 
de “colocar” estas entidades (SARTRE, 1972, p. 28).  
 
Vemos neste trecho que, para o existencialista francês, o marxismo antes era não 
preconceituoso, fixado no devir do real, e, nas palavras de Henri Lefebvre
29
, inclinado 
abertamente a levar em conta outras propostas, está se fechando em si. Parece que nesta 
vertente temos o caminho inverso ao proposto antes por Marx, que defende que os conceitos, 
referentes a determinadas coisas, são produzidos através do real e não o inverso.  
                                                 
29
 Cf. (LEFEBVRE, 2011, p. 10) “Na concepção marxista do mundo, a ação se define racionalmente em contato 
com o conjunto doutrinário e dá lugar, abertamente, a um programa político”. 
92 
 
Conceitos e significação das coisas não devem ser tratados como eternos e imutáveis, 
e, também como fundamento primeiro da vivência. É ela que fundamenta a construção dos 
conceitos e não o contrário. Esta deturpação do marxismo por alguns marxistas desorienta a 
principal virtude que Marx defendia em seu marxismo, a saber, a verdade é movimento, 
enquanto devir. Alguns de seus seguidores dogmáticos a transforma em Verdade a priori e 
absoluta. Distorcem o princípio de adquirir conhecimento pelo fato de constituí-lo em Saber 
absoluto
30
. 
Posto isto, parece que a vivência social e histórica foge ao Saber. Existem 
conhecimentos especificistas, que são muitos, da realidade que não possuem embasamento 
coeso, não têm fundamento teórico que valide suas concepções e tentam disfarçar suas 
imprecisões parciais e incompletas. E o marxismo, como age? Sartre (1987a, p. 123) responde 
de seu modo: “Quanto ao marxismo, tem fundamentos teóricos, abarca toda a realidade 
humana, mas não sabe mais nada: [...] seu objetivo não é mais o de adquirir conhecimentos, 
mas o de construir-se a priori em Saber absoluto”. 
Sartre sugere uma resposta para esse “imbróglio”: 
 
Ao contrário, o existencialismo e Marxismo visam o mesmo objeto, mas o 
segundo reabsorveu o homem na idéia e o primeiro procura-o por toda parte 
onde ele está, no seu trabalho, em sua casa, na rua. Não julgamos certamente 
– como fazia Kierkegaard – que o homem real seja incognoscível. Dizemos 
somente que ele não é conhecido (SARTRE, 1972, p. 29).  
 
Então, se algumas “doutrinas” não possuem base teórica para justificar racionalmente 
suas posições, a que possui (marxismo), tende a se fundamentar como Verdade absoluta da 
realidade concreta, de maneira a priori e convicta. Já o existencialismo, do mesmo modo que 
o marxismo, procura a mesma coisa, só que por meios diferentes, enquanto o marxismo 
subsumiu o homem à ideia, o existencialismo busca o ser humano em todo lugar, situado em 
sua época e sociedade.  
Se a princípio o homem é marginal ao conhecimento concreto isso se deve ao fato de 
que, até então, só temos definições idealistas dele, que parecem ser parciais e abstratas, não 
correspondem ao homem real e mundano. Este idealismo marxista parece “amarrar” o homem 
comunista em sua condição determinista, não o possibilitando tomar consciência de si mesmo. 
Em outras palavras, este marxismo reproduz todos seus erros e problemas nas lutas 
                                                 
30
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 123) “A pesquisa totalizadora deu lugar a escolástica da totalidade. O princípio 
heurístico: ‘procurar o todo através das partes’ tornou-se esta prática terrorista: ‘liquidar a particularidade’. Não 
é por acaso que Lukács, que violou tantas vezes a história – encontrou em 1956 a melhor definição deste 
marxismo cristalizado. Vinte anos de prática lhe dão toda a autoridade necessária para chamar esta 
pseudofilosofia de um idealismo voluntarista”. 
93 
 
conflituosas dos seres humanos. 
O existencialista francês expõe assim: 
 
É verdade também que a prática marxista nas massas não reflete ou reflete 
pouco a esclerose da teoria: mas justamente o conflito entre a ação 
revolucionária e a escolástica da justificação impede o homem comunista, 
nos países socialistas como nos países burgueses, de tomar uma clara 
consciência de si: um dos caráteres mais marcantes de nossa época é que a 
história se faz sem ser conhecida (SARTRE, 1987a, pp. 122-123). 
 
O grande problema é quando alguns intelectuais marxistas se valem de conceitos antes 
postos pelo próprio “marxismo tendencioso” a condicionar, em prol de crenças políticas, 
grupos ou pessoas a seguirem suas predicações. Isto quer dizer que, os conceitos antes 
eficientes em situações concretas ou reais, podem vir a ser usados, em um anacronismo 
completo, temporal e espacial, para sanar as contradições de outro tempo futuro. 
O marxismo de Marx é uma teoria e uma prática, que está ainda em pleno vigor, no 
começo de seu desenvolvimento. É a filosofia a ser superada, pois sua época ou suas 
situações, que foram substrato para edificação, ainda estão aí. Todo pensamento de nosso 
tempo presente tem influência marxista, mas podemos cair em uma dicotomia, se não formos 
coerentes e expansivos a outras posições teóricas, Sartre afirma que podemos nos perder num 
niilismo teórico ou regredirmos a posições impróprias. 
O filósofo francês descreve assim tal orientação em relação ao marxismo: 
 
Ele permanece pois a filosofia de nosso tempo: é insuperável porque as 
circunstâncias que o engendraram não foram ainda superadas. Nossos 
pensamentos, quaisquer que sejam, não podem se formar se não sobre este 
humo; eles devem conter-se no quadro que ele lhes forneceu, perder-se no 
vazio ou retroceder (SARTRE, 1972, p. 30). 
 
Se o marxismo é a filosofia insuperável de nosso tempo, pois tenta entender a 
realidade por e nela mesma. O existencialismo percorre o mesmo caminho. Se esforça em 
compreender a concretude humana em sua realização, buscando nela mesma sínteses 
concretas, que são fundamentos para uma totalização em pleno devir dialético, que podemos 
chamar de história. 
O mundo é o princípio primeiro de toda e qualquer filosofia, mesmo que, aceita como 
abstrata, metafísica ou qualquer outra doutrina tida ou encarada como irreal – aqui, 
relembrando, Sartre não aceita a noção de filosofia como teoria axiomática e eterna. O 
existencialista francês aponta assim esta estreita relação entre o existencialismo e o marxismo: 
 
O existencialismo, como o marxismo, aborda a experiência para nela 
94 
 
descobrir sínteses concretas, não pode conceder estas sínteses senão no 
interior de uma totalização em movimento e dialética que nada mais é do que 
a história ou – do ponto de vista estritamente cultural em que nos colocamos 
aqui – do que o “tornar-se-mundo-da-filosofia” (SARTRE, 1987a, p. 124). 
 
Então, o existencialismo defende uma verdade que emerge da realidade. É uma 
filosofia que aborda uma totalização em constante devir, que não termina ou perdura para 
sempre, é situada. Não devemos nos ater somente a fatos singulares, pois isolados eles não 
possuem significação completa de si mesmos, se assim procedermos cairíamos num 
relativismo conceitual, não teríamos nem o verdadeiro nem o falso. 
Esta indefinição se refere a uma noção de parcialidade. Ela só terá sentido se for 
comprovada diante de uma totalização unificadora. Por mais que, diversas teorias defendam 
uma segregação do conhecimento, na qual cada especialidade trata de determinado assunto ou 
tema, Sartre defende, assim como Marx, uma concepção totalizadora da realidade, esta 
cosmovisão seria a verdade de determinado tempo histórico, no qual ela está presente. 
O existencialismo é: 
 
Para nós a verdade torna-se, ela é e será devinda. É uma totalização que se 
totaliza sem cessar; os fatos particulares nada significam, não são nem 
verdadeiros nem falsos enquanto não forem referidos pela mediação de 
diferentes totalidades parciais à totalização em curso (SARTRE, 1972, p. 
30). 
 
Postas todas essas reflexões e interpelações de Sartre ao marxismo e aos marxistas 
“dogmáticos”, ele mesmo afirma que tal teoria é a teoria a ser superada, então por que ele não 
se assume como um marxista “desconfiado”? O existencialista francês propõe e recolhe-se 
numa humildade filosófica, ou seja, uma filosofia para ultrapassar o marxismo deve dar ao 
homem uma liberdade que supera o produzir de si próprio em seu meio. Tal filosofia parece 
ainda não existir e pontua: 
 
Logo que existir para todos uma margem de liberdade real para além da 
produção da vida, o marxismo deixará de viver; uma filosofia da liberdade 
tomará seu lugar. Mas não temos nenhum meio, nenhum instrumento 
intelectual, nenhuma experiência concreta, que nos permita conceber esta 
liberdade ou esta filosofia (SARTRE, 1987a, p. 126). 
 
Como vimos até então, Sartre não aceita uma defesa da filosofia como ciência eterna e 
axiomática. O conhecimento ou verdade está sempre por se fazer. Se a filosofia ou o saber são 
históricos, não é prudente defender princípios abstratos, imóveis e eternos. O que chama a 
atenção do francês em todo o percurso de Questões de método é a sua aproximação do 
marxismo com ressalvas, como observado recorrentemente até agora. 
95 
 
Um marxista, em especial, mereceu a reverência de Sartre. Seu nome, não por acaso, é 
Henri Lefebvre, que aferiu ao método dialético uma importância e simplicidade racional. Ele 
não despreza, pelo contrário, eleva a noção de contradição a um patamar de extrema 
relevância no tocante a possibilidade de entendimento crítico, racional e lógico. 
Assim, Lefebvre se destaca pela sua moderação perante a teoria marxista. Ele, ao 
contrário de alguns intelectuais marxistas, busca estabelecer seu marxismo sobre os 
primórdios do marxismo originário. Tais fundamentações recaem no movimento histórico 
contínuo, no devir permanente da vida e da história humana. Aqui, temos a defesa de uma 
concepção de mundo aberta, despreconceituosa e flexível. Assim, Sartre expressa o seu 
respeito à Henri Lefebvre: “Para estudar, sem aí se perder, uma tal complexidade (ao 
quadrado) e uma tal reciprocidade de inter-relações. Lefebvre propõe ‘um método muito 
simples’, utilizando as técnicas auxiliares e comportando vários momentos” (SARTRE, 1972, 
p. 47). 
Os distintos momentos
31
 descritos por Lefebvre, a saber, demonstram-se na exposição, 
que é devinda da pesquisa ou análise e é a posteriori. Já a análise dialética é um método que 
fixa o estudo da realidade na história. Neste sentido, relembrando Lefebvre e discordando de 
muitos marxistas ortodoxos, devemos primeiro perceber a realidade, a experiência, para 
depois produzir conceitos referentes a ela. Expor ou apresentar estes dados é um passo 
derradeiro. Não é possível exibir um conceito sem antes tê-lo originado em uma práxis, 
circunstância situada. 
Por fim, Sartre repreende aos marxistas ortodoxos e dogmáticos, aqueles que pregam 
um idealismo marxista fundado em ideais já postos, se valendo de um indutivismo conceitual, 
ou seja, se um procedimento teórico funcionou bem em determinada circunstância podemos 
torná-lo aplicável a todas as situações semelhantes, isto é, a impressão de que um conceito foi 
aplicado de forma satisfatória pode ser utilizado em atitudes análogas, se tornando verdade 
eterna, sem verificar tal acontecimento em sua realidade. 
Finalizando, Sartre é enfático em seu posicionamento: 
 
Assim, a autonomia das pesquisas existenciais resulta necessariamente da 
negatividade dos marxistas (e não do marxismo). Enquanto a doutrina não 
reconhecer a sua anemia, enquanto fundar seu Saber sobre uma metafísica 
dogmática (dialética da Natureza), em lugar de apoiá-la na compreensão do 
                                                 
31
 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 134) “a) Descritivos. – Observação, mas com um olhar informado pela experiência e 
por uma teoria geral... 
b) Analítico-regressivo. – Análise da realidade. Esforço no sentido de datá-la exatamente... 
c) Histórico-genético... – Esforço no sentido de reencontrar o presente, mas elucidado, compreendido, explicado. 
(Henri Lefebvre: “Perspectives de sociologie rurale”. Cahiers de Sociologie, 1953)”. 
96 
 
homem vivo, enquanto rejeitar em nome de irracionalismo as ideologias – 
como fez Marx – querem separar o ser do Saber e fundar, em antropologia, 
conhecimento do homem sobre a existência humana, o existencialismo 
prosseguirá suas pesquisas (SARTRE, 1987a, p. 126). 
 
O existencialismo continuará existindo sempre que os marxistas persistirem no erro de 
tentar se basear em conceitos apriorísticos os elevando a um nível de eternos, imutáveis e 
indubitáveis. Enquanto isto tudo não for revisto eles vão continuar segregando o ser 
(existência concreta) do Saber (conhecimentos da humanidade). E mais, no existencialismo,  
 
Isto significa que ele tentará esclarecer os dados do Saber marxista com os 
conhecimentos indiretos (isto é, como vimos, com palavras que denotam 
regressivamente estruturas existenciais) e engendrar no quadro do marxismo 
um verdadeiro conhecimento compreensivo que reencontrará o homem no 
mundo social e o seguirá em sua práxis ou, se se preferir, no projeto que o 
lança em direção dos possíveis sociais a partir de uma situação definida 
(SARTRE, 1972, p. 148). 
 
Então, a filosofia sartreana
32
 visa entender os dados concretos do conhecimento 
marxista (Lefebvre e Marx) no núcleo da realidade social humana. Tecer ao lado de Marx um 
conhecimento verdadeiramente dialético e construído, como afirma o marxista francês, na 
vivência humana contraditória fundada no método dialético e na razão dialética. A harmonia 
não passa de um conceito abstrato que não se encontra na sociedade, que é fundada sob o solo 
da contradição. 
  
                                                 
32 Cf. (SARTRE, 1987a, p. 123) “Há, pois, duas concepções que se deve evitar confundir: a primeira, a de 
numerosos sociólogos americanos e de alguns marxistas franceses, substitui tolamente os dados da experiência 
por um causalismo abstrato ou algumas formas metafísicas ou conceitos como os de motivação, de atitude ou de 
papel, que só têm sentido associados a uma finalidade; a segunda reconhece a existência de fins em todo lugar 
em que se encontram e limita-se a declarar que alguns deles podem ser neutralizados no seio do processo de 
totalização histórica. É a posição do marxismo real e do existencialismo. O movimento dialético que vai do 
condicionamento objetivo à objetivação permite, com efeito, compreender que os fins da atividade humana não 
são entidades misteriosas e acrescentadas ao próprio ato: representam simplesmente a superação e a manutenção 
do dado num ato que vai do presente em direção ao futuro; o fim é a própria objetivação, na medida em que 
constitui a lei dialética de uma conduta humana e a unidade de suas contradições interiores”.  
97 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
 
Concluindo, as críticas postas a Sartre parecem não serem verdadeiras. Se 
observarmos bem, quando os marxistas dizem que esta teoria sartreana defende uma 
subjetividade pura , o cogito cartesiano – no qual o homem se isolaria em si do mundo 
exterior e dos outros –, tal crítica não é procedente. Como vimos, a subjetividade defendida 
por Sartre se baseia na relação necessária do eu com o outro, pois a minha existência somente 
é aferida pelo exame do outro. 
Nesta perspectiva, o outro é condição para minha existência de forma plena, visto que, 
eu existo enquanto consciência reflexiva e como um ser humano para o outro. Assim, temos a 
intersubjetividade humana. Em outras palavras, o homem reconhece seu ser na relação direta 
com os outros, há a definição, ao mesmo tempo, de mim e do outro. O mesmo se aplica ao 
problema da liberdade. Então, quando Lefebvre critica o existencialismo de ser uma 
concepção individualista do mundo não é direcionado a Sartre, como observamos, pode ser à 
Jaspers, que defende um existencialismo subjetivista.  
Somente sou livre se todos os outros são da mesma forma. A liberdade humana é 
concreta, não é abstração ou transcendência, “ela é situada no mundo”. Se, como vimos, o ser 
humano é totalidade (unidade) de consciência e corpo, ele deve agir em sua própria realidade, 
no mundo como um todo. A liberdade então é realizada diante de obstáculos postos ao longo 
da vida, é a facticidade. Sem tais adversidades, o homem não passaria de um cumpridor de 
tarefas já dadas. Seríamos como um animal dentro de um corredor sem barreiras, no qual só 
seguiríamos o caminho delimitado pelas paredes, sem ter que ultrapassar nenhum tipo de 
obstáculo. 
Aqui Sartre e Lefebvre se aproximam. O marxista francês defende uma verdade, seja 
ela do conhecimento ou no tocante a moral, provinda da realidade e contradições presentes na 
vida concreta humana. Para ele, não devemos tenta resolver os problemas conceituais ou 
éticos nos valendo de uma enganadora harmonia. As contradições ou obstáculos estão aí, não 
importa que teorias digam o contrário, devemos tentar superá-las e não nos apoiar em uma 
tendenciosa e ideológica conformidade. O mundo é conflituoso. 
Todo e qualquer ser humano exerce uma determinada ação visando realizar sua 
liberdade em ato. É neste momento que eu descubro que minha liberdade está ligada aos 
outros homens, que, por conseguinte, têm suas liberdades relacionadas ao modo de como sou 
livre. Com isso, quando todos exercem suas escolhas livres é que exerço minha liberdade e 
escolha também. Assim sendo, existe a relação de compromisso, pois sou forçado a realizar a 
98 
 
minha liberdade em congruência com a dos outros. 
Posto isto, notamos que é só em liberdade que o homem pode estabelecer a relação 
humana de conduta e de existência, e, a minha liberdade só será considerada como um fim se 
for considerada a de todos como fim também. A partir disto, caímos na moral. Ela está 
fundada na liberdade, pois é por ela que o ser humano inventa seus valores e sua conduta. 
Neste ponto também aparece Lefebvre que aprova as ideias de Marx, o qual afirma 
que não se encontra, ao longo de toda a história, uma moral que abrangesse, ao mesmo tempo 
e de maneira igualitária aos anseios, tanto de dominados, quanto de dominantes. A 
sobreposição das morais elitistas sempre foi notória, defendiam uma exploração, que se 
refinou e melhorou com o passar do tempo, em moldes legais e religiosos. 
O marxismo tenta esclarecer que o erro da moral, que se fundamenta em princípios 
abstratos e ideológicos, está em um processo constante. Determinada moral nasce na sua 
antecessora e as incertezas podem vir a ser reproduzidas ou não, dependendo do caminho 
tomado. Estas morais que se pautam por tais meios são ferramentas de dominação, se valem 
de princípios sobrenaturais para oprimir os proletariados. 
A crítica dialética propõe um esclarecimento deste erro contínuo e irracional. O 
materialismo dialético não se posiciona de forma cínica perante o problema dessas morais já 
estabelecidas, ele apenas as recusa e não assente tais normas como o caso a ser seguido. 
Lefebvre defende uma moral do progresso, só poderemos ter uma ética, propriamente dita, se 
todos os homens forem iguais – a noção de dominação deve ser excluída da vivência humana 
– e possuírem identificação e participação em seus produtos. Dito de outro modo, deve ser 
superada a alienação.  
Para o marxista, esta nova moral deve vir de uma classe excepcional. Tal classe é o 
proletariado, pois somente ela pode ultrapassar esta alienação moral imposta por seus 
dominadores, visto que, é quem sente na pele a opressão e a exploração e que pretende e 
deseja mudar tal situação. Para que isto seja possível, o trabalhador deve se “desamarrar” 
(liberdade) e, do mesmo modo, soltar todos os seus semelhantes.  
O homem pode até exercer suas ações levando em conta uma moral abstrata, porém, a 
decisão final sobre o que fazer é de inteira responsabilidade sua. Neste sentido, ele escolhe 
sua moral. Diante de todos os conflitos que aparecem na vida, o ser humano tem que escolher, 
mesmo que não escolha, ele escolheu não escolher. Nota-se, assim, que a escolha tem um 
caráter de comprometimento humano-temporal, visto que, a escolha de um está ligada aos 
outros por meio da responsabilidade inerente a ela e a escolha é válida para todo tempo 
presente.  
99 
 
A escolha, então, se torna auto-valorativa, pois se escolho tal caminho, o fiz perante 
um número considerável de possíveis e em coerência, responsabilidade e comprometimento 
com a humanidade, em autenticidade e boa fé. Do contrário, quem nega e se esconde da 
liberdade, da responsabilidade perante a si e todos, está agindo de má-fé. Este momento é 
quando uma pessoa tenta se livrar da necessidade de escolher e se apresenta da maneira como 
o outro deseja.  
Já para Lefebvre, nesta nossa sociedade opressora, a escolha está diretamente ligada à 
alienação a qual o homem sofre. Escolho aquilo que me é determinado, pois sou alienado e 
explorado, me vendo, não somente como força de trabalho, mas também como ser humano. 
Não me reconheço em minhas criações, estou sempre exaurido e desgostoso. Se lembrarmos 
bem, mesmo neste meio inóspito, Sartre ainda dá uma autonomia ao ser humano, por mais 
que esteja condicionado por inúmeras imposições é o ser humano, dentro de seu campo de 
possibilidades, que se faz e escolhe suas ações. 
Contrariamente, o agente de má-fé afirma que existem valores pré-estabelecidos, tenta 
justificar suas ações em algo que não eles próprios. Isto é, agindo de forma errônea, 
inautêntica, já implica uma ação de inteira má-fé. Relembrando, todas as justificações e 
desculpas – religiosas, psicológicas, teóricas, científicas ou ideológicas – são a tentativa de 
recusar a liberdade e a responsabilidade referente a seus atos.  
Aqui também notamos a presença de Henri Lefebvre, ele também rejeita valores 
morais fundamentados em metafísica e/ou ideologias. Seguir valores abstratos traz duas 
consequências negativas, uma que não possui uma congruência com o real e outra que serve, 
que o digam os burgueses, de instrumentos de dominação – a moral é aquela que o dominante 
segue, que prega a obediência às “regras” para um bom trabalho (que dignifica o homem). 
Devido a esta intensa responsabilidade diante de todos, o homem se depara com a 
angústia. Ela não é um divisor entre o ser humano e sua escolha, ou seja, ela não é 
fundamento para se escolher algo, ela faz parte da relação entre liberdade, escolha e 
responsabilidade. Não se pode escolher tendo como ponto de partida a angústia, pois ela é 
contemporânea à escolha e não princípio. Somente na má-fé pode-se atribuir à angústia um 
caráter de fundante da escolha. 
Não notamos diretamente a má-fé em Lefebvre, mas ela poderia ser uma justificativa, 
burguesa, para os valores postos em uma sociedade. Não há uma racionalidade metódica que 
valide uma moral fundada em princípios idealistas e/ ou metafísicos, pois eles podem não ser 
aplicáveis ao real concreto. Por exemplo, quando se defende valores provindos de Deus, que é 
sumamente bom e onipotente, parece que nessa realidade alienada e conflituosa não notamos 
100 
 
tais valores, eles são ideias perfeitas e não ações humanas do concreto, fica tudo muito 
“suspenso”. 
Não é verdade também a crítica Cristã ao existencialismo. Sartre parte da concretude 
humana e ateísmo por posição filosófica e não meramente por um ceticismo. A “existência 
precede a essência”, pois primeiro o homem existe, toma consciência de si, para depois sim se 
definir (essência). Tal definição não ocorre de modo instantâneo, só depois que for se 
realizando a si próprio ao longo de sua existência. Sendo assim, não existe natureza humana e 
nem valores morais
 
pré-estabelecidos por um Deus, visto que ele não existe para realizá-los. 
Lefebvre também quer escapar do cristianismo, que segundo ele, favorece 
politicamente quem mais lhe convém. Os grandes sacerdotes, pensadores cristãos, fazem 
acordos com aqueles que mais lhes dão proveitos. A posição política é definida diante de 
anseios previamente atendidos. A política aqui é base para a teoria e não produto de uma 
metódica decisão coerente e racional. 
Os possíveis “ideais” que os homens podem vir a seguir são criados por eles próprios, 
pois o homem é quem inventa seus valores e eles não lhes são superiores. Isto é, a existência 
de Deus - como uma idealização humana - não muda o fato de que o homem é o único 
responsável por suas ações, sua existência e essência. Nisto nos parece que os dois pensadores 
estão de acordo. 
Nota-se que é possível julgar o outro baseando-se na noção de má-fé, pois quando se 
age de tal modo contrariamos a coerência e a responsabilidade humana. Os valores são 
inventados, mas com comprometimento total da humanidade, não é algo licencioso, pois 
tenho que conviver com os outros, com isso, não se pode fazer o que quiser. As ações 
humanas são de responsabilidade dos próprios homens, deve-se, então, afirmá-la. 
E sobre o existencialismo ser pessimista, é algo que não deve ser levado em conta. 
Sartre define o homem por sua ação, “o homem é a totalidade de suas ações”, o ser humano 
que é covarde o é por suas ações covardes e nada mais. Assim, esta teoria é ativa e concreta e 
não imobilista. Pelo contrário, uma pessoa, para ser, tem de agir em sua realidade e não se 
baseando em um postulado a priori. 
O existencialismo é um humanismo porque ele possibilita ao homem ser o próprio 
detentor de seu “destino”, é ele que se define como ser. O homem sempre está por se fazer ao 
longo de sua existência, ele nunca está pronto e acabado. Sua essência é definida por ele 
próprio, suas ações constituem seu ser. Nesta perspectiva, o homem define seu mundo através 
de suas ações e de sua consciência, é ele que atribui significado às coisas e principalmente 
determina seus valores e conduta. 
101 
 
O ser humano, ao escolher suas ações, vai construindo simultaneamente uma imagem 
que ele entende ser a melhor em seu caso. Porém, como a teoria sartreana é concreta e ativa, o 
homem pode mudar de escolha, por algum motivo que tenha comprometimento autêntico 
consigo e com os outros, ele pode ser outra coisa. 
Em suma, o ser humano é livre para escolher, mas não de forma individualista, ele tem 
responsabilidades para com os outros e a angústia decorrente desta circunstância é inerente a 
ele. A conduta moral humana parece ser necessária, pois minha existência só é confirmada de 
modo pleno por meio do outro. Esta inter-relação humana não é harmoniosa, mas é necessária 
para que eu me torne eu e o outro se torne ele mesmo. Então, a moral só pode vir desta 
relação conflituosa e concreta, a saber, eu-outro.  
O método marxista, abordado por Lefebvre, traz à tona o conflito inserido em uma 
análise minuciosa da realidade, a tensão entre elementos, entre o positivo e o negativo, entre o 
proletariado e a burguesia (o que sempre se ressaltou como a força motriz do movimento 
histórico de Marx), assim se desenha a “Luta de Classes” como o cerne da realidade, da 
história. A contradição se expõe como algo que não pode ser ignorado. 
A realidade passa a ser vista de forma diferenciada, como um contexto em movimento. 
Tal movimento é dilacerado, quando separam-se os elementos, os traços a serem analisados, 
as conexões entre eles e investiga-se isoladamente. Aqui se destaca uma peculiaridade da 
teoria marxista, a pesquisa não impede a reconstituição do todo, do movimento, da realidade. 
O método de Marx demonstra um traço singular, a originalidade de cada objeto 
estudado. Individualmente o objeto exprime suas qualidades e diferenças, exprime sua 
contradição. Isso não distancia o marxismo de um âmbito universal, as diferenças são 
destoantes umas das outras, mas não se desligam de uma universalidade, de uma 
racionalidade. 
Sartre se aproxima assim de Lefebvre porque este não rompe com o marxismo de 
Marx. Devemos nos ater ao fato de que a filosofia é histórica, assim como os seus conceitos. 
Um conceito é válido e aceito em sua época e tentar transferi-lo para outra é, no mínimo, 
perigoso. 
O que fica nesta breve relação lefebvriana e sartreana é a importância de se ter um 
método dialético – Análise, racional e metódica da realidade e sua exposição como forma de 
remontar o todo – do qual possa ser produzido um conhecimento racional e histórico. Para 
isto, deve-se pensar numa realidade, necessariamente, conflituosa, na qual desenvolvem-se a 
vida e as relações humanas. É do conflito e condicionamentos que podemos refletir uma 
moral propriamente concreta. Somente deste modo. 
102 
 
Com isto Sartre se opõe não ao marxismo e sim a alguns marxistas. Pois estes tentam 
transformar o marxismo num dogmatismo teórico, eternizando os conceitos marxistas, 
construídos dialeticamente e situados, em Verdades Absolutas. Com isto podem cair no 
mesmo erro dos idealistas, duplicar a realidade, uma para o ser e outra para o saber, tornando 
o marxismo abstrato. Assim este marxismo dogmático deve se atualizar, acompanhar as 
novidades da sociedade e de seu tempo. O marxismo deve se reinventar, não pode ficar se 
autodeterminando como A Teoria, pois esta não existe, como vimos, existem as filosofias, que 
são frutos de seu tempo e a totalização do saber de uma determinada época.  
O idealismo pode sim contribuir com alguns conceitos, mas que se não forem 
congruentes com o real se tornam vazios e sem sentido. Então não devemos excluir 
radicalmente qualquer teoria, pois esta é a totalização do conhecimento de seu tempo que um 
pensador se torna um agente transformador. Porém, o que faz a vida e o conhecimento são as 
pessoas, em sua vivência concreta e real. 
Então, o existencialismo e o marxismo lefebvriano defende uma verdade que emerge 
da realidade. São filosofias ou concepções de mundo que abordam uma totalização que está 
em constante movimento, que não cessa ou perdura para sempre, é situada. Não devemos nos 
ater somente a fatos singulares, pois, isolados, eles não possuem significação completa de si 
mesmos, se assim procedêssemos adotaríamos um relativismo conceitual, não teríamos nem o 
verdadeiro nem o falso. Temos que entender o todo em suas relações. 
Por fim, este trabalho não tem a mínima pretensão de ser uma resposta cabal, pronta e 
acabada sobre o tema, pretendemos que seja um caminho possível para se entender este 
assunto. Marxismo e existencialismo podem sim coexistirem, pois os dois buscam a verdade 
provinda da vida concreta e moral da igualdade e liberdade. Tentar ser a Verdade absoluta e 
imutável é ir contra este princípio do movimento histórico do Ser. Deste modo, este texto 
também é uma invenção histórica e situada, e, não A Resposta. 
  
103 
 
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